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Adoção e união homoafetiva
1. Adoção e dinâmica do núcleo familiar
O Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA (Lei 8069/90), elaborado à luz da nova Constituição, trouxe consigo um novo panorama, de caráter nitidamente assistencial e protetor. Estabeleceu a teoria da proteção integral a toda e qualquer criança e adolescente, tendo em vista a condição peculiar da pessoa em desenvolvimento, e concebeu a criança e o adolescente como sujeitos de direito. Houve a judicialização do procedimento da adoção e consagrou-se a total ruptura dos vínculos do adotado com a família biológica.
Com o Estatuto, restou indubitável o caráter caritativo e assistencial, pois este estabelece que a adoção deve ser concedida apenas quando se vislumbrar reais vantagens para o adotando, proibindo a sua colocação em ambiente familiar inadequado e demonstrando que o foco está na melhoria de condições morais e materiais da criança ou do adolescente. Atualmente, o Código Civil de 2002, adota o novo panorama trazido pelo ECA.
A adoção pode ser feita individualmente por qualquer pessoa, independentemente do estado civil, fato que amplia as possibilidades de realização do ato. Contudo, conjuntamente, só podem adotar homem e mulher, casados ou que vivam em união estável.
As relações familiares, reestruturadas sobre novas bases, passaram a ser regidas pelo princípio da afetividade, reconhecendo na família um fato cultural, e não natural ou biológico. O comprometimento dos seus membros e o envolvimento emocional de uns com os outros, baseando-se na solidariedade e no cuidado, passa a ter extrema importância e superioridade em relação aos elementos biológicos. A diversidade e a tolerância são colocadas em lugar de destaque. A família é encarada como uma instituição plural, onde prevalece a verdade sociológica.
A solidariedade identifica-se, atualmente, como princípio basilar do Direito de Família. Solidariedade significa amparo recíproco, afeto, assistência, respeito e corresponsabilidade. Valores estes que vem se transformando em direitos e deveres.
Também a filiação deixou de ter caráter predominantemente biológico para ter caráter sócio-afetivo. Fala-se, atualmente, em filiação socioafetiva, considerada por melhor atender aos interesses de todos os membros da família, especialmente o melhor interesse dos filhos.
Reconhece-se, a partir desse ponto, que é necessário averiguar, em qualquer situação, a posse do estado de filho, ou seja, quem desfruta da condição de pai e quem o filho considera como tal, quem cumpre os deveres inerentes ao poder familiar e quem mantém com a criança uma relação afetiva, íntima e duradoura. Pai é quem se mostra e se comporta como tal perante os filhos e a sociedade. Deixa-se, cada vez mais, em plano secundário a realidade biológica, presumida, legal ou genética. A filiação pode ser, assim, deduzida de uma série de fatos e situações.
2. União homoafetiva
Quanto à união homoafetiva, esta é a convivência duradoura entre duas pessoas do mesmo sexo, fundada sobre os laços do afeto. Esta união, atualmente, existe apenas de fato, não existindo leis que a regulamentem.
Não devemos olvidar de que a sexualidade integra a própria condição humana, é natural, caracterizando um direito fundamental a sua manifestação com liberdade, o que injustifica a hipossuficiência social em que vivem os homoafetivos. Tanto a homossexualidade quanto a heterossexualidade, adotada na esfera privada, é característica própria e inerente à pessoa, não admitindo restrições.
Notável é que a noção de homossexual e heterossexual depende do momento histórico e cultural em que determinada sociedade se encontra. É, antes de tudo, uma construção histórica. A diferenciação, deste ponto de vista, tem raiz sócio-cultural.
Pessoas do mesmo sexo, no nosso atual sistema legislativo, não podem contrair casamento, pois a diversidade de sexos é pressuposto essencial de sua existência, não apenas de sua validade. Também a união estável entre pessoas do mesmo sexo não é legalmente estabelecida, nos termos do artigo 1723 do Código Civil e artigo 226, §3º, da Constituição Federal. Contudo, as uniões homossexuais que preenchem todos os requisitos exigidos para a caracterização da união estável são numerosas e constituem uma realidade inegável.
Observa-se uma iniciativa legislativa, com nítida intenção de proteger as relações homoafetivas, ainda que tímida. Começou a tramitar no Congresso Nacional, em outubro de 2007, O Estatuto das Famílias, sob a forma do Projeto de Lei 2285/07, proposto pelo deputado federal Sérgio Barradas Carneiro, auxiliado pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM.
Este estatuto tenta reconhecer a pluralidade da família brasileira, propondo a revisão e uma grande reforma em todo o sistema jurídico brasileiro sobre a família, regulamentando-a e legitimando-a em todas as suas formas, incluindo a união homoafetiva, a fim de traduzir a realidade. O projeto possui base em princípios novos e autênticos, expressando uma maior autonomia do Direito de Família em relação aos demais ramos do Direito Privado.
No que se refere à união homoafetiva, o projeto estabelece o reconhecimento e a dissolução desta por meio de escritura pública e possibilita que o seu reconhecimento seja feito judicialmente. Dentre os direitos assegurados incluem-se a guarda e a convivência com os filhos, a adoção de filhos, direito previdenciário e direito à herança.
Ainda que não haja lei específica sobre o tema em vigor, em todas as situações de fato ocorrem conflitos, e como não se pode excluir da apreciação do Poder Judiciário nenhuma lesão ou ameaça a direito, estes conflitos são passíveis de serem resolvidos pelos magistrados, concedendo juridicidade aos fatos sociais. Óbvio se torna o cada vez mais amplo reconhecimento dos efeitos jurídicos do relacionamento entre duas pessoas do mesmo sexo, com todas as suas conseqüências.
Nos tribunais de todo o país há decisões considerando que tal união marcada pelo comprometimento mútuo possui efeitos jurídicos próprios de uma entidade familiar. A jurisprudência tem se esforçado em suprir a falta de regulamentação legal específica, usando da analogia e da equidade, e os direitos vem sendo reconhecidos paulatinamente.
A tendência é crescente em vislumbrar que considerar o aspecto apenas obrigacional destas uniões é insuficiente para garantir-lhes dignidade e plena efetivação de direitos. A inserção das relações homoafetivas no âmbito da competência das varas de família é perceptível nos Tribunais de diferentes Estados. Representação clara da evolução dos valores histórico-sociais.
Acompanhando e ratificando esta tendência, houve um progresso legislativo, que apesar de lento e, muitas vezes, de cunho apenas administrativo, é contínuo e demonstra a necessidade de se amparar a minoria homossexual, bem como reflete a maior aceitação social deste fenômeno, da qual decorre o fato de os legisladores terem necessidade de regulamentar os fatos sociais. As normas precisam observar a Constituição e refletir as tendências e vontades de seu povo.
Não devemos desconsiderar o art. 226 da Constituição Federal, que é claro ao citar como entidades familiares a família monoparental, aquela constituída pelo vínculo do casamento e aquela constituída pela união estável, das quais a diversidade de sexos é pressuposto de existência.
Mas em razão da necessidade de harmonização de todas as normas constitucionais entre si e da observância aos princípios basilares do ordenamento jurídico e aos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, busca-se uma interpretação teleológica e harmônica da Constituição, eliminando as contradições e conservando a coexistência de valores antagônicos.
Alguns autores entendem que o art. 226 seria meramente exemplificativo, cuja defesa representa um caminho mais fácil para o reconhecimento da união homoafetiva como entidade familiar. Eles argumentam que o referido artigo é cláusula geral de inclusão.
Dentre os juristas com este posicionamento está Paulo Luiz Netto Lobo, que afirma que o termo "também" contido no §4º do art. 226 da CF representa uma cláusula geral de inclusão, "sendo inadmissível excluir qualquer entidade que preencha os requisitos da afetividade, estabilidade e ostensibilidade. Assim, as uniões homoafetivas estarão sobre a proteção constitucional quando preencherem estes requisitos".
Outros doutrinadores, no entanto, reconhecem que essa enumeração é taxativa, e que a união homoafetiva deve, pelo menos enquanto se espera uma emenda constitucional que altere o artigo 226 e a legitime, se servir de argumentos outros para que tenha seu reconhecimento garantido.
Esses outros argumentos são encontrados na própria Constituição, em seus princípios fundamentais que, como diretrizes de todo o ordenamento jurídico, aplicam-se à própria Carta Magna. Especialmente na questão aqui tratada, sobre a qual não há nenhuma proibição explícita.
Dentre estes juristas, há adeptos de teorias que defendem a inconstitucionalidade de normas constitucionais, que seriam aquelas normas que, apesar de presentes no texto constitucional, ferem algum princípio maior da Constituição, como Otto Bachof. Para ele, uma norma só formalmente constitucional pode ser nula se desrespeitar os postulados fundamentais da justiça.
Carl Schmitt, por sua vez, faz a distinção entre constituição e lei constitucional, sendo que a última não é intocável e deve ser mudada para se adequar à Constituição, esta sim "decisão política intangível". Também Canotilho admite a contradição entre normas constitucionais e os valores fundamentais do ordenamento jurídico de um país.
Nestas ocasiões, para estes citados autores, a norma constitucional contrária a um princípio constitucional, ou com este incompatível, carece de legitimidade. A aplicação do direito à espécie deve ser feita à luz de diversos preceitos constitucionais, não apenas de um artigo. O artigo 226 da Constituição Federal vigente carece de legitimidade, sob esta perspectiva.
O art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil, ressalte-se, é perfeitamente aplicável e, de acordo com a analogia e com os princípios gerais de direito, forçoso se faz reconhecer todos os direitos atinentes a uma comunhão de vida aos casais homossexuais, sob pena de violação dos princípios constitucionais acima referidos.
Claro que a aplicação dos princípios fundamentais do nosso sistema jurídico, reconhecendo a união homoafetiva como entidade familiar, não exime a necessidade de regulamentação própria e de legitimação constitucional expressa, atribuindo-lhe direitos específicos.
3. Casais homossexuais e prole
A questão da adoção por casal cujos membros são do mesmo sexo, sobre a qual nos restringiremos a partir de agora, ainda não foi seriamente enfrentada no Brasil.
