Notícias
CNJ reconhece autodeclaração de gênero no sistema prisional; especialista comenta as novas regras

Em decisão aprovada na sexta-feira (2), o Conselho Nacional de Justiça – CNJ determinou que as pessoas condenadas devem ser direcionadas a presídios e cadeias conforme sua autoidentificação de gênero e orientação sexual. A medida permite que lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, travestis ou intersexo – LGBTI condenados e privados de liberdade possam cumprir suas penas em locais adequados à sua identidade.
A nova resolução determina que a Justiça leve em consideração a autodeclaração dos cidadãos, que o sistema penal respeite seus direitos e que os juízes busquem exercer a possibilidade do cumprimento de pena dos LGBTIs em presídios com alas diferenciadas para essa população. As análises serão feitas caso a caso.
A regra também será aplicada aos adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa que se autodeterminem como parte da população LGBTI, enquanto não for elaborada lei própria, considerando-se a condição de pessoa em desenvolvimento, com as devidas adaptações, conforme previsão do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA.
De acordo com o CNJ, a norma aprovada está em conformidade com tratados internacionais ratificados pelo Brasil, com a legislação nacional relativa a Direitos Humanos e com a Constituição Federal. Vai ao encontro, ainda, da proteção às minorias que o atual presidente do órgão, ministro Luiz Fux, defende como fundamental para reduzir as violações de direitos ainda perpetuadas pelo Estado brasileiro.
No Brasil, apenas 3% das unidades prisionais (36 cadeias) possuem alas destinadas ao público LGBTI, segundo dados do Departamento Penitenciário Nacional – DEPEN. Outras 100 cadeias possuem celas exclusivas para essa comunidade. No geral, 90% das penitenciárias não possuem cela ou ala destinada a esse público.
Iniciativa louvável
Maria Berenice Dias, vice-presidente nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM e presidente da Comissão de Direito Homoafetivo e Gênero do IBDFAM, elogiou a medida que atenta para a realidade que das pessoas LGBTI no sistema prisional.
“É enorme a perversidade quando as pessoas acabam aprisionadas em locais que não correspondem a sua identidade de gênero. Todos sabemos dos abusos sexuais, dos estupros reiterados que essas pessoas sofrem quando são colocadas em celas com homens”, enfatiza.
Apesar da nova resolução ser bastante positiva, ela não é inovadora, uma vez que algumas capitais e estados já haviam implementado normas parecidas. No entanto, ainda se fazia necessário uma regra geral para impor a segmentação em todo o país.
“São essenciais essas alas especiais ou, o que eu acho mais correto, que o aprisionamento seja feito em conformidade com o gênero com o qual pessoa se identifica. Ainda que não tenha havido a troca de identidade perante o registro civil, basta haver a autodeclaração. Louvável essa iniciativa”, destaca a especialista.
Necessidade de uma legislação
A advogada manifesta que agora o mais significativo é a aprovação de uma lei nesse sentido, porque os direitos dessas pessoas vulneráveis sempre estão ameaçados. Assim, ela lembra do Estatuto da Diversidade Sexual, previsto no Projeto de Lei do Senado – PLS 134/2018, que dispõe também sobre a identificação de gênero no sistema prisional.
“O indispensável é que essas previsões todas integrem uma lei. Principalmente em face desse fundamentalismo perverso que está se instalando no país, e já está tendo reflexo no âmbito do Poder Judiciário. Então, não bastam só decisões judiciais ou normatizações do CNJ”, diz Maria Berenice.
Atendimento à imprensa: ascom@ibdfam.org.br