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Como ficam as visitas aos idosos residentes em ILPI’S durante as festas de final de ano? Reflexões necessárias.
Como ficam as visitas aos idosos residentes em ILPI’S durante as festas de final de ano? Reflexões necessárias.
Larissa Tenfen Silva
Mestre em Direito. Advogada. Professora em Direito. Presidente da Comissão da Pessoa Idosa do IBDFAM/SC e Vice-Presidente da Comissão da Pessoa Idosa da OAB/SC.
1 Festas de Final de Ano e Pandemia
Um dos períodos mais esperados e desejados de grande parte da população mundial são as festas de final de ano, que incluem o Natal e o Ano Novo, por serem datas que remontam a uma imensa possibilidade de significados, esperança e renovação.
Após um longo ano, a aproximação destas datas serve como um alento e uma nova injeção de ânimo para dar continuidade à vida que segue num futuro próximo. A alegria das festas, dos encontros familiares e de amizade, o exercício de afetos e desejos por meio de abraços, beijos, apertos de mão, as trocas de presentes, a esperança, o tão esperado descanso, as férias e as experiências de lazer são apenas alguns das possibilidades que surgem e envolvem a todos.
Em março de 2020, foi decretada pela Organização Mundial de Saúde a Pandemia da Covid-19 acarretando uma reviravolta na vida e no cotidiano de todos os Estados Nacionais, bem como da população mundial que, diante da possibilidade da morte, saiu em busca de organizar meios de combate, prevenção e redução do crescimento da doença.
Dentre os vários efeitos difíceis de vivenciar que surgiram com a pandemia, os mais marcantes e dolorosos a serem geridos e supridos foram o isolamento social, o sentimento de medo, as perdas pelo falecimento de entes queridos e amigos e as experiências de luto não compartilhados, em termos afetivos e relacionais. A importância e a necessidade dos encontros, dos afetos, ou seja, do estar presente, ficam ainda mais urgentes.
Entretanto, a pandemia está em curso, ainda que com esperanças de término diante dos avanços das produções de vacinas, mas realisticamente, o perigo da disseminação da doença é um fato incontestável. Projeções já demonstram que o período das festas de final de ano, seguidos dos tempos de férias de verão poderão colapsar o sistema de saúde e aprofundar a crise sanitária que já é esperada para o mês de janeiro de 2021, quando bandeiras pretas surgirão para demarcar a gravidade da situação da doença nos municípios dos estados brasileiros.
Surge aí o dilema que grande parte da população mundial se encontra: manter-se recolhido e afastado em busca da preservação da vida individual e coletiva, ou vivenciar de forma plena as festividades na busca de apaziguar as dores, os desejos, as necessidades afetivas e a busca pela melhora da saúde mental? Depois de mais de 9 meses de pandemia esta não é uma questão simples de se responder, seja no plano moral, afetivo ou jurídico.
E um dos desdobramentos deste dilema está atrelado aos desafios ao exercício do direito de convivência familiar e de visitas nestas festas de final de ano, especialmente para aquelas famílias que possuem parentes idosos que moram em instituições de longa permanência.
2 Pessoa idosa, direto de convivência e ILPI
A pandemia da Covid-19 deixa em evidência o aprofundamento da vulnerabilidade social do grupo etário das pessoas idosas, aquelas entendidas com idade igual ou acima de sessenta anos (art. 1 do Estatuto do Idoso).
O processo de envelhecimento, caracterizado pela produção de fragilidades de teor biológico, psicológico, mental, sentimental e social, acrescidos das circunstâncias envoltas da doença causada pelo novo coronavírus, tal como o alto grau de disseminação da doença, a alta resistência de sobrevida do vírus, a falta de uma vacina eficaz ou medicamento específico para cura, da falta de leitos e vagas em hospitais para atendimento de um grande número de doentes, faz com que as pessoas idosas sejam consideradas grupo de risco, frente ao quadro de vulnerabilidade próprio da sua condição de envelhecimento, ainda mais aprofundado quando presentes a existência de comorbidade já estabelecidas (SILVA; ANTUNES, 2020).
