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Justiça do DF autoriza mães a registrarem filhos sem comprovar casamento ou união estável
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Duas mulheres conseguiram na Justiça do Distrito Federal o reconhecimento da dupla maternidade sem estarem casadas ou terem união estável estabelecida. Elas tiveram dois filhos gerados por fertilização in vitro, mas um dos Cartórios de Registro Civil do DF negou o pedido de registro de nascimento e a inclusão de uma delas como genitora das crianças sem comprovação de casamento ou união estável.
As mães compareceram ao cartório para solicitar a lavratura dos documentos com as duas como genitoras, porém o pedido foi negado já que elas não têm certidão de casamento ou de união estável.
O caso chegou à Vara de Registros Públicos do Distrito Federal, que julgou improcedente a dúvida suscitada pelo Cartório. A Justiça confirmou que as mães não precisam ser casadas ou ter união estável para terem os nomes incluídos nos registros de nascimentos dos filhos gerados por meio de fertilização in vitro.
De acordo com o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios – TJDFT, a juíza responsável pelo caso destacou que a apresentação de registro de casamento ou escritura pública de união estável não é necessária para incluir o nome da segunda genitora nos registros de nascimento das crianças.
A juíza explica que a legislação dispõe acerca da possibilidade de apenas um dos genitores comparecer ao cartório para registrar os filhos, desde que apresente documento que comprove o casamento ou a união estável.
A sentença considerou os artigos 512 a 515 do Código Nacional de Normas do Foro Extrajudicial do Conselho Nacional de Justiça – CNJ, que tratam do registro de filhos gerados por reprodução assistida.
Segundo a magistrada, embora o capítulo que trata do tema não preveja especificamente casos em que os genitores não sejam casados ou não convivam em união estável, a lacuna deve ser suprida por meio de uma declaração de reconhecimento da maternidade.
A juíza pontuou que as mulheres planejaram a constituição da família, por meio de reprodução heteróloga, cujo doador é anônimo, e compareceram juntas ao cartório, momento em que aquela que não foi submetida à fertilização se declarou genitora dos menores. Assim, “desnecessária se faz a apresentação de registro de casamento ou a escritura pública de união estável para incluir o nome nos registros dos filhos”, finalizou.
Documentos necessários
A registradora civil Márcia Fidelis Lima, presidente da Comissão de Registros Públicos do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, explica que, para obter o registro nos casos de fertilização in vitro, basta apresentar os documentos das mães e dos pais e também comprovar a contratação da técnica.
“Não é obrigatória a existência de conjugalidade entre pais e mães quando comparecem juntos ou juntas ao Ofício de Registro Civil competente para o registro do filho ou filha. A exigência de comprovação de união estável ou casamento entre eles somente será imposta caso apenas um deles compareça ao ato de registro”, afirma.
Segundo ela, a decisão da magistrada vai ao encontro da literalidade do artigo 513 do Provimento 149 do CNJ. “A menos que haja alguma exigência de norma local neste sentido, editada pelo Tribunal de Justiça da Unidade Federativa correspondente, não haverá necessidade de submissão do pedido à apreciação judicial”, explica.
Márcia Fidelis avalia que a existência da discussão em sede do juízo dos Registros Públicos demonstra a possibilidade do entendimento de que haja uma lacuna no texto da norma.
“A decisão deixa inequívoca a desnecessidade de existência de casamento ou união estável entre duas pessoas que pretendam contratar a técnica de reprodução assistida e realizar o projeto parental comum de perfilhação. É um precedente importante para ratificar esse entendimento”, aponta.
Conjugalidade e parentalidade
O advogado Ricardo Calderón, diretor nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, avalia que a interpretação dada de fato supre lacunas que podem resultar da interpretação dos artigos do Código de Normas Judiciais do CNJ.
“O entendimento marca claramente a distinção entre a conjugalidade e a parentalidade, ao permitir o registro de duas mães sem condicionar tal anotação à comprovação de casamento ou união estável. Ao assim proceder, claramente está separando as questões da conjugalidade e da parentalidade, o que parece cada vez mais adequado no cenário brasileiro”, afirma.
Além disso, ele aponta que a decisão confere tratamento isonômico para as uniões homoafetivas.
“No caso em questão, trata-se de um par homoafetivo feminino, de modo que a dificuldade encontrada no registro poderia não se manifestar com a mesma intensidade caso se tratasse de um relacionamento heteroafetivo. Desse modo, a decisão procura dar eficácia à isonomia que vem das deliberações do Supremo Tribunal Federal – STF no trato dos direitos das uniões afetivas”, diz.
Para ela, a deliberação merece atenção porque também utiliza, para um caso de reprodução assistida, “uma solução análoga ao registro dos filhos biológicos”.
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