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Nasce um novo (?) Código Civil
Todos os seres têm apenas uma razão de viver: o encontro da felicidade.
Ao Estado cabe organizar de tal forma a sociedade que, além de regular as relações das pessoas, precisa respeitar sua liberdade e garantir o direito à vida com dignidade. Para isso, necessário o estabelecimento de regras de comportamento, que, para serem respeitadas, precisam ser dotadas de sanções: nascem, assim, as normas jurídicas.
A sociedade evolui, transforma-se, rompe com tradições e amarras, o que implica a necessidade de atualização das leis. A mais árdua tarefa é a de mudar as regras que tratam do Direito de Família, pois dizem com as relações afetivas, os sentimentos, a alma do ser humano.
O Projeto original do Código Civil data de 1972, anterior, inclusive, à Lei do Divórcio, que é de 1977. Tramitou pelo Congresso Nacional antes da promulgação da Constituição Federal, que adotou uma nova ordem de valores, privilegiando a dignidade da pessoa humana. Daí o sem-número de emendas que sofreu e as críticas com que vem sendo bombardeado. Preferir que as coisas fiquem como estão - postura tipicamente humana, pelo medo de mudanças - é mais fácil, mas estéril adotar-se uma atitude detratora ou escatológica, que em nada contribui para que algo seja melhorado.
A legislação em vigor regula a família do início do século passado, constituída unicamente pelo matrimônio, verdadeira instituição, matrimonializada, patrimonializada, patriarcal, hierarquizada e heterossexual. O surgimento dos novos paradigmas, quer pela emancipação da mulher, quer pelo surgimento dos métodos contraceptivos, e a evolução da engenharia genética dissociaram os conceitos de casamento, sexo e reprodução. O moderno enfoque dado à família pelo Direito volta-se muito mais à identificação do vínculo afetivo que a enlaça.
Assim, por exemplo, não mais se justifica a permanência do instituto da separação, quando, simplesmente findo o amor, possível deveria ser buscar o divórcio. Será que o Estado tem legitimidade para impor que permaneçam unidas pessoas que não mais se amam?
A mesma perplexidade persiste em relação à necessidade da identificação de um culpado para que se rompa o vínculo marital, postura nitidamente punitiva. Mas como identificar o responsável pelo fim do amor? Como provar o carinho que não foi feito, as mágoas que se transformam em frustrações, brigas e até em agressões?
Ainda que tenha o Estado interesse na preservação da família, dispõe de legitimidade para invadir a auréola de privacidade e intimidade dos cônjuges, impondo-lhes que revelem o comportamento do par? Onde andarão as garantias tão preservadas pela nossa Constituição cidadã?
Esses questionamentos mostram que, embora bem-vinda, nos chega uma lei velha. Imprescindível é que, no período de dois anos, até sua entrada em vigor, os lidadores do Direito busquem aperfeiçoá-la, realizando algumas emendas retificativas, quem sabe até verdadeiras cirurgias plásticas, para que o Código Civil, que regulará a vida de todos nós, adquira o viço que a sociedade merece.
* Desembargadora do Tribunal de Justiça do RS; Vice-Presidente Nacional do IBDFAM.
Ao Estado cabe organizar de tal forma a sociedade que, além de regular as relações das pessoas, precisa respeitar sua liberdade e garantir o direito à vida com dignidade. Para isso, necessário o estabelecimento de regras de comportamento, que, para serem respeitadas, precisam ser dotadas de sanções: nascem, assim, as normas jurídicas.
A sociedade evolui, transforma-se, rompe com tradições e amarras, o que implica a necessidade de atualização das leis. A mais árdua tarefa é a de mudar as regras que tratam do Direito de Família, pois dizem com as relações afetivas, os sentimentos, a alma do ser humano.
O Projeto original do Código Civil data de 1972, anterior, inclusive, à Lei do Divórcio, que é de 1977. Tramitou pelo Congresso Nacional antes da promulgação da Constituição Federal, que adotou uma nova ordem de valores, privilegiando a dignidade da pessoa humana. Daí o sem-número de emendas que sofreu e as críticas com que vem sendo bombardeado. Preferir que as coisas fiquem como estão - postura tipicamente humana, pelo medo de mudanças - é mais fácil, mas estéril adotar-se uma atitude detratora ou escatológica, que em nada contribui para que algo seja melhorado.
A legislação em vigor regula a família do início do século passado, constituída unicamente pelo matrimônio, verdadeira instituição, matrimonializada, patrimonializada, patriarcal, hierarquizada e heterossexual. O surgimento dos novos paradigmas, quer pela emancipação da mulher, quer pelo surgimento dos métodos contraceptivos, e a evolução da engenharia genética dissociaram os conceitos de casamento, sexo e reprodução. O moderno enfoque dado à família pelo Direito volta-se muito mais à identificação do vínculo afetivo que a enlaça.
Assim, por exemplo, não mais se justifica a permanência do instituto da separação, quando, simplesmente findo o amor, possível deveria ser buscar o divórcio. Será que o Estado tem legitimidade para impor que permaneçam unidas pessoas que não mais se amam?
A mesma perplexidade persiste em relação à necessidade da identificação de um culpado para que se rompa o vínculo marital, postura nitidamente punitiva. Mas como identificar o responsável pelo fim do amor? Como provar o carinho que não foi feito, as mágoas que se transformam em frustrações, brigas e até em agressões?
Ainda que tenha o Estado interesse na preservação da família, dispõe de legitimidade para invadir a auréola de privacidade e intimidade dos cônjuges, impondo-lhes que revelem o comportamento do par? Onde andarão as garantias tão preservadas pela nossa Constituição cidadã?
Esses questionamentos mostram que, embora bem-vinda, nos chega uma lei velha. Imprescindível é que, no período de dois anos, até sua entrada em vigor, os lidadores do Direito busquem aperfeiçoá-la, realizando algumas emendas retificativas, quem sabe até verdadeiras cirurgias plásticas, para que o Código Civil, que regulará a vida de todos nós, adquira o viço que a sociedade merece.
* Desembargadora do Tribunal de Justiça do RS; Vice-Presidente Nacional do IBDFAM.
Os artigos assinados aqui publicados são inteiramente de responsabilidade de seus autores e não expressam posicionamento institucional do IBDFAM