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IBDFAM ACADÊMICO - Responsabilidade Civil por Abandono Afetivo na Filiação
Considerações iniciais
Em virtude da precarização das relações intersubjetivas, são crescentes as discussões acerca da responsabilidade civil nas relações afetivas. De fato, os transtornos psicológicos provenientes da falta de solidez do seio familiar são capazes de implicar seqüelas intransponíveis. Isto porque, é sobretudo no âmbito mais próximo das pessoas que se assimilam valores primordiais para o saudável desenvolvimento humano, notadamente no que diz respeito à formação de um cidadão.
Diante dessas questões, há de se avaliar se há procedência na conduta dos indivíduos que decidiram intentar reconhecimento judicial do dever de reparar os danos causados em conseqüência da ausência de relação de fraternidade, de cooperação, de respeito recíproco, de acolhimento ao outro, no bojo da entidade familiar.
Um aspecto importante de ser considerado, de pronto, é a necessidade da condenação do pai a pagar indenização pelo dano psicológico causado por sua omissão na formação e desenvolvimento do filho, assumir um cunho pedagógico, na medida em que deve ser capaz de desincentivar condutas dessa natureza. Assim, dificilmente um pai que teve de reparar o abandono de um filho reincidirá, como também a tendência será a maior preocupação dos pais quanto ao seu papel de orientador e formador dos seus descendentes.
Desse modo, muito embora seja compreensível que o laço de filiação não possa ser reconstituído com o pagamento da indenização, uma vez que o amor paternal não é passível de quantificação, vale o escopo de "reparação de um dano, de fato, suportado com prejuízos na formação da personalidade e identidade da criança"[1].
No que tange ao dever de sustento, vê-se que a postura do Judiciário brasileiro mostra-se intransigente: há que se prestar a promoção material das necessidades dos filhos, sob pena, inclusive, de prisão civil. Entretanto, diante da profunda crise das instituições familiares, culminado, inclusive, com bárbaros crimes, suscita-se a necessidade de discutir a problemática da imperiosidade de se reconhecer a família como responsável pela subsistência emocional dos indivíduos, a ponto de ser capaz de moldar a personalidade dos filhos segundo os valores que são discutidos no âmbito dessa entidade.
Assim, não deve prevalecer que a necessidade de alimentação é mais imperiosa do que o direito de receber uma orientação educacional, uma demonstração de afeto, uma diretriz comportamental.
Ademais, no que diz respeito ao disciplinamento legal da matéria, uma vez reconhecido o sobredito dever de indenização por abandono moral, resta cabalmente respeitado o artigo 1634, I e II do Código Civil, que impõe que o dever dos pais não se restringe ao dever de sustento. Há, também, a obrigação de dirigir aos filhos a criação e a educação, bem como o dever de tê-los em sua companhia e guarda.
Assim, do ponto de vista do presente estudo, a condenação do pai ausente a indenizar o filho abandonado é uma postura que contribuiria para o aperfeiçoamento das relações familiares e sociais como um todo, pois, primeiramente, evidenciaria aos pais que o seu dever paterno não se restringe ao sustento, despertando-lhes a consciência da sua função social no bojo familiar, e, de modo reflexo, haveria a formação de indivíduos mais equilibrados e conscientes.
1. Aspectos gerais acerca da Responsabilidade Civil
A responsabilidade civil no âmbito do Direito de Família é questão que vem sendo amplamente debatida. Há exaltados discursos em torno da possibilidade de responsabilização por fatos provenientes das relações familiares lato sensu[2].
O termo responsabilidade é utilizado para designar várias situações no campo jurídico. Em sentido amplo, encerra a noção em virtude da qual se atribui a um sujeito o dever de assumir as conseqüências de um evento ou de uma ação. Nessa ocasião, importa encarar a responsabilidade como fato ou ato punível ou moralmente reprovável, que viola direitos de outrem e acarreta reflexos jurídicos[3].
Para a configuração da responsabilidade civil, e, pois, para a configuração do dever de indenizar, deve restar cabalmente demonstrada a existência de uma ação ou omissão voluntária, de dano a um sujeito passivo, e uma relação de causalidade entre o dano e a ação ou omissão.
Quando se trata de responsabilidade civil na seara do Direito de Família, é importante salientar a necessidade de demonstração da culpabilidade - dolo ou culpa. Isto decorre do fato da sobredita responsabilidade ser subjetiva, o que faz com que não exista dever de indenizar se não caracterizada uma ação ou omissão dolosa ou culposa.
