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Criança é registrada com três pais e uma mãe no Espírito Santo
A Justiça do Espírito Santo permitiu que uma criança seja registrada com os nomes de três pais e uma mãe. O menino de 10 anos foi criado por um casal homoafetivo e mantém laços com os pais biológicos.
No caso em questão, a criança nasceu e foi registrada regularmente com os nomes da mãe e do pai biológicos. Logo nos primeiros meses de vida do garoto, os pais passaram a contar com a ajuda do tio paterno e de seu marido, primeiro de forma esporádica e depois regularmente, o que ocasionou uma relação afetiva do casal com a criança.
Com o rompimento definitivo da relação conjugal entre o pai e a mãe, a criança passou a viver integralmente com os tios e, diante da necessidade de matriculá-la na escola, surgiu a vontade de regularizar o registro civil. Por se tratar de um caso de multiparentalidade, a família foi obrigada a ingressar com uma ação no Judiciário.
Em primeiro grau, o pedido foi negado porque o juízo entendeu que a mudança no registro só seria possível por meio da adoção. Como esse não era o desejo das partes, a família ingressou com apelação cível e a Justiça reconheceu a paternidade socioafetiva do casal, que passa a constar na certidão de nascimento da criança junto com o nome do pai e da mãe biológicos.
Entendimento consolidado
A advogada Ana Paula Morbeck, presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família, seção Espírito Santo – IBDFAM-ES, atuou no caso e comenta que o pedido de reconhecimento da paternidade socioafetiva foi fundamentado pelo entendimento já consolidado de socioafetividade no Judiciário brasileiro.
“A paternidade e maternidade socioafetivas são uma realidade nos tribunais, consolidada pelo Supremo Tribunal Federal – STF no Recurso Extraordinário 898060 (Tema 622), de repercussão geral. O que diferencia o caso é a configuração desta família específica, em que se apresentam 3 pais e uma mãe”, afirma.
Segundo ela, o processo contou com o trabalho de uma equipe multidisciplinar e de uma perita assistente técnica que constataram a conjuntura da família e a necessidade de retificação do registro civil da criança.
“O julgamento levou em consideração a realidade vivida, a condição da criança, o cerco de amor, afeto e cuidado que a criança desfruta ao lado dos pais socioafetivos, não deixando dúvidas sobre a estrutura familiar formada por três pais, uma mãe e um filho”, pontua.
Sensibilidade e coragem
Para Ana Paula Morbeck, uma decisão como essa reconhece a diversidade das famílias, fortalece os vínculos de afeto, dá segurança jurídica e dignifica as várias formas de relação contemporâneas.
“Conforme disse a grande doutrinadora Maria Berenice Dias, ‘os operadores da Justiça precisam se encharcar de sensibilidade e coragem para ver a realidade da vida’, e, no presente caso, eles viram e, assim, deram à criança o reconhecimento jurídico da família que ela já tinha”, comenta.
Segundo a advogada, um dos pais socioafetivos, ao receber a notícia de que a Justiça permitiu o registro da criança, sentiu finalmente que sua família foi vista pelo Estado. “Para ele, dessa forma, seu filho poderá ter mais segurança para transitar e viver no mundo, com menos medo de apresentar seu núcleo familiar”, acrescenta.
Por Guilherme Gomes
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