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Respeito nas redes: a importância do respeito para um diálogo produtivo
O Direito das Famílias e das Sucessões é permeado por temas sensíveis que repercutem em algumas das parcelas mais vulneráveis da sociedade. A relevância dos debates, porém, muitas vezes é ofuscada por discordâncias polarizadas, que podem tornar o que deveria ser um espaço de diálogo em um cenário de discussões acaloradas.
O IBDFAM acredita no diálogo e no respeito às diferentes formas de pensamento, por isso não apaga comentários em nenhuma postagem – desde que não incluam insultos e/ou palavras de baixo calão.
Para saber mais sobre o tema, o IBDFAM ouviu a advogada Celia Caiuby, membro da Comissão de Família e Tecnologia do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, coordenadora da Comissão de Tecnologia e Inovação do Instituto Brasileiro de Práticas Colaborativas – IBPC, founder da Legal Family, mestra em Direito, consultora, pesquisadora e parecerista jurídica, também autora de livros e artigos jurídicos.
Foto: Arquivo Pessoal
Confira, a seguir, a entrevista na íntegra:
IBDFAM: Na sua opinião, por que o respeito e o diálogo são tão cruciais nas interações on-line, especialmente em discussões que envolvem temas sensíveis como o Direito das Famílias?
Celia Caiuby:
Em discussões sensíveis, especialmente aquelas que envolvem questões do Direito das Famílias, o respeito não é apenas uma exigência ética, mas também um fator indispensável para garantir um debate inclusivo e produtivo.
Somente por meio do respeito mútuo é possível criar um ambiente propício à escuta ativa e à consideração das múltiplas perspectivas que permeiam essas questões, muitas vezes delicadas e de grande impacto social e emocional.
Apenas um diálogo efetivo, respeitoso e cuidadoso é capaz de promover a consideração empática e construtiva de diferentes pontos de vista. No ambiente on-line, o compartilhamento das manifestações em rede é exponencial, o que demanda maior cautela e responsabilidade de quem interage em tais canais.
Temas relacionados ao Direito das Famílias, por terem o desafio de regular e proteger situações fáticas e arranjos familiares diversos, que, muitas vezes, existem à margem da regulação formal e desafiam o status quo, acabam por gerar uma resistência natural àquilo que é novo.
Contudo, mesmo em um único país, como é o caso do Brasil, mas de extensão continental e culturas típicas regionais, os relacionamentos e a forma de se relacionar evoluem e se transformam de uma geração para outra. Tal fato se agrava ainda mais com o aumento da expectativa de vida e longevidade, que expõem de forma muito clara os conflitos intergeracionais.
Estar atento a essas questões é um dever de todos que transitam nesse mundo pós-pandêmico e que se tornou híbrido.
IBDFAM: Como podemos incentivar um ambiente de diálogo respeitoso nas redes sociais, especialmente divergentes quando lidamos com opiniões?
Celia Caiuby:
Em um mundo ideal, a educação digital, pautada no respeito, na responsabilidade e no bom senso, seria suficiente para evitar que debates acalorados se transformassem em cancelamentos e ataques pessoais. No entanto, estamos longe de uma sociedade que, de fato, tenha implementado o direito pleno à inclusão digital.
Nesse cenário, esperar que todos os usuários tenham maturidade digital, ainda é uma utopia. Isso torna fundamental a adoção de medidas proativas para incentivar um ambiente de diálogo respeitoso nas redes sociais, mesmo em meio a divergências de opiniões.
Assim, muitas redes sociais, comunidades, plataformas de relacionamento e grupos abertos têm-se valido dos seguintes recursos:
• Moderação Ativa e Políticas de Conteúdo:
– Implementação de políticas claras de moderação que removam discursos ofensivos, sem sufocar o direito à liberdade de expressão.
– Transparência nas regras das plataformas, permitindo que os usuários entendam os limites do que é considerado aceitável.
– Aplicação de sanções ou bloqueios temporários para aqueles que violarem normas de conduta.
• Códigos de Conduta e Normas Éticas:
– Estabelecimento de códigos de conduta nas plataformas, promovendo comportamentos adequados e sanções para quem os desrespeitar.
– Autorregulação por parte dos usuários, incentivando o respeito mútuo e a autorreflexão antes de postar ou comentar.
• Ferramentas Tecnológicas para Moderação:
– Utilização de inteligência artificial para filtrar e identificar conteúdos abusivos ou inadequados, proporcionando moderação em tempo real.
– Ferramentas de controle para usuários, como bloquear ou silenciar perfis tóxicos, para promover um ambiente mais seguro.
• Envolvimento das Plataformas:
– Incentivo para que as próprias redes sociais adotem medidas proativas, como campanhas de conscientização e educação sobre comportamento on-line.
– Adoção de mecanismos de denúncia fáceis de usar, para que os usuários possam relatar condutas abusivas.
• Proteção Legal e Responsabilidade Civil:
– Ressaltar a necessidade de seguir as diretrizes legais, como as previstas no Marco Civil da Internet (art. 19 e parágrafos, art. 20 e seguintes da Lei nº 12.965/2014), alertando sobre a possibilidade de responsabilização civil e até penal daqueles que ultrapassarem os limites legais em suas interações.
• Diálogo Mediado e Estratégias de Facilitação:
– Utilização de moderadores neutros para mediar discussões acaloradas em comunidades específicas.
IBDFAM: Quais são as melhores práticas para tornar a seção de comentários um espaço seguro e acolhedor, mesmo em meio a debates acalorados?
Celia Caiuby:
A meu ver, destacam-se positivamente, por serem efetivas e de fácil implementação a:
I – Moderação Comunitária Responsável, em que a própria comunidade sinaliza ou denuncia comportamentos tóxicos, promovendo a autorregulação por meio de ferramentas que permitam votos negativos ou marcações de relevância, constituindo uma maneira de os próprios usuários ajudarem a destacar comentários construtivos e ocultar os negativos.
II – Distinção entre Comportamento Tóxico e Discordância Saudável, por meio do desenvolvimento, treinamento e implementação de algoritmos que consigam diferenciar comportamento abusivo de opiniões divergentes, de modo a garantir que vozes legítimas não sejam silenciadas. Para tanto, é imprescindível o estabelecimento de diretrizes claras sobre o que constitui discurso tóxico, evitando que opiniões discordantes, mas respeitosas, sejam equivocadamente moderadas.
III – Assegurar a Transparência e Feedback para os Usuários, de forma a garantir a transparência nas ações de moderação, por meio de justificativas claras sobre a remoção de comentários ou aplicação de sanções, para que os usuários compreendam os limites e tenham a oportunidade de corrigir seu comportamento, reforçando a confiança nas regras e moderação da respectiva plataforma.
IBDFAM: Em sua experiência, quais são as estratégias mais eficazes para lidar com comportamentos tóxicos nos comentários sem silenciar vozes legítimas e divergentes?
Celia Caiuby:
Inicialmente, é importante ter em mente que a internet não é uma “terra sem lei”, pois é possível a identificação dos acessos e posts, por meio do endereço IP da respectiva máquina.
Em relação às estratégias mais eficazes, dependendo da plataforma e do nível de engajamento dos usuários, ao primeiro sinal de conduta inadequada, a própria comunidade frequentemente assume a iniciativa de moderação, denunciando o conteúdo e reforçando as políticas de uso e as regras de interação.
Esse tipo de autorregulação comunitária pode ser uma ferramenta eficaz para manter o ambiente saudável, pois os próprios usuários se tornam guardiões das normas de convivência, promovendo o respeito e a civilidade nas interações.
O restabelecimento de mecanismos, como votos negativos ou marcações de relevância para permitir que os próprios usuários ajudem a destacar comentários construtivos e ocultar os negativos, tem-se mostrado muito eficientes na moderação de redes sociais.
IBDFAM: Quais são as principais tendências que a senhora observa atualmente nessa seara? Estamos caminhando para um ambiente mais saudável ou mais polarizado?
Celia Caiuby:
Atualmente, as redes sociais apresentam uma mistura de tendências que impactam tanto de forma positiva quanto negativa no ambiente on-line. Por um lado, estamos vendo uma melhoria nas ferramentas de moderação e nos esforços das próprias plataformas para criar um ambiente mais saudável, com algoritmos que priorizam o conteúdo positivo e regras mais claras para combater comportamentos tóxicos. No entanto, a polarização continua a crescer, alimentada principalmente por fatores externos, como crises políticas e econômicas, e pela própria estrutura de engajamento das redes, que muitas vezes amplificam discursos extremados.
Apesar de algumas iniciativas, como a melhoria de políticas de denúncia e a crescente preocupação com a saúde mental dos usuários, a velocidade de disseminação de fake news e discursos de ódio ainda são um grande desafio.
Essas tendências mostram que estamos em uma encruzilhada: enquanto as plataformas evoluem para promover um ambiente mais seguro, as pressões externas e a lógica do engajamento continuam alimentando a polarização.
A moderação eficaz, combinada com a responsabilidade dos usuários e das plataformas, será crucial para definir o futuro das interações on-line. Particularmente, como boa otimista/realista que sou, apesar do desafio crescente, prefiro ver o copo meio cheio e olhar positivamente para o futuro.
Por Débora Anunciação
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