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Nova revolução na constituição de famílias
O casamento por amor fez uma grande revolução nas relações de família. A partir daí as famílias deixaram de ser preponderantemente núcleos econômicos e reprodutivos. Surge o divórcio, já que o amor às vezes acaba. O afeto tornou-se um valor jurídico e em conseqüência surgiram diversas configurações de famílias conjugais e parentais, para além do casamento: uniões estáveis hetero e homoafetivas, multiparentalidade, famílias monoparentais, simultâneas, mosaico etc.
Outra grande revolução que está começando, e em breve se tornará comum, está na constituição de novos modelos de famílias parentais, isto é, filhos de pais que não são fruto de uma relação conjugal ou sexual. Isto só tornou-se possível porque passou-se a distinguir, no campo jurídico, parentalidade de conjugalidade. Até pouco tempo atrás, uma mulher que tivesse uma relação extra-conjugal, além de ser considerada culpada pelo fim do casamento, perdia a guarda de seu filho. Já não é mais assim. O Direito já entendeu que não há culpados, mas sim responsáveis pelo fim da conjugalidade. E uma mulher, embora não tenha sido uma boa esposa, pode ser uma ótima mãe, e vice versa. Foi na esteira desse raciocínio jurídico que as funções conjugais começaram a ficar separadas e diferenciadas das funções parentais, instalando-se uma nova lógica jurídica.
Com a distinção entre essas duas funções na constituição de famílias, é que se tem feito hoje contrato de geração de filhos, assim como já se fazia antes contratos de união estável e pactos antenupciais para regulamentar aspectos patrimoniais dos casamentos. O primeiro sinal dessas novas gerações de famílias parentais são as conhecidas “produções independentes”. Com a liberação dos costumes sexuais a partir da década de sessenta, mulheres que queriam ter filhos, independentemente de terem um parceiro fixo, assumiam a maternidade, até mesmo sem que seu parceiro soubesse. São as denominadas família monoparentais, reconhecidas pelo Estado a partir da Constituição da República de 1988.
A partir da década de oitenta, com o desenvolvimento da engenharia genética, quem não pudesse ter filhos, e não quisesse adotar, já poderia recorrer às técnicas de inseminações artificiais, útero de substituição, busca de material genético em bancos de sêmen e óvulos, independentemente de ter parceiro ou não. Ficou mais fácil ter filhos, e cada vez mais desatrelado de uma relação conjugal ou sexual.
Uma nova categoria de famílias está surgindo, facilitada pela internet. Tais pessoas não estão interessadas em um novo amor ou em constituir uma família conjugal, mas apenas uma parceria de paternidade . Se isto era feito nas décadas anteriores, com dificuldades e limitações da criança não conhecer o doador do material genético, agora fez-se um upgrade nestas famílias parentais. Pelas redes sociais e sites de “paternidade compartilhadas”, já tem sido comum homens e mulheres encontrarem alguém para compartilhar a paternidade/maternidade, sem estabelecerem uma relação amorosa ou sexual. Este novo modelo de filiação se apresenta como uma alternativa à adoção, inseminações artificiais nas quais não se sabe quem é o doador do material genético e barriga de aluguel em que se terceiriza a gravidez. A internet, na verdade, apenas facilitou e ampliou essas facilidades de parcerias de paternidade. No Brasil já se materializava essa idéia, em pequena escala é claro, através de contratos de geração de filhos. A diferença das famílias comuns, é que ao invés de se escolher um parceiro para estabelecer uma relação amorosa ou conjugal, escolhe-se um parceiro apenas para compartilhar a paternidade/maternidade através da combinação de um ato reprodutivo. Isto dá um nó na teoria psicanalítica, que tem como uma de suas bases de sustentação o Complexo de Édipo e o interdito proibitório do incesto, pois fica uma pergunta no ar: como será essa paternidade e maternidade, cujos pais não ocupam lugar de desejo no outro genitor?
Estas novas configurações familiares podem causar uma grande estranheza. Não faltará quem pense que isto é o fim da família, como se falou em 1977 com a introdução do divórcio no Brasil, e que nossa sociedade está sendo invadida por pais errantes e mães desvairadas. No início deste século quando os tribunais começaram a reconhecer e legitimar as famílias entre pessoas do mesmo sexo, não faltou também quem falasse na desordem da família. Nesta nova modalidade de paternidades compartilhadas, certamente, os filhos terão pais muito mais responsáveis e comprometidos com a sua criação e educação do que os muitos filhos de famílias constituídas nos moldes tradicionais, que muitas vezes os abandonam, ou não se responsabilizam por eles. Enfim, estamos diante de um novo marco revolucionário na história da família, assim como foi revolucionário o casamento por amor, que destituiu a lógica essencialmente patrimonialista nas relações de família.
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