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Os contornos jurídicos da responsabilidade afetiva na relação entre pais e filhos – além da obrigação legal de caráter material.*
1. À GUISA DE INTRODUÇÃO: A CRIANÇA NÃO SE DIVORCIA DE SEUS PAIS.
Embora a disputa seja simbolizada pelo versus que significa duas partes adversas em pólos opostos de uma linha, há de fato uma terceira parte cujos interesses e direitos fazem da linha um triângulo. Essa pessoa, a criança, que não é uma parte oficial do processo, mas cujo bem-estar está no centro da controvérsia, tem direito à guarda compartilhada quando ambos os genitores têm igual capacidade de prover. Inerente à política pública é o reconhecimento do direito da criança ao acesso igual e à oportunidade com ambos os pais, do direito de ser guiado e criado por ambos os pais, do direito para ter as decisões principais feitas pelo exercício do julgamento, da experiência e da sabedoria de ambos os pais. "A criança não perde estes direitos quando os pais se divorciam."1
2. DESEMBRULHANDO A DELICADA QUESTÃO DO ABANDONO AFETIVO
Neste estudo, cuidará a autora de procurar esclarecer aspectos fundamentais e essenciais de uma questão que, se não foi trazida à baila no passado, hoje não se pode mais conter dentro da restrita esfera das relações familiares mal resolvidas ou sem solução, expandindo-se – em casos pontuais e bem definidos – até às portas de um Poder Judiciário renovado, corajoso e inovador, que não tem demonstrado temor nem tem se recusado à análise cuidadosa do que se pleiteia na atualidade.
O assunto refere-se exatamente a esta difícil e delicada questão: podem um pai ou uma mãe ser responsabilizados civilmente – e por isso, condenados a indenização – pelo abandono afetivo perpetrado contra o filho? A procura pelo fundamento da resposta a essa pergunta levaria à seguinte indagação: a denominada responsabilidade paterno-filial resume-se ao dever de sustento, ao provimento material do necessário ou do imprescindível para manter a prole, ou vai além dessa singela fronteira, por situar-se no campo do dever de convívio, a significar uma participação mais integral na vida e na criação dos filhos, de forma a contribuir em sua formação e subsistência emocionais.
Muitos julgaram – e o século anterior esteve a dar respaldo a esta convicção – que a assunção da responsabilidade pela mantença material dos filhos seria o suficiente a ser feito em prol de alguém a quem não se deseja por perto. Certamente, essa meia-responsabilidade não foi jamais suficiente, mas o paradigma de outrora não abria chance para tal análise, porque a importância da vontade e do querer adulto sempre foi significativamente mais importante que a necessidade e a carência infantil.
Foi o caso, por exemplo, da menina judaica abandonada afetivamente por seu pai logo após o nascimento, quando ele se separou de sua mãe e, em seguida, casou-se com outra mulher, com quem teve outros três filhos. Por serem todos membros da comunidade judaica, o pai e sua nova família encontravam-se freqüentemente com a menina abandonada, e nessas ocasiões o pai fingia não conhecê-la, de modo a desprezá-la reiteradamente. O interesse do pai em formar nova família, completamente desvinculada da família anterior – independente de quais tenham sido as razões que o levaram a assim agir – foi mais importante e imperativo que o interesse da menina. Essa situação provocou, desde logo, os sentimentos de rejeição e de humilhação, os quais se transformaram em causas de danos importantes, como significativo complexo de inferioridade, demandando cuidados médicos e psicológicos por longo tempo. Só bem mais tarde, na verdade, essa criança encontrou guarida na resposta jurisdicional para os anseios, as frustrações e os traumas que a acompanharam por toda a vida.
Foi assim também o caso do menino, igualmente abandonado por seu pai, que, por razões semelhantes, deixou-o desprovido de sua presença, de seu carinho, de seu interesse por sua criação e por seu desenvolvimento, o que lhe causou significativo déficit psicológico e emocional. Pela produção de tal dano moral a seu jovem filho, o pai foi condenado pelo Poder Judiciário, em segunda instância, a reparar a falha praticada, a omissão perpetrada e a responsabilidade por tantos anos ignorada.
Com sua sensibilidade e inteligência ímpares, além do invejável conhecimento específico – em razão dos casos reais que trata, na advocacia –, Rolf Madaleno escreve:
justamente por conta das separações e dos ressentimentos que remanescem na ruptura da sociedade conjugal, não é nada incomum deparar com casais apartados, usando os filhos como moeda de troca, agindo na contramão de sua função parental e pouco se importando com os nefastos efeitos de suas ausências, suas omissões e propositadas inadimplências dos seus deveres. Terminam os filhos, experimentando vivências de abandono, mutilações psíquicas e emocionais, causadas pela rejeição de um dos pais e que só servem para magoar o genitor guardião. Como bombástico e suplementar efeito, baixa a níveis irrecuperáveis a auto-estima e o amor próprio do filho enjeitado pela incompreensão dos pais.