O artigo 1622 do Código Civil estabelece que ninguém pode ser adotado por duas pessoas, salvo se forem marido ou mulher, ou se viverem em união estável. E o artigo 1723 do mesmo diploma legal dispõe que a união estável é a entidade familiar reconhecida entre um homem e uma mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituir família.
Apesar da claridade da lei quanto à impossibilidade de adoção conjunta por companheiros do mesmo sexo, a realidade, fatos que se antecipam ao Direito e ao qual este deve se adequar, mostra que a convivência de crianças com companheiros do mesmo sexo é freqüente.
Muitas crianças e adolescentes convivem com o companheiro ou companheira homossexual da mãe ou do pai, após a separação destes, ou morte de um deles. Também não há como negar que as técnicas de procriação assistida e o uso de bancos de material reprodutivo possibilitam que alguém, indicando produção independente, possa facilmente criar uma criança na companhia de um parceiro (a) do mesmo sexo.
Também o dispositivo que permite a adoção aos maiores de dezoito anos, independentemente do estado civil, não havendo necessidade de se ocultar a orientação sexual para a habilitação, permite, com facilidade, que alguém, declarando-se solteiro, apesar de viver em união homoafetiva, consiga adotar uma criança ou adolescente e os submeta ao convívio da parceria homossexual. Acreditar que aquilo que não se encontra legalmente regulamentado não existe é manter uma visão restrita e institucionalista. Há vários casos em que a guarda ou tutela de uma criança ou de um adolescente foram concedidas a homossexuais e notável é a presença da afetividade nessas relações de filiação.
A Associação Psiquiátrica Americana — APA, que representa trinta e oito mil profissionais da área de saúde dos Estados Unidos, já declarou que apóia o direito de casais homossexuais de adotar. De acordo com a Associação, os estudos demonstraram que a atenção dada aos filhos e o comprometimento dos pais com a sua criação são os fatores decisivos para que a criança se torne um adulto estável e saudável, e não a orientação sexual dos pais. Também asseveram que pesquisas dos últimos trinta anos demonstram de forma consistente que crianças criadas por pais gays ou por casais de lésbicas não exibem diferenças nos campos emocional, cognitivo, social e sexual em relação a filhos criados por heterossexuais.
Outros grupos que representam profissionais da área de saúde nos Estados Unidos já haviam partilhado desta mesma opinião, como a Academia Americana de Pediatria, a Associação Americana de Psiquiatras de Crianças e Adolescentes e a Associação Americana de Médicos Familiares.
Estudos confirmam que, sim, as crianças identificam-se com o modelo dos pais, mas com os papéis feminino e masculino que eles representam, não com a forma física desses papéis. O acompanhamento de famílias homoafetivas com prole não registra a presença de dano sequer potencial no desenvolvimento, inserção social e sadio estabelecimento de vínculos afetivos. Não se vislumbram distúrbios, desvios de conduta ou efeitos danosos à estabilidade emocional. E nada comprova que a falta do modelo heterossexual confunde a identidade de gênero.
Desde a década de 70, no estado da Califórnia, estudos são feitos em famílias não convencionais, dentre estas aquelas compostas por homossexuais, concluindo que crianças com pais do mesmo sexo são tão ajustadas quanto crianças com pais dos dois sexos, não havendo nenhum desvio no desenvolvimento da sexualidade destas crianças. O estudo concluiu que a criação em lares formados por lésbicas não leva, por si só, a um desenvolvimento psicossocial atípico, nem constitui fator de risco psiquiátrico.
O livro Emerging Issues in Child Psychiatry and the Law nos chama a atenção para a necessidade e importância de uma avaliação imparcial e objetiva no momento de se decidir sobre a concessão ou não da adoção a um casal homossexual. Nele, afirma-se que frequentemente os juízes decidem como os interesses das crianças podem melhor ser servidos a partir de estereótipos comuns na sociedade a respeito de lésbicas e gays. Há, portanto, um sério risco de que o pai ou mãe não será avaliado imparcial e objetivamente nos termos do desempenho do seu papel paterno ou materno, e no que de fato servirá para os melhores interesses da criança.
E acrescenta que todas as evidências que nós temos disponíveis até agora indicam que a orientação sexual por si mesma não prediz status psicológico, mecanismos para enfrentar dificuldades, estilo de vida ou grau de estabilidade, tratando-se de suposições sem uma base de dados concreta.
O que influencia a sexualidade de maneira significativa é a relação que os pais estabelecem entre si e a função que exercem no âmbito familiar, o que independe do gênero.
Notamos que, independente de opiniões pessoais favoráveis ou desfavoráveis, a convivência de crianças e adolescentes com casais homossexuais está presente no nosso cotidiano, e não há base científica para que se diga ser prejudicial essa convivência.
4. Necessidade de regulamentação específica favorável à possibilidade de adoção conjunta por homossexuais
Não há dúvidas de que a adoção é legalmente permitida ao homossexual, individualmente, pois tanto o Código Civil, em seu art.1618, ao dispor que só pode adotar o maior de dezoito anos, como o Estatuto da Criança e do Adolescente, art. 42, ao estabelecer que podem adotar os maiores de 18 anos, independentemente do estado civil, evidenciam esta permissão.
Não há nenhuma outra ressalva feita, ficando claro que, preenchidos os demais requisitos exigidos para a concessão da adoção, em observância ao princípio do melhor interesse da criança, esta pode ser concedida ao homossexual que tenha realizado o pedido individualmente.
O problema consta na possibilidade de concessão da adoção a um casal formado por duas pessoas do mesmo sexo, que convivam de forma pública e duradoura; ou seja, na possibilidade de concessão da adoção a quem viva em união homoafetiva.
O art. 1622 do Código Civil de 2002, situado no Capítulo IV, do Subtítulo II, do Título I, do Livro IV, que trata da adoção, estabelece que ninguém pode ser adotado por duas pessoas, salvo se forem marido e mulher, ou se viverem em união estável.
A Constituição Federal, por sua vez, em seu artigo 226, situado no Capítulo VII, do Título VIII (Da Ordem Social), que trata da Família, da Criança, do Adolescente e do Idoso, no §3º, dispõe que para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar a sua conversão em casamento.
Diante disso, nota-se que a legislação, apesar de não ter direcionado expressamente a proibição de adotar aos casais compostos por duas pessoas do mesmo sexo, também não permitiu que o instituto da adoção fosse efetivado nestas circunstâncias.
Não se pode dizer que a legislação foi omissa, em se tratando do Código Civil, já que este diploma legal foi expresso ao usar as palavras marido e mulher, bem como a Constituição o foi ao usar as palavras homem e mulher para definir a união estável; apenas se pode afirmar que a proibição não decorre expressamente da lei, mas sim da leitura lógica dos artigos acima referidos.
E não se pode entender, a nosso ver, que a Carta Magna, quando não enumerou a união homoafetiva como forma de entidade familiar, desejou proibir a sua constituição, pois a nossa Carta Constitucional foi elaborada há mais de vinte anos e a presença da conformação familiar aqui tratada era pouco perceptível, motivo pelo qual, por decisão política, não se sentiu necessidade de sua normatização.
Tanto que o Projeto de Lei 2285/07, denominado de Estatuto das Famílias, que se encontra atualmente na Mesa Diretora da Câmara dos Deputados, propõe que se assegurem todos os direitos à união homoafetiva, dentre eles a guarda e a convivência com os filhos e a possibilidade de adoção conjunta.
Como em todos os demais casos em que houve mudança de valores jurídicos ou culturais, também no que se refere aos casos que versem sobre a homossexualidade o Poder Judiciário vem se adiantando e proclamando a mudança de paradigmas antes do Poder Legislativo, já que este age em função de seu eleitorado, o que dificulta tal evolução pela via legislativa. Os juízes, sim, acabam fazendo o papel de criadores do Direito e devem contribuir para a modificação, ou melhor, evolução dos valores jurídicos.
A não regulamentação do tema aqui tratado, sem dúvida, traz conseqüência. A falta de regulamentação específica de um fato socialmente presente acarreta o sério problema da insegurança jurídica, pois não há uma norma a ser aplicada uniforme e igualmente para todos.
A resolução dos conflitos daí originados fica à mercê exclusivamente do Judiciário, cujos membros são dotados de independência funcional e, sem uma lei para se pautarem, agindo apenas com base numa apreciação subjetiva da questão, acabam solucionando de modos muito diferentes situações semelhantes.
Ora, sabemos que o Direito tem caráter fático-axiológico-normativo, conforme ensinamentos do professor Miguel Reale; ou seja, a experiência jurídica surge da complementaridade dos elementos fato, valor e norma. É "fato social na forma que lhe dá uma norma racionalmente promulgada por uma autoridade competente, segundo uma ordem de valores".
Nos dizeres deste jurista, "a unidade do direito é uma unidade de processus, essencialmente dialética e histórica, e não apenas distinta aglutinação de fatores na conduta humana, como se esta pudesse ser conduta jurídica abstraída daqueles três elementos (fato, valor e norma), que são o que a tornam pensável como conduta e, mais ainda, como conduta jurídica".
Ou seja, fato, valor e norma devem estar presentes e correlacionados em qualquer expressão da vida jurídica, e "esta correlação é de natureza funcional e dialética, dada a implicação-polaridade existente entre fato e valor, de cuja tensão resulta o momento normativo". Do complexo de fatos e valores é feita a opção por uma das soluções regulativas possíveis.
Na questão aqui tratada, da adoção na união homoafetiva, notamos, através da análise histórica e cultural acerca da homossexualidade, da procura de sua origem e da configuração familiar atual, que esta orientação sexual e a convivência de homossexuais com crianças e adolescentes são fatos.
Também notamos, diante dos estudos que vem sendo realizados e foram aqui apresentados, da legitimação de novas entidades familiares e das opiniões dos diferentes setores sociais, que a homossexualidade é algo que vem sendo cada vez mais aceito.
