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Viúva tem direito à renda vitalícia mesmo antes da conclusão do inventário, decide STJ

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ reconheceu o direito de uma viúva legatária ao recebimento das prestações mensais previstas em testamento, independente da conclusão do inventário. A decisão foi unânime.
O caso envolve viúva de 78 anos, sem fonte de renda própria e economicamente dependente do falecido, que havia lhe garantido, por testamento, pensão mensal vitalícia. As duas filhas do testador, únicas herdeiras da parte disponível dos bens e dispensadas da colação (ato de igualar as doações feitas em vida para fins de partilha), recusaram-se a cumprir a obrigação testamentária. Alegaram que o pagamento só seria exigível após a partilha dos bens.
Conforme o entendimento da relatora, ministra Nancy Andrighi, o legado tem natureza assistencial e deve ser pago com abertura da sucessão. Segundo a relatora, embora a regra geral determine que o legatário (quem recebe um bem específico por testamento) só possa exigir o cumprimento de sua parte após a partilha, a natureza assistencial da renda vitalícia – comparável à dos alimentos – impõe a necessidade de pagamento imediato.
A ministra também destacou que, conforme o artigo 1.926 do Código Civil, quando o testamento não especifica a data de início do pagamento da renda vitalícia, esta deve coincidir com a abertura da sucessão (momento da morte do testador). Além disso, apontou a condição de vulnerabilidade da viúva, a morosidade processual do inventário e o elevado grau de conflito entre as herdeiras e a beneficiária, fatores que reforçam a urgência da prestação.
Com base nesses elementos, o colegiado decidiu pelo restabelecimento imediato das prestações mensais devidas à viúva desde o falecimento do testador. As parcelas deverão ser pagas pelas herdeiras, proporcionalmente aos seus quinhões hereditários, conforme disposto no testamento, e sem necessidade de aguardar a conclusão do inventário.
Legado
O jurista Rolf Madaleno, diretor nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, afirma que, quando alguém recebe por testamento um legado de alimentos, que tem objetivo claro e inescusável de manter a subsistência, não tem como aguardar toda a tramitação – pois só no final do processo de inventário é que vai se poder medir se o espólio teria condições de pagar estes alimentos.
Ele compara com a pensão alimentícia, que pode ser fixada em um valor alto e, no final, o juiz decide se deveria ser mais baixa. Nesses casos, o beneficiário não precisa devolver aquilo que já consumiu. “A pensão alimentícia pode ser devida e pode ser indevida, e se for paga não será devolvida. Este é o mesmo espírito do legado de alimentos.”
“É um valor maior, que é o valor da vida humana. A subsistência do legatário de alimentos está em primeiro lugar, assim como a sobrevivência do credor de pensão alimentícia está em primeiro lugar”, avalia.
O jurista acrescenta: “O dinheiro, se depois foi gasto indevidamente, salvou uma vida ou manteve uma vida, então, nesse sentido, para mim está absolutamente correta a decisão judicial que manda pagar desde a abertura da sucessão para que a pessoa não ‘morra de fome’ esperando o fim do inventário”.
Rolf conclui que o entendimento é absolutamente coerente, mas pouco frequente. “Imagino, com o tempo que levou para chegar ao Superior Tribunal de Justiça essa decisão, como sobreviveu esta pessoa legatária de alimentos que, enquanto esse processo tramitou, provavelmente nada recebeu. Vai receber agora com o trânsito de um legado da decisão do STJ.”
Processo: REsp 2.163.919
Por Débora Anunciação
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