A ausência injustificada do pai, como se observa, origina evidente dor psíquica e conseqüente prejuízo à formação da criança, decorrente da falta não só do afeto, mas do cuidado e da proteção – função psicopedagógica – que a presença paterna representa na vida do filho, mormente quando entre eles já se estabeleceu um vínculo de afetividade. Além da inquestionável concretização do dano, também se configura, na conduta omissiva do pai, a infração aos deveres jurídicos de assistência imaterial e proteção que lhe são impostos como decorrência do poder familiar.
Por um lado – nesta vertente da relação paterno-filial em conjugação com a responsabilidade – há o viés naturalmente jurídico, mas essencialmente justo, de buscar-se indenização compensatória em face de danos que os pais possam causar a seus filhos por força de uma conduta imprópria, especialmente quando a eles são negados a convivência, o amparo afetivo, moral e psíquico, bem como a referência paterna ou materna concretas, o que acarretaria a violação de direitos próprios da personalidade humana, de forma a magoar seus mais sublimes valores e garantias, como a honra, o nome, a dignidade, a moral, a reputação social; isso, por si só, é profundamente grave.
Por outro lado – é invencível e imprescindível esta menção – outros casos considerados como assemelhados não foram recepcionados pelo Poder Judiciário –e de modo acertado, segundo o meu sentir – exatamente porque as decisões não reconheceram, nos casos concretos, a existência de danos morais indenizáveis decorrentes do fato de um eventual abandono afetivo, ou porque não houve dano, ou porque não houve abandono, ou porque não estava estabelecida a relação paterno-filial da qual decorre a responsabilidade em apreço, ou, finalmente, porque não se estabeleceu o imprescindível nexo de causalidade, causa eficiente da responsabilização civil in casu.3. O JULGAMENTO PARADIGMÁTICO ESCOLHIDO: O CASO DE MINAS GERAIS. ENTRE DUAS OUTRAS IMPORTANTES E INOVADORAS DECISÕES, A DO RIO GRANDE DO SUL E A DE SÃO PAULO.
A decisão que escolhemos como o marco judicial inovador a justificar este estudo foi o caso do menor Alexandre Batista Fortes, de Minas Gerais, correspondente à Apelação Cível n. 408.550-5, da 7ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais.
3.1. Esse acórdão encontra precedente na Comarca de Capão da Canoa, em sentença proferida em 16 de setembro de 2003, referente ao Processo n. 141/1030012032-0, da 2ª Vara, cujo prolator foi o juiz de direito Mário Romano Maggioni. Nesse caso, como informa o desembargador Luiz Felipe Brasil Santos, "tendo sido o réu revel, não houve recurso, ficando restrita a repercussão, que só agora se deu, ironicamente em razão do decisório posterior". Eis, em inteiro teor, a decisão escolhida:EMENTA – INDENIZAÇÃO DANOS MORAIS – RELAÇÃO PATERNO-FILIAL – PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA – PRINCÍPIO DA AFETIVIDADE.
A dor sofrida pelo filho, em virtude do abandono paterno, que o privou do direito à convivência, ao amparo afetivo, moral e psíquico, deve ser indenizável, com fulcro no princípio da dignidade da pessoa humana.
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível Nº 408.550-5 da Comarca de BELO HORIZONTE, sendo Apelante (s): ALEXANDRE BATISTA FORTES MENOR PÚBERE ASSIST. P/ SUA MÃE e Apelado (a) (os) (as): VICENTE DE PAULO FERRO DE OLIVEIRA,
ACORDA, em Turma, a Sétima Câmara Cível do Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais DAR PROVIMENTO.
Presidiu o julgamento o Juiz JOSÉ AFFONSO DA COSTA CÔRTES e dele participaram os Juízes UNIAS SILVA (Relator), D. VIÇOSO RODRIGUES (Revisor) e JOSÉ FLÁVIO ALMEIDA (Vogal).
O voto proferido pelo Juiz Relator foi acompanhado, na íntegra, pelos demais componentes da Turma Julgadora.
Assistiu ao julgamento pelo apelante, a Drª. Thais Câmara Maia e Produziu sustentação oral pelo apelado, o Dr. João Bosco Kumaira.
Belo Horizonte, 01 de abril de 2004.
JUIