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Casal de lavradores consegue adotar menino de 9 anos cuidado por eles desde o nascimento
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Um casal de lavradores conquistou na Justiça do Tocantins o direito de adotar um menino de nove anos, criado por eles desde o nascimento. A criança vivia em condição irregular, sem representante legal e sem nenhum documento de identificação.
Conforme consta nos autos, logo após o nascimento do filho, a mãe biológica adoeceu. Como precisaria ficar internada no hospital, ela pediu para que duas mulheres com as quais teve contato no hospital cuidassem da criança até sua recuperação.
A filha e sobrinha do casal de lavradores atenderam o pedido e levaram o recém-nascido para a casa dos pais. A genitora, no entanto, nunca mais procurou a criança. O pai biológico é desconhecido.
O casal alega que tentou entrar em contato com a mãe biológica e seus familiares, mas sem sucesso. Deste modo, em fevereiro de 2022, ajuizaram o pedido de adoção.
No mês seguinte, o juízo da 1ª Escrivania Cível de Wanderlândia concedeu a guarda provisória e pediu um estudo do caso ao Grupo Gestor das Equipes Multidisciplinares – GGEM.
Conforme o relatório, o casal possui capacidade satisfatória e potencial para exercer uma boa parentalidade, e tem passado por uma série de vivências específicas, como preconceitos, fantasias e medo de perder alguém de quem cuidaram desde o primeiro mês de vida. O estudo aponta que o menino “vê no casal o seu conceito de família, o seu mundo presumido, o lugar que pode chamar de casa e de lar, e onde pode expressar suas manifestações de afeto, emoções e sentimentos, e tudo o mais que a infância permitir expressar”.
Também foram realizadas duas audiências de instrução. Em uma delas, a sobrinha disse que a mãe do menino falava que iria “jogá-lo para as formigas” caso não encontrasse ninguém para cuidar dele, o que a sensibilizou.
A decisão da Justiça de Tocantins considerou a ausência de oposição da mãe, e as informações dos relatórios e conclusões de especialistas, além do parecer favorável do Ministério Público.
O juiz destacou ainda que o casal consegue satisfazer as necessidades do menino em suas fases de desenvolvimento, pois dispõe “de situação socioeconômica suficiente, um bom nível de maturidade, um relacionamento conjugal satisfatório e estável, disponibilidade afetiva e flexibilidade”.
Por fim, o magistrado determinou que, após o trânsito em julgado, seja enviada uma ordem para o cartório fazer o registro civil, com os nomes do casal como pai e mãe da criança.
Melhor interesse
A advogada Silvana do Monte Moreira, presidente da Comissão de Adoção do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, acredita que a adoção intuitu personae (quando os adotantes não são necessariamente previamente cadastrados por já haver vínculo estabelecido) precisa ser regulada com urgência. “Chega de jogar para debaixo do tapete as milhares de adoções consensuais que ocorrem no Brasil.”
“A Justiça insiste em não ver, assim como o Ministério Público e o Legislativo. A adoção consentida, pronta, direta, faz parte das raízes da nossa cultura. Enquanto não existir sua expressa previsão legal, conforme amplamente defendido pelo IBDFAM, crianças e adolescentes ficam no limbo jurídico e à mercê de decisões que podem, eventualmente, não atender ao superior interesse do sujeito de direitos criança e adolescente”, avalia.
A especialista considera importante o reconhecimento do superior interesse pela Justiça do Tocantins. “O que não se pode permitir nunca é a venda, subtração ou intermediação de crianças para fins de adoção.”
“Não podemos corroborar com qualquer prática criminosa e esse tem que ser ponto pacífico entre todos os operadores da área da criança e do adolescente. A criança – aqui considerado o sujeito de 0 a 18 anos incompletos nos termos dos normativos internacionais – terá seu superior interesse atendido se garantidos os direitos insertos no artigo 227, caput, da CRFB”, lembra.
Silvana comenta que relatórios e conclusões dos especialistas ajudam a assegurar que o melhor interesse da criança seja atendido. “O magistrado de primeiro grau precisa de equipes interdisciplinares competentes, capacitadas e vocacionadas, além de despidas de preconceitos e dogmas pessoais.
A análise, segundo ela, deve ser puramente técnica e absolutamente voltada à criança. “Com base nesses estudos o magistrado sentenciará ou não a adoção.”
“Com isso, reforça-se a imprescindibilidade de que todas as Varas da Infância e da Juventude tenham equipes técnicas na forma já prescrita em vários provimentos do Conselho Nacional de Justiça – CNJ que, lamentavelmente, restam descumpridos e contribuindo para a manutenção da invisibilidade de crianças e adolescentes”, conclui.
Por Débora Anunciação
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