Não podemos igualmente nos esquecer do cada vez maior valor dado à criança e ao adolescente pela sociedade, valor este que se materializa juridicamente pelos princípios já anteriormente analisados nesta pesquisa, como o princípio do melhor interesse da criança; e se materializa socialmente através das ações de ONG's e do Estado, na tentativa de proteger os menores e dar-lhes mais assistência e educação, tanto acadêmica quanto espiritual e moral.
Resta demonstrado, desta forma, o valor social que vem sendo dado à questão, o que se enfatiza especialmente pela jurisprudência analisada tanto no que se refere ao reconhecimento da união homoafetiva como entidade familiar como no deferimento de guardas, tutelas e adoções de crianças e adolescentes a homossexuais de forma conjunta ou isolada, visto que não há fundamento técnico e moral para o seu indeferimento.
Cabe, neste ponto, ressaltar que Miguel Reale afirma que: "A jurisprudência é uma realidade cultural e não mero instrumento técnico de medida no plano ético da conduta, pois nela e através dela se compõe conflitos de interesses, e se integram renovadas tensões fático-axiológicas, segundo razões de oportunidade e prudência".
Se a jurisprudência é a integração de renovadas tensões fático-axiológicas, e se temos casos de adoções por casais homossexuais sendo pleiteados, cujas decisões compõem jurisprudência, fácil fica perceber que, quanto ao tema aqui tratado, já há um tensão entre fato e valor, que deve necessariamente culminar numa norma para que a experiência jurídica atinja seu ápice e o Direito realize de modo efetivo a sua função de regulador do comportamento social e, conseqüentemente, solucionador dos conflitos daí decorrentes.
Para completar, Miguel Real afirma que "o direito é uma realidade in fieri, refletindo no seu dinamismo a historicidade mesmo do ser do homem". Devemos reconhecer o caráter mutável do Direito, que se modifica constantemente para se adequar aos novos fatos e valores que surgem na evolução histórico-social-cultural, com a conseqüente necessidade de regulamentação de novos comportamentos sociais, o que é o caso.
A normatização é o momento culminante da experiência jurídica, que não pode ser evitada nem negada, especialmente quando o argumento para tal negação é, na maioria das vezes, o preconceito. Ademais, o tratamento legislativo específico traz mais benefícios do que a boa vontade e a atitude de magistrados individualmente considerados.
Claro está que a aprovação de uma regulamentação da união homoafetiva e da possibilidade de adoção por parte desta é imprescindível e urgente, a fim de respeitar os princípios propagados pelo nosso ordenamento jurídico e efetivar a proteção da criança e do adolescente, legitimando juridicamente esta situação.
A falta de regulamentação legal específica e permissiva é uma negativa de direitos, algo incompatível com o Estado Democrático de Direito, pois as decisões proferidas pelo Poder Judiciário favoráveis a esta entidade familiar não são suficientes, visto que não têm caráter geral.
Afinal, o Direito deve exprimir a sociedade. E a função do legislador é proteger as minorias no tocante a qualquer aspecto que se refira ao pleno desenvolvimento de sua personalidade.
5. A possibilidade de concessão da adoção a casais homossexuais decorrente da aplicabilidade dos princípios e seus fundamentos
Por ora, os magistrados, ao concederem a adoção conjunta aos homossexuais, fundam ou devem se fundar, especialmente, nos princípios.
As normas podem ter maior ou menor relevância dentro de um sistema jurídico, sendo que os princípios estão entre as de maior relevância. São fundamentos normativos para a interpretação e aplicação do Direito.
Karl Larenz define os princípios como "pautas diretivas de normatização jurídica que, em virtude da sua própria força de convicção, podem justificar resoluções jurídicas". Eles estabelecem uma idéia jurídica geral, pela qual se orienta a resolução do caso concreto, determinando a realização de um fim juridicamente relevante.
Os princípios são reflexos dos valores, desta forma, em conflito de princípios, aquele de maior valor é o que será preponderante. Tem grande força normativa e são fonte do Direito, portanto, axiologicamente superiores às regras e embasadores de todo um ordenamento jurídico.
Formalmente, os princípios são fonte supletiva, conforme art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil, aplicáveis nos casos de omissão legal. Contudo, substancialmente, os princípios "vem em primeiro lugar e constituem a porta de entrada para qualquer leitura interpretativa do direito". Ou seja, eles possuem função integradora e interpretativa.
Ana Paula Peres explica que a normatividade dos princípios tem relação estreita com a difusão da idéia de que todas as normas constitucionais são dotadas de eficácia jurídica e do destaque aos direitos fundamentais.
Diante de tais considerações, é inegável a possibilidade dos magistrados suprirem as deficiências legais aplicando princípios, já que estes são os representantes dos valores sociais em determinado momento histórico. Assim, aplica-se diretamente a Constituição às relações intersubjetivas.
Todas as regras constitucionais devem se conformar aos princípios da igualdade e da dignidade da pessoa humana, traduzindo-se em flagrante inconstitucionalidade as regras, mesmo constitucionais, que agridam tais princípios fundamentais. Estes devem ser usados para dar efetividade ao ordenamento jurídico como um todo, axiologicamente, orientando toda a atividade interpretativa. A harmonização das normas conflitantes é necessária em razão da unidade da Constituição.
Entretanto, nota-se que os critérios tradicionais, como o cronológico, o da especialidade e o hierárquico são de pouca valia na solução dos conflitos principiológicos. O melhor método, portanto, é o da ponderação de bens, ou seja, de valores e interesses, mensurando-os proporcionalmente, diante do caso concreto, desde que haja uma maior consideração pelos direitos fundamentais.
No caso da concessão do instituto da adoção para casais homossexuais, a ausência de permissão legal não impede o seu deferimento, que é possibilitado mediante a aplicação de determinados princípios, partindo de uma atividade interpretativa. Mais do que isso, os princípios não só possibilitam como, de fato, autorizam a concessão da adoção aos casais que vivem em união homoafetiva, salvo se estes não oferecerem ambiente familiar adequado para a criança ou adolescente, fato que não decorrerá da orientação sexual e vale também para os casais heterossexuais.
Comecemos pela dignidade da pessoa humana.
A dignidade da pessoa humana é fundamento da República Federativa do Brasil, conforme art. 1º, inciso III, da Constituição, o que evidencia a pessoa humana como valor fundamental e enfoque principal do direito, situando-a no epicentro de todo o ordenamento jurídico.
Exige o respeito e a proteção dos direitos inalienáveis da pessoa humana, como o respeito pela vida, pela integridade física e moral, e tudo o mais que constitua condições mínimas para uma existência digna. Significa direito a um "tratamento honrado e não degradante".
Ora, dificultar a adoção, em qualquer aspecto, é permitir que um número cada vez maior de crianças permaneçam nos abrigos e instituições acolhedoras, por um longo período de tempo, submetidas a um tratamento coletivo e em condições precárias, o que ofende a dignidade destas, visto que tem direito à convivência familiar e ao melhor desenvolvimento possível de sua personalidade.
Também é ofender a dignidade do homossexual, tratando-o de forma degradante e restringindo o seu direito de constituir família, sem que existam motivos para tanto, o que se traduz em evidente falta de respeito à orientação sexual.
A liberdade individual significa livre exercício da vida privada, podendo a pessoa realizar suas próprias escolhas sem interferências, em todos os aspectos de sua vida, inclusive quanto à opção sexual, desde que não interfira na liberdade individual alheia, conduzindo à solidariedade.
Este livre exercício da vida privada não deve sofrer nenhuma restrição, enquanto não interferir na liberdade individual alheia. Como tal não ocorre no caso aqui tratado, não devemos restringir o direito à liberdade de adotar e de ser adotado de nenhuma das partes envolvidas no processo.
Também se encontra disposta no art. 5º da CF a afirmação de que todos são iguais perante a lei, sem discriminações de qualquer natureza. Todos sabem que as pessoas desiguais podem e devem ser tratadas desigualmente, na medida de sua desigualdade. Deve haver diferenciação no regime normativo em face de hipóteses distintas.
O fundamento racional utilizado para a justificação da discriminação deve estar em harmonia com os valores prestigiados pelo sistema normativo constitucional. Desta forma, a correlação lógica entre o fato discriminatório e o tratamento jurídico é relativizada, dependendo das concepções e das características histórico-sociais da época e do lugar, visto que os valores não são absolutos.
Entretanto, resta claro que os valores prestigiados pelo ordenamento jurídico vigente e expressos pela sociedade não tem nenhuma correlação lógica com o fato discriminatório aqui tratado.
Ou seja, discriminar os homossexuais, atribuindo-lhes uma menor capacidade para educar e amar os filhos é uma discriminação que não guarda harmonia com os direitos fundamentais garantidos em um Estado Democrático de Direito. Especialmente quando os estudos realizados na área não apontam para nenhum inconveniente originado desta situação.
Portanto, o tratamento desigual não se justifica nesta hipótese, já que a diferença de orientação sexual não é suficiente para que se constitua uma correlação lógica entre o fato discriminatório e o tratamento jurídico atribuído em face da desigualdade apontada, muito menos para que haja afinidade entre correlação apontada e os valores protegidos pelo nosso ordenamento constitucional.
A liberdade e a igualdade são decorrentes da dignidade, já que representam os atributos de uma vida digna e honrosa. O desrespeito e a discriminação social reservada aos homossexuais são incompatíveis com estes princípios, especialmente com a dignidade. Deve ser reconhecida a isonomia e a liberdade de escolha sexual, para que se caracterize a dignidade, concretizadora de todos os outros valores.
A opção sexual não pode implicar na perda de direitos fundamentais, e a própria Constituição Federal nos obriga a isso ao estabelecer como um de seus objetivos fundamentais a proteção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Ora, a expressão "quaisquer outras formas de discriminação", obviamente, inclui a discriminação em razão da orientação sexual. E para que esta premissa tenha eficácia, necessário ressaltar que, por desconhecimento ou preconceito, negar que um casal homossexual seja digno e capaz de criar filhos e de ter uma vida estável, não contribuirá para lhes promover o bem, nem das crianças que estão disponíveis para a adoção.