Apesar de uma série de normas e ações políticas, desenvolvidas pelos órgãos públicos e esferas governamentais, aliada com inúmeras práticas solidárias realizadas própria sociedade civil, seja por meio de ações individuais ou coletivas estarem em curso para proteção dos idosos, ainda há muito que ser feito e mantido para proteção da vida e saúde desses indivíduos em tempos de pandemia, principalmente diante do cansaço de grande parte dos brasileiros no cumprimento das medidas de cuidado e isolamento e do afrouxamento das restrições por parte dos Estados.
E neste contexto é necessário refletir sobre o exercício do direito de convivência e de visitas, especialmente, das pessoas idosas residentes nas instituições de longa permanência.
O direito de convivência da pessoa idosa, seja ela familiar ou comunitária, é um direito fundamental, tal como disposto no texto constitucional em seus artigos 229 e 230, os quais responsabilizam a família, a sociedade e o Estado pela função de amparo e promoção da participação comunitária e familiar do idoso.
No mesmo sentido são as prescrições dispostas no Estatuto do Idoso que positiva o direito à convivência comunitária e familiar no caput do artigo 3°, bem como no inciso V, § 1° do art. 10, inclusive como forma de garantir o direito de liberdade do idoso. E ainda institui e garante a prioridade deste convívio por meio da participação com outras gerações e o seu atendimento realizado por sua própria família, tal como descrito nos incisos IV e V do § 1° do citado art. 3°.
Em relação ao direito de convivência familiar é importante compreender que tal prescrição vem justamente garantir ao idoso o acesso à família e as possibilidades dessa integração, já que a família se constitui no principal espaço social para o desenvolvimento dos vínculos e capacidades humanas, sendo assim, importante para a proteção, afeto, segurança, apoio e referência para os idosos, em especial, quando existe situação de perda de autonomia e independência (GHILARD; SILVA, 2020).
Assim, independente do idoso viver sozinho, seja em sua casa ou em uma instituição, ou com um parente, ainda que existam outros e que não morem com este, a garantia deste convívio deve ser sempre assegurada, inclusive com todos os membros da chamada família extensa que englobam netos, bisnetos, tios, sobrinhos etc. (GHILARD; SILVA, 2020).
As instituições de longa permanência se apresentam como modalidade de residência coletiva que tem por finalidade o atendimento integral ao idoso, podendo ter caráter público, privado ou filantrópico, cuja configuração alterna de instituições pobres a casas de luxo (CAMARANO; LEITÃO E MELLO, 2010, p. 74). Tal modalidade residencial é permitida pelo Estatuto do Idoso que em seu art. 37 caracteriza as instituições como meio de garantia do direito de habitação da pessoa idosa.
Por tal motivo é que as instituições de longa permanência têm como obrigação garantir a preservação dos vínculos familiares (art. 49 do Estatuto do Idoso) como diretriz realizadora do direito de convivência familiar e do primado do atendimento prioritário ao idoso realizado pela família, agora residente em situação de institucionalização.
Desde o início da pandemia, uma das grandes preocupações do governo e da sociedade brasileira foi à proteção das pessoas idosas em situação de institucionalização diante da alta probabilidade de infecção ou morte destes indivíduos, tal como ocorrido nos primeiros meses da pandemia na Itália, Espanha, França, Irlanda e Bélgica e Canadá (JORNAL DE MINAS – INTERNACIONAL, 2020).
No Brasil, esta realidade começou a ser evidenciada conforme noticiada pela mídia nacional em diversas cidades e Estados da Federação. No Estado de Santa Catarina, por exemplo, de acordo com reportagem veiculada pelo Portal G1 em 05/05/2020, dos 2.519 infectados pela doença, 28 eram idosos e já havia registro de 6 mortes acontecidas em residências coletivas nas regiões de Antônio Carlos, Biguaçu e Camboriú (2020).
