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IBDFAM ACADÊMICO - Paternidade Sócio-afetiva:O Afeto faz apelo à Paternidade
INTRODUÇÃO
O presente artigo científico, sob ênfase do cenário atual no que concerne ao Direito de Família, observou que cada vez mais se torna exigível uma tutela jurídica mínima que respeite a liberdade de constituição, convivência e dissolução da relação denominada família.
A igualdade de direitos, mesmo reconhecendo-se as diferenças naturais e culturais de gênero; a igualdade entre irmãos, seja biológica, seja adotiva ou havidos fora do casamento, com respeito a seus direitos fundamentais; o sentimento de solidariedade recíproca, que não pode ser perturbado pelo prevalecimento de interesses patrimoniais, vem atingindo a repersonalização das relações familiares como direito da pessoa humana.
Por conseguinte, o presente ramo do Direito Civil tolera suas repercussões, já que quase toda a organização jurídica sobre a família compreende as questões do afeto e da sexualidade.
Além disso, está fazendo-nos compreender o verdadeiro sentido da paternidade e suas várias formas, até mesmo já refletidas em textos normativos como o Estatuto da Criança e do Adolescente. A engenharia genética desvenda, pela via dos exames em DNA, a paternidade biológica e crimes nunca antes desvendados, as ciências sociais e psicológicas, cooperando para a determinação de guarda de filhos, tutela e curatela.
Mas, naquilo que é foco do presente trabalho, é o afeto o mais novo elemento considerando e analisado na sua imperativa importância na seara familiar. E é sobre este enfoque que se debruça o artigo que se segue.
1. CONCEITO DE FAMÍLIA
De acordo com Caio Mário (2007; p. 19 e p.20), família em sentido genérico e biológico é o conjunto de pessoas que descendem de tronco ancestral comum; em senso estrito, a família se restringe ao grupo formado pelos pais e filhos; e em sentido universal é considerada a célula social por excelência.
No que concerne à família, Silvio Rodrigues (2004; p. 4 e p.5) num conceito mais amplo, diz ser a formação por todas aquelas pessoas ligadas por vínculo de sangue, ou seja, todas aquelas pessoas provindas de um tronco ancestral comum, o que inclui, dentro da órbita da família, todos os parentes consangüíneos. Num sentido mais estrito, constitui a família o conjunto de pessoas compreendido pelos pais e sua prole.
Já Maria Helena Diniz (2007; p. 9 e p. 10) discorre sobre família no sentido amplo como todos os indivíduos que estiverem ligados pelo vínculo da consangüinidade ou da afinidade, chegando a incluir estranhos. No sentido restrito é o conjunto de pessoas unidas pelos laços do matrimônio e da filiação, ou seja, unicamente os cônjuges e a prole.
Segundo Paulo Nader (2006; p.3), Família consiste em "uma instituição social, composta por mais de uma pessoa física, que se irmanam no propósito de desenvolver, entre si, a solidariedade nos planos assistencial e da convivência ou simplesmente descendem uma da outra ou de um tronco comum".
Sintetizando a conceituação desse instituto, Silvio Venosa (2005, p.18), assevera que a Família em um conceito amplo, "é o conjunto de pessoas unidas por vínculo jurídico de natureza familiar", em conceito restrito, "compreende somente o núcleo formado por pais e filhos que vivem sob o pátrio poder".
Washington de Barros Monteiro (2004; p.3) ainda menciona que, enquanto a família num sentido restrito, abrange tão somente o casal e a prole, num sentido mais largo, cinge a todas as pessoas ligadas pelo vínculo da consangüinidade, cujo alcance é mais dilatado, ou mais circunscrito.
Dessa forma, a partir do conceito, pode-se perceber que família é, unidade básica da sociedade formada por indivíduos com ancestrais em comum ou ligados por laços afetivos. Podendo também ser considerada como, um conjunto invisível de exigências funcionais que organiza a interacção dos membros da mesma, considerando-a, igualmente, como um sistema, que opera através de padrões transacionais.
2. A QUESTÃO DO AFETO NO DESENVOLVIMENTO DAS INSTITUIÇÕES FAMILIARES
Na maioria das vezes, o novo se revela como incômodo ante o mistério do desconhecido, apresentando-se, assim, uma forte tendência à rejeição, pela suposta impossibilidade de segurança que ele nos traz. Desse modo, como bem nos relata Maria Berenice Dias (2005; p. 1), em seu artigo sobre A ética do afeto: "Toda mudança traz a sensação de afronta ao que é certo, havendo uma tendência de rejeitar o novo por considerá-lo uma quebra do que sempre foi tido como correto".