No que tange ao aspecto prático, a jurisprudência dos Tribunais Superiores majoritariamente entendem, no julgamento de demandas que visam a condenação a indenizações por danos decorrentes de abandono moral, que não é cabível a imputação de sanção pecuniária. Entretanto, consideráveis argumentos em sentido contrário vêem sendo propostos pela doutrina, o que contribui sobremaneira para o aperfeiçoamento das questões atinentes à matéria.
2. Importância da figura paterna na formação dos filhos
A necessidade de governar as ações humanas fez com que historicamente fosse importante atribuir aos pais a autoridade suficiente para ter o poder de guiar e proteger as condutas dos membros da família.
Em virtude do papel a ser desempenhado pelo pai no seio familiar, é, logicamente, sua atribuição não caminhar em sentido contrário às necessidades dos seus filhos. Do contrário, tal conduta refletiria um modo ilegítimo de exercício do seu mister. Nesse sentido, vê-se que os afazeres dos pais sofrem limitações, as quais são aferidas conforme se avalia se determinada conduta é ou não benéfica para o filho.
Assim, a orientação dos pais constitui uma diretriz fundamental na formação dos filhos. Daí porque não raras vezes é perceptível identificar um indivíduo que cresceu sem o apoio, a cooperação, a dedicação e o amor comuns em uma família bem estruturada.
A assistência moral e afetiva, pois, representa importante valor para o adequado desenvolvimento dos filhos. Em sentido contrário, a sua ausência gera danos irreparáveis, capazes de comprometer toda a existência dos indivíduos.
Segundo dispõe Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka[4]:
Ao final do processo de autoridade paterna, de formação familiar, de dependência dos filhos em relação aos pais, o que temos é uma outra associação, cujos laços mais fortes que os laços determinados pela vida civil a todos os cidadãos são justamente os laços do afeto, quando tais laços tenham tido a devida oportunidade de se formarem, ao longo de todo esse percurso.
(...)
A responsabilidade dos pais consiste principalmente em dar oportunidade ao desenvolvimento dos filhos, consiste principalmente em ajudá-los na construção da própria liberdade. Trata-se de uma inversão total, portanto, da idéia antiga e maximamente patriarcal de pátrio poder.
Depreende-se, então, que a boa formação familiar repercute não só individualmente, mas também produz reflexos nas relações sociais como um todo. Por isso, a ausência paterna na formação dos filhos deve ser encarada como uma omissão danosa e, como tal, passível de reparação.
Acerca dessa postura, diz a Ministra Eliana Calmon Alves[5], que o "ilícito que atente contra o estado familiar, capaz de gerar gravame moral, assim como sucede nas demais violações do direito da personalidade, está sujeito a ser reparado mediante indenização.".
Uma vez incidentes, pois, os pressupostos que caracterizam a responsabilidade civil subjetiva, não obstante tratar-se de uma relação atinente à seara familiar, merece haver a condenação em reparar o dano através da indenização pecuniária cabível.
De fato, há de se destacar que se trata de uma questão constrangedora; um litígio entre pais e filhos em nenhuma situação se configura um episódio confortável. Embora seja perceptível a acuidade da questão, não é possível deixar de reconhecer esse direito em favor dos filhos sob o argumento de que o valor indenizado não será capaz de unificar os laços entre o pai e o filho, ou, por outro norte, considerar que o amor que se deixou de dar não poder ser quantificável.
Primeiro, porque a condenação pecuniária tem por um de seus fundamentos justamente o fato de recompor o dano que não é passível de reparação em espécie; depois, porque várias decisões jurisprudências imensuráveis, num primeiro momento, foram razoavelmente aferidas pelos magistrados a ponto de se chegar a um montante aceitável, é o caso do que ocorre, por exemplo, nas indenizações por acidente de trabalho, nas reparações que tem por objeto uma coisa de valor tão-somente afetivo etc..
No que se refere ao aspecto normativo, restringir a responsabilidade dos pais ao sustento consiste em afronta direta à legislação pátria.
Assim, Constituição Federal vigente (art. 227), atribuiu expressamente à família, à sociedade e ao Estado o dever de proteger de modo especial a família, assegurando à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Desse modo, o citado dispositivo legal representa um direito oponível não somente ao Estado, à sociedade ou a estranhos, mas a cada membro da própria família. O pai que não exteriorizar afeto em favor do seu filho desrespeita um dever de ordem moral, mas afronta, sobretudo, a ordem legal, inclusive em nível constitucional.
Ademais, "nas concepções mais recentes de família, os pais de família têm certos deveres que independem do seu arbítrio, porque agora quem os determina é o Estado."[6].
O dever de sustento corresponde, então, a uma obrigação de cunho eminentemente material. Não exaure nem supre as obrigações afetivas que os pais assumem desde a concepção dos filhos. Aliada a esta atribuição, portanto, subsiste a responsabilidade de promover a formação emocional do filho, porque o desenvolvimento humano pleno não prescinde do amor.
Por essa razão, vale frisar, ainda, que um filho de pai carente de recursos financeiros, não obstante a pobreza material, pode ser um homem digno (em sentido amplo), mas o filho de um pai ausente, nunca será um indivíduo completo.
3. Postura do Judiciário acerca da ausência de afeto dos pais como um elemento 1ensejador de indenização por danos morais
Com as substancias transformações na postura das instituições, que vêem assumindo progressivamente uma função social, é importante mencionar que ao Judiciário compete se portar de modo proativo quando da resolução de litígios que versem sobre o Direito de Família.
Num primeiro momento, seria interessante que, no bojo dos processos de separação judicial, divórcio, guarda, e demais correlatos, o Judiciário trabalhasse em parceria com entidades de apoio psicológico (universidades, inclusive), de modo que fosse trabalhada a importância da família na formação dos filhos; o apoio que os pais devem mutuamente despender para a formação de indivíduos sadios física e mentalmente. Seria, então, uma iniciativa que tentaria diminuir os efeitos nefastos que a demandas dessa natureza refletem na estrutura familiar.
Dessa maneira, propõe-se o desenvolvimento de um trabalho preventivo, de forma que, mesmo nos casos em que há o escopo de dissolução da sociedade conjugal, o crescimento dos filhos e as suas relações com os pais não sejam prejudicadas.
Por outro norte, para os casos, entretanto, em que um estudo psicológico acurado demonstrar que a ausência paterna, por dolo ou culpa, influenciou negativamente na identidade dos filhos, não resta outro meio senão a reparação. Por uma questão de justiça, há, pois, que se determinar a recomposição do dano psíquico voluntariamente causado ao prejudicado.
É de se destacar, por oportuno, que não se pretende, por meio desse estudo, defender a doutrinariamente chamada "indústria do dano moral". Tanto que, para a responsabilização do pai ausente, é elementar a comprovação do dolo ou da culpa.
No entanto, há de se destacar que, em regra, não existe motivo fático capaz de justificar a falta de participação dos pais na educação e crescimento dos filhos. Assim, o argumento esposado em sede de contestação, no Recurso Especial n.º 757.411/MG, segundo o qual o pai não visitava o filho por ter de viajar diversas vezes a trabalho, não justifica nem deve fundamentar a ausência paterna em situações nas quais a sua presença ou, simplesmente, a demonstração de lembrança, seria suficiente, como um telefonema no aniversário, a presença na formatura do filho, dentre outras situações.
No que se refere aos principais argumentos que embasaram a modificação do acórdão que concedia a indenização ao filho abandonado moralmente, foi externado que "nenhuma finalidade positiva seria alcançada com a indenização pleiteada (fl.197)" uma vez que a indenização não teria o condão de reconstruir a relação paterna, bem como que "a determinação da perda do poder familiar é a mais grave pena civil a ser imputada a um pai". O Ministério Público, no mesmo sentido, opinou pelo provimento do recurso do pai, proclamando, em suma, não caber "ao Judiciário condenar alguém ao pagamento de indenização por desamor."
Entretanto, desde a ocasião em que o pai participa da concepção de um filho, ele assume, senão moralmente, mas juridicamente, o dever de educá-lo, respeitá-lo e contribuir para a sua formação moral. Isto porque, tanto determina essa postura o Código Civil (art. 1634, I e II), a Constituição Federal (art. 229), como também o Estatuto da Criança e do Adolescente (art. 16, V e VII; art. 19; art. 21 etc.).
Quanto ao argumento da não reconstrução do vínculo paternal, há de se reportar ao entendimento do cunho pedagógico que a indenização deve assumir. Assim, o objetivo positivo adquirido com a reparação dos danos causados pela omissão voluntária da figura paterna é, justamente, a não reincidência pelo condenado, bem como o fator coercitivo que repercutirá sobre todas as relações paternas.
No que tange à perda do poder familiar como sanção no caso de abandono do dever de sustento, guarda e educação dos filhos (art. 24, ECA; art. 1638, II, CC), oportunamente dispôs o Ministro Gomes de Barros (RESP 757.411/MG) que a destituição do pátrio poder não interfere na indenização. "Ao lado de assistência econômica, o genitor tem o dever de assistir moral e afetivamente o filho", afirmou.