Em agosto do mesmo ano, apesar das inúmeras ações realizadas pelos Conselhos dos Idosos, Ministério Público, Vigilância Sanitária, Corpo do Bombeiro, dentre outros órgãos, a realidade catarinense ainda se fez presente diante de novos surtos, tal como acontecido no Asilo Simeão no município de Blumenau no qual ocorreram 3 mortes de residentes, sendo que dos 76 ocupantes 34 testaram positivos (JORNAL DO ALMOÇO, 2020).
No mês de setembro, a realidade de novos surtos e mortes se manteve presente, conforme reportagem veiculada em 29/09/2020 pelo jornal NDmais:
Em Santa Catarina, conforme dados do MPSC, há 292 ILPIs, onde vivem 6.023 pessoas, com 472 casos confirmados de Covid-19 – 346 idosos e 126 funcionários – e 61 mortes. Ao todo, 37 instituições tiveram surtos, pouco mais de 12%. A taxa de letalidade é de 17,63% para os residentes neste tipo de instituição e de 8,59% na população acima de 60 anos no Estado. Uma das situações mais graves de desrespeito aos protocolos de combate ao coronavírus ocorreu em Barra Velha, onde foram suspensas pela Justiça as atividades de três casas, todas dos mesmos proprietários.
Esta mesma situação foi evidenciada no Estado do Rio Grande do Sul sendo aprofundada nestes meados de dezembro, tal como visto na reportagem publicada em 8/12/2020 no portal RBS TV e G1 RS:
Com o avanço da pandemia no Rio Grande do Sul, instituições de acolhimento a idosos voltaram a registrar surtos de coronavírus. Em todo o estado, segundo a Secretaria Estadual da Saúde, foram registrados 353 surtos e houve 481 mortes de residentes desde o início da pandemia. Em Caxias do Sul, na Serra, dois residentes, uma mulher de 67 anos e um homem de 76 anos, do Lar da Velhice São Francisco de Assis morreram em decorrência da Covid-19, nesta terça-feira (8). Eles estavam internados na UTI. Outros seis faleceram, desde o dia 30 de novembro. A secretaria municipal da Saúde informou, na quarta (9), que o exame de uma idosa que faleceu deu negativo para a doença. Segundo a direção, os primeiros casos foram há duas semanas, quando alguns idosos tiveram febre.
"Vínhamos com cuidados intensos com os funcionários, atendendo a todos os protocolos de segurança, com um plano de contingência nesses nove meses. Fomos surpreendidos com uma febrezinha de dois ou três idosos, mas que rapidamente voltou ao normal. No outro dia, foi em outro idoso, e percebemos a necessidade de testá-los", diz a presidente Analice Carrer. De acordo com a Prefeitura de Caxias do Sul, é o surto mais grave em instituições deste tipo na cidade até o momento. Outros três idosos seguem internados no hospital em estado estável. No total, 50 idosos e 20 funcionários do lar testaram positivo para coronavírus. "Contamos com uma médica que acompanha os idosos, com orientação, e vamos continuar trabalhando esses cuidados todos: uso de EPIs, com os produtos que chegam. Os cuidados serão intensificados", afirma Analice. "Estamos todos muito sentidos. É uma situação lamentável, mas estamos empenhados em evitar que isso aumente", acrescenta a presidente. A Vigilância Sanitária fez uma vistoria no local para tentar descobrir a origem do surto, dar orientações às pessoas e solicitar adequações para conter a disseminação do vírus. A Secretaria Municipal da Saúde também fará uma nova testagem nos próximos dias para monitorar os casos. Ao todo, em Caxias do Sul, são seis surtos ativos em casas asilares.[...]