A superação de paradigma não é tarefa fácil; requer evolução de consciências, valores, costumes, adaptações pessoais, culturais e sociais. Por isso, a concepção de entidade familiar percorreu longos trajetos e turbulentas manifestações até chegarmos a nossa atual dimensão sobre a família. Todavia, muito ainda há a ser conquistado, principalmente no campo jurídico, e muito paradigmas hão de ser reformulados, a fim de atingirmos o que Netto Lôbo (2004; p. 2) chama de repersonalização das relações familiares como direito da pessoa humana.
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2.1 ORIGEM E EVOLUÇÃO CONCEITUAL DA FAMÍLIA
Registros históricos, monumentos literários, fragmentos jurídicos, comprovam acertadamente o fato de que a família ocidental viveu largo período sob a forma "patriarcal". Destarte as civilizações mediterrâneas a reconheceram. Dessa forma, anunciou a documentação bíblica.
Como fala Caio Mário (2007; p.25) em sua doutrina, que ressalta ainda hoje o tônus emocional com que Cícero alude à figura valetudinária de Appius Claudius, que dirige os seus com a plena autoridade de um patriarca autêntico, não obstante a idade avançada e a quase cegueira. Os princípios fixados através dos tempos, desde época anterior ao Código Decenviral até a codificação justinianéia do século VI, dão testemunho verdadeiro dessa tipicidade familiar.
Em Roma, a família era estabelecida sobre o princípio da autoridade e compreendia quantos a ela estavam submetidos. O pater era, ao mesmo tempo, chefe político, sacerdote e juiz. Liderava, oficiava o culto dos deuses domésticos e espalhava justiça. Exercia sobre os filhos direito de vida e de morte, podia impor-lhes pena corporal, vendê-los, tirar-lhes a vida. A mulher vivia in loco filiae, completamente dependente à autoridade marital, nunca contraindo autonomia. Somente o pater adquiria bens, exercendo o poder sobre o patrimônio familiar ao lado, e como conseqüência do poder sobre a pessoa dos filhos e do poder sobre a mulher. A família era estabelecida em desempenho do juízo religioso, e o poder do império romano surgiu dessa organização.
Todavia com o passar do tempo, esfriaram-se estes preceitos rigorosos, conhecendo-se o casamento sine manu; as necessidades militares instigaram a invenção do patrimônio independente para os filhos, instituídos pelos bens contraídos como soldado, pelos que auferiram no exercício de atividades intelectuais, artísticas ou funcionais e pelos que lhe surgiam por formas diversas desses.
Conforme Caio Mário (ibidem; p. 27), a partir do século IV com o Imperador Constantino, instala-se no Direito Romano o entendimento cristão da família, no qual a ansiedade de ordem moral prevalece, sob inspiração do espírito de caridade. Por outro lado, comina-se o direito da cidade com maior vigor, sobrepôs-se ao doméstico, e sacrificou em parte a autoridade do paterfamilias.
Maria Berenice Dias (ibidem; p. 1), nos mostra que, ao longo da história, a família gozou de um conceito sacralizado por ser considerada a base da sociedade. De início, as relações afetivas foram apreendidas pela religião, que as solenizou como união divina e abençoada pelos céus. O Estado não podendo ficar aquém dessa intervenção nas relações familiares, buscou estabelecer padrões de estrita moralidade e de conservação da ordem social, transformando a família numa instituição matrimonializada.
Assim, todos que fugissem desse padrão legal e ousasse comprometer a estabilidade das relações sociais, sofreriam sanções. Nega-se juridicidade a quem se rebela e afronta o normatizado. Explica a autora:
A tendência do legislador é de arvorar-se no papel de guardião dos bons costumes, buscando a preservação de uma moral conservadora. É o grande ditador que prescreve como as pessoas devem proceder, impondo condutas afinadas com o moralismo vigente. Limita-se a regulamentar os institutos sociais aceitáveis e, com isso, acaba refugiando-se em preconceitos. Qualquer agir que se distancie do parâmetro estabelecido é tido como inexistente por ausência de referendo legal (ibidem; p. 1).
Desse modo, acaba-se não só se negando direitos, como também deixando de reconhecer a existência dos fatos, sendo a desobediência condenada à invisibilidade. Diante dessa postura, o legislador equivoca-se, pois negar a existência de fatos e não lhe atribuir efeitos só estimula irresponsabilidade. Expõe DIAS (ibidem; p. 2), que "a aparente 'punição', além de não alcançar o intuito inibitório, não dispõe de qualquer conteúdo repressivo, transformando-se em fonte de injustificáveis e indevidos privilégios. Desse modo, a Justiça acaba sendo conivente com o infrator".
DIAS (2005; p. 1), todavia, relata-nos que, mesmo diante das sanções legais, um significativo movimento social promoveu profundos reflexos na formação da família. Afirma ela que a laicização do Estado revolucionou os costumes e especificamente o Direito de Família, visto que sobreveio o pluralismo das entidades familiares, escapando suas novas estruturas do convívio das normatizações existentes. Diz ela:
O distanciamento entre Estado e Igreja culminou na busca de referenciais outros para a mantença das estruturas convencionais. Sem o freio da religião, valores outros precisaram ser prestigiados, e a moral e a ética foram convocadas como formas de adequação do convívio social. Esses os paradigmas que começaram a ser invocados para tentar conter a evolução dos costumes. [...] A questão pós-moderna essencial passa a ser a ética. (ibidem; p. 2).
