Notícias
Mediação no Brasil: desafios e perspectivas no Norte
A mediação tem-se consolidado como uma importante ferramenta na resolução de conflitos de maneira ágil e eficaz no Brasil. Em cada região do país, especialistas atuam para promover e fortalecer a técnica como alternativa ao litígio tradicional, destacando seus benefícios e desafios. Pensando nisso, o IBDFAM convocou representantes das Comissões estaduais para traçar um panorama da Mediação no Brasil.
As cinco matérias têm como foco, cada uma delas, uma das regiões do país e pretende abordar um panorama regional sobre a evolução da técnica, suas especificidades locais e as perspectivas para o futuro.
A região Norte
Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins. O Norte é a maior das cinco regiões do Brasil e apresenta um cenário de desafios e oportunidades diante da vasta extensão territorial, diversidade cultural e dificuldades de acesso a serviços de Justiça em áreas remotas.
Os representantes das Comissões estaduais ouvidos pelo IBDFAM indicam que a mediação tem crescido na região, mas ainda enfrenta desafios estruturais e culturais para sua implementação e consolidação como método alternativo de resolução de conflitos. Confira:
Acre
No Estado do Acre, o principal desafio para a expansão da mediação é promover os benefícios desse método na esfera privada, uma vez que ainda não existem câmaras privadas de arbitragem e conciliação, e a cultura do litígio é predominante. Por outro lado, instituições públicas como o Ministério Público e o Tribunal de Justiça do Acre têm investido em projetos para introduzir e consolidar a resolução alternativa de conflitos, cumprindo as diretrizes do CNJ e do CNMP, alcançando a comunidade local.
(Ludmilla Alves Carbone, representante da Comissão de Mediação do Instituto Brasileiro de Direito de Família, seção Acre – IBDFAM-AC).
Amapá
A Mediação e Conciliação no Amapá enfrentam o grande desafio da falta de conhecimento sobre seus benefícios, pois a cultura jurídica tradicional ainda valoriza o conflito, enquanto a política do Judiciário busca promover a paz social. O objetivo é que as partes envolvidas alcancem soluções construídas em conjunto, respeitando limites legais e promovendo satisfação mútua, ao invés de uma vitória judicial sobre alguém significativo em suas vidas. Os projetos nacionais e locais em andamento visam ampliar o acesso a esses métodos consensuais, com atendimento humanizado e sem a necessidade de advogados. No nosso Estado, temos projetos em desenvolvimento em nível nacional, como a Semana Nacional da Conciliação e a Oficina da Parentalidade, bem como projetos em nível local, como rodas de conversa e oficinas para noivos. Os profissionais da resolução consensual estão preparados para receber demandas, sem a necessidade de advogado e com um atendimento humanizado.
(Marcione Rocha, representante da Comissão de Mediação do Instituto Brasileiro de Direito de Família, seção Amapá – IBDFAM-AP).
Amazonas
No Amazonas, a mediação em conflitos familiares enfrenta desafios culturais, estruturais e educacionais. Entre eles, estão a falta de compreensão das dinâmicas familiares, a cultura competitiva dos operadores do Direito, a rigidez do sistema judicial e o desconhecimento sobre os benefícios da mediação. Além disso, crenças pessoais sobre a família podem interferir no processo, e a formação contínua de mediadores é essencial para lidar com casos complexos. Superar essas barreiras exige capacitação, sensibilização dos profissionais e conscientização da sociedade sobre o valor da mediação. O Centro Judiciário de Solução de Conflitos das Varas de Família do TJAM (CEJUSC-Famílias) tem-se destacado com projetos inovadores, como a Semana de Intervenção Psicossocial (SIP), criada em 2022, que promoveu 118 audiências, resultando em 49% de acordos. Em 2024, o projeto expandiu-se e foi renomeado IMFAM (Intervenção Multiprofissional com Famílias), refletindo o sucesso da abordagem multidisciplinar e preventiva. A atuação do CEJUSC-Famílias também se estende aos litígios sucessórios, buscando promover o diálogo, preservar relações e otimizar o sistema de justiça. Esses projetos têm fortalecido a mediação no Amazonas e transformado a resolução de conflitos familiares.
(Andréa Basílio C. Viana, representante da Comissão de Mediação do Instituto Brasileiro de Direito de Família, seção Amazonas – IBDFAM-AM).
