Notícias
STJ: plano de saúde deve custear criopreservação de óvulos de paciente com câncer até o fim da quimioterapia
![](https://ibdfam.org.br/publicador/assets/img/upload/noticias/afa5f-whatsapp-image-2023-08-17-at-13.01.29.jpeg)
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ decidiu que as operadoras de planos de saúde têm a obrigação de custear o procedimento de criopreservação dos óvulos de pacientes com câncer, como medida preventiva diante do risco de infertilidade, até a alta do tratamento de quimioterapia.
O colegiado entende que, se o plano cobre o tratamento, também deve prevenir os efeitos adversos e previsíveis dele, como a infertilidade, de modo a possibilitar a plena reabilitação da beneficiária.
De acordo com o Tribunal, uma mulher com câncer de mama ajuizou ação para obrigar a operadora de seu plano de saúde a custear o procedimento de criopreservação de óvulos, necessário para preservação de sua capacidade reprodutiva após a realização da quimioterapia. As instâncias ordinárias concordaram com o pedido e condenaram a operadora a reembolsar à autora o valor aproximado de R$ 18 mil.
No recurso ao STJ, a operadora alegou que o contrato exclui expressamente técnicas de fertilização in vitro, inseminação artificial e quaisquer outros métodos de reprodução assistida.
Efeito adverso
Para a relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, o ordenamento jurídico considera de formas distintas o tratamento da infertilidade – que, segundo a jurisprudência, não é de cobertura obrigatória pelo plano – e a infertilidade como possível efeito adverso da quimioterapia coberta pela operadora.
Com base na Lei 9.656/1998 da Agência Nacional de Saúde Complementar – ANS, a ministra explicou que a coleta dos gametas é uma das etapas do procedimento de reprodução assistida, cuja exclusão assistencial é permitida. Por outro lado, ela ressaltou que a Lei impõe às operadoras de planos de saúde a obrigação de prevenir doenças – como, no caso dos autos, a infertilidade.
De acordo com a relatora, a operadora também tem o dever de prevenir, sempre que possível, o dano previsível e evitável resultante do tratamento médico prescrito. "Partindo dessa premissa, verifica-se, no particular, que a infertilidade é um efeito adverso da quimioterapia, previsível e evitável, e que, portanto, pode e – quando possível – deve ser prevenido", concluiu.
"Se a obrigação de prestação de assistência médica assumida pela operadora de plano de saúde impõe a cobertura do tratamento prescrito para o câncer de mama, a ela se vincula a obrigação de custear a criopreservação dos óvulos", declarou Andrighi.
A ministra ponderou ainda que é necessário encontrar uma solução que atenda à expectativa da consumidora, de prevenção da infertilidade, sem impor à operadora obrigação desnecessária ou desarrazoada.
Com essa finalidade, ela considerou que a obrigação de custear a criopreservação dos óvulos, para a operadora, deve ser limitada à data da alta do tratamento de quimioterapia, cabendo à beneficiária, a partir daí, arcar com os custos do serviço.
Impedir a infertilidade
Para o professor José Roberto Moreira Filho, presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família, seção Minas Gerais – IBDFAM-MG, há uma necessidade de diferenciar a utilização de planos de saúde para questões de fertilidade e a atuação desses mesmos planos para impedir a infertilidade.
"O que o STJ fez foi distinguir a não obrigatoriedade do plano de saúde de custear tratamentos para que uma pessoa que é infértil possa ter filhos daqueles tratamentos ou procedimentos médicos que evitam infertilidade. Isso é distinto do que o próprio STJ já vem decidindo", afirma.
O especialista destaca que a Resolução 2023/2022 do Conselho Federal de Medicina – CFM determina que técnicas de reprodução humana artificial podem ser utilizadas não apenas para se ter filhos, mas também por outros motivos como a preservação de embriões em caso de infertilidade.
“As técnicas de reprodução assistida podem ser utilizadas para doação de gametas e para preservação de gametas, embriões e tecidos germinativos por razões médicas e não médicas”, diz um trecho da resolução.
Para José Roberto, a decisão do STJ poderá ter repercussão não só em casos de tratamentos que causam infertilidade, mas também em situações cotidianas.
"Entendo que essa é uma decisão que vai ter repercussão na vida de outras pessoas, até mesmo, por exemplo, para aquelas que exercem profissões que podem causar infertilidade. Uma decisão como essa leva em conta a proteção e o cuidado, atendendo aos princípios bioéticos da beneficência e da não maleficência", avalia.
Efeitos colaterais
A advogada Marcia Boen Garcia Liñan Figueiredo, membro do IBDFAM, demonstra preocupação sobre o impacto da decisão.
"Essa é uma decisão que está sendo tomada de forma recorrente pelo judiciário e que impactará de forma contundente aos consumidores de planos de saúde que terão que arcar com esses custos, pois a Operadora terá que repassar esses custos aos mesmos", afirma.
E acrescenta: "Isso ensejara que outros casos de doenças com efeitos colaterais estejam sujeitos a serem questionados judicialmente".
REsp 1962984
Atendimento à imprensa: ascom@ibdfam.org.br