É a partir disto que vislumbramos uma gama de entidades familiares a desflorar no mundo das relações, pois como muito bem assinala Netto Lôbo (2004; p. 2) "A família é o núcleo natural e fundamental da sociedade e tem direito à proteção da sociedade e do Estado".
Netto Lôbo (2004 - A; p. 5) defende que a característica fundante da família atual é a afetividade. Diz ele que as Constituições liberais sempre atribuíram à família o papel de célula básica do Estado. Todavia, demonstra que as declarações de direito, como a Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, em sinal dos tempos, preferiram não vinculá-la ao Estado, mas à sociedade, como reconhecimento da perda histórica e de sua função política. Afirma ele:
A função política na família patriarcal, cujos fortes traços marcaram a cena histórica brasileira, da Colônia às primeiras décadas deste Século (séc. XX, grifo nosso). Em obras clássicas, vários pensadores assinalaram este instigante traço de formação do homem brasileiro, ao demonstrar que a religião e o patrimônio doméstico se colocaram como irremovíveis obstáculos ao sentimento coletivo da república. Por trás da família, estavam a religião e o patrimônio, em hostilidade permanente ao Estado, apenas tolerado como instrumento de interesses particulares. Em suma, o público era (e ainda é, infelizmente) pensado como projeção do espaço privado-familiar (ibidem; p. 5 e p. 6).
Todavia, hodiernamente, a família brasileira vem desmentir essa tradição centenária, visto que relativizou-se sua função procracional; desapareceram suas funções política, econômica e religiosa (para as quais era necessária a origem biológica) e ressurgiu a função que, certamente, esteve arraigada às suas origens mais remotas - a de comunhão de vida unida por desejos e laços afetivos.
Nessa dinâmica, Netto Lôbo (2004 - A; p.1) aponta que, a partir da década de sessenta, as relações familiares e de parentesco passaram por transformações profundas, logo observadas pela psicologia, psicanálise, antropologia, sociologia, demografia, ciência política e engenharia genética; provocando, assim, uma radical mudança de paradigmas. No entanto, o Direito de Família pouco mudou, mantendo relativa distância dessas mudanças, e preservando no paradigma familiar o modelo patriarcal.
Expõe ele que, na sociedade brasileira, dois fenômenos podem ser apontados como principais responsáveis para essa mudança de paradigmas, nas duas últimas décadas: a concentração urbana e emancipação feminina. Diz ainda que a concentração urbana impulsionou a mais devastadora implosão do modelo patriarcal da família, e contribuiu para a emancipação da mulher, tendo, a partir de então acesso progressivo à educação e ao mercado de trabalho.
Assim, diante das demandas surgidas, veio a Constituição de 1988 como epílogo da lenta evolução legal das relações familiares e de parentesco no Brasil, antes amparada, em parte, pelo Estatuto da Mulher Casada e a lei do Divórcio.
Diante de tudo isso, pode-se concluir que a família evoluiu e continua evoluindo sob a conquista do afeto. Este só sendo possível se manifestar com a eliminação do elemento despótico no seio familiar. Hoje não há mais espaço para a família patriarcal, com abuso de poder, hierarquia, autoritarismo e predomínio do interesse patrimonial. Na trajetória da história familiar, viajamos do poder absoluto do paterfamilias romano, que incluía o direito de vida e de morte sobre seus filhos, para o conceito atual de autoridade parental, que é mais dever do que poder diante da filiação.
Netto Lobo (2000; p.3 e p.4) assinala que o princípio da afetividade foi constitutivo para a evolução social da família. Fazendo uma análise do art. 226 e 227 da Constituição, ele sintetiza dizendo que:
Se todos os filhos são iguais, independentemente de sua origem, é porque a Constituição afastou qualquer interesse ou valor que não seja o da comunhão de amor ou do interesse afetivo como fundamento da relação entre pai e filho. [...] Se a Constituição abandonou o casamento como único tipo de família juridicamente tutelada, é porque abdicou dos valores que justificavam a norma de exclusão, passando a privilegiar o fundamento comum a todas as entidades, ou seja, a afetividade, necessário para realização pessoal de seus integrantes. O advento do divórcio direto (ou a livre dissolução na união estável) demonstrou que apenas a afetividade, e não a lei mantém unidas essas entidades familiares. (2001; p.6)
3. FUNDAMENTOS JURÍDICO-CONSTITUCIONAIS DO PRINCÍPIO DA AFETIVIDADE
O princípio da afetividade tem fundamento constitucional. Não é rogativa de princípio, nem episódio excepcionalmente sociológico ou psicológico. No que tange aos filhos, o progresso dos valores da civilização ocidental levou à progressiva superação dos fatores de discriminação, entre eles. A declaração da natureza da família como grupo social instituído fundamentalmente nos laços de afetividade, projetou-se no campo jurídico-constitucional.
