Artigos
Os Testamentos Vitais e as Diretrizes Antecipadas
A idéia de dignidade humana está associada à proteção das circunstâncias indispensáveis para uma existência plena de sentido. Essa idéia traduz o estado do homem enquanto indivíduo, afastando-o da condição de objeto à disposição de interesses alheios, impondo limites às ações que não consideram a pessoa como um fim em si mesma.
A Constituição Federal de 1988 consagrou no art. 1º, III, a dignidade da pessoa humana, como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito. Em seguida, no art. 5º, III, preceitua que "ninguém será submetido a tratamento desumano ou degradante".
Segundo o Professor Oscar Vilhena Vieira, se olharmos a carta de direitos fundamentais, especialmente no art. 5º, encontraremos um razoável conjunto de direitos que circulam diretamente na órbita do direito à dignidade. Sustenta o professor que, em todas essas ocasiões, o constituinte está proibindo que a vida seja extinta ou que seja submetida a padrões inadmissíveis, da perspectiva do que se compreenda por vida digna.
É nesse contexto que surge o embate Vida X Dignidade Humana quando nos propomos a investigar a validade dos testamentos vitais e das diretrizes antecipadas perante o ordenamento jurídico brasileiro.
Os testamentos vitais, também conhecidos como living will, testamentos biológicos ou testament de vie, são documentos elaborados por uma determinada pessoa que, mediante diretrizes antecipadas, realizadas em situação de lucidez mental, declara a sua vontade, autorizando os profissionais médicos, no caso de doenças irreversíveis ou incuráveis, em que já não seja mais possível expressar a sua vontade, a não prolongarem o tratamento. Nesses casos, o paciente em fase terminal ou em estado vegetativo autoriza a suspensão de tratamentos que visam apenas a adiar a morte, em vez de manter a vida.
Em geral, estes testamentos aplicam-se nos casos de condições terminais, sob um estado permanente de inconsciência ou um dano cerebral irreversível que não possibilite a capacidade de a pessoa se recuperar e tomar decisões. Aqui entra a aplicação do testamento vital, estabelecendo limites para aplicação do tratamento, a fim de que sejam tomadas medidas necessárias para manter o conforto, a lucidez e aliviar a dor, inclusive com a suspensão do tratamento.
Trata-se de um tema bastante delicado, em que, de um lado, encontramos a proteção à vida e, de outro, o direito a uma morte digna, com a libertação da dor que implica uma vida sem vida.
É certo que a vida é o bem maior, traduzindo-se como bem indisponível, da qual derivam todos os demais direitos. Contudo, de que vale a vida sem dignidade? Cabe aqui a indagação sobre a relativização desse direito nos casos de pacientes terminais, com doenças incuráveis ou em estado vegetativo. Essas pessoas não gozam da vida em sua plenitude. Não se pode afirmar sequer a existência de vida digna, pois o indivíduo se encontra privado de sua liberdade e do exercício de muitos de seus direitos.
Embora existam os adeptos da eutanásia, não se está aqui defendendo esta prática. Os testamentos vitais são instrumentos de manifestação de vontade antecipada, com a indicação negativa ou positiva de tratamentos e assistência médica a serem ou não realizados em determinadas situações. Trata-se de uma escolha do paciente em se submeter ou não a um tratamento, que não lhe trará a cura, mas poderá adiar a sua morte.
Nessas situações, o processo de morte já está instalado. Assim, o paciente recebe a contribuição do médico no sentido de se abster de adotar qualquer procedimento que prolongue artificialmente a sua morte, deixando que ela ocorra naturalmente. Do ponto de vista médico, essa prática recebe o nome de ortotanásia e, como dito, não se trata de defender um procedimento que causa a morte do paciente, mas sim o reconhecimento de sua liberdade e autodeterminação.
O indivíduo acometido por uma doença grave e incurável, cujo tempo de vida contribui apenas para a sua degradação e sofrimento não pode ser ignorado. É ele quem padece da dor oriunda da sua enfermidade. Embora seja uma decisão difícil de ser aceita pela família, que deseja somente a presença do ente querido, fazendo de tudo para que ele aqui permaneça, em determinados casos, por melhor que sejam as intenções, esse desejo acaba por aprisionar o paciente, prolongando a sua dor.
A vontade declarada do paciente nada mais é do que o seu posicionamento diante desse embate. Nesse aspecto, a morte digna desejada pelo indivíduo nada mais seria do que deixar a natureza agir por si própria, no que a medicina não pode remediar.
Trata-se de realizar a vontade do indivíduo dentro dos limites impostos pela lei. Sendo assim, os testamentos vitais poderiam ser feitos e cumpridos apenas nos casos de doenças irreversíveis ou terminais, cujo tratamento destinado a prolongar a vida do enfermo provocaria, inevitavelmente, dor e sofrimento.
No caso de o paciente solicitar a eutanásia ativa, por exemplo, o médico estaria proibido de executá-la, pois é ilegal no Brasil. Porém, nos casos em que a doença levar inevitavelmente à morte, o direito de autodeterminação do paciente deve ser respeitado.
De fato, não é possível a previsão de todos os casos pela lei. Cada quadro clínico tem um desenvolvimento próprio. Porém, compete à família e ao corpo clínico responsável avaliar a situação, verificando se a vontade do paciente se enquadra dentro dos limites previstos pela lei.
