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Os limites da mediação
Fonte: Boletim nº 17
A mediação é uma palavra que está na moda, ocupando um espaço representativo nos noticiários, inserida em cursos de diversas áreas, apresentando-se, enfim, como uma solução mágica, de ilimitada aplicação, principalmente no que concerne os conflitos familiares.
Como bem salienta Jean-François Six [1] , referindo-se à mediação, diz que se trata de uma planta nova, ainda frágil, adolescente, que trabalha ardente e arduamente para tornar-se uma bela árvore. E, para chegar à idade adulta, é preciso que ela se torne tudo o que pode ser e tudo que poderá vir a ser - um espaço de criatividade pessoal e social, um acesso à cidadania.
Portanto, colaborando com o amadurecimento do conceito e da aplicabilidade da mediação, impõe-se destacar os limites de sua indicação, que, inicialmente, podem ser absolutos, podendo vir a se transformarem em relativos, dada a especificidade de cada caso.
Uma regra fundamental que rege a mediação é o limite de sua indicação, quando concomitantemente à ocorrência de violência física ou abuso sexual, com risco iminente de graves danos a algum dos integrantes da família. Esta situação exige medidas incisivas e coercitivas, cuja eficácia venha a inibir a repetição do comportamento. Porém, controlada a violência, é possível promover a mediação entre aquelas pessoas, principalmente por se tratar de uma metodologia capaz de oferecer aos litigantes a oportunidade de compreensão e entendimento do comportamento de cada um, antecedendo e ativando a violência.
Quando se trata de um casal, logo se identifica quem é a vítima e quem é o agressor - numa expressão popular - quem bate e quem apanha. Controlada a agressividade, a mediação pode ser indicada como uma instância protegida pelos valores fundamentais que norteiam esta prática, tais como a imparcialidade, a neutralidade, a liberdade, na qual os mediandos poderão reconstituir as situações em que ocorreu a violência física, para que entendam os mecanismos subjacentes desenvolvidos por ambos, e que culminam naquela desqualificação insuportável a todos os integrantes da família.
O resultado da mediação indicada para um caso como este ora exemplificado, dependendo da disponibilidade pessoal dos mediandos, poderá despertar nos protagonistas a iniciativa de busca de psicoterapia individual e/ou terapia de casal ou familiar, ou até um diagnóstico médico, que poderá vir a descobrir um comprometimento físico causador do comportamento anti-social.
Ademais, é bastante freqüente aos mediadores depararem-se com pessoas altamente comprometidas com o uso de drogas lícitas ou ilícitas, tais como o alcoolismo, os modernos medicamentos oferecidos pela farmacopéia como proposta de "felicidade em drágeas", identificados, genericamente, pelo Prozac, já que foi um dos primeiros a surgir nesta era em que se levanta polêmica quanto à possibilidade destes medicamentos substituírem a prática das diversas psicoterapias. No tocante às drogas ilícitas, o uso da maconha e da cocaína é muito freqüente, ao menos por um dos mediandos.
Este relato de ocorrências na prática privada da mediação demonstra que o mediador necessita de uma fundamentada formação interdisciplinar, capacitando-o a identificar os seus próprios limites em determinadas situações, envolvendo muita responsabilidade. Neste caso o mediador poderá simplesmente recusar o caso, se isto corresponder ao seu foro íntimo.
No entanto, há outra alternativa mais construtiva, com reflexos sobre os mediandos e sobre o próprio mediador. Trata-se da análise da prática, importada da Psicanálise que se vale da supervisão, que vem a ser a oportunidade do mediador recorrer a um terceiro, que pode ser representado por um ou mais mediadores, para a prática da mediação entre si próprio e a mediação à qual está vinculado.
Desta dinâmica instalada entre mediadores, ou o terceiro, o mediador recorrente poderá extrair outras alternativas, dentre as quais, por exemplo, propor aos mediandos a co-mediação com outro mediador que tenha por profissão de origem a necessária experiência para identificar a existência de enfermidades, como, por exemplo, o psicólogo, o médico etc.
Enfim, a mediação tem limites, algumas vezes intransponíveis, porém, na maioria das vezes, a transformação dos limites depende da coragem do mediador que, ao identificar seus próprios limites, reportam-se à fonte inesgotável de seu autoconhecimento.
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