O cumprimento da função social da família, como célula básica da sociedade e formadora do caráter de seus componentes, independe da opção sexual de seus membros, sendo decorrente apenas do relacionamento estabelecido entre eles, ou seja, da relação de afeto, respeito, cuidado e solidariedade que possuem; algo que não pode ser dado em um lugar de tratamento impessoal como os abrigos, e que, de forma nenhuma, pode ser negado a uma criança para a qual a convivência com sua família biológica foi considerada inadequada.
Negar a possibilidade de constituição de uma família é uma ofensa aos princípios aqui explicitados em relação ao casal que deseja ter filhos, mas também e principalmente, é uma ofensa à dignidade daquela criança que sonha em ter uma família que por ela tenha verdadeiro afeto.
O resguardo da dignidade da criança e do adolescente, com a obtenção de um lar seguro deve ficar acima da orientação sexual daqueles que ofereçam este lar. A ética não está na sexualidade, mas no amor, afeto e respeito.
E é dever do Estado, conforme art. 227 da Constituição Federal, assegurar às crianças e aos adolescentes, com absoluta prioridade, o direito à convivência familiar. Caso esta convivência, por diferentes razões, não possa ser exercida junto à família biológica, a adoção é uma forma de dar efetividade ao princípio da proteção integral.
O princípio da proteção integral à criança e ao adolescente convive intimamente com o princípio do respeito ao melhor ou maior interesse da criança ou do adolescente.
O melhor interesse da criança, expressão abrangente, significa melhoria de condições de vida em relação à situação anterior, como segurança, educação, afeição, respeito e proteção, priorizando vantagens de ordem moral e não de ordem econômica. Deve-se decidir sempre pelo bem-estar do menor, o que só é aferível no caso concreto e não pode, portanto, ser objeto de generalização.
Nenhum destes fatores remete à orientação sexual do adotante.
Toda criança, e também todo adolescente, precisa do cuidado particular de alguém, não bastando o tratamento coletivo dispensado nas instituições. E o juiz deverá basear sua decisão não em algo discricionário, mas na observação do contato com as partes envolvidas, no laudo psicossocial e no legítimo interesse da criança.
Portanto, independentemente de se tratar de casais homo ou heterossexuais, a decisão não obedece a uma regra, ela é casuística. Ou seja, ninguém, independente da orientação sexual, que não ofereça ambiente familiar adequado, será considerado apto a adotar. À oitiva da criança deve-se conceder especial atenção, visto que este procedimento aproxima o juiz da realidade.
Não merece prosperar a afirmação de que as crianças ou adolescentes que conviverem com um casal homoafetivo sofrerão preconceitos. Primeiro porque estas crianças já existem, e merecem ter sua situação regularizada. Depois, o preconceito vem da falta de conscientização, conhecimento e educação; não podemos, portanto, deixar com que crianças e adolescentes em situação de abandono, bem como casais que desejam ter filhos, sofram conseqüências de situações que não decorrem de seus atos, mas dos atos infundados de outras pessoas.
Que o preconceito diminui com a convivência é algo que não se pode negar. Os filhos de mulheres divorciadas muito sofriam em decorrência desta atitude, algo que agora não mais atinge a sociedade. Quanto mais natural se torna uma situação, menor é o preconceito.
A legitimação jurídica de uma entidade familiar constituída por filhos e dois pais ou duas mães poderia impulsionar uma maior legitimação social destas mesmas entidades, contribuindo para o respeito; contra o preconceito, a favor de uma sociedade livre, justa e solidária.
Até que este momento chegasse, pode ser que haja a necessidade de um acompanhamento psicológico, tanto em relação à criança quanto em relação ao casal, o que nada tem de mais perto de todas as vantagens que a convivência familiar adequada pode trazer e visto que muitas crianças convivem com casais heterossexuais e precisam igualmente deste acompanhamento.
Com mais razão ainda esta afirmação vale para as crianças que vivem em abrigos ou outras instituições assemelhadas, e que também são vítimas de preconceito social e de desigualdade, sem que tenham qualquer condição de obter um acompanhamento psicológico de qualidade.
É incabível ligarmos o homossexual a uma figura instável e promíscua. Todos nós já conhecemos e convivemos com um número relevante de homossexuais para sabermos que isto é uma inverdade. Existem sim, aqueles que o são, assim como muitos heterossexuais também o são, e, nestes casos, nenhum uns nem outros poderão adotar uma criança.
Também é indiscutível que a convivência de crianças e adolescentes com parceiros homossexuais, que participam efetivamente de sua educação e formação, perceptível no mundo dos fatos, sem legitimação jurídica da situação, traz sérias conseqüências.
A inexistência do registro deixa o filho desprotegido diante da ausência de vínculo jurídico, que não permite a imposição do dever de prestar alimentos, não garante direitos sucessórios nem assegura o direito de visitas. Esta atitude acaba por impedir o exercício de direitos que a criança, de fato, possui.
Alguns afirmam que a doação ou o testamento resolveriam esta situação, contudo, o prejuízo, nestes casos, não é só o econômico. As situações familiares não podem e nem devem ser resolvidas como se fossem meros problemas financeiros.
A criança que convive com um casal homossexual, quando se vê sem um deles, em razão de separação ou morte, e não possui vínculo jurídico em relação ao outro, passa por um período de instabilidade, visto que sua tutela ou guarda pode ser deferida a terceira pessoa que nada tinha a ver com o núcleo familiar a que ela estava acostumada, além de não poder exigir o cumprimento de certos direitos, como o de visitas. A ausência de vínculo jurídico pode prejudicar a continuidade de uma relação de afeto já existente, fato que não traz benefícios para nenhuma das partes.
Tal argumentação nem seria necessária, pois qualquer fato social que não seja abarcado pelo sistema jurídico produz conseqüências e se traduz em restrição de direitos, já que a resolução de um conflito de interesses eventualmente surgido fica dificultada.
Algumas pessoas alertam para a inconveniência que é, para as crianças que vivem com pais homossexuais, a aposição do nome de dois pais ou de duas mães na certidão de nascimento da criança, por não ser o convencional e porque a lei de Registros Públicos veda tal situação ao determinar a aposição do nome dos pais, fazendo referência a pai e mãe. Outros, contrariamente, asseveram que a formalidade exigida por um diploma legal de 1973 e o convencionalismo não são argumentos suficientes quando, de outro lado, estão presentes o melhor interesse da criança, a afetividade, a solidariedade e a dignidade da pessoa humana.
Para Maria Berenice Dias, não há na Lei de Registros Públicos óbice nenhum à indicação de duas pessoas do mesmo sexo como genitores, bastando registrar o adotando como "filho de", acrescentando o nome dos pais.
Deste ponto de vista, torna-se possível admitir, por completa ficção jurídica, que, aliás, é característica inerente de qualquer adoção, a aposição dos nomes de dois pais ou duas mães no registro civil, sempre que isto resultar na efetivação do princípio do melhor interesse da criança.
E considerando-se o panorama social brasileiro, por vezes temos que pensar não na solução que seria ideal, mas naquela que é menos prejudicial à formação da personalidade da criança, conforme nos lembra Ana Paula Peres, visto que algumas dificuldades são mais facilmente superáveis do que outras.
Muitos casais, especialmente os mais ricos, consideram a adoção como última opção, e, diante da atual situação das nossas crianças, dos nossos abrigos e das exigências dos adotantes, necessário e urgente é o estímulo à adoção.
Os homossexuais, por toda a discriminação sofrida e pela dificuldade de formação de uma família, são menos exigentes em relação às características dos adotados, o que seria uma excelente saída para que se consiga assegurar o direito destas crianças e adolescentes.
Cabe deixar absolutamente claro que a permissão legal para tanto não significa deferimento da adoção em qualquer caso concreto. O processo depende de fatores outros, que levam em consideração especialmente o interesse e a segurança do adotando.
Afinal, não se deixará de apreciar as reais vantagens para o adotante e a adequação do ambiente familiar, que deve sempre ser compatível com a natureza da medida, segundo critérios de razoabilidade e que asseguram o melhor interesse da criança e do adolescente, em qualquer caso.
Considerações finais
A solução no caso concreto, portanto e por enquanto, é buscar os princípios gerais de direto, atendendo aos fins sociais da lei. A base principiológica é o instrumento para se superar o legalismo, buscando a solução mais equânime.
De um lado, garantiríamos o respeito à orientação sexual, à igualdade e à dignidade dos homossexuais, reconhecendo-os como aptos a constituir uma entidade familiar e concedendo-lhe o direito de estabelecer vínculos de filiação mediante a adoção. De outro lado, garantiríamos a eficácia do princípio da proteção integral da criança, que é inerente à sua dignidade, fornecendo-lhe um ambiente familiar que lhe proporcionaria melhorias materiais e morais.
Para aqueles responsáveis pela aplicação da lei, torna-se necessário, então, a utilização da hermenêutica para o deferimento do instituto, e dos meios postos pelo Direito para a supressão das lacunas legislativas, no intuito de assegurar às entidades familiares a proteção pela qual o Estado se responsabiliza, sob pena de não concretização dos princípios fundamentais estabelecidos na Carta Magna.
Cabe ressaltar que a permissão para que os casais homossexuais adotem não significa, de forma alguma, que qualquer casal homossexual poderá adotar; da mesma maneira que a adoção não é concedida a qualquer casal heterossexual. Deve-se observar, igualmente e sempre, as reais vantagens para o adotado e a adequação do ambiente familiar, ou seja, o melhor interesse da criança, que será apurado conforme os mecanismos legais estabelecidos, como as avaliações psicossociais, o estágio de convivência e a oitiva do menor.
O Direito não tem como função primordial dizer o que é certo ou errado, nem moldar os fatos sociais à maneira que bem entender. Ele é dinâmico, mutável. Não se trata aqui de sermos contra ou a favor dos movimentos homossexuais. Não se deve usar o sistema jurídico para defender crenças subjetivas, mas sim para responder os conflitos de interesses já existentes.
Como juristas, devemos ter em mente que a função primordial do Direito é regulamentar os fatos sociais e solucionar os conflitos deles decorrentes, de forma valorativa, atuando como eficiente mecanismo de pacificação social e de garantidor de direitos.