Na Carta Magna é possível encontrar três fundamentos essenciais do princípio da afetividade, constitutivos dessa exasperada evolução social da família, máxime durante as últimas décadas do Século XX: todos os filhos são iguais, independentemente de sua origem (art. 227, § 6º); a adoção, como escolha afetiva, alçou-se integralmente ao plano da igualdade de direitos (art. 227, §§ 5º e 6º) e; a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes, incluindo-se os adotivos, tem a mesma dignidade de família constitucionalmente protegida (art. 226, § 4º).
A filiação biológica era claramente dividida entre filhos legítimos e ilegítimos, a evidenciar que a procedência genética nunca foi, rigorosamente, a essência das relações familiares. A Constituição não tutela apenas a família matrimonializada e não constitui mais distinção entre filhos biológicos e adotivos. As pessoas que se unem em comunhão de afeto, não podendo ou não querendo ter filhos, é família protegida pela Constituição.
A igualdade entre filhos biológicos e adotivos implodiu o fundamento da filiação na origem genética. A concepção de família, a partir de um único pai ou mãe e seus filhos, eleva-os a mesma dignidade da família matrimonializada. O que há de comum nessa concepção plural de família e filiação é a relação entre eles fundada no afeto.
4. FAMÍLIA SÓCIO-AFETIVA
Consolida-se a família sócio-afetiva em nossa Doutrina e Jurisprudência, como um novo elemento no Direito Brasileiro contemporâneo, transpondo os limites fixados pela Constituição Federal de 1988, porém incorporados dos seus princípios. Quando declarada a convivência familiar e comunitária, a não discriminação de filhos, a co-responsabilidade dos pais quanto ao exercício do poder familiar e o núcleo monoparental reconhecido como entidade familiar está concretizada a chamada família sócio-afetiva. Os vínculos de afeto se sobrepõem à verdade biológica, convocando assim, os pais a uma "paternidade responsável".
No Brasil, a afetividade invade a ciência jurídica transcendendo aos aspectos exclusivamente psicológico e sociológico. Assim, como o respeito e consideração mútuos (art. 1.566, V do Código Civil de 2002) e lealdade e respeito (art. 1724 do Código Civil de 2002), o afeto e tolerância hão de ser incorporados como valores jurídicos no âmbito das relações familiares.
Segundo Caio Mário (2007; p. 40), ocasiões peculiares devem ser assumidas no mundo jurídico como relações de afeto com força própria para uma definição jurídica: o "filho de criação", quando comprovado o "estado de filho afetivo" (posse de estado de filho), a adoção judicial, o reconhecimento voluntário ou judicial da paternidade ou maternidade e a conhecida "adoção à brasileira".
5.1 PATERNIDADE SÓCIO-AFETIVA
O sistema clássico de estabelecimento da filiação fundava-se na proteção da instituição matrimonializada e calcada, por isso, numa visão patriarcal e hierarquizada da família, não passando, muitas vezes, pelos muros da verdade jurídica, a busca da verdade biológica, nem muito menos a da verdade sócio-afetiva.
A superação desse sistema buscou considerar efetivamente a verdade da filiação, possibilitando investigar a verdadeira descendência genética. Mas, além disso, como diz Fachin (1996; p.65):
Expressivo movimento legislativo percebeu uma realidade marcante: a verdadeira paternidade não pode se circunscrever na busca de uma preciosa informação biológica; mais do que isso, exige uma concreta relação paterno-filial, pai e filho que se tratam como tal, donde emerge a verdade sócio-afetiva.
Netto Lôbo (2003; p. 2) afirma que, nos últimos anos, dois foram os marcos essenciais para solucionar o conflito entre filiação biológica e filiação não-biológica: a Constituição de 1988 e a Convenção sobre os Direitos da Criança, adotada pela Assembléia da ONU em 20 de novembro de 1989, ganhando força de lei no Brasil através do Decreto Legislativo nº 28, de 24 de setembro de 1990, e o Decreto Executivo nº 99.710, de 21 de novembro de 1990. Diz o autor:
Da Constituição derivam o estado de filiação biológico e não-biológico e o direito de personalidade à origem genética, e da Convenção a solução do conflito pela aplicação do princípio do melhor interesse do filho, que significou verdadeiro giro de Copérnico, na medida em que a primazia do interesse dos pais foi transferida para o do filho. (idem; p. 2).
Rodrigo Pereira (2003; p. 4) informa que a Constituição de 1988 provocou uma mudança marcante no Direito de Família a partir de três eixos: a igualdade de homens e mulheres diante da lei; o reconhecimento de outras formas de família pelo Estado, além da constituída pelo casamento; e a alteração do sistema de filiação, que trouxe a igualdade dos filhos havidos dentro e fora do casamento, proibindo qualquer forma de discriminação entre eles (art. 226).