Tal perspectiva é corroborada, quando se depreende que "o princípio da afetividade especializa, no campo das relações familiares, o macroprincípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da Constituição Federal), que preside todas as relações jurídicas e submete o ordenamento jurídico nacional."[7].
Um considerável passo para se chegar ao reconhecimento do dever de indenização decorrente do Direito de Família, foi a consideração, em algumas poucas hipóteses, do direito de indenização do dano material decorrente de violação à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem[8].
Isso porque, a grande questão a ser enfrentada não são aquelas atinentes aos direitos que têm repercussão na esfera patrimonial, já que nesse caso é possível quantificar o dano.
As dificuldades surgem quando se passa a discutir acerca do dano moral ou imaterial e sua respectiva mensuração. O campo do Direito de Família é recheado de conceitos e preconceitos firmados nos laços de afeto, difíceis de serem trabalhados sob um enfoque econômico: quanto vale, por exemplo, os transtornos emocionais de um filho submetido por seus pais ao castigo excessivo? o abalo causado por uma dissolução conjugal? Os danos decorrentes da recusa voluntária de um pai de amar o seu filho?
Não obstante o Direito de Família seja calcado por conceitos íntimos e valores tão abstratos quanto difíceis de serem aferidos sob uma perspectiva econômica, invariavelmente o Judiciário deve se posicionar de modo justo e razoável acerca das questões que lhe são intentadas.
Vejamos, por oportuno, a postura do Judiciário diante de um caso análogo ao referido outrora:
APELAÇÃO CÍVEL nº 2007.001.63727/RJ
Relator DES. JOSE C. FIGUEIREDO - Julgamento: 09/04/2008 - DECIMA PRIMEIRA CAMARA CIVEL
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. RELAÇÃO DE AFETIVIDADE. AUSÊNCIA. DANO MORAL. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. Ninguém é obrigado a amar ou continuar amando outrem. Hipótese em que o filho postula a compensação por dano moral em face de seu pai ao argumento da falta de amor. Com a separação dos pais, a regra geral é a de que haja um natural afastamento daquele que se ausentou do lar em relação aos filhos. Em casos tais, é mesmo comum a dificuldade de relacionamento entre ascendentes e descendentes o que pode resultar em questões como as narradas nestes autos. Eventuais discórdias e mágoas recíprocas, além de outros infortúnios oriundos da conturbada relação não podem ensejar a compensação pretendida. RECURSO PROVIDO.
Num primeiro momento importa destacar, data venia, que as discórdias e mágoas recíprocas devem ficar cingidas à relação matrimonial. Ela que veio à falência; deixou de existir. Ademais, embora de fato o Judiciário não possa obrigar um pai a amar seu filho, por outro norte, deve puni-lo por não ter participado de sua formação, pois, quando há o dever de agir, a omissão deve ser repreendida, sobremaneira quando dela resulta dano irreversível.
Diante desses fatos, percebe-se que não há que se admitir o argumento trazido normalmente em sede de contestação, segundo o qual o pai era impedido pela genitora a desenvolver uma relação saudável com seu filho. Para combater iniciativas dessa ordem o Direito de Família prevê a regulamentação do direito de visita, a guarda compartilhada, dentre outros instrumentos.
Num outro momento, ao se avaliar a importância institucional da família, não há de se aceitar o argumento segundo o qual "escapa ao arbítrio do Judiciário obrigar alguém a amar, ou a manter um relacionamento afetivo", pois, conforme entendeu a Dra. Simone Ramalho Novaes (1ª Vara Cível de São Gonçalo - RJ):
Se o pai não tem culpa por não amar o filho, a tem por negligenciá-lo. O pai deve arcar com a responsabilidade de tê-lo abandonado, por não ter cumprido com o seu dever de assistência moral, por não ter convivido com o filho, por não tê-lo educado, enfim, todos esses direitos impostos pela Lei.
Assim sendo, quando uma demanda dessa natureza é proposta, pretende-se, não forçar o pai a cumprir um dever que espontaneamente se nega a exercer - se é que o exercício do amor pode ser encarado desse modo. Quer-se a recomposição dos danos causados pelos distúrbios de ordem psicológica causados a um indivíduo que não se desenvolveu plenamente por decisão voluntária de seu genitor, que ao se furtar do seu dever institucional no bojo de uma entidade familiar, se encontrava consciente de que estava deixando de contribuir para a formação e educação do seu filho.