REFERÊNCIAS
O Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA (Lei 8069/90), elaborado à luz da nova Constituição, trouxe consigo um novo panorama, de caráter nitidamente assistencial e protetor. Estabeleceu a teoria da proteção integral a toda e qualquer criança e adolescente, tendo em vista a condição peculiar da pessoa em desenvolvimento, e concebeu a criança e o adolescente como sujeitos de direito. Houve a judicialização do procedimento da adoção e consagrou-se a total ruptura dos vínculos do adotado com a família biológica.
Com o Estatuto, restou indubitável o caráter caritativo e assistencial, pois este estabelece que a adoção deve ser concedida apenas quando se vislumbrar reais vantagens para o adotando, proibindo a sua colocação em ambiente familiar inadequado e demonstrando que o foco está na melhoria de condições morais e materiais da criança ou do adolescente. Atualmente, o Código Civil de 2002, adota o novo panorama trazido pelo ECA.
A adoção pode ser feita individualmente por qualquer pessoa, independentemente do estado civil, fato que amplia as possibilidades de realização do ato. Contudo, conjuntamente, só podem adotar homem e mulher, casados ou que vivam em união estável.
As relações familiares, reestruturadas sobre novas bases, passaram a ser regidas pelo princípio da afetividade, reconhecendo na família um fato cultural, e não natural ou biológico. O comprometimento dos seus membros e o envolvimento emocional de uns com os outros, baseando-se na solidariedade e no cuidado, passa a ter extrema importância e superioridade em relação aos elementos biológicos. A diversidade e a tolerância são colocadas em lugar de destaque. A família é encarada como uma instituição plural, onde prevalece a verdade sociológica.
A solidariedade identifica-se, atualmente, como princípio basilar do Direito de Família. Solidariedade significa amparo recíproco, afeto, assistência, respeito e corresponsabilidade. Valores estes que vem se transformando em direitos e deveres.
Também a filiação deixou de ter caráter predominantemente biológico para ter caráter sócio-afetivo. Fala-se, atualmente, em filiação socioafetiva, considerada por melhor atender aos interesses de todos os membros da família, especialmente o melhor interesse dos filhos.
Reconhece-se, a partir desse ponto, que é necessário averiguar, em qualquer situação, a posse do estado de filho, ou seja, quem desfruta da condição de pai e quem o filho considera como tal, quem cumpre os deveres inerentes ao poder familiar e quem mantém com a criança uma relação afetiva, íntima e duradoura. Pai é quem se mostra e se comporta como tal perante os filhos e a sociedade. Deixa-se, cada vez mais, em plano secundário a realidade biológica, presumida, legal ou genética. A filiação pode ser, assim, deduzida de uma série de fatos e situações.
2. União homoafetiva
Quanto à união homoafetiva, esta é a convivência duradoura entre duas pessoas do mesmo sexo, fundada sobre os laços do afeto. Esta união, atualmente, existe apenas de fato, não existindo leis que a regulamentem.
Não devemos olvidar de que a sexualidade integra a própria condição humana, é natural, caracterizando um direito fundamental a sua manifestação com liberdade, o que injustifica a hipossuficiência social em que vivem os homoafetivos. Tanto a homossexualidade quanto a heterossexualidade, adotada na esfera privada, é característica própria e inerente à pessoa, não admitindo restrições.
Notável é que a noção de homossexual e heterossexual depende do momento histórico e cultural em que determinada sociedade se encontra. É, antes de tudo, uma construção histórica. A diferenciação, deste ponto de vista, tem raiz sócio-cultural.
Pessoas do mesmo sexo, no nosso atual sistema legislativo, não podem contrair casamento, pois a diversidade de sexos é pressuposto essencial de sua existência, não apenas de sua validade. Também a união estável entre pessoas do mesmo sexo não é legalmente estabelecida, nos termos do artigo 1723 do Código Civil e artigo 226, §3º, da Constituição Federal. Contudo, as uniões homossexuais que preenchem todos os requisitos exigidos para a caracterização da união estável são numerosas e constituem uma realidade inegável.
Observa-se uma iniciativa legislativa, com nítida intenção de proteger as relações homoafetivas, ainda que tímida. Começou a tramitar no Congresso Nacional, em outubro de 2007, O Estatuto das Famílias, sob a forma do Projeto de Lei 2285/07, proposto pelo deputado federal Sérgio Barradas Carneiro, auxiliado pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM.
Este estatuto tenta reconhecer a pluralidade da família brasileira, propondo a revisão e uma grande reforma em todo o sistema jurídico brasileiro sobre a família, regulamentando-a e legitimando-a em todas as suas formas, incluindo a união homoafetiva, a fim de traduzir a realidade. O projeto possui base em princípios novos e autênticos, expressando uma maior autonomia do Direito de Família em relação aos demais ramos do Direito Privado.
No que se refere à união homoafetiva, o projeto estabelece o reconhecimento e a dissolução desta por meio de escritura pública e possibilita que o seu reconhecimento seja feito judicialmente. Dentre os direitos assegurados incluem-se a guarda e a convivência com os filhos, a adoção de filhos, direito previdenciário e direito à herança.
Ainda que não haja lei específica sobre o tema em vigor, em todas as situações de fato ocorrem conflitos, e como não se pode excluir da apreciação do Poder Judiciário nenhuma lesão ou ameaça a direito, estes conflitos são passíveis de serem resolvidos pelos magistrados, concedendo juridicidade aos fatos sociais. Óbvio se torna o cada vez mais amplo reconhecimento dos efeitos jurídicos do relacionamento entre duas pessoas do mesmo sexo, com todas as suas conseqüências.
Nos tribunais de todo o país há decisões considerando que tal união marcada pelo comprometimento mútuo possui efeitos jurídicos próprios de uma entidade familiar. A jurisprudência tem se esforçado em suprir a falta de regulamentação legal específica, usando da analogia e da equidade, e os direitos vem sendo reconhecidos paulatinamente.
A tendência é crescente em vislumbrar que considerar o aspecto apenas obrigacional destas uniões é insuficiente para garantir-lhes dignidade e plena efetivação de direitos. A inserção das relações homoafetivas no âmbito da competência das varas de família é perceptível nos Tribunais de diferentes Estados. Representação clara da evolução dos valores histórico-sociais.
Acompanhando e ratificando esta tendência, houve um progresso legislativo, que apesar de lento e, muitas vezes, de cunho apenas administrativo, é contínuo e demonstra a necessidade de se amparar a minoria homossexual, bem como reflete a maior aceitação social deste fenômeno, da qual decorre o fato de os legisladores terem necessidade de regulamentar os fatos sociais. As normas precisam observar a Constituição e refletir as tendências e vontades de seu povo.
Não devemos desconsiderar o art. 226 da Constituição Federal, que é claro ao citar como entidades familiares a família monoparental, aquela constituída pelo vínculo do casamento e aquela constituída pela união estável, das quais a diversidade de sexos é pressuposto de existência.
Mas em razão da necessidade de harmonização de todas as normas constitucionais entre si e da observância aos princípios basilares do ordenamento jurídico e aos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, busca-se uma interpretação teleológica e harmônica da Constituição, eliminando as contradições e conservando a coexistência de valores antagônicos.
Alguns autores entendem que o art. 226 seria meramente exemplificativo, cuja defesa representa um caminho mais fácil para o reconhecimento da união homoafetiva como entidade familiar. Eles argumentam que o referido artigo é cláusula geral de inclusão.
Dentre os juristas com este posicionamento está Paulo Luiz Netto Lobo, que afirma que o termo "também" contido no §4º do art. 226 da CF representa uma cláusula geral de inclusão, "sendo inadmissível excluir qualquer entidade que preencha os requisitos da afetividade, estabilidade e ostensibilidade. Assim, as uniões homoafetivas estarão sobre a proteção constitucional quando preencherem estes requisitos".
Outros doutrinadores, no entanto, reconhecem que essa enumeração é taxativa, e que a união homoafetiva deve, pelo menos enquanto se espera uma emenda constitucional que altere o artigo 226 e a legitime, se servir de argumentos outros para que tenha seu reconhecimento garantido.
Esses outros argumentos são encontrados na própria Constituição, em seus princípios fundamentais que, como diretrizes de todo o ordenamento jurídico, aplicam-se à própria Carta Magna. Especialmente na questão aqui tratada, sobre a qual não há nenhuma proibição explícita.
Dentre estes juristas, há adeptos de teorias que defendem a inconstitucionalidade de normas constitucionais, que seriam aquelas normas que, apesar de presentes no texto constitucional, ferem algum princípio maior da Constituição, como Otto Bachof. Para ele, uma norma só formalmente constitucional pode ser nula se desrespeitar os postulados fundamentais da justiça.
Carl Schmitt, por sua vez, faz a distinção entre constituição e lei constitucional, sendo que a última não é intocável e deve ser mudada para se adequar à Constituição, esta sim "decisão política intangível". Também Canotilho admite a contradição entre normas constitucionais e os valores fundamentais do ordenamento jurídico de um país.
Nestas ocasiões, para estes citados autores, a norma constitucional contrária a um princípio constitucional, ou com este incompatível, carece de legitimidade. A aplicação do direito à espécie deve ser feita à luz de diversos preceitos constitucionais, não apenas de um artigo. O artigo 226 da Constituição Federal vigente carece de legitimidade, sob esta perspectiva.
O art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil, ressalte-se, é perfeitamente aplicável e, de acordo com a analogia e com os princípios gerais de direito, forçoso se faz reconhecer todos os direitos atinentes a uma comunhão de vida aos casais homossexuais, sob pena de violação dos princípios constitucionais acima referidos.
Claro que a aplicação dos princípios fundamentais do nosso sistema jurídico, reconhecendo a união homoafetiva como entidade familiar, não exime a necessidade de regulamentação própria e de legitimação constitucional expressa, atribuindo-lhe direitos específicos.
3. Casais homossexuais e prole
A questão da adoção por casal cujos membros são do mesmo sexo, sobre a qual nos restringiremos a partir de agora, ainda não foi seriamente enfrentada no Brasil.