3 Direito de visitas dos idosos nas festas de final de ano em tempos de pandemia
É importante ressaltar que no Brasil, desde o início da decretação da pandemia, foi iniciado um movimento, em todos os âmbitos da federação, ainda que em graus diferentes, na busca por ações e diretrizes políticas e normativas em atenção aos cuidados de saúde da pessoa idosa em situação institucionalizada, com ênfase na atuação do Ministério da Saúde, do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e órgãos do Ministério da Saúde (Secretaria de Atenção Primária à Saúde).
Todos estes cuidados refletiram no fato, conforme pesquisa realizada sobre “Ocorrência de infecção e mortalidade por covid-19 em residências para idosos no Brasil”, do Brasil apresentar, ainda que baseado em dados incompletos relacionados somente a alguns estados da federação, taxa de letalidade de 17,65% de mortes em ILPI, enquanto que o Reino Unido teve 72% dos óbitos de idosos que viviam em residências coletivas de covid (WACHHOLZ, 2020).
Em relação aos cuidados necessários para a realização das visitas aos idosos institucionalizados, observa-se que no início da pandemia as normas visaram restringir ou suspender as mesmas, como forma de garantir a saúde individual e coletiva dos idosos residentes nas casas geriátricas, o que auxiliou na obtenção nacional dos baixos dados de mortalidade nas instituições citados acima.
Os primeiros direcionamentos da Anvisa, que por meio da expedição de normas específicas voltadas para as ILP’S, tal como a Nota Técnica GVIMS/GGTES/ANVISA N. 05/2020 21 de março de 2020 e a Nota Técnica CSIPS/GGTES/ANVISA N. 01/2020, 08 de abril de 2020 passam a orientar no sentido de redução das visitas, incluindo o estabelecimento, pelas instituições, do número de visitantes, frequência e duração das mesmas, além da criação de um cronograma de visitas para evitar aglomerações. Em caso de visitantes com sintomas respiratórios ou que tenham tido contato prévio com pessoas com suspeita ou diagnóstico de Covid-19 a visita não é permitida. Para os casos de sua realização, a indicação de protocolo de análise da saúde do visitante e orientações a serem seguidas durante o período de visitação sobre higiene, etiqueta de tosse, distanciamento e proibição de contato físico com qualquer membro da equipe ou o idoso são normas a serem seguidas (ANVISA, 2020a, p. 10). A necessidade de manter as famílias informadas sobre as medidas de prevenção e a sua importância para a prevenção de contaminação é conduta necessária.
As normas expedidas pela Secretaria de Atenção Primária à Saúde, (Nota Técnica N. 7/2020-COSAPI/CGCIVI/DAPES/SAPS/MS e a Nota Técnica N. 8/2020-COSAPI/CGCIVI/DAPES/SAPS/MS) trazem orientações no sentido de suspensão das visitas de familiares nas instituições de longa permanência com o fim de reduzir o risco de transmissão da doença, incentivando a necessidade de promoção do contato por telefone ou vídeo chamadas entre idoso e familiares, além da referência aos procedimentos de higienização dos equipamentos eletrônicos e telefônicos utilizados. Ademais, há explícita indicação de que os residentes devem evitar o contato com pessoas que apresentem sintomas respiratórios e crianças, uma vez que podem ser vetores de transmissão. A suspensão das saídas dos idosos das ILPI’s nesse período é outra recomendação. A necessidade de orientação e informação aos familiares e outros cuidadores sobre as medidas de prevenção adotas pela Instituição e a situação de suspensão temporária de visitas presenciais e as novas formas de contato são também indicadas. Por fim, as diretrizes apontam para a importância do apoio e monitoramentos pelos cuidadores dos idosos isolados, inclusive apontando pela criação de novas formas de ocupação ao longo deste período (MS, 2020).
Esse movimento pela restrição ou suspensão das visitas de familiares e amigos foi também acompanhado pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia expedida em parecer pela Comissão Especial da Covid-19 em 29 de junho de 2020 (SBGG, 2020), bem como pela Frente Nacional de Fortalecimento das Instituições de Longa Permanência para Idosos (FNFILPI) em relatório apresentado em 5/5/2020 e reforçado nos demais materiais elaborados, tal como a Cartilha de Orientações para Manejo de Visitas ILPI (2020b).