Vê-se, então, que não se deve acolher que o Judiciário se quede contrário à reparação de um dano tão profundo e injustificável causado pelo próprio pai, que normalmente deveria sempre agir de modo a beneficiar seus filhos.
Diante do tema aqui trazido, duas questões merecem ser reavaliadas pelo Judiciário diante do cotejo de casos similares aos citados: o fato de ser incompreensível a falta de interesse de um pai em amar um filho e, de modo aditivo, a grande dimensão do distúrbio ao qual se submete um filho quando ele passa a ser consciente de que seu pai não lhe ama por simples opção.
Conclusão
Como não há qualquer legislação que trate de forma específica dessas situações, cabe à jurisprudência, com base na analogia, nos costumes e nos princípios gerais do direito, se utilizar dos meios que dispõe e, primando pela dignidade da pessoa humana, atuar de modo a evitar a banalização da figura paterna no âmbito familiar.
Nesse sentido, embora não sejam muitos os precedentes jurisprudenciais consagrando a tese da indenização no Direito de Família, tradicionalmente fundamentado no afeto e nos laços parentais, sem se dar valor econômico às relações de família, muda-se neste início de século o paradigma.
Nesse mundo globalizado e mensurável pelo econômico, passa o patrimônio moral a ter valor materializado em espécie dinheiro e, como tal, tem a jurisprudência de, seguindo os passos da doutrina, forçar o legislador a positivar na legislação o conteúdo desse direito[9].
Reconhece-se que o tema em pauta deve ser encarado com parcimônia, já que quando se invade a esfera íntima das relações humanas, a razoabilidade deve restar ainda mais patente. Contudo, a sensibilidade da matéria não pode resultar no medo de ousar.
Destaca-se, porém, que a ação de indenização por abandono afetivo não deve ser encarada como um meio através do qual o filho se vinga do pai, ou como uma oportunidade de forçar o pai a ser normal ao ponto de amar sua prole. Ao Judiciário não compete intervir com tamanha profundidade. Pretende-se, como dito, reparar a omissão danosa e voluntária de um pai negligente, bem como advertir os demais a não cometer um erro semelhante.
Resta, então, explanar que, num mundo em que os indivíduos estão sendo cada vez mais coisificados, o homem não deve jamais perder sua peculiar capacidade de dar significação aos objetos. Há muito se passou a reconhecer que os direitos inerentes à condição humana devem ser o fundamento para as ações institucionais; as entidades que devem se adequar às necessidades do homem, pois ele deve ser início, meio e fim de suas ações.
REFERÊNCIAS
ALVES, Eliana Calmon. Responsabilidade Civil no Direito de Família.
Disponível em:
<http://bdjur.stj.gov.br/dspace/bitstream/2011/353/4/Responsabilidade_Civil_Direito.pdf>.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: < http://www.tj.rj.gov.br >.
_____. Código Civil. Disponível em: < http://www.tj.rj.gov.br >.
_____. Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em: < http://www.tj.rj.gov.br >.
_____. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Disponível em:
.
HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Responsabilidade Civil na relação paterno-filial. Disponível em:
< http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4192&p=2 >.
SILVA, Unias. Disponível em:
.
VENOSA, Sílvio Salvo. Direito Civil: responsabilidade civil. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2004.
[1] Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro Apelação Cível n.º 2007.001.63727 Disponível em: . Acesso em 15 maio 2008.
[2] As relações familiares referidas nessa ocasião, incluem as que dizem respeito aos relacionamentos homoafetivos, ao casamento, à união estável, aos relacionamentos extraconjugais, de parentesco, relativos à filiação, dentre outras.
[3] VENOSA, Sílvio Salvo. Direito Civil: responsabilidade civil. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2004. p.12.
[4] HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Responsabilidade Civil na relação paterno-filial. 1Disponível em: < http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4192&p=2 >. Acesso em 19 maio 2008.
[5] ALVES, Eliana Calmon. Responsabilidade Civil no Direito de Família. Disponível em: < http://bdjur.stj.gov.br/dspace/bitstream/2011/353/4/Responsabilidade_Civil_Direito.pdf>. Acesso em 20 maio 2008.
[6] SILVA, Unias. Disponível em: . Acesso em 20 maio 2008.
[7] ALVES, Eliana Calmon. Idem.
[8] Ibidem.
[9] ALVES, Eliana Calmon. Idem.
Eddla Karina Gomes Pereira é advogada e mestranda em Direitos Humanos - UFPB - foi a 2º classificada no Concurso de Monografias do II Congresso Paraibano de Direito das Famílias e Sucessões.
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