A mudança com relação à filiação veio corrigir as injustiças que os filhos havidos fora do casamento sofriam. Antes, eles não podiam ser registrados cm nome do pai, mesmo que este quisesse, tendo em vista o zelo da "moral e dos bons costumes", pois se considerava uma afronta à família. Assim, o filho existia no mundo real, mas não no mundo jurídico.
Aponta ainda Rodrigo Pereira (2003; p. 5) que a Lei nº 8.560, de 1992, também veio fazer uma intervenção pertinente com relação à filiação e à paternidade. Ela veio determinar ao Estado que promova investigação de paternidade de todos os filhos que não tiverem o nome do pai no seu registro de nascimento. Sabe-se que a evolução do conhecimento científico veio facilitar e muito essa averiguação, tendo em vista a precisão do exame de DNA para a determinação da paternidade biológica.
Todavia, infelizmente essa lei não produziu os efeitos esperados: talvez pelo excesso de intervenção do Estado na vida privada das pessoas, posto que sempre haverá algo no sujeito que escapará aos ditames legais. Entretanto, ressalta-se que apesar da lei não poder impor ao genitor que assuma o efetivo papel de pai - tendo em vista que essa função não se impõe, mas se constrói - ela ao menos determina a paternidade para fins de subsídio.
O citado autor continua informando que, no campo jurídico, o laço biológico, sempre poderá ser fonte de responsabilidade civil, especialmente para fins de alimentos e sucessão, demonstrando que na França, o Código Civil (art. 311-1) foi alterado para fazer uma distinção entre paternidade para fins de subsídio e paternidade enquanto função para aquele que detém a "posse de estado de pai". Percebe-se, então, que diante dos avanços das técnicas médicas e da engenharia genética, mostrou-se necessário repensar meticulosamente a família frente às implicações trazidas por essas demandas atuais.
É sabido que, normalmente, a paternidade de filho havido no casamento, funda-se em três pilares: o jurídico (o marido da mãe é por presunção pai do filho tido com esta mulher o qual está casado), o biológico (o marido da mãe é, por presunção, o autor genético da fecundação) e o sócio-afetivo (o marido da mãe trata-o como filho e é tratado por este como pai).
No entanto, a falta de coincidência desses vetores pode gerar complexidade. Percebemos isso quando questionamos a paternidade do filho originado pela inseminação artificial heteróloga, ou seja, aquela cujo sêmen é de um doador que não é o marido, ou no caso do filho oriundo da união estável entre um homem e uma mulher, estando esta ainda casada legalmente com o ex-marido. Será que o fator biológico poderá determinar a paternidade no primeiro caso; e o fator jurídico, sob a presunção pater is est, determinar no segundo?
Diante desses exemplos percebemos claramente a impossibilidade de se aplicar literalmente a presunção legal ou a biológica. A adoção e a inseminação artificial heteróloga vem comprovar que o fator biológico não determina a afetividade da paternidade. Da mesma forma, constatamos que a presunção pater is est não autoriza a determinação da paternidade ao ex-marido da mulher que há anos é separada de fato, e que já construiu outra vida conjugal ao lado de seu companheiro, e dessa união originou filhos. Antes, presumia-se pai biológico o marido da mãe, no qual o adágio pater is est mantinha amarrado o biológico ao institucional, tendo ainda como pressuposto a fidelidade da mulher. Hoje, presume-se pai o marido da mãe que age e se apresenta como pai, independente de ter sido o procriador ou não. Diante disso, constata-se que a paternidade nesses casos será determinada, predominantemente, pelo fator sócio-afetivo.
A relação paterno filial sócio-afetiva é aquela que se revela no transcurso da convivência; é uma conquista que ganha grandeza e se consubstancia nos detalhes. É fruto de um querer, onde o desejo de ser pai se constrói na via do querer ser filho. Assim, a verdade sócio-afetiva nem sempre é verdade desde logo, nem sempre se apresenta desde a concepção ou do nascimento, ela se constrói e refina-se no seio da vivência familiar (Fachin; 1996).