O artigo 1622 do Código Civil estabelece que ninguém pode ser adotado por duas pessoas, salvo se forem marido ou mulher, ou se viverem em união estável. E o artigo 1723 do mesmo diploma legal dispõe que a união estável é a entidade familiar reconhecida entre um homem e uma mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituir família.
Apesar da claridade da lei quanto à impossibilidade de adoção conjunta por companheiros do mesmo sexo, a realidade, fatos que se antecipam ao Direito e ao qual este deve se adequar, mostra que a convivência de crianças com companheiros do mesmo sexo é freqüente.
Muitas crianças e adolescentes convivem com o companheiro ou companheira homossexual da mãe ou do pai, após a separação destes, ou morte de um deles. Também não há como negar que as técnicas de procriação assistida e o uso de bancos de material reprodutivo possibilitam que alguém, indicando produção independente, possa facilmente criar uma criança na companhia de um parceiro (a) do mesmo sexo.
Também o dispositivo que permite a adoção aos maiores de dezoito anos, independentemente do estado civil, não havendo necessidade de se ocultar a orientação sexual para a habilitação, permite, com facilidade, que alguém, declarando-se solteiro, apesar de viver em união homoafetiva, consiga adotar uma criança ou adolescente e os submeta ao convívio da parceria homossexual. Acreditar que aquilo que não se encontra legalmente regulamentado não existe é manter uma visão restrita e institucionalista. Há vários casos em que a guarda ou tutela de uma criança ou de um adolescente foram concedidas a homossexuais e notável é a presença da afetividade nessas relações de filiação.
A Associação Psiquiátrica Americana — APA, que representa trinta e oito mil profissionais da área de saúde dos Estados Unidos, já declarou que apóia o direito de casais homossexuais de adotar. De acordo com a Associação, os estudos demonstraram que a atenção dada aos filhos e o comprometimento dos pais com a sua criação são os fatores decisivos para que a criança se torne um adulto estável e saudável, e não a orientação sexual dos pais. Também asseveram que pesquisas dos últimos trinta anos demonstram de forma consistente que crianças criadas por pais gays ou por casais de lésbicas não exibem diferenças nos campos emocional, cognitivo, social e sexual em relação a filhos criados por heterossexuais.
Outros grupos que representam profissionais da área de saúde nos Estados Unidos já haviam partilhado desta mesma opinião, como a Academia Americana de Pediatria, a Associação Americana de Psiquiatras de Crianças e Adolescentes e a Associação Americana de Médicos Familiares.
Estudos confirmam que, sim, as crianças identificam-se com o modelo dos pais, mas com os papéis feminino e masculino que eles representam, não com a forma física desses papéis. O acompanhamento de famílias homoafetivas com prole não registra a presença de dano sequer potencial no desenvolvimento, inserção social e sadio estabelecimento de vínculos afetivos. Não se vislumbram distúrbios, desvios de conduta ou efeitos danosos à estabilidade emocional. E nada comprova que a falta do modelo heterossexual confunde a identidade de gênero.
Desde a década de 70, no estado da Califórnia, estudos são feitos em famílias não convencionais, dentre estas aquelas compostas por homossexuais, concluindo que crianças com pais do mesmo sexo são tão ajustadas quanto crianças com pais dos dois sexos, não havendo nenhum desvio no desenvolvimento da sexualidade destas crianças. O estudo concluiu que a criação em lares formados por lésbicas não leva, por si só, a um desenvolvimento psicossocial atípico, nem constitui fator de risco psiquiátrico.
O livro Emerging Issues in Child Psychiatry and the Law nos chama a atenção para a necessidade e importância de uma avaliação imparcial e objetiva no momento de se decidir sobre a concessão ou não da adoção a um casal homossexual. Nele, afirma-se que frequentemente os juízes decidem como os interesses das crianças podem melhor ser servidos a partir de estereótipos comuns na sociedade a respeito de lésbicas e gays. Há, portanto, um sério risco de que o pai ou mãe não será avaliado imparcial e objetivamente nos termos do desempenho do seu papel paterno ou materno, e no que de fato servirá para os melhores interesses da criança.
E acrescenta que todas as evidências que nós temos disponíveis até agora indicam que a orientação sexual por si mesma não prediz status psicológico, mecanismos para enfrentar dificuldades, estilo de vida ou grau de estabilidade, tratando-se de suposições sem uma base de dados concreta.
O que influencia a sexualidade de maneira significativa é a relação que os pais estabelecem entre si e a função que exercem no âmbito familiar, o que independe do gênero.
Notamos que, independente de opiniões pessoais favoráveis ou desfavoráveis, a convivência de crianças e adolescentes com casais homossexuais está presente no nosso cotidiano, e não há base científica para que se diga ser prejudicial essa convivência.
4. Necessidade de regulamentação específica favorável à possibilidade de adoção conjunta por homossexuais
Não há dúvidas de que a adoção é legalmente permitida ao homossexual, individualmente, pois tanto o Código Civil, em seu art.1618, ao dispor que só pode adotar o maior de dezoito anos, como o Estatuto da Criança e do Adolescente, art. 42, ao estabelecer que podem adotar os maiores de 18 anos, independentemente do estado civil, evidenciam esta permissão.
Não há nenhuma outra ressalva feita, ficando claro que, preenchidos os demais requisitos exigidos para a concessão da adoção, em observância ao princípio do melhor interesse da criança, esta pode ser concedida ao homossexual que tenha realizado o pedido individualmente.
O problema consta na possibilidade de concessão da adoção a um casal formado por duas pessoas do mesmo sexo, que convivam de forma pública e duradoura; ou seja, na possibilidade de concessão da adoção a quem viva em união homoafetiva.
O art. 1622 do Código Civil de 2002, situado no Capítulo IV, do Subtítulo II, do Título I, do Livro IV, que trata da adoção, estabelece que ninguém pode ser adotado por duas pessoas, salvo se forem marido e mulher, ou se viverem em união estável.
A Constituição Federal, por sua vez, em seu artigo 226, situado no Capítulo VII, do Título VIII (Da Ordem Social), que trata da Família, da Criança, do Adolescente e do Idoso, no §3º, dispõe que para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar a sua conversão em casamento.
Diante disso, nota-se que a legislação, apesar de não ter direcionado expressamente a proibição de adotar aos casais compostos por duas pessoas do mesmo sexo, também não permitiu que o instituto da adoção fosse efetivado nestas circunstâncias.
Não se pode dizer que a legislação foi omissa, em se tratando do Código Civil, já que este diploma legal foi expresso ao usar as palavras marido e mulher, bem como a Constituição o foi ao usar as palavras homem e mulher para definir a união estável; apenas se pode afirmar que a proibição não decorre expressamente da lei, mas sim da leitura lógica dos artigos acima referidos.
E não se pode entender, a nosso ver, que a Carta Magna, quando não enumerou a união homoafetiva como forma de entidade familiar, desejou proibir a sua constituição, pois a nossa Carta Constitucional foi elaborada há mais de vinte anos e a presença da conformação familiar aqui tratada era pouco perceptível, motivo pelo qual, por decisão política, não se sentiu necessidade de sua normatização.
Tanto que o Projeto de Lei 2285/07, denominado de Estatuto das Famílias, que se encontra atualmente na Mesa Diretora da Câmara dos Deputados, propõe que se assegurem todos os direitos à união homoafetiva, dentre eles a guarda e a convivência com os filhos e a possibilidade de adoção conjunta.
Como em todos os demais casos em que houve mudança de valores jurídicos ou culturais, também no que se refere aos casos que versem sobre a homossexualidade o Poder Judiciário vem se adiantando e proclamando a mudança de paradigmas antes do Poder Legislativo, já que este age em função de seu eleitorado, o que dificulta tal evolução pela via legislativa. Os juízes, sim, acabam fazendo o papel de criadores do Direito e devem contribuir para a modificação, ou melhor, evolução dos valores jurídicos.
A não regulamentação do tema aqui tratado, sem dúvida, traz conseqüência. A falta de regulamentação específica de um fato socialmente presente acarreta o sério problema da insegurança jurídica, pois não há uma norma a ser aplicada uniforme e igualmente para todos.
A resolução dos conflitos daí originados fica à mercê exclusivamente do Judiciário, cujos membros são dotados de independência funcional e, sem uma lei para se pautarem, agindo apenas com base numa apreciação subjetiva da questão, acabam solucionando de modos muito diferentes situações semelhantes.
Ora, sabemos que o Direito tem caráter fático-axiológico-normativo, conforme ensinamentos do professor Miguel Reale; ou seja, a experiência jurídica surge da complementaridade dos elementos fato, valor e norma. É "fato social na forma que lhe dá uma norma racionalmente promulgada por uma autoridade competente, segundo uma ordem de valores".
Nos dizeres deste jurista, "a unidade do direito é uma unidade de processus, essencialmente dialética e histórica, e não apenas distinta aglutinação de fatores na conduta humana, como se esta pudesse ser conduta jurídica abstraída daqueles três elementos (fato, valor e norma), que são o que a tornam pensável como conduta e, mais ainda, como conduta jurídica".
Ou seja, fato, valor e norma devem estar presentes e correlacionados em qualquer expressão da vida jurídica, e "esta correlação é de natureza funcional e dialética, dada a implicação-polaridade existente entre fato e valor, de cuja tensão resulta o momento normativo". Do complexo de fatos e valores é feita a opção por uma das soluções regulativas possíveis.
Na questão aqui tratada, da adoção na união homoafetiva, notamos, através da análise histórica e cultural acerca da homossexualidade, da procura de sua origem e da configuração familiar atual, que esta orientação sexual e a convivência de homossexuais com crianças e adolescentes são fatos.
Também notamos, diante dos estudos que vem sendo realizados e foram aqui apresentados, da legitimação de novas entidades familiares e das opiniões dos diferentes setores sociais, que a homossexualidade é algo que vem sendo cada vez mais aceito.
