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STJ garante atuação da Defensoria Pública na defesa de familiares de vítima de feminicídio
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Atualizado em 17/07/2025
A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ decidiu que a Defensoria Pública pode representar familiares de vítimas de feminicídio mesmo em ações julgadas pelo Tribunal do Júri. O colegiado reforçou que a Lei Maria da Penha garante o direito à assistência jurídica especializada, e esse suporte é obrigatório, inclusive nos casos mais graves.
Segundo o STJ, a nomeação da Defensoria pode ocorrer automaticamente como medida de proteção provisória, nos casos em que a vítima ou seus familiares ainda não indicaram advogado. Essa assistência, no entanto, não impede que, a qualquer momento, eles optem por um profissional particular de sua confiança.
A controvérsia foi levantada pelo Ministério Público do Rio de Janeiro – MPRJ, que recorreu da decisão do 2º Tribunal do Júri do Rio de Janeiro, o qual havia autorizado a atuação da Defensoria como assistente qualificada, a pedido da própria instituição. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro – TJRJ manteve a decisão, mas o MPRJ levou a discussão ao STJ. Para o Ministério Público, a Defensoria não poderia atuar simultaneamente na defesa do réu e na representação dos familiares da vítima, por haver conflito de interesses.
Independência funcional
O argumento foi rejeitado pelo ministro Joel Ilan Paciornik, relator do caso. Ele explicou que a Defensoria Pública é composta por profissionais com independência funcional, como garante a Lei Complementar 80/1994. Por isso, é possível que defensores diferentes atuem no mesmo processo, desde que não haja coincidência de pessoas no exercício dessas funções.
Paciornik comparou a situação ao exercício da advocacia privada, afirmando que não faria sentido impedir dois advogados da mesma seccional da OAB de atuarem em lados opostos de um processo. Para ele, o mesmo raciocínio vale para defensores públicos.
O ministro também destacou que a Lei Maria da Penha, nos artigos 27 e 28, determina que mulheres em situação de violência doméstica têm direito à assistência jurídica especializada. Essa obrigação, combinada com o que estabelece a Constituição Federal sobre o papel da Defensoria, reforça o dever de o Estado oferecer suporte jurídico completo às vítimas. A atuação da Defensoria, segundo ele, não cria uma nova forma de participação no processo, mas garante que a vítima tenha respaldo técnico para exercer seus direitos.
Direitos fundamentais
Para a defensora pública Cristiana Mendes, presidente da Comissão dos Defensores Públicos do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, o julgamento do STJ representa uma interpretação constitucional acertada sobre o papel da Defensoria Pública, que “tutela inúmeros direitos fundamentais, para além da renda ou da hipossuficiência econômica”.
“Todos os cidadãos têm o direito à assistência jurídica integral e gratuita, que não pode ser apenas uma garantia formal, mas um direito efetivo e concreto no Estado de Direito. Assim, sem prejuízo de outras atuações relevantes da Defensoria Pública no processo, a vítima de violência doméstica deve ser assistida individualmente por defensoras ou defensores públicos, salvo se já possuir advogada ou advogado. Essa assistência jurídica, portanto, é obrigatória”, afirma.
Segundo ela, cabe ao juiz comunicar imediatamente à Defensoria Pública para garantir o acesso à ordem jurídica justa, refletindo a função promocional do ordenamento. “A vítima não pode ser tratada como mera testemunha ou espectadora, mas merece um tratamento jurídico humanizado e adequado, diante de sua vulnerabilidade, de modo a influenciar eficazmente o resultado do processo”, explica.
Autonomia
A defensora também ressalta que esse reconhecimento se estende ao Tribunal do Júri, sendo papel da Defensoria Pública atuar em prol da família da vítima de feminicídio.
“A Defensoria também pode atuar na defesa do réu no mesmo processo, por meio de profissionais distintos, com independência funcional assegurada. Esse sistema garante que todos os direitos fundamentais sejam respeitados com autonomia”, pontua.
E destaca que o Ministério Público tem como missão constitucional a acusação em nome da sociedade, mas não lhe cabe defender os interesses individuais da vítima. “Essa tutela específica é da Defensoria Pública, que atua diretamente nas necessidades da vítima e de sua família”, conclui.
Por Guilherme Gomes
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