Netto Lôbo (2004; p. 6) cita que o Tribunal de Justiça do Paraná, homenageando a filiação sócio-afetiva, em promissora linha de tendência da jurisprudência brasileira, decidiu:
1. A ação de negatória de paternidade é imprescritível, na esteira do entendimento consagrado na Súmula nº 149/ STF, já que a demanda versa sobre o estado da pessoa, que é emanação do direito de personalidade. 2. No confronto entre a verdade biológica, atestada em exame de DNA, e a verdade sócio-afetiva, decorrente da denominada adoção à brasileira (isto é, da situação de um casal ter registrado, com outro nome, menor, como se deles filho fosse) e que perdura por quase quarenta anos, há de se prevalecer a solução que melhor tutele a dignidade da pessoa humana. 3. A paternidade sócio-afetiva, estando baseada na tendência de personificação do direito civil, vê a família como instrumento de realização do ser humano; aniquilar a pessoa do apelante, apagando-lhe todo o histórico de vida e condição social, em razão de aspectos formais inerentes à irregular adoção à brasileira, não tutelaria a dignidade humana, nem faria justiça ao caso concreto, mas, ao contrário, por critérios meramente formais, proteger-se-ia as artimanhas, os ilícitos e as negligências utilizadas em benefício do próprio apelado.
Fazendo uma análise nesse mesmo diapasão, Dias (2007; p. 1) comenta que a mudança de paradigmas da família acabou por refletir na identificação dos vínculos de parentalidade, surgindo, desse modo, novos conceitos e uma linguagem que melhor retrata a realidade atual: filiação social, filiação sócio-afetiva, posse do estado de filho.
Afirma ela que, todas essas expressões nada mais significam do que a consagração, também do campo da parentalidade, do mesmo elemento que passou a fazer parte do Direito de Família - o afeto. Assim, como aconteceu com a entidade familiar, a filiação passou a ser identificada pela presença de um vínculo afetivo paterno-filial. O Direito ampliou o conceito de paternidade, que passou a compreender o parentesco psicológico, que prevalece sobre a verdade biológica e a realidade legal. (idem; p. 4).
No direito brasileiro considera-se estado de filiação ope legis, com fulcro no art. 227 da Constituição Federal de 1988 e arts. 1.593, 1.596 e 1.597 do Código Civil:
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Filiação biológica em face de ambos os pais, havida de relação de casamento ou de união estável, ou em face do único pai ou mãe biológicos na família monoparental;
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Filiação não-biológica em face de ambos os pais, oriunda de adoção regular; ou em face do pai ou da mãe que adotou exclusivamente o filho;
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Filiação em face do pai que autorizou a inseminação artificial heteróloga.
Netto Lôbo (2003; p. 13) esclarece que nessas hipóteses a convivência familiar e a afetividade são presumidas. Nos últimos dois casos, os estados de filiação não-biológica são irreversíveis e invioláveis, não podendo ser questionado por investigação de maternidade ou paternidade, tendo como fundamento a origem biológica; somente podendo ser objeto de pretensão e ação para fins de tutela de direito da personalidade.
Isso se justifica porque se fosse possível a investigação de paternidade no caso da inseminação artificial heteróloga, a paternidade ficaria incerta, posto que o sigilo profissional médico e o anonimato do doador impossibilitaria o conhecimento do pai biológico. A intenção da lei foi justamente o contrário. Ela veio possibilitar a legitimidade desse estado de filiação e fortalecer fundamentalmente a natureza sócio-afetiva da paternidade e da filiação, e não a natureza biológica.
Ressalta-se que, no que concerne ao estado de filiação, tanto o mandamento constitucional quanto à Convenção Internacional dos Direitos da Criança (que passou a integrar o direito brasileiro desde 1990) priorizam os direitos da criança e do adolescente. Assim, o princípio do "interesse maior da criança" está previsto nos arts. 4º e 6º da Lei nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA):
Art. 4º. É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, a profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e a convivência familiar e comunitária (grifo nosso).
Art. 6º. Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento (grifo nosso).
Percebe-se, então, que o filho saiu das margens para ocupar o centro dos interesses no seio familiar, tendo prioridade na satisfação de seus direitos. Valério Pocar e Paola Ronfani (apud Netto Lôbo, 2003; p. 8,) simbolizam muito bem essa transformação do papel do filho na família:
Em lugar da construção piramidal e hierárquica, na qual o menor ocupava a escala mais baixa, tem-se a imagem de círculo, em cujo centro foi colocado o filho, e cuja circunferência é desenhada pelas recíprocas relações com seus genitores, que giram em torno daquele centro. Nos anos mais recentes, parece que uma outra configuração de família relacional está se delineando, em forma estelar, que tem no centro o menor, sobre o qual convergem relações tanto do tipo biológico quanto do tipo social, com os seus dois genitores em conjunto ou separadamente, inclusive nas crises e separações conjugais.
Assim, diante de um conflito entre filiação biológica e sócio-afetiva, o princípio do interesse do filho é que norteará a decisão do julgador.
Foi em busca de um equilíbrio entre a verdade biológica da filiação com o sentido sócio-afetivo da paternidade, que o legislador valeu-se da noção de posse de estado. A posse de estado de filho não serve prioritariamente à verdade biológica, mas busca valorizar, acima de tudo, o elemento afetivo e sócio-lógico da filiação, posto que a sua ausência pode pôr em dúvida o vínculo da filiação. Assim, como bem traz Fachin parafraseando Vilela (1996; p. 37) a paternidade apresenta-se, então, "como aquela que, fruto do nascimento mais emocional e menos fisiológico, reside antes no serviço e amor que na procriação".