Para isso não basta apenas o desejo de não sofrer, mas o desejo de não ver prolongada uma vida de dor, quando existe a certeza da irreversibilidade da doença.
A Constituição Federal de 1988 consagrou no art. 1º, III, a dignidade da pessoa humana, como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito. Em seguida, no art. 5º, III, preceitua que "ninguém será submetido a tratamento desumano ou degradante".
Segundo o Professor Oscar Vilhena Vieira, se olharmos a carta de direitos fundamentais, especialmente no art. 5º, encontraremos um razoável conjunto de direitos que circulam diretamente na órbita do direito à dignidade. Sustenta o professor que, em todas essas ocasiões, o constituinte está proibindo que a vida seja extinta ou que seja submetida a padrões inadmissíveis, da perspectiva do que se compreenda por vida digna.
É nesse contexto que surge o embate Vida X Dignidade Humana quando nos propomos a investigar a validade dos testamentos vitais e das diretrizes antecipadas perante o ordenamento jurídico brasileiro.
Os testamentos vitais, também conhecidos como living will, testamentos biológicos ou testament de vie, são documentos elaborados por uma determinada pessoa que, mediante diretrizes antecipadas, realizadas em situação de lucidez mental, declara a sua vontade, autorizando os profissionais médicos, no caso de doenças irreversíveis ou incuráveis, em que já não seja mais possível expressar a sua vontade, a não prolongarem o tratamento. Nesses casos, o paciente em fase terminal ou em estado vegetativo autoriza a suspensão de tratamentos que visam apenas a adiar a morte, em vez de manter a vida.
Em geral, estes testamentos aplicam-se nos casos de condições terminais, sob um estado permanente de inconsciência ou um dano cerebral irreversível que não possibilite a capacidade de a pessoa se recuperar e tomar decisões. Aqui entra a aplicação do testamento vital, estabelecendo limites para aplicação do tratamento, a fim de que sejam tomadas medidas necessárias para manter o conforto, a lucidez e aliviar a dor, inclusive com a suspensão do tratamento.
Trata-se de um tema bastante delicado, em que, de um lado, encontramos a proteção à vida e, de outro, o direito a uma morte digna, com a libertação da dor que implica uma vida sem vida.
É certo que a vida é o bem maior, traduzindo-se como bem indisponível, da qual derivam todos os demais direitos. Contudo, de que vale a vida sem dignidade? Cabe aqui a indagação sobre a relativização desse direito nos casos de pacientes terminais, com doenças incuráveis ou em estado vegetativo. Essas pessoas não gozam da vida em sua plenitude. Não se pode afirmar sequer a existência de vida digna, pois o indivíduo se encontra privado de sua liberdade e do exercício de muitos de seus direitos.
Embora existam os adeptos da eutanásia, não se está aqui defendendo esta prática. Os testamentos vitais são instrumentos de manifestação de vontade antecipada, com a indicação negativa ou positiva de tratamentos e assistência médica a serem ou não realizados em determinadas situações. Trata-se de uma escolha do paciente em se submeter ou não a um tratamento, que não lhe trará a cura, mas poderá adiar a sua morte.
Nessas situações, o processo de morte já está instalado. Assim, o paciente recebe a contribuição do médico no sentido de se abster de adotar qualquer procedimento que prolongue artificialmente a sua morte, deixando que ela ocorra naturalmente. Do ponto de vista médico, essa prática recebe o nome de ortotanásia e, como dito, não se trata de defender um procedimento que causa a morte do paciente, mas sim o reconhecimento de sua liberdade e autodeterminação.
O indivíduo acometido por uma doença grave e incurável, cujo tempo de vida contribui apenas para a sua degradação e sofrimento não pode ser ignorado. É ele quem padece da dor oriunda da sua enfermidade. Embora seja uma decisão difícil de ser aceita pela família, que deseja somente a presença do ente querido, fazendo de tudo para que ele aqui permaneça, em determinados casos, por melhor que sejam as intenções, esse desejo acaba por aprisionar o paciente, prolongando a sua dor.
A vontade declarada do paciente nada mais é do que o seu posicionamento diante desse embate. Nesse aspecto, a morte digna desejada pelo indivíduo nada mais seria do que deixar a natureza agir por si própria, no que a medicina não pode remediar.
Trata-se de realizar a vontade do indivíduo dentro dos limites impostos pela lei. Sendo assim, os testamentos vitais poderiam ser feitos e cumpridos apenas nos casos de doenças irreversíveis ou terminais, cujo tratamento destinado a prolongar a vida do enfermo provocaria, inevitavelmente, dor e sofrimento.
No caso de o paciente solicitar a eutanásia ativa, por exemplo, o médico estaria proibido de executá-la, pois é ilegal no Brasil. Porém, nos casos em que a doença levar inevitavelmente à morte, o direito de autodeterminação do paciente deve ser respeitado.
De fato, não é possível a previsão de todos os casos pela lei. Cada quadro clínico tem um desenvolvimento próprio. Porém, compete à família e ao corpo clínico responsável avaliar a situação, verificando se a vontade do paciente se enquadra dentro dos limites previstos pela lei.
Para isso não basta apenas o desejo de não sofrer, mas o desejo de não ver prolongada uma vida de dor, quando existe a certeza da irreversibilidade da doença.
Carolina da Cunha Pereira França Magalhães é Advogada
Os artigos assinados aqui publicados são inteiramente de responsabilidade de seus autores e não expressam posicionamento institucional do IBDFAM