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Câmara dos Deputados aprova projeto sobre proteção de crianças e adolescentes na internet
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O Projeto de Lei 2628/2022, que regulamenta a proteção de crianças e adolescentes em ambientes digitais, foi aprovado nessa quarta-feira (20), pela Câmara dos Deputados. O tema ganhou destaque após a viralização do vídeo feito por um influenciador que expôs casos de “adultização” nas redes sociais.
A proposta cria regras para a proteção de crianças e adolescentes quanto ao uso de aplicativos, jogos eletrônicos, redes sociais e programas de computador. São previstas obrigações para os fornecedores e controle de acesso por parte de pais e responsáveis.
De autoria do senador Alessandro Vieira (MDB-ES), o projeto tem entre seus principais objetivos garantir que as plataformas digitais facilitem aos responsáveis o acesso a informações sobre o que os filhos fazem on-line, prevenindo a exposição a crimes como pedofilia.
O texto, de autoria do Senado Federal, foi aprovado com mudanças feitas pelos deputados. Agora, o projeto retorna para nova votação pelos senadores.
O relator do projeto, deputado Jadyel Alencar (Republicanos-PI), disse que a proposta é mais técnica e restritiva do que o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal – STF, no final de junho, que determinou a retirada de qualquer conteúdo que viole direitos de crianças e adolescentes mediante simples notificação.
"O projeto inova ao estabelecer parâmetros objetivos, requisitos formais e hipóteses específicas de violação, conferindo maior segurança jurídica e eficácia prática à regra", explicou o parlamentar.
Conforme o texto aprovado, as redes sociais devem adotar o chamado "dever de cuidado", impondo uma série de medidas de proteção e responsabilizando as empresas que não cumprirem essas obrigações. Jadyel Alencar defendeu o apelido "ECA Digital" para a proposta, por considerar que a nomenclatura relacionada ao Estatuto da Criança e do Adolescente vai ampliar a adesão social e a observância da medida.
Ambiente digital
A advogada Patrícia Sanches, presidente da Comissão de Tecnologia do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, explica que o Projeto de Lei 2628/2022 estava em análise da Comissão Especial na Câmara desde dezembro de 2024, mas com a denúncia pública realizada pelo Felca em seu canal no Youtube, o tema ganhou força popular, o que provocou a urgência na tramitação.
O texto, segundo ela, busca maior segurança jurídica e aplicabilidade das medidas previstas, com a obrigatoriedade de mecanismos de mediação parental e acessibilidade de canais de denúncia.
Por outro lado, a advogada percebe que a proposta apresenta limitações que precisam ser analisadas, “uma vez que gera a dependência de uma regulamentação posterior por parte do Executivo, e uma indefinição do órgão fiscalizador com competência concreta para aplicação de sanções”.
Patrícia Sanches destaca que o projeto expressamente vedou mecanismos de vigilância massiva, genérica ou indiscriminada, com o cuidado para não comprometer a liberdade de expressão, a privacidade ou o tratamento diferenciado de dados pessoais de crianças e adolescentes.
“A tentativa é aliar critérios técnicos definidos por meio de regulamento, mas sempre com o desafio de impedir a censura e a arbitrariedade. No entanto, o foco principal precisa ser a prioridade absoluta de crianças e adolescentes estabelecida no art. 227 da Constituição Federal”, observa.
Responsabilidade
De acordo com a diretora nacional do IBDFAM, as plataformas de conteúdo da internet terão que se sujeitar a regras que as obrigam a implementarem filtros de conteúdo e sistemas de classificação etária mais robustos, interfaces de controles parentais acessíveis e eficazes, canais de denúncia que atendam aos requisitos de acessibilidade e clareza, além da adoção de medidas técnicas desde o design (privacy by design) com foco na prevenção de exposição infantil a riscos digitais.
A especialista explica que todas as big techs – grandes empresas de tecnologia –, serão responsabilizadas se não demonstrarem que adotaram medidas razoáveis em todos os estágios de criação e operação dos serviços digitais. “Contudo, como já mencionado, todo esse mecanismo de responsabilização ainda dependerá da regulamentação para a criação de um órgão fiscalizador que poderá dar efetividade à legislação”, complementa.
Para Patrícia Sanches, a proposta sinaliza uma mudança regulatória no país, e aproxima o Brasil “de modelos avançados como o da União Europeia, ao estabelecer normas técnicas e objetivas voltadas à proteção integral de crianças e adolescentes no ambiente digital”.
Infância
A psicóloga Glicia Brazil, vice-presidente da Comissão da Infância e Juventude do IBDFAM, reconhece a importância de que toda sociedade civil se reúna para criar políticas públicas de combate à exploração da infância.
Ela explica que o termo “adultização” não é novo e não se restringe ao uso da criança enquanto objeto sexual. “Adultização significa um assassinato simbólico da infância, significa retirar da criança o direito dela ‘ser criança’.”
“Isso acontece em várias esferas da vida de uma criança, inclusive dentro da própria família quando, por exemplo, o casal está se separando e um dos pais, ou ambos, se agridem mutuamente, e a criança presencia situações que fazem com que ela amadureça antes do tempo, que fazem com que ela se sinta desprotegida e desamparada. Isso também é adultização”, esclarece.
Glicia pontua que é necessário pensar em políticas que de fato ajudem os pais a ter controle sobre o que a criança acessa. “Temos hoje um certo controle, por meio de aplicativos, por exemplo, mas o que precisa, na minha opinião, é uma mudança de consciência dos pais a respeito do uso de telas.”
“Muitos pais, por conveniência, deixam os filhos sem limites no uso de telas. Pesquisas de neurociência provam que, além de a criança ter prejuízos cognitivos, essa criança também tem prejuízos de relacionamentos interpessoais, porque, muitas vezes, abre mão dIsso para se relacionar com uma tela”, observa.
Punição
A psicóloga também reconhece que falta maior punição para quem pratica esse tipo de crime. “A punição tem que existir porque se houver projetos que falem apenas em educação para os pais, em educação para professores, em conscientização da sociedade, isso não tem efetividade.”
“Precisamos de políticas efetivas e, para isso, é necessário que haja a punição de quem pratica esse tipo de ação. Do ponto de vista simbólico, a pessoa que explora a criança e a utiliza para fins de exploração sexual, ou uso da imagem de forma indevida, precisa entender que o Estado não tolera abusos”, conclui.
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Por Débora Anunciação
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