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Animais domésticos e o afeto familiar
ANIMAIS DOMÉSTICOS E O AFETO FAMILIAR
Família! Família!
Cachorro, gato, galinha.
Família,
Titãs
Quando o ministro Antonio Magri surpreendeu o Brasil, dizendo que seu cachorro também era gente, houve uma reação geral, criticando-o pelo excesso de sentimento e ultraje à condição humana.
Hoje, pelo que se vê e observa, não chocariam tanto suas palavras, já que os animais estão conquistando cada vez mais direitos e considerações no seio das famílias, principalmente das famílias sem filhos e dos solteiros que vivem só. E agora o Obama convoca o prestígio dos animais de estimação para torná-los cabos eleitorais de sua campanha pela reeleição.
Veio-me à inspiração este tema ao tomar conhecimento de que está tramitando, no Congresso, uma lei disciplinando a guarda de animais de estimação no momento do divórcio do casal, inclusive na forma de guarda compartilhada. Não só a guarda, mas o direito de visita.
Esse detalhe vivo sempre esteve presente nos acertos do casal que se divorcia, provocando acirrados debates. É que os animais estão suprindo a carência de afetos e a solidão das pessoas. Seria exagero dizer que, atualmente, esses animais queridos são também membros da família, alguns até com a consideração de filhos?
Acompanhei a separação de um casal de amigos que, ao partilharem seus bens, depararam-se com um inesperado impasse: e a gata? Com quem ficará a gata? Todos queriam aquela gata, companheira de vinte anos de convivência e filha adotiva do casal sem filhos. A mulher acabou levando o animal, mas o marido sempre ligava para saber notícias dela.
Há poucos dias, tomei conhecimento, por uma empregada, de um drama que estava vivendo sua sogra, ao vir de Matinha para visitar o filho, em São Luís. Ali, ela deixou um papagaio falante, que logo entrou em depressão devido à ausência de sua amiga. Entre ficar mais tempo com o filho e curar o papagaio deprimido, escolheu a segunda opção. E o mais curioso é que, para amenizar a crise do pássaro de estimação, falava com ele pelo celular. Ouvindo a voz amiga, disseram-lhe que ele se acalmava e respondia com resmungos de consolo.
Na literatura, são muitos os exemplos em que aparece a figura de um gato ou de um cachorro como integrantes do enredo dos contos, romances e poesias. Destaco aqui o famoso conto de Tchekov, “A dama e o cachorrinho”, em que aparece um cãozinho branco, levado por aquela dama sensual e solitária, pelo cais de uma distante cidade da Rússia. Logo desperta a paixão de um homem, apesar de ambos serem casados. Evoco essa imagem para concluir que não se concebe aquela dama sem a companhia do seu cachorrinho, mesmo que ficasse sem o marido. Aquele animal passou a fazer parte indispensável da vida da personagem e da peça literária pela genialidade do contista.
As despesas para manter um animal de estimação em casa chegam perto das despesas com um filho. Se comparar com um filho de pobre, nem se duvida. Vale a pena esse sacrifício? Não é preciso ser poeta para constatar a grandeza desse sentimento que desperta um animal doméstico Alguns já têm quartos próprios, dentistas e especialidades médicas para cuidá-los. Quem assistiu ao Fantástico do dia 3 de junho, viu o transtorno das pessoas à procura de animais perdidos ou roubados.
A terminologia usada para esses animais criados em casa é animais de estimação e animais domésticos. Hoje, entretanto, essas expressões tomaram um sentido mais profundo, atingindo o afeto, esse catalisador da química familiar, tornando-os membros da família.
Apesar de toda a corrida do mundo moderno em que vivemos, ninguém pode viver sem dar ou receber afeto. E por falta de gente, de parentes e amigos, essa força do sentimento reprimido que se acumula no coração de uma pessoa volta-se para um ente irracional que, por intuição natural, capta essa dedicação e sabe explorar esse privilégio. De fato, esses animais estão passando à categoria de filhos de criação. Antes de achar exagero essa previsão, o leitor deve passar por Copacabana, onde se encontram as maiores exibições de conforto e apego a cachorros e cachorrinhos de todas as raças, por homens, mulheres e babás.
O poeta Ferreira Gullar dedicou um livro ao seu gato siamês: “Um gato chamado gatinho”. E ficou de luto por muitos dias, após o falecimento daquele felino tão querido. Era um gato tão inteligente, que pensava e fazia artes. Só não falava, mas tinha vinte miados que expressavam seus desejos.
Com o tempo, esses animais tão estimados vão acabar falando.
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