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CNJ autoriza cartórios a contratar mediadores e conciliadores cadastrados no Nupemec

Atualizado em 28/08/2025
Cartórios extrajudiciais poderão contratar mediadores e conciliadores externos, desde que os profissionais estejam cadastrados no Núcleo Permanente de Mediação e Conciliação – Nupemec do Tribunal competente ou autorizados pela Corregedoria-Geral da Justiça. A orientação foi dada pelo Conselho Nacional de Justiça – CNJ em resposta à Consulta julgada na 10ª Sessão Virtual, encerrada em 15 de agosto.
A consulta foi feita pela Corregedoria-Geral da Justiça de Mato Grosso do Sul – CGJ-MS, que questionou a possibilidade de contratação de mediadores e conciliadores judiciais por cartórios.
Segundo o relator, conselheiro Ulisses Rabaneda, a remuneração dos profissionais deve ser definida de forma transparente e proporcional, com acordo prévio entre as partes. Também devem ser respeitados os valores fixados pelo Judiciário em casos de gratuidade da Justiça.
A contratação precisa seguir a Lei de Mediação (13.140/2015), o Código de Processo Civil, a Resolução 125/2010 e o Provimento 149/2023.
Regras e limitações
Os mediadores e conciliadores não poderão atuar, ao mesmo tempo, no Nupemec e em cartórios. Além disso, precisam concluir a formação prevista pela Resolução 125/2010.
Se o curso tiver sido pago pelo Poder Público, o custo deverá ser reembolsado pelo responsável pelo cartório, que também terá de supervisionar a qualidade do serviço.
O corregedor nacional de Justiça, ministro Campbell Marques, reforçou que eventuais cursos de aperfeiçoamento devem ser custeados pelos próprios cartórios.
Identificação nacional
Em paralelo, a Câmara dos Deputados analisa o Projeto de Lei 2678/2025, que cria a Carteira Nacional do Conciliador e Mediador – CNACOM. O documento terá validade em todo o território nacional e poderá ser usado como identidade.
A proposta é da deputada Rosângela Reis (PL-MG) e tem como objetivo unificar o modelo de identificação desses profissionais. A emissão ficará a cargo de instituições autorizadas.
O projeto será analisado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania. Para virar lei, ainda precisa ser aprovado pela Câmara e pelo Senado.
Acesso à Justiça
Para a advogada Ana Brusolo Gerbase, presidente da Comissão Nacional de Mediação do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, permitir que cartórios contratem mediadores e conciliadores externos cadastrados no NUPEMEC, pode ampliar o acesso à Justiça Consensual.
Segundo a advogada, os cartórios estão presentes em todo o território nacional, muitas vezes em locais onde o acesso a centros de mediação judiciais ou privados é limitado. Neste sentido, “levar a mediação e conciliação para estes espaços, significa permitir amplo acesso a esses métodos”.
“A rede cartorária oferece uma capilaridade que poucas outras instituições possuem. Isso aproxima os serviços de mediação e conciliação da população, tornando-os mais acessíveis. Além disso, os cartórios, por sua natureza e função de fé pública, conferem credibilidade e segurança jurídica aos procedimentos de mediação e conciliação extrajudiciais, o que pode aumentar a confiança das partes no processo e nos acordos resultantes, garantindo maior celeridade na resolução das demandas, o que o Judiciário sobrecarregado, não consegue oferecer aos jurisdicionados”, observa.
A mediadora Sandra Bayer, membro do IBDFAM, entende que a medida parece uma tentativa para desafogar o Judiciário, “buscando um alcance maior da população através dos cartórios”.
No entanto, ela alerta: “Há que se atentar para a capacitação e especialização dos profissionais da mediação e da conciliação, principalmente quando se fala de um Brasil tão extenso e, em muitos lugares, ainda tão carente de informação adequada”.
Sandra Bayer também reconhece a necessidade de atenção especial para que não se torne “apenas mais um atendimento em massa, para cumprir metas, e não para atender as reais necessidades dos mediandos”.
Soluções
Ana Gerbase entende que o impacto para os cidadãos poderá ser positivo, pois os conflitos podem ser resolvidos de forma mais rápida e com menos formalidades, evitando anos de espera por uma decisão judicial. “A mediação extrajudicial geralmente é mais econômica do que o litígio judicial, evitando custas processuais e eventuais honorários periciais, além de acirrar o conflito.”
Ela pondera, entretanto: “Tudo vai depender de como se dará a prestação dos serviços e quais critérios serão aplicados”.
Na visão da mediadora Marilene Marodin, também membro do IBDFAM, há uma falha na iniciativa: o fato de não ter sido aberto para mediadores privados trabalharem em parceria com os cartórios.
“O Judiciário se espraia cada vez mais e a mediação privada fica com menos espaço. Vai ser outro ‘núcleo do Judiciário’ com mediadores com a formação que temos tido notícias, realizando uma mediação institucional com objetivos claros”, pondera.
De acordo com Marilene Marodin, na mediação, as partes têm um papel ativo na construção da solução, o que resulta em acordos personalizados, sustentáveis, criativos e que atendem melhor aos seus interesses e necessidades, em vez de uma decisão imposta por um terceiro. “Ao focar no diálogo e no consenso, a mediação visa preservar, ou até mesmo melhorar, o relacionamento entre os envolvidos, o que é fundamental em relações continuadas, como os familiares, por exemplo.”
“Nomear o mediador ad-hoc, nestes casos, vai ao encontro dos objetivos da mediação, em restabelecer diálogos rompidos, revincular relações onde o afeto foi perdido e transformar os conflitos. Para isso é necessário especialização nas técnicas apropriadas, dedicação e tempo”, ressalta.
Regulamentação
Ana Gerbase reconhece que, embora a medida seja benéfica, alguns desafios jurídicos podem surgir. Entre eles, a necessidade de regulamentação clara e abrangente sobre as responsabilidades dos cartórios, os limites de atuação dos mediadores e conciliadores externos, as tabelas de emolumentos e os procedimentos específicos a serem seguidos.
A diretora nacional do IBDFAM também alerta sobre a importância de definir quais tipos de conflitos poderão ser tratados nos cartórios via mediação extrajudicial. “O artigo 3º. da Lei da Mediação estabelece que acordos envolvendo direitos indisponíveis devem ser homologados em juízo, ouvido o Ministério Público. Esse procedimento poderá criar mais uma burocracia para os cartórios, em meio a tantas que eles já enfrentam.”
Garantir a orientação de advogado ou defensor público, para que nenhum direito seja violado e os eventuais acordos firmados possam ser exequíveis e não objeto de possíveis nulidades futuras, também são necessidades apontadas pela especialista. “Embora a intenção seja ampliar o acesso, a definição dos custos de emolumentos ou honorários poderá ser um desafio para assegurar o acesso para todas as camadas da população, o que irá implicar no envolvimento da Defensoria Pública também, ou seja, mais burocracia”, avalia.
Outro ponto citado por Ana Gerbase é a necessidade de supervisionar a atuação desses mediadores externos para manter a qualidade e a imparcialidade, “evitando conflitos de interesse ou práticas antiéticas e assegurar que os mediadores e conciliadores externos mantenham sua qualificação e se atualizem constantemente, dada a dinâmica da legislação e das melhores práticas”.
“Em suma, a medida representa um avanço significativo para o sistema de justiça brasileiro, promovendo a desjudicialização e fortalecendo a cultura da paz, mas exige um arcabouço jurídico e regulatório robusto para garantir sua eficácia e segurança para os mediandos”, conclui a advogada.
Por Débora Anunciação e Guilherme Gomes
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