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Bulling, responsabilidade dos pais ou professores?
Bulling, responsabilidade dos pais ou professores?
Ana Katarina Nascimento de Azevedo
Graduação em Direito, Professora da Secretaria Municipal de Educação de Natal/RN, Professora da Secretaria Estadual do Rio Grande do Norte.
Ana Ketsia Barreto de Medeiros Pinheiro
Oficial de Justiça de Parnamirim/RN; Professora da Faculdade de Natal/RN, Professora Orientadora.
Resumo: O presente trabalho tem como finalidade abordar uma forma de agressão física e psicológica que tem se tornado frequente nas escolas brasileiras, o bullying. Neste artigo pretende-se debater a quem deveria ser responsabilizado em casos de bullying. Já que se verifica que há uma forte correlação entre os casos de violência e problemas criminais na vida adulta. Dan Olweus foi o primeiro pesquisado do tema e atribuiu algumas características ao bullying: ações repetitivas contra a mesma vítima num período prolongado de tempo; desequilíbrio de poder, o que dificulta a defesa da vítima; ausência de motivos que justifiquem os ataques. No aspecto jurídico o bullying pode ser analisado pela esfera civil, sendo atribuída responsabilidade aos pais, escolas ou Estado. Nota-se evidente concorrência nos casos concretos da responsabilidade dos pais e dos professores. Entretanto, embora a responsabilidade dos professores e mestres esteja fundada na mesma ideia da responsabilidade dos pais, é fato que professores possuem responsabilidade decorrente de um dever exclusivo de vigilância, enquanto aos pais incumbe não só o de vigilância, como também a educação, entendendo-se o dever de educação em seu sentido mais amplo, ou seja, de transmitir os elevados valores morais, éticos e cívicos ao infante, permitindo-lhes possuir a compreensão do certo e do errado. No Brasil, inúmeros projetos de lei estão em discussão nas casas legislativas municipais e estaduais. Na cidade de São Paulo, a lei municipal n. 14.957, de 16 de julho de 2009, de autoria do vereador Gabriel Chalita, dispõe sobre as medidas de conscientização, prevenção e combate ao bullying escolar que deverão integrar o projeto pedagógico das escolas publicas. Em Santa Catarina destaca-se a publicação da Lei n. 14.651 de 12/01/2009, que instituiu o Programa de Combate ao Bullying, de ação interdisciplinar e de participação comunitária nas escolas públicas e privadas do Estado, como uma das boas iniciativas no combate ao bullying nas escolas. Os pais respondem, solidariamente, pelos danos causados por seus filhos, ainda que estejam estes sob a guarda e vigilância das escolas, em razão do dever constitucional de educação. A crise na educação, e, por conseguinte, a deficiente formação de valores morais, éticos e cívicos, no seio da família, tem sido no mais das vezes, a causa do crescente número de crianças e adolescentes envolvidos nos casos de bullying. Como solução, propõe-se uma educação participativa do professor junto aos alunos e pais. Já que agir de forma preventiva é conhecer, participar, orientar, fiscalizar e repreender os alunos, caso seja necessário. Acredita-se que prevenir o bullying é medida para qualidade do ensino, saúde pública e formação do espírito de cidadania.
Palavras chaves: Bullying, responsabilidade civil, família.
Sumário: 1. Conceito: bullying; 2. Aspectos Jurídicos, 3. Conhecendo a realidade brasileira e 4. Considerações Finais.
1. Conceito: Bullying
O termo Bulling é uma forma de agressão, física ou psicológica praticada repetida e intencionalmente com o objetivo de ridicularizar, humilhar ou intimidar quem a sofre. O ato de violência geralmente é cometido contra alguém em desvantagem de poder, sem motivação aparente, causando-lhe dor e humilhação[1].
Sendo um comportamento abusivo e agressivo, manifestado através de gestos, palavras, atitudes, comportamentos ou qualquer outro meio, de forma intencional e repetitiva, que atenta contra a dignidade e integridade física e psíquica de uma pessoa, causando-lhe medo, insegurança, dor, angústia e sofrimento, engendrando, conseqüentemente, doenças psíquicas e físicas (psicossomáticas), desordem pessoal e profissional, além de refletir na qualidade e finalidade do processo educativo, bem como na sociedade e na saúde pública[2].
Existem alguns critérios básicos, que foram estabelecidos pelo pesquisador Dan Olweus, da Universidade de Bergen, Noruega (1978 a 1993), para identificar as condutas de bullying e diferenciá-las de outras formas de violência e das brincadeiras próprias da idade. Os critérios estabelecidos são: ações repetitivas contra a mesma vítima num período prolongado de tempo; desequilíbrio de poder, o que dificulta a defesa da vítima; ausência de motivos que justifiquem os ataques[3].
Verifica-se que há forte relação entre a prática de bulling pelos adolescentes e os posteriores problemas criminais na fase adulta, mostrando um estudo que 60% dos que praticaram bulling na escola durante o ensino primário e secundário sofreram condenações criminais antes dos 24 anos de idade[4].