É esse som da vivência afetiva que devemos nos propor a afinar e aprimorar a cada dia no seio familiar, a fim de construirmos um concerto sintonizado com a energia do amor, do respeito e da responsabilidade paternal, para assim se alcançar o desenvolvimento da mais fina melodia filial.
5.2 A IMPORTÂNCIA DO PAI NA ESTRUTURAÇÃO DO SUJEITO: O AFETO FAZ APELO À PATERNIDADE
Busca-se expor a importância do pai na estruturação psíquica do filho, buscando demonstrar as conseqüências pessoais e sociais relacionadas à ausência paterna, resgatar a função paterna a fim de acatar o apelo do afeto, que se vê tão fragilizado e frígido nos vínculos paternos filiais na sociedade atual. Assim, perceberemos que não só os filhos, mas também os pais fazem apelo ao afeto, a fim de alcançarem sua homeostase emocional.
Estatística da ausência paterna.
Montgomery (sem ano) informa que hoje, no Brasil, a taxa de divórcio quadruplicou em relação à década de sessenta, sendo que, na classe social baixa, o número de crianças que vive sem os pais atinge mais de 40%. Fazendo uma análise estatística sobre a paternidade com base num estudo atual da National Fathrboard Iniciative, Lancaster, Pensilvânia, aponta ainda que, nos Estados Unidos, um estudo projetivo estima que 55 a 60% das crianças nascidas na década de 90 passaram boa parte de suas vidas distanciadas dos seus pais biológicos.
Em 1960 era de cinco milhões o número de crianças, vivendo só com a mãe; hoje, chega a oito milhões. Cerca de 40% dessas crianças que vivem só com a mãe, vêem seus pais apenas uma vez por ano; e mais de 50% nem sequer conhecem seus pais. Aproximadamente, 15% das mães divorciadas não valorizam o contato das crianças com seus pais.
Expõem-se, ainda, dados alarmantes, vinculando os dados à ausência paterna, são eles: 72% dos adolescentes assassinos cresceram sem os pais; 70% dos delinqüentes juvenis em reformatórios cresceram com um só progenitor ou sem família; 60% dos estupradores da América cresceram sem seus pais; as crianças sem a presença paterna têm duas vezes mais probabilidade de repetir o ano escolar; as crianças de comportamento violento nas escolas é onze vezes mais provável que haja ausência do pai; a taxa de suicídio na adolescência triplicou entre 1960 e 2002, sendo que em cada quatro, três ocorrem em lares onde o pai é ausente. Ele diz ainda que as crianças na ausência do pai estão mais propensas a risco de suicídio, doenças sexuais, drogas, alcoolismo gravidez, aborto, criminalidade e baixa performance acadêmica; bem como mais vulneráveis a acidentes, asma, dores e dificuldades na elaboração da fala (gagueira).
Em estudo realizado no Hospital Psiquiátrico de Nova Orleans constatou-se que cerca de 80% das crianças de pré-escola que lá eram admitidas como doentes psiquiátricos, vinham de lares sem pai.
Demonstra-se ainda que em cada seis crianças, uma apenas vê seu pai pelo menos uma vez por semana. Em dez anos de separação do casal, somente uma em dez tem contato com o pai.
20% das crianças que vivem com seus pais quando perguntando o nome de adultos que você admira e se espelha, responderam como sendo "seu pai". Esse número quando perguntando a criança que vive sem o pai subiu para 66%.
Ressalta-se, então, que esses dados virão fundamentar a análise da importância do pai na estruturação do sujeito, impulsionando uma reflexão séria a respeito da temática paterna como co-responsável no desenvolvimento físico, psíquico, social e emocional do filho. O chamamento a essa análise visa não só o resgate do afeto na relação paterno-filial, mas também sua responsabilização como defesa da dignidade da pessoa humana e da harmonia social.
O pai como representante da Lei e sua importância na estruturação do sujeito.
A intenção de trazer a contribuição do saber psicanalítico sobre essa abordagem é justamente ampliar a análise sobre a importância da paternidade, abrindo novos horizontes no campo do Direito. É preciso conhecer o papel do pai na estruturação psíquica do sujeito, e fazer o resgate dessa função na sociedade atual.
Regatar a paternidade significa, não só garantir um desenvolvimento digno para o filho, mas defender o direito do pai de gozar o seu papel de maneira mais plena, reestruturando o vínculo afetivo na relação paterno-filial.
Análise da paternidade frente às demandas atuais.
Hoje, os homens tendem a participar mais efetivamente na educação dos filhos, não se limitando apenas a ser o representante da Lei. Constata-se, então, que nas sociedades ocidentais, cresce o número de pais que educam os filhos sozinhos. Na França, em 1990, cerca de 223.500 crianças viviam só com o pai; já nos Estados Unidos, entre 1971 e 1981, aumentou em 100% o número de pais que convivem sozinho com os filhos. Também no Brasil revela-se essa tolerância, embora em menor proporção do que nesses países (Pereira; p.3).
