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Alimentos Gravídicos — Breves Considerações
Com acerto, a Presidência da República decidiu vetar parcialmente, por contrariedade ao interesse público e inconstitucionalidade, o Projeto de Lei nº 7.376/2006, de autoria do Deputado Federal Rodolpho Tourinho (BA).
Foram vetados os artigos 3º, 4º, 5º, 8º, 9º e 10º. O veto a referidos artigos veio de encontro à manifestação de juristas especializados na matéria, devendo ser destacada a oportuna e eficiente campanha idealizada pelo IBDFAM - Instituto Brasileiro de Direito de Família -, que propôs a revisão e veto de artigos contrários à Constituição Federal e aos interesses do nascituro e da gestante.
Com efeito, conforme noticia vinculada em 23 de julho passado, no site da instituição(http://www.ibdfam.org.br/?noticias¬icia=2551), a vice-presidente do IBDFAM, Des. Maria Berenice Dias, fez o alerta relativo à necessidade de mobilização para alteração do Projeto de Lei que previa alimentos às gestantes, então aprovado na Câmara dos Deputados.
Naquela oportunidade, ponderou a Dra. Maria Berenice Dias que:
"Alguns artigos apresentam incongruências em relação à Lei de Alimentos, à contestação de paternidade, e aos princípios constitucionais, do acesso à justiça, da responsabilidade parental e do melhor interesse da criança.
Inconsistências
Exame de DNA
Se o suposto pai negar a paternidade, o projeto prevê "realização de exame pericial pertinente" (Art. 8) para que a investigação de paternidade seja efetivada. Se não vetada, essa disposição pode pôr em risco a vida da criança. É consenso na comunidade médica que o exame de DNA em líquido amniótico pode comprometer a gestação.
Pai a partir da citação
O projeto prevê que os alimentos sejam pagos desde a data da citação do réu (Art. 9). A paternidade não é configurada a partir do momento em que o oficial de justiça cita o réu de uma ação dessa natureza. "Pai é assim o é desde a concepção do filho", é a máxima sustentada pelo IBDFAM, que defende que os alimentos sejam devidos pelo pai desde o momento em que o juiz distribui a ação, evitando que o réu atrase a tramitação da ação ao esquivar-se de receber o oficial de justiça.
Suposto pai pode requerer indenização
A gestante, segundo o projeto, pode ser responsabilizada por danos matérias e morais se a paternidade indicada for negativa (Art. 10). Para Dias, o artigo afronta o princípio constitucional do acesso à justiça (art. 5°, inc. XXXV da Constituição Federal), ao abrir um grave precedente de o réu ser indenizado pelo fato de ter sido acionado em juízo.
Deslocamento da gestante
O texto aprovado, ao invés de melhor atender à gestante, fixa a competência judicial no domicílio do suposto pai (Art. 3), forçando-a a deslocar-se para a cidade/ região do suposto pai para as audiências.
Necessidade de audiência de justificação
O art. 5° do projeto impõe a realização de audiência de justificação, mesmo que sejam trazidas provas de o réu ser o pai do filho que a autora espera. Porém, tendo em vista a possibilidade demora da realização da audiência, imperioso se mostra a dispensa da solenidade para a fixação da verba alimentar."
Todos os artigos do Projeto de Lei citados no texto acima sofreram veto presidencial. Além desses, conforme já mencionado, houve veto ao artigo 4º que, por sua vez, previa a necessidade de a petição inicial ser instruída com laudo médico que atestasse a gravidez e a sua viabilidade, bem assim indicasse em quais circunstâncias a concepção ocorreu, mencionando as provas existentes para provar o alegado, apontando, ainda, o suposto pai, sua qualificação, os recursos de que dispõe etc.
As razões que motivaram o veto presidencial ao aludido artigo 4º foram as seguintes: "O dispositivo determina que a autora terá, obrigatoriamente, que juntar à petição inicial laudo sobre a viabilidade da gravidez. No entanto, a gestante, independentemente da sua gravidez ser viável ou não, necessita de cuidados especiais, o que enseja dispêndio financeiro. O próprio art. 2o do Projeto de Lei dispõe sobre o que compreende os alimentos gravídicos: 'valores suficientes para cobrir as despesas adicionais do período de gravidez e que sejam dela decorrentes, da concepção ao parto, inclusive referente à alimentação especial, assistência médica e psicológica, exames complementares, internações, parto e demais prescrições preventivas e terapêuticas indispensáveis (...)'. Esses gastos ocorrerão de qualquer forma, não sendo adequado que a gestante arque com sua totalidade, motivo pelo qual é medida justa que haja compartilhamento dessas despesas com aquele que viria a ser o pai da criança."
Destarte, o novel texto de Lei encontra-se assim redigido:
"LEI Nº 11.804, DE 5 DE NOVEMBRO DE 2008
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1o Esta Lei disciplina o direito de alimentos da mulher gestante e a forma como será exercido.
Art. 2o Os alimentos de que trata esta Lei compreenderão os valores suficientes para cobrir as despesas adicionais do período de gravidez e que sejam dela decorrentes, da concepção ao parto, inclusive as referentes a alimentação especial, assistência médica e psicológica, exames complementares, internações, parto, medicamentos e demais prescrições preventivas e terapêuticas indispensáveis, a juízo do médico, além de outras que o juiz considere pertinentes.
Parágrafo único. Os alimentos de que trata este artigo referem-se à parte das despesas que deverá ser custeada pelo futuro pai, considerando-se a contribuição que também deverá ser dada pela mulher grávida, na proporção dos recursos de ambos.
Art. 3º (VETADO)
Art. 4º (VETADO)
Art. 5º (VETADO)
Art. 6o Convencido da existência de indícios da paternidade, o juiz fixará alimentos gravídicos que perdurarão até o nascimento da criança, sopesando as necessidades da parte autora e as possibilidades da parte ré.
Parágrafo único. Após o nascimento com vida, os alimentos gravídicos ficam convertidos em pensão alimentícia em favor do menor até que uma das partes solicite a sua revisão.
Art. 7o O réu será citado para apresentar resposta em 5 (cinco) dias.
Art. 8º (VETADO)
Art. 9º (VETADO)
Art. 10º (VETADO)
Art. 11. Aplicam-se supletivamente nos processos regulados por esta Lei as disposições das Leis nos 5.478, de 25 de julho de 1968, e 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil.
Art. 12. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 5 de novembro de 2008; 187o da Independência e 120o da República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Tarso Genro
José Antonio Dias Toffoli
Dilma Rousseff"
A partir de agora, estando em vigor a tão aguardada Lei que disciplina os chamados alimentos gravídicos, assegurando a responsabilidade parental desde a concepção, deve-se aguardar o posicionamento do Poder Judiciário frente aos casos que surgirão, notadamente, em relação à interpretação que será dada ao disposto no caput do artigo 6º, ou seja, o que será considerado como suficiente para que o magistrado se veja "convencido da existência de indícios da paternidade."
Por fim, com os vetos havidos, cumpre-nos registrar o apreço pela edição da Lei em comento que, agora, definitivamente, ampara o direito de ser concedido alimentos à mulher gestante. Com isso, a gestante e, consequentemente o nascituro, terão maior oportunidade de usufruírem um período gestacional digno, com toda a sorte de assistência, mesmo que involuntária, por parte do futuro pai, lembrando-se, porém, que a colaboração deve ser de ambos os genitores, na proporção de seus respectivos recursos.
Renato de Mello Almada é sócio do IBDFAM, advogado, especialista em Direito Processual Civil pela PUC/SP. Sócio da Almeida e Alvarenga Advogados Associados.
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