Pará
A mediação de conflitos familiares no Pará enfrenta desafios significativos, especialmente no que diz respeito à capacitação e permanência dos mediadores. A maioria dos usuários desses serviços pertence a grupos economicamente desfavorecidos, o que gera uma grande demanda por mediações gratuitas. Embora a legislação local exija que os mediadores atuem de forma gratuita em apenas 10% dos casos, muitos acabam ultrapassando esse limite, já que a maioria dos casos está sob o regime de gratuidade e não há um fundo para garantir a remuneração. A falta de remuneração adequada é um grande fator de desestímulo e tem levado à evasão de mediadores judiciais. Além disso, a postura adversarial de advogados em processos judiciais dificulta, e às vezes inviabiliza, o trabalho dos mediadores. Outro desafio importante é a limitação tecnológica enfrentada por parte da população, que tem pouca instrução no uso de ferramentas para videoconferências, o que impede a realização de um número maior de sessões de mediação. Além disso, a baixa qualidade da internet em diversas áreas do Pará é um obstáculo adicional. Apesar desses problemas, os CEJUSCs do Pará têm um índice de eficácia de aproximadamente 80% nas mediações de conflitos familiares, o que é considerado bastante expressivo. Entretanto, demandas relacionadas ao Direito Sucessório raramente são encaminhadas para os CEJUSCs, sendo que apenas recentemente, após uma decisão do CNJ em resposta ao TJGO, foi admitida a mediação pré-processual nessas questões. A ausência de promotores de justiça ou defensores públicos em muitos CEJUSCs dificulta a resolução de casos como inventários, especialmente quando há menores ou pessoas incapazes envolvidos. Por outro lado, existem projetos importantes em andamento, como convênios para a realização de testes de DNA na fase pré-processual, que buscam ampliar a resolução de disputas no âmbito do Direito das Famílias.
(Carlos Queiroz, representante da Comissão de Mediação do Instituto Brasileiro de Direito de Família, seção Pará – IBDFAM-PA).
Rondônia
A mediação em Rondônia ainda está em fase inicial, especialmente em conflitos familiares, enfrentando o grande desafio de disseminar a cultura desse método e demonstrar suas vantagens. Atualmente, a mediação judicial predomina no Estado, mas muitas vezes é vista com ceticismo, pois é conduzida por servidores do Tribunal de Justiça sem qualificação técnica adequada, focados principalmente em cumprir metas de audiência. A qualificação dos mediadores é, portanto, um dos principais desafios. Apesar disso, o TJ de Rondônia, sob nova gestão, tem trabalhado para valorizar os mediadores, estudando a possibilidade de privatizá-los e remunerá-los adequadamente. Além disso, a Defensoria Pública possui um núcleo pré-processual que atua em mediação e conciliação antes do ajuizamento, e a OAB está implantando o Centro de Mediação e Arbitragem para fortalecer a desjudicialização no Estado.
(Mario Sergio Leiras Teixeira, representante da Comissão de Mediação do Instituto Brasileiro de Direito de Família, seção Rondônia – IBDFAM-RO).
Roraima
Em Roraima, um dos principais obstáculos para a mediação é a falta de profissionais capacitados, especialmente para lidar com conflitos familiares conforme o Código de Processo Civil. Embora a mediação esteja em ascensão no Estado, a carência de qualificação técnica ainda limita seu potencial. No entanto, o Tribunal de Justiça de Roraima tem buscado fomentar essa prática por meio do Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos, criado em 2015, que incentiva a capacitação de mediadores judiciais. A Defensoria Pública do Estado também tem atuado para evitar a judicialização de conflitos por meio de sua Câmara de Conciliação, Mediação e Arbitragem, promovendo soluções extrajudiciais.
(Cintia Schulze, representante da Comissão de Mediação do Instituto Brasileiro de Direito de Família, seção Roraima – IBDFAM-RR).
Tocantins
A mediação familiar no Tocantins pode ser dividida em duas abordagens: a extrajudicial e a judicial, cada uma com suas características e desafios. A mediação extrajudicial é oferecida pela Defensoria Pública e algumas câmaras privadas, mas enfrenta baixa procura devido à desinformação, desinteresse dos advogados e custos. Já a mediação judicial, mais consolidada, ocorre nos CEJUSCS, distribuídos em 12 polos no Estado. Apesar dos avanços, desafios como a baixa remuneração dos mediadores, rotatividade e tempo limitado para as sessões afetam sua eficácia. Para aprimorar a mediação, é necessário que o Judiciário e as instituições promovam ações que incentivem seu uso e melhorem as condições para mediadores e partes envolvidas.
(Indira Matos Magalhães, representante da Comissão de Mediação do Instituto Brasileiro de Direito de Família, seção Tocantins – IBDFAM-TO).
Por Guilherme Gomes
Atendimento à imprensa: ascom@ibdfam.org.br