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STJ: pena pelo crime de ameaça pode ser aumentada quando ex-marido intimida vítima para desistir de divórcio e pensão
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Para a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ, a pena pelo crime de ameaça pode ser aumentada quando o homem tenta intimidar a ex-esposa para que ela desista de pedir na Justiça o divórcio e a fixação de pensão alimentícia em favor dos filhos. O colegiado considerou válida a valoração negativa da circunstância judicial relativa aos motivos do delito (artigo 59 do Código Penal), o que levou ao aumento da pena-base.
Conforme consta nos autos, o casamento durou cerca de 15 anos. Por não aceitar o fim do relacionamento nem a obrigação de arcar com os alimentos, o homem ameaçou a ex-esposa de morte.
Pelo crime de ameaça ele foi condenado a dois meses e dez dias de detenção. Na primeira fase da dosimetria da pena, a juíza avaliou negativamente a circunstância judicial dos motivos do crime e fixou a pena-base em dois meses – o dobro do mínimo legal.
Ao STJ, a defesa alegou que os elementos apontados para justificar a valoração negativa dos motivos seriam inerentes ao tipo penal. O argumento é de que as infrações penais ocorridas em âmbito doméstico, normalmente, são praticadas em razão de discussão sobre o próprio relacionamento, envolvendo questões como o término da relação e as despesas com os filhos.
Segurança jurídica
De acordo com o relator, ministro Ribeiro Dantas, estando devidamente motivada a elevação da pena-base, não há ilegalidade a ser corrigida pelo STJ na via do habeas corpus. O magistrado considerou legal o fato de a pena-base ter passado para dois meses em razão da valoração negativa de uma única circunstância judicial, quando a jurisprudência considera ideal o acréscimo de um oitavo para cada circunstância negativa, aplicado sobre a diferença entre as penas mínima e máxima.
"Tratando-se de patamar meramente norteador, que busca apenas garantir a segurança jurídica e a proporcionalidade do aumento da pena, é facultado ao juiz, no exercício de sua discricionariedade motivada, adotar quantum de incremento diverso diante das peculiaridades do caso concreto e do maior desvalor do agir do réu", registrou o relator.
O ministro concluiu que "a fundamentação adotada justifica o aumento da pena, considerando que o agravante, utilizando-se de ameaças à vida da vítima, buscava covardemente atemorizá-la para que desistisse de ajuizar ações de divórcio e de pensão alimentícia em benefício de seus próprios filhos".
HC 746.729.
Caráter simbólico e educativo
Para a advogada, mediadora e professora Marília Pedroso Xavier, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, o STJ acertou ao adotar este entendimento. “Infelizmente, são comuns os relatos de clientes que buscam escritórios familiaristas alegando que estão recebendo ameaças e intimidações para que desistam da busca de direitos absolutamente fundamentais seus e até mesmo dos filhos comuns”.
“Acredito que a decisão tem importante caráter simbólico e até mesmo educativo. É preciso dar visibilidade para o fato de que ameaças não passarão impunes. O Poder Judiciário realmente não pode tolerar esse tipo de postura criminosa”, afirma a especialista.
A advogada acredita que a decisão representa um avanço para maior punição daqueles que praticam atos de violência contra a mulher, em especial em situações de maior fragilidade e vulnerabilidade, como ocorre em casos de separação e divórcio. Ela destaca a importância da Lei Maria da Penha (11.340/2006), que considera como formas de violência não apenas a agressão física, mas também as violências psicológica, sexual, patrimonial e moral.
“A referida lei assegura à mulher em situação de violência que no prazo de 48 horas seja determinando seu encaminhamento ao órgão de assistência judiciária, quando for o caso, para o ajuizamento da ação de separação judicial, de divórcio, de anulação de casamento ou de dissolução de união estável perante o juízo competente (art. 18, inc. II). É importante ressaltar que a lei também prevê a restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores e a prestação de alimentos provisionais ou provisórios (art. 22, inc. IV e V). Todas estas medidas podem ser requeridas para a proteção das mulheres em processo de separação e divórcio”, explica Marília.
Valoração
Segundo a professora, o Código Penal dá ampla margem ao magistrado para valorar as circunstâncias judiciais na sentença penal condenatória. “Em seu art. 59, o CP estabelece oito vetoriais que influem na fixação da pena-base, dentro dos limites mínimo e máximo da pena cominada em abstrato, antes de chegar à apreciação das agravantes e atenuantes e às causas especiais de aumento e diminuição de pena.”
“Os motivos do crime estão entre essas chamadas circunstâncias judiciais. Normalmente, o que se deve averiguar é se os motivos são inerentes à espécie delitiva, ou se constituem alguma circunstância favorável ou desfavorável ao condenado, o que poderá servir para abrandar ou exasperar a pena, conforme o caso concreto”, aponta a especialista.
A advogada pontua que a legislação penal pune o ato de dirigir palavra, escrito, gesto ou qualquer outro meio simbólico a alguém, ameaçando causar-lhe algum mal injusto e grave. “Trata-se de crime que tutela a liberdade individual e autodeterminação.”
Neste caso, a professora explica que o intuito ameaçador é inerente ao crime. “Contudo, o contexto em que a ameaça é proferida pode justificar a maior reprovação do fato.”
“Exemplo disso é a ameaça dirigida à ex-esposa ou ex-companheira para que desista do exercício de seus direitos assegurados pela legislação civil, como é o caso do divórcio, da partilha ou mesmo dos alimentos. Neste caso, o contexto ameaçador se torna ainda mais grave, havendo espaço para aumento da pena, dentro do limite de um a seis meses previsto pela legislação penal”, observa.
Marília Pedroso Xavier conclui que “a devida proporcionalidade entre a pena imposta e a ofensa é fundamental para que a sanção jurídica possa efetivamente corresponder à gravidade da ofensa ao bem jurídico, traduzindo-se em medida de justiça”.
Por Débora Anunciação
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