Entretanto, de forma mais recente, observa-se um movimento pela flexibilização das visitas, especialmente neste final de ano, por Estados e municípios da Federação.
O Estado de Santa Catarina, por exemplo, por meio da Nota Técnica n. 36/2020 de 9 de dezembro de 2020 – DIVS/DIVE/SUV/SES/SC lançou orientações para prevenção de contágio por coronavírus em instituições de longa permanência aplicadas aos feriados de natal e ano novo no Estado de Santa Catarina com orientações e medidas direcionadas aos visitantes, as instituições e às autoridades de fiscalização. Já o Estado do Rio Grande do Sul, por meio de Nota Informativa Conjunta entre o Centro de Vigilância em Saúde o a Saúde do Idoso, em 16/12/2020, lançou orientações muito mais seguras e diretivas às instituições de longa permanência para idosos durante o período de festas natalinas e de final de ano frente à pandemia da covid-19. Ressalta-se que tal nota, além dos cuidados relacionados às visitas, de forma contundente recomenda aos gestores, trabalhadores e familiares de residentes de ILPI considerar o adiamento ou redução significativa de visitas a residentes de modo a evitar aglomeração no período dos festejos de final de ano, sendo que nas celebrações no interior das instituições, os familiares não devem participar. Há ainda direcionamentos para estimular a utilização dos contatos virtuais, além da recomendação da não realização de saídas dos idosos para festejos natalinos e de final de ano.
Nesse sentido, as recomendações, no Rio Grande do Sul, estão mais alinhadas com os direcionamentos recentes da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) – Organização Mundial de Saúde (OMS) que, no dia 25/11/2020, lançou recomendação de se evitar viagens e grandes reuniões durante celebrações de fim de ano. Conforme as palavras do subdiretor da Organização, Jarbas Barbosa: “Durante uma pandemia, não existe época de festas sem riscos. Cada encontro, cada viagem de compras e cada plano de viagem aumentam as chances de propagação do vírus” (OPAS/MS, 2020). Entretanto, para minorar os riscos, as pessoas devem seguir as orientações das autoridades de saúde internacional e nacional.
É bom lembrar que, conforme o alerta da pesquisadora da FioCruz Margareth Dalcolmo em participação no debate “E agora, Brasil”, em 14/12/2020, a previsão é de que a chegada da segunda onda no Brasil ocorrerá em janeiro de 2021 provocada justamente pelas festas de natal e de fim de ano. Nas palavras da profissional, “Teremos o janeiro mais triste da nossa História porque nós falhamos em trazer uma consciência cívica da gravidade do que estamos vivendo” (grifo nosso). A epidemia mudou de lugar saindo das ruas e entrando nas casas, porque os jovens abandonaram o isolamento social e levaram o vírus para seus pais e avós (GLOBO, 2020).
Frente a este contexto se apresenta um dilema complexo, não só moral, mas afetivo e jurídico, pois após 9 meses de pandemia, isolamento social, dores e perdas, a necessidade dos encontros e afetos se fazem ainda mais prementes e as datas de Natal de Final de Ano são simbologias que afloram estas necessidades. Entretanto, por outro lado, tem-se a realidade nua e crua do crescimento da pandemia, da falta de vacinação e o perigo do rápido aumento da doença que pode levar a morte de muitos brasileiros, inclusive pelo colapso do sistema de saúde.
Por isso, o exercício do direito de visita dos amigos e familiares de idosos residentes em ILPI precisa ser realmente ponderado, já que ao mesmo tempo se constitui em direito do idoso de receber visitas e de obrigação dos parentes de realizá-las. Tais direitos devem ainda ser analisados juntamente com o direito de saúde e o direito a vida dos idosos. Aqui, o princípio do melhor interesse da pessoa idosa é uma diretriz jurídica que deve auxiliar a reflexão e a ponderação dos direitos acima.