Porém devemos atentar para o fato de que a queda do modelo patriarcal trouxe consigo a queda de uma estrutura familiar que estava aí há milênios. Na estrutura patriarcal os lugares de pai, mãe e filho eram claros e bem demarcados. Com o declínio dessa ideologia do patriarcalismo e com as transformações sociais iniciadas com a revolução feminista (a partir da redivisão sexual do trabalho) "os lugares estruturantes e fundantes dos sujeitos, enquanto função, ficaram alterados, gerando sérias conseqüências na formação das famílias atuais". (ibidem; p. 7).
Uma das conseqüências desse fenômeno atual é o redimensionamento do masculino e da função paterna nesse novo contexto. Temos, hoje, uma crise da paternidade diante do rompimento do modelo patriarcal e da redefinição da família moderna. Assim fala PEREIRA:
Sua função básica, estruturadora e estruturante do filho como sujeito, está passando por um momento histórico de transição de difícil compreensão, onde os varões não assumem ou reconhecem para si o direito/dever de participar da formação, convivência afetiva e desenvolvimento de seus filhos. [...] Enfim, a ausência do pai, e dessa imago paterna, em decorrência de um abandono material e/ou psíquico, tem gerado graves conseqüências na estruturação psíquica dos filhos e que repercute, obviamente, nas relações sociais. (idem; p. 7).
Assim, o desafio que se coloca para esse terceiro milênio é aprender a organizar a "polis", considerando que não é possível pensar o Estado sem a família, sendo esta seu núcleo básico. Da mesma forma não é possível reorganizar esse núcleo básico sem o lugar estruturante do Pai. Desse modo, "teremos que reaprender, então, diante das novas formas de família, e nesse novo contexto social, o que é um pai, pois já sabemos que a ausência dele pode ser desestruturante para o sujeito" (Pereira; p. 9).
Pereira (sem ano; p. 9) destaca um aspecto muito interessante ao falar da importância de um pai ausente se fazer presente no discurso da mãe. Ele tomando como exemplo o filme "Central do Brasil", relata que, apesar de Josué não ter conhecido pai, pois se mudou do Nordeste para o Rio de Janeiro com a mãe, quando ainda estava em seu ventre, esta sempre falava em seu pai, fazendo com que o filho crescesse admirando um pai que nem chegou a conhecer. Assim, "a mãe falava bem do pai, e introduzindo para o filho a imago paterna, fez presente um OUTRO, e através de seu desejo possibilitou que o filho se estruturasse psiquicamente" (ibidem, p. 09).
Mas como bem ressalta Pereira (sem ano; p. 9), apesar da imagem boa do pai ser estruturante para o sujeito, não há como viver só dessa imagem, visto que, para a construção do mundo real, também é preciso um pouco de carne; dessa forma, a presença viva e próxima do pai também se faz necessária.
CONCLUSÃO
Concluímos que, o desafio para a consagração do princípio da afetividade será converter a população infanto-juvenil em sujeitos de direito, retirando-a da qualidade de objeto passivo para a de titular de direitos juridicamente protegidos. Assim, diante de um conflito de princípios, o interesse superior da criança deverá ser tratado como uma "consideração primordial", destacando-se, dessa forma, que nem o interesse do Estado, nem o interesse dos pais podem ser considerados o único interesse relevante para satisfazer os direitos da criança.
Apesar de o abandono material ser danoso, ele não se equipara ao psíquico, visto que, no primeiro caso, o Estado tem meios legais de cobrar pensão alimentícia, podendo até mesmo o pai ser preso, caso não cumpra com a obrigação de alimentos. Já o abandono psíquico e afetivo mostra-se bem mais gravoso, pois representa a ausência do pai no exercício de suas funções paternas, como aquele que representa a lei, o limite, a segurança e proteção. Essa ausência paterna mostra-se, hoje, como um fenômeno social alarmante, não sendo descabida a constatação trazida pelos dados estatísticos ora apresentados.
A apologia da presença paterna mostra-se uma necessidade urgente para nosso mundo atual. Os saberes, as instituições, o Estado, as mães, a sociedade como um todo, devem se mobilizar para o alcance dessa conquista. Trazer a temática do afeto é também trazer à tona a importância da presença paterna como co-responsável na estruturação ou reelaboração emocional dos sujeitos envolvidos na trama familiar. Além disso, possibilita o sujeito fazer laço social, contribuindo para a construção de uma sociedade mais digna e humanizada.
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Rafaele Ferreira Rocha e Gleick Meira Oliveira foram classificadas em 4º lugar no Concurso de Monografias do II Congresso Paraibano de Direito das Família e Sucessões.
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