2. Aspectos jurídicos
Sob a ótica do direito constitucional, a proteção contra a prática do bulling decorre do princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1; inciso III) e do disposto no art. 5, inciso X da CF/88:
“Art. 1: A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado de Democrático de direito e tem como fundamentos: III – a dignidade da pessoa humana.”
“Art. 5: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.”
Já no Código Civil brasileiro a proteção contra bulling encontra amparo na proteção dos direitos da personalidade (art. 12) dentre os quais se inserem a honra, a imagem, a integridade física, o nome e a própria paz interior, ou seja, inerentes à inviolabilidade da pessoa humana, no aspecto físico, moral e intelectual.
“Art. 12: Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.”
Apesar das previsões que visam inibir tal prática de violência, conforme já citado anteriormente, esta temática tem sido analisada pelo Direito, por refletir diretamente em uma de suas searas que é a responsabilidade civil. Existe uma enorme celeuma jurídica se tal responsabilidade é dos pais ou dos professores, em virtude de existir muitos casos relacionados ao âmbito escolar.
Quanto aos atos danosos ocorridos no âmbito escolar, sempre tidos como de exclusiva responsabilidade das escolas, parece não somente ser possível como necessário, atribuir também aos pais a responsabilidade posto que a eles incumbem com absoluta prioridade o dever de educá-los.
O Código Civil dispensa a necessidade de se buscar qualquer indício de culpa por parte dos genitores nos casos de danos causados pelos filhos. Basta a existência do dano perpetrado pelos filhos menores para que se imponha aos genitores o dever de reparação.
Nota-se evidente concorrência nos casos concretos da responsabilidade dos pais e dos professores. Entretanto, embora a responsabilidade dos professores e mestres esteja fundada na mesma idéia da responsabilidade dos pais, é fato que professores possuem responsabilidade decorrente de um dever exclusivo de vigilância, enquanto aos pais incumbe não só o de vigilância, como também a educação, entendendo-se o dever de educação em seu sentido mais amplo, ou seja, de transmitir os elevados valores morais, éticos e cívicos ao infante, permitindo-lhes possuir a compreensão do certo e do errado[5].
Não se esquecendo nem excluindo que o menor responde de maneira direta e excepcional, segundo art. 116 do Estatuto da criança e do adolescente, pois a citada norma estabelece que, e se tratando de ato infracional com reflexos patrimoniais, a autoridade poderá determinar se for o caso, que o adolescente restitua a coisa, promova o ressarcimento do dano ou por outra forma compense o prejuízo da vitima.
3. Conhecendo a realidade brasileira
Inúmeros países adotam a mesma ideia de que o combate ao bulling continua a ser uma missão mais atribuída às escolas do que aos tribunais. No Reino Unido todas as escolas são obrigadas a ter um plano antibulling que integre normas disciplinares claras. No Canadá e EUA foram introduzidas no currículo escolar, medidas de prevenção contra bulling podendo as escolas serem responsabilizadas por omissão. A Noruega instituiu um programa que prevê a constituição de comissões antibulling com competência para a capacitação de docentes e demais profissionais a realização de intervenções e encontros com estudantes e pais dos envolvidos incluindo a adoção de medidas de apoio as vitimas. Em Portugal, o tema está sendo amplamente discutido e foi incluído no Programa de educação para saúde e deve integrar o projeto educativo das escolas[6].
No Brasil, inúmeros projetos de lei estão em discussão nas casas legislativas municipais e estaduais. O diferencial dos textos sob análise nas câmaras legislativas brasileiras é a exigência de que também os clubes de recreação adotem medidas de conscientização, prevenção, diagnóstico e combate ao bulling, ao lado das alterações propostas no estatuto da criança e do adolescente (ECA) e na lei de diretrizes e bases da educação (LDB)[7].
Na cidade de São Paulo, a lei municipal n. 14.957, de 16 de julho de 2009, de autoria do vereador Gabriel Chalita, ex-secretário estadual de educação, dispõe sobre as medidas de conscientização, prevenção e combate ao bulling escolar que deverão integrar o projeto pedagógico das escolas publicas[8].
Em Santa Catarina destaca-se a publicação da Lei n. 14.651 de 12/01/2009, que instituiu o Programa de Combate ao Bullying, de ação interdisciplinar e de participação comunitária nas escolas públicas e privadas do Estado, como uma das boas iniciativas no combate ao bullying nas escolas.
Todas estas manifestações no sentido de criar uma legislação pertinente para o assunto devem-se principalmente a uma pesquisa nacional realizada nas cinco regiões brasileiras em que se mostraram dados inéditos quanto a essa realidade. Dos 5.168 estudantes de seis a nove anos ouvidos, 17% estão envolvidos em bulling no espaço físico escolar e 31% no espaço virtual. Quanto ao local de maior incidência foi apontada a sala de aula, sem ou com o professor, seguido do pátio de recreio. Outros dados relevantes indicam que o bulling é mais comum nas regiões sudeste e centro oeste e praticado com mais freqüência pelos adolescentes na faixa etária entre onze e quinze anos de idade, estudantes da sexta série do ensino fundamental[9].