Para auxiliar neste exercício de balanceamento de direitos que confirmam ou afastam as visitas, é relevante levar em conta outras questões. A primeira delas é verificar se há normas municipais, estaduais e federais que permitam as visitas, bem como as suas condicionantes e orientações. Ademais, há necessidade de verificar a possibilidade prática e real das ILPI’s oportunizarem, de modo seguro, para os idosos, visitantes e funcionários tais visitas, lembrando que as instituições são muito diferentes em natureza, infraestrutura e recursos humanos. Assim, devem ser observadas as modalidades de vistas permitidas conjugadas com a obediência dos protocolos de segurança. As modalidades de visitas variam desde visitas presenciais sem contatos físicos, tal como as realizadas nos portões das instituições, como as modalidades Drive Thru e Romeu e Julieta; as visitas nas áreas externas protegidos por barreiras de vidros ou grade de separação, ou ainda as visitas presenciais com contato físico que são realizadas dentro das áreas internas das residências coletivas, caracterizadas como excepcionais, como nos casos de pessoas em situação de terminalidade ou em cuidados paliativos. Nestes casos, além da análise individual da situação do idoso há ainda que se observar a necessidade, ou não, de autorização pelas autoridades sanitárias locais e a discussão com o representante do Ministério Público (FNFILP, 2020b).
Ademais, cabe ainda a análise fática da situação de saúde do idoso a ser visitado, bem como a verificação dos reais benefícios e reflexos futuros desse encontro familiar, tanto para os idosos com quanto para os idosos sem discernimento, pois as visitas podem gerar instabilidades emocionais, alterações de comportamentos, tentativas de aproximação física e até mesmo necessidade de intervenção de funcionários para garantir a segurança e o bem-estar do residente e do visitante (FNFILPI). Importante também há necessidade da verificação das condições de saúde dos visitantes e o cumprimento dos protocolos de visita.
Tem-se ainda a modalidade de visita virtual desenvolvida por videochamadas e contatos virtual sendo a opção mais segura, podendo ser realizada de várias formas, desde simples conversas com ou sem imagem, gravações de vídeos, envio de mensagens eletrônicas, tal como envio de canções virtuais, poesias e flores virtuais, mensagens positivas, abraços virtuais, mensagens espirituais, cartas virtuais etc. Estas maneiras podem ser utilizadas para fomentar o espírito natalino e aproximar os residentes e familiares.
É importante lembrar que grande parte das ILPI’s, desde o início da pandemia, vêm realizando, com muita criatividade e sensibilidade, várias atividades alternativas de socialização comunitária e com as famílias sendo o apoio das equipes técnicas, das famílias e dos voluntários externos de extrema importância. Neste momento de festas de final de ano, este apoio é ainda mais relevante com a realização e incentivo de atividades que ressaltam o Natal e o Ano Novo e proporcionando as famílias e amigos estarem presentes de outras formas que não sejam físicas. Neste sentido a Frente Nacional de Fortalecimento das Instituições de Longa Permanência (2020c) elaborou rico material com formas de atividades que podem ser utilizadas em atividades antes, durante e depois das festas natalinas.
Por fim, se as visitas são formas de estar e ser presente são também possibilidades de contágio da doença e morte. Por isso, as reflexões sobre o direito de visita e os contatos de amigos e famílias com os idosos residentes em casas coletivas precisam ser analisadas com responsabilidade e racionalidade, deixando de lado, ainda que dolorosamente difícil, os desejos e sentimentos, para que as escolhas pela opção de visita e suas modalidades sejam as que permitam o estar presente de forma segura, ainda que distante fisicamente em certas situações. As ressignificações das formas de manifestação de afeto e cuidado surgidas a partir da pandemia ensinam que o afastamento presencial e a aproximação virtual são formas de amor.
REFERÊNCIAS
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