Não podemos igualmente nos esquecer do cada vez maior valor dado à criança e ao adolescente pela sociedade, valor este que se materializa juridicamente pelos princípios já anteriormente analisados nesta pesquisa, como o princípio do melhor interesse da criança; e se materializa socialmente através das ações de ONG's e do Estado, na tentativa de proteger os menores e dar-lhes mais assistência e educação, tanto acadêmica quanto espiritual e moral.
Resta demonstrado, desta forma, o valor social que vem sendo dado à questão, o que se enfatiza especialmente pela jurisprudência analisada tanto no que se refere ao reconhecimento da união homoafetiva como entidade familiar como no deferimento de guardas, tutelas e adoções de crianças e adolescentes a homossexuais de forma conjunta ou isolada, visto que não há fundamento técnico e moral para o seu indeferimento.
Cabe, neste ponto, ressaltar que Miguel Reale afirma que: "A jurisprudência é uma realidade cultural e não mero instrumento técnico de medida no plano ético da conduta, pois nela e através dela se compõe conflitos de interesses, e se integram renovadas tensões fático-axiológicas, segundo razões de oportunidade e prudência".
Se a jurisprudência é a integração de renovadas tensões fático-axiológicas, e se temos casos de adoções por casais homossexuais sendo pleiteados, cujas decisões compõem jurisprudência, fácil fica perceber que, quanto ao tema aqui tratado, já há um tensão entre fato e valor, que deve necessariamente culminar numa norma para que a experiência jurídica atinja seu ápice e o Direito realize de modo efetivo a sua função de regulador do comportamento social e, conseqüentemente, solucionador dos conflitos daí decorrentes.
Para completar, Miguel Real afirma que "o direito é uma realidade in fieri, refletindo no seu dinamismo a historicidade mesmo do ser do homem". Devemos reconhecer o caráter mutável do Direito, que se modifica constantemente para se adequar aos novos fatos e valores que surgem na evolução histórico-social-cultural, com a conseqüente necessidade de regulamentação de novos comportamentos sociais, o que é o caso.
A normatização é o momento culminante da experiência jurídica, que não pode ser evitada nem negada, especialmente quando o argumento para tal negação é, na maioria das vezes, o preconceito. Ademais, o tratamento legislativo específico traz mais benefícios do que a boa vontade e a atitude de magistrados individualmente considerados.
Claro está que a aprovação de uma regulamentação da união homoafetiva e da possibilidade de adoção por parte desta é imprescindível e urgente, a fim de respeitar os princípios propagados pelo nosso ordenamento jurídico e efetivar a proteção da criança e do adolescente, legitimando juridicamente esta situação.
A falta de regulamentação legal específica e permissiva é uma negativa de direitos, algo incompatível com o Estado Democrático de Direito, pois as decisões proferidas pelo Poder Judiciário favoráveis a esta entidade familiar não são suficientes, visto que não têm caráter geral.
Afinal, o Direito deve exprimir a sociedade. E a função do legislador é proteger as minorias no tocante a qualquer aspecto que se refira ao pleno desenvolvimento de sua personalidade.
5. A possibilidade de concessão da adoção a casais homossexuais decorrente da aplicabilidade dos princípios e seus fundamentos
Por ora, os magistrados, ao concederem a adoção conjunta aos homossexuais, fundam ou devem se fundar, especialmente, nos princípios.
As normas podem ter maior ou menor relevância dentro de um sistema jurídico, sendo que os princípios estão entre as de maior relevância. São fundamentos normativos para a interpretação e aplicação do Direito.
Karl Larenz define os princípios como "pautas diretivas de normatização jurídica que, em virtude da sua própria força de convicção, podem justificar resoluções jurídicas". Eles estabelecem uma idéia jurídica geral, pela qual se orienta a resolução do caso concreto, determinando a realização de um fim juridicamente relevante.
Os princípios são reflexos dos valores, desta forma, em conflito de princípios, aquele de maior valor é o que será preponderante. Tem grande força normativa e são fonte do Direito, portanto, axiologicamente superiores às regras e embasadores de todo um ordenamento jurídico.
Formalmente, os princípios são fonte supletiva, conforme art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil, aplicáveis nos casos de omissão legal. Contudo, substancialmente, os princípios "vem em primeiro lugar e constituem a porta de entrada para qualquer leitura interpretativa do direito". Ou seja, eles possuem função integradora e interpretativa.
Ana Paula Peres explica que a normatividade dos princípios tem relação estreita com a difusão da idéia de que todas as normas constitucionais são dotadas de eficácia jurídica e do destaque aos direitos fundamentais.
Diante de tais considerações, é inegável a possibilidade dos magistrados suprirem as deficiências legais aplicando princípios, já que estes são os representantes dos valores sociais em determinado momento histórico. Assim, aplica-se diretamente a Constituição às relações intersubjetivas.
Todas as regras constitucionais devem se conformar aos princípios da igualdade e da dignidade da pessoa humana, traduzindo-se em flagrante inconstitucionalidade as regras, mesmo constitucionais, que agridam tais princípios fundamentais. Estes devem ser usados para dar efetividade ao ordenamento jurídico como um todo, axiologicamente, orientando toda a atividade interpretativa. A harmonização das normas conflitantes é necessária em razão da unidade da Constituição.
Entretanto, nota-se que os critérios tradicionais, como o cronológico, o da especialidade e o hierárquico são de pouca valia na solução dos conflitos principiológicos. O melhor método, portanto, é o da ponderação de bens, ou seja, de valores e interesses, mensurando-os proporcionalmente, diante do caso concreto, desde que haja uma maior consideração pelos direitos fundamentais.
No caso da concessão do instituto da adoção para casais homossexuais, a ausência de permissão legal não impede o seu deferimento, que é possibilitado mediante a aplicação de determinados princípios, partindo de uma atividade interpretativa. Mais do que isso, os princípios não só possibilitam como, de fato, autorizam a concessão da adoção aos casais que vivem em união homoafetiva, salvo se estes não oferecerem ambiente familiar adequado para a criança ou adolescente, fato que não decorrerá da orientação sexual e vale também para os casais heterossexuais.
Comecemos pela dignidade da pessoa humana.
A dignidade da pessoa humana é fundamento da República Federativa do Brasil, conforme art. 1º, inciso III, da Constituição, o que evidencia a pessoa humana como valor fundamental e enfoque principal do direito, situando-a no epicentro de todo o ordenamento jurídico.
Exige o respeito e a proteção dos direitos inalienáveis da pessoa humana, como o respeito pela vida, pela integridade física e moral, e tudo o mais que constitua condições mínimas para uma existência digna. Significa direito a um "tratamento honrado e não degradante".
Ora, dificultar a adoção, em qualquer aspecto, é permitir que um número cada vez maior de crianças permaneçam nos abrigos e instituições acolhedoras, por um longo período de tempo, submetidas a um tratamento coletivo e em condições precárias, o que ofende a dignidade destas, visto que tem direito à convivência familiar e ao melhor desenvolvimento possível de sua personalidade.
Também é ofender a dignidade do homossexual, tratando-o de forma degradante e restringindo o seu direito de constituir família, sem que existam motivos para tanto, o que se traduz em evidente falta de respeito à orientação sexual.
A liberdade individual significa livre exercício da vida privada, podendo a pessoa realizar suas próprias escolhas sem interferências, em todos os aspectos de sua vida, inclusive quanto à opção sexual, desde que não interfira na liberdade individual alheia, conduzindo à solidariedade.
Este livre exercício da vida privada não deve sofrer nenhuma restrição, enquanto não interferir na liberdade individual alheia. Como tal não ocorre no caso aqui tratado, não devemos restringir o direito à liberdade de adotar e de ser adotado de nenhuma das partes envolvidas no processo.
Também se encontra disposta no art. 5º da CF a afirmação de que todos são iguais perante a lei, sem discriminações de qualquer natureza. Todos sabem que as pessoas desiguais podem e devem ser tratadas desigualmente, na medida de sua desigualdade. Deve haver diferenciação no regime normativo em face de hipóteses distintas.
O fundamento racional utilizado para a justificação da discriminação deve estar em harmonia com os valores prestigiados pelo sistema normativo constitucional. Desta forma, a correlação lógica entre o fato discriminatório e o tratamento jurídico é relativizada, dependendo das concepções e das características histórico-sociais da época e do lugar, visto que os valores não são absolutos.
Entretanto, resta claro que os valores prestigiados pelo ordenamento jurídico vigente e expressos pela sociedade não tem nenhuma correlação lógica com o fato discriminatório aqui tratado.
Ou seja, discriminar os homossexuais, atribuindo-lhes uma menor capacidade para educar e amar os filhos é uma discriminação que não guarda harmonia com os direitos fundamentais garantidos em um Estado Democrático de Direito. Especialmente quando os estudos realizados na área não apontam para nenhum inconveniente originado desta situação.
Portanto, o tratamento desigual não se justifica nesta hipótese, já que a diferença de orientação sexual não é suficiente para que se constitua uma correlação lógica entre o fato discriminatório e o tratamento jurídico atribuído em face da desigualdade apontada, muito menos para que haja afinidade entre correlação apontada e os valores protegidos pelo nosso ordenamento constitucional.
A liberdade e a igualdade são decorrentes da dignidade, já que representam os atributos de uma vida digna e honrosa. O desrespeito e a discriminação social reservada aos homossexuais são incompatíveis com estes princípios, especialmente com a dignidade. Deve ser reconhecida a isonomia e a liberdade de escolha sexual, para que se caracterize a dignidade, concretizadora de todos os outros valores.
A opção sexual não pode implicar na perda de direitos fundamentais, e a própria Constituição Federal nos obriga a isso ao estabelecer como um de seus objetivos fundamentais a proteção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Ora, a expressão "quaisquer outras formas de discriminação", obviamente, inclui a discriminação em razão da orientação sexual. E para que esta premissa tenha eficácia, necessário ressaltar que, por desconhecimento ou preconceito, negar que um casal homossexual seja digno e capaz de criar filhos e de ter uma vida estável, não contribuirá para lhes promover o bem, nem das crianças que estão disponíveis para a adoção.
O cumprimento da função social da família, como célula básica da sociedade e formadora do caráter de seus componentes, independe da opção sexual de seus membros, sendo decorrente apenas do relacionamento estabelecido entre eles, ou seja, da relação de afeto, respeito, cuidado e solidariedade que possuem; algo que não pode ser dado em um lugar de tratamento impessoal como os abrigos, e que, de forma nenhuma, pode ser negado a uma criança para a qual a convivência com sua família biológica foi considerada inadequada.
Negar a possibilidade de constituição de uma família é uma ofensa aos princípios aqui explicitados em relação ao casal que deseja ter filhos, mas também e principalmente, é uma ofensa à dignidade daquela criança que sonha em ter uma família que por ela tenha verdadeiro afeto.
O resguardo da dignidade da criança e do adolescente, com a obtenção de um lar seguro deve ficar acima da orientação sexual daqueles que ofereçam este lar. A ética não está na sexualidade, mas no amor, afeto e respeito.
E é dever do Estado, conforme art. 227 da Constituição Federal, assegurar às crianças e aos adolescentes, com absoluta prioridade, o direito à convivência familiar. Caso esta convivência, por diferentes razões, não possa ser exercida junto à família biológica, a adoção é uma forma de dar efetividade ao princípio da proteção integral.
O princípio da proteção integral à criança e ao adolescente convive intimamente com o princípio do respeito ao melhor ou maior interesse da criança ou do adolescente.
O melhor interesse da criança, expressão abrangente, significa melhoria de condições de vida em relação à situação anterior, como segurança, educação, afeição, respeito e proteção, priorizando vantagens de ordem moral e não de ordem econômica. Deve-se decidir sempre pelo bem-estar do menor, o que só é aferível no caso concreto e não pode, portanto, ser objeto de generalização.
Nenhum destes fatores remete à orientação sexual do adotante.
Toda criança, e também todo adolescente, precisa do cuidado particular de alguém, não bastando o tratamento coletivo dispensado nas instituições. E o juiz deverá basear sua decisão não em algo discricionário, mas na observação do contato com as partes envolvidas, no laudo psicossocial e no legítimo interesse da criança.
Portanto, independentemente de se tratar de casais homo ou heterossexuais, a decisão não obedece a uma regra, ela é casuística. Ou seja, ninguém, independente da orientação sexual, que não ofereça ambiente familiar adequado, será considerado apto a adotar. À oitiva da criança deve-se conceder especial atenção, visto que este procedimento aproxima o juiz da realidade.
Não merece prosperar a afirmação de que as crianças ou adolescentes que conviverem com um casal homoafetivo sofrerão preconceitos. Primeiro porque estas crianças já existem, e merecem ter sua situação regularizada. Depois, o preconceito vem da falta de conscientização, conhecimento e educação; não podemos, portanto, deixar com que crianças e adolescentes em situação de abandono, bem como casais que desejam ter filhos, sofram conseqüências de situações que não decorrem de seus atos, mas dos atos infundados de outras pessoas.
Que o preconceito diminui com a convivência é algo que não se pode negar. Os filhos de mulheres divorciadas muito sofriam em decorrência desta atitude, algo que agora não mais atinge a sociedade. Quanto mais natural se torna uma situação, menor é o preconceito.
A legitimação jurídica de uma entidade familiar constituída por filhos e dois pais ou duas mães poderia impulsionar uma maior legitimação social destas mesmas entidades, contribuindo para o respeito; contra o preconceito, a favor de uma sociedade livre, justa e solidária.
Até que este momento chegasse, pode ser que haja a necessidade de um acompanhamento psicológico, tanto em relação à criança quanto em relação ao casal, o que nada tem de mais perto de todas as vantagens que a convivência familiar adequada pode trazer e visto que muitas crianças convivem com casais heterossexuais e precisam igualmente deste acompanhamento.
Com mais razão ainda esta afirmação vale para as crianças que vivem em abrigos ou outras instituições assemelhadas, e que também são vítimas de preconceito social e de desigualdade, sem que tenham qualquer condição de obter um acompanhamento psicológico de qualidade.
É incabível ligarmos o homossexual a uma figura instável e promíscua. Todos nós já conhecemos e convivemos com um número relevante de homossexuais para sabermos que isto é uma inverdade. Existem sim, aqueles que o são, assim como muitos heterossexuais também o são, e, nestes casos, nenhum uns nem outros poderão adotar uma criança.
Também é indiscutível que a convivência de crianças e adolescentes com parceiros homossexuais, que participam efetivamente de sua educação e formação, perceptível no mundo dos fatos, sem legitimação jurídica da situação, traz sérias conseqüências.
A inexistência do registro deixa o filho desprotegido diante da ausência de vínculo jurídico, que não permite a imposição do dever de prestar alimentos, não garante direitos sucessórios nem assegura o direito de visitas. Esta atitude acaba por impedir o exercício de direitos que a criança, de fato, possui.
Alguns afirmam que a doação ou o testamento resolveriam esta situação, contudo, o prejuízo, nestes casos, não é só o econômico. As situações familiares não podem e nem devem ser resolvidas como se fossem meros problemas financeiros.
A criança que convive com um casal homossexual, quando se vê sem um deles, em razão de separação ou morte, e não possui vínculo jurídico em relação ao outro, passa por um período de instabilidade, visto que sua tutela ou guarda pode ser deferida a terceira pessoa que nada tinha a ver com o núcleo familiar a que ela estava acostumada, além de não poder exigir o cumprimento de certos direitos, como o de visitas. A ausência de vínculo jurídico pode prejudicar a continuidade de uma relação de afeto já existente, fato que não traz benefícios para nenhuma das partes.
Tal argumentação nem seria necessária, pois qualquer fato social que não seja abarcado pelo sistema jurídico produz conseqüências e se traduz em restrição de direitos, já que a resolução de um conflito de interesses eventualmente surgido fica dificultada.
Algumas pessoas alertam para a inconveniência que é, para as crianças que vivem com pais homossexuais, a aposição do nome de dois pais ou de duas mães na certidão de nascimento da criança, por não ser o convencional e porque a lei de Registros Públicos veda tal situação ao determinar a aposição do nome dos pais, fazendo referência a pai e mãe. Outros, contrariamente, asseveram que a formalidade exigida por um diploma legal de 1973 e o convencionalismo não são argumentos suficientes quando, de outro lado, estão presentes o melhor interesse da criança, a afetividade, a solidariedade e a dignidade da pessoa humana.
Para Maria Berenice Dias, não há na Lei de Registros Públicos óbice nenhum à indicação de duas pessoas do mesmo sexo como genitores, bastando registrar o adotando como "filho de", acrescentando o nome dos pais.
Deste ponto de vista, torna-se possível admitir, por completa ficção jurídica, que, aliás, é característica inerente de qualquer adoção, a aposição dos nomes de dois pais ou duas mães no registro civil, sempre que isto resultar na efetivação do princípio do melhor interesse da criança.
E considerando-se o panorama social brasileiro, por vezes temos que pensar não na solução que seria ideal, mas naquela que é menos prejudicial à formação da personalidade da criança, conforme nos lembra Ana Paula Peres, visto que algumas dificuldades são mais facilmente superáveis do que outras.
Muitos casais, especialmente os mais ricos, consideram a adoção como última opção, e, diante da atual situação das nossas crianças, dos nossos abrigos e das exigências dos adotantes, necessário e urgente é o estímulo à adoção.
Os homossexuais, por toda a discriminação sofrida e pela dificuldade de formação de uma família, são menos exigentes em relação às características dos adotados, o que seria uma excelente saída para que se consiga assegurar o direito destas crianças e adolescentes.
Cabe deixar absolutamente claro que a permissão legal para tanto não significa deferimento da adoção em qualquer caso concreto. O processo depende de fatores outros, que levam em consideração especialmente o interesse e a segurança do adotando.
Afinal, não se deixará de apreciar as reais vantagens para o adotante e a adequação do ambiente familiar, que deve sempre ser compatível com a natureza da medida, segundo critérios de razoabilidade e que asseguram o melhor interesse da criança e do adolescente, em qualquer caso.
Considerações finais
A solução no caso concreto, portanto e por enquanto, é buscar os princípios gerais de direto, atendendo aos fins sociais da lei. A base principiológica é o instrumento para se superar o legalismo, buscando a solução mais equânime.
De um lado, garantiríamos o respeito à orientação sexual, à igualdade e à dignidade dos homossexuais, reconhecendo-os como aptos a constituir uma entidade familiar e concedendo-lhe o direito de estabelecer vínculos de filiação mediante a adoção. De outro lado, garantiríamos a eficácia do princípio da proteção integral da criança, que é inerente à sua dignidade, fornecendo-lhe um ambiente familiar que lhe proporcionaria melhorias materiais e morais.
Para aqueles responsáveis pela aplicação da lei, torna-se necessário, então, a utilização da hermenêutica para o deferimento do instituto, e dos meios postos pelo Direito para a supressão das lacunas legislativas, no intuito de assegurar às entidades familiares a proteção pela qual o Estado se responsabiliza, sob pena de não concretização dos princípios fundamentais estabelecidos na Carta Magna.
Cabe ressaltar que a permissão para que os casais homossexuais adotem não significa, de forma alguma, que qualquer casal homossexual poderá adotar; da mesma maneira que a adoção não é concedida a qualquer casal heterossexual. Deve-se observar, igualmente e sempre, as reais vantagens para o adotado e a adequação do ambiente familiar, ou seja, o melhor interesse da criança, que será apurado conforme os mecanismos legais estabelecidos, como as avaliações psicossociais, o estágio de convivência e a oitiva do menor.
O Direito não tem como função primordial dizer o que é certo ou errado, nem moldar os fatos sociais à maneira que bem entender. Ele é dinâmico, mutável. Não se trata aqui de sermos contra ou a favor dos movimentos homossexuais. Não se deve usar o sistema jurídico para defender crenças subjetivas, mas sim para responder os conflitos de interesses já existentes.
Como juristas, devemos ter em mente que a função primordial do Direito é regulamentar os fatos sociais e solucionar os conflitos deles decorrentes, de forma valorativa, atuando como eficiente mecanismo de pacificação social e de garantidor de direitos.
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