4. Considerações finais
Os pais respondem, solidariamente, pelos danos causados por seus filhos, ainda que estejam estes sob a guarda e vigilância das escolas, em razão do dever constitucional de educação.
A crise na educação, e, por conseguinte, a deficiente formação de valores morais, éticos e cívicos, no seio da família, tem sido no mais das vezes, a causa do crescente número de crianças e adolescentes envolvidos nos casos de bulling.
Como solução, propõe-se uma educação participativa do professor junto aos alunos. Agir de forma preventiva é conhecer, participar, orientar, fiscalizar e repreender os alunos, caso seja necessário. Acredita-se que prevenir o bullying é medida para qualidade do ensino, saúde pública e formação do espírito de cidadania.
Além disso, a escola deve incluir no Projeto Político Pedagógico disciplinas focadas no conhecimento e prática de cidadania e dos direitos e garantias fundamentais consagrados pela Constituição Federal.
Concluindo destaca-se a publicação da Lei n. 14.651 de 12/01/2009, que instituiu o Programa de Combate ao Bullying, de ação interdisciplinar e de participação comunitária nas escolas públicas e privadas do Estado de Santa Catarina, como uma das boas iniciativas no combate ao bullying nas escolas.
Abstract: This study aimed at approach a form of physical and psychological aggression that has become common in Brazilian schools, bullying. In this article we discuss who should be responsible in cases of bullying. Since it is apparent that there is a strong correlation between violence and crime problems in adulthood. Dan Olweus was first researched the topic and some characteristics attributed to bullying: repetitive actions against the same victim over a prolonged period of time; imbalance of power, which makes the defense of the victim; absence of reasons justifying the attacks. In legal aspect bullying can be analyzed by the civil sphere, being assigned responsibility to parents, schools, or State. Note become apparent competition in a particular case the responsibility of parents and teachers. However, although the responsibility of teachers is based on the same idea of the responsibility of the parents, is the fact that teachers have a duty liability of unique vigilance, while the parents lies not only vigilance but also education, understanding the duty to education in its widest sense, that is, to transmit the high moral, ethical and civic values to the infant, allowing them to have an understanding of right and wrong. In Brazil, numerous bills are under discussion at the municipal and state legislative houses. In São Paulo, the municipal law. 14,957, of July 16, 2009, authored by Councilman Gabriel Chalita, provides for measures of awareness, prevent and combat school bullying that should integrate the pedagogical project of public schools. In Santa Catarina there is the publication of Law no. 14,651 of 12/01/2009, which established the Program to Combat Bullying, disciplinary action and community participation in public and private schools of the State, as one of the best initiatives to combat bullying in schools. Parents respond jointly and severally, for damages caused by their children, even if they are under the custody and supervision of schools, because of the constitutional duty of education. The crisis in education, and, therefore, inadequate training of moral, ethical and civic, in the family, has been in most cases, the cause of the increasing number of children and adolescents involved in cases of bullying. As a solution, we propose a participatory education teacher with students and parents. Since preventative action is to know, to participate, to guide, supervise and reprimanding students, if necessary. Believed to prevent bullying is to measure the quality of education, health and training of the spirit of citizenship.
Keywords: Liability, Family e Bullying.
[1] ESPER Glaucia Cristina da Silva. Bullying, Revista jurídica Consulex, ano XVI n 325, 01 de agosto de 2010.
[2] NASCIMENTO, Grasiele Augusta Ferreira; ALKIMIN, Maria Aparecida. Violência na escola: O bullying na relação aluno-professor e a responsabilidade jurídica. Texto publicado nos anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI, Fortaleza/CE, 2010.
[3] FANTE, Cléo; PEDRA, José Augusto. Bullying escolar: perguntas e respostas. Porto Alegre, Artmed, 2008.
[4] BONFIM, Silvano Andrade do. Bullying e Responsabilidade civil: Uma nova visão do direito de família á luz do direito civil constitucional. Revista Brasileira de direito das famílias e sucessões. Porto Alegre: magister; Belo horizonte: IBDFAM, vol. 22 (jun./jul. 2011).
[5] BONFIM, Silvano Andrade do. Bullying e Responsabilidade civil: Uma nova visão do direito de família á luz do direito civil constitucional. Revista Brasileira de direito das famílias e sucessões. Porto Alegre: magister; Belo horizonte: IBDFAM, vol. 22 (jun./jul. 2011).
[6] FANTE, Cléo. Bullying no ambiente escolar. Revista jurídica Consulex, ano XVI n 325 01 de agosto de 2010.
[7] FANTE, Cléo. Bullying no ambiente escolar. Revista jurídica Consulex, ano XVI n 325 01 de agosto de 2010.
[8] BONFIM, Silvano Andrade do. Bullying e Responsabilidade civil: Uma nova visão do direito de família á luz do direito civil constitucional. Revista Brasileira de direito das famílias e sucessões. Porto Alegre: magister; Belo horizonte: IBDFAM, vol. 22 (jun./jul. 2011).
[9] FANTE, Cléo. Bullying no ambiente escolar. Revista jurídica Consulex, ano XVI n 325 01 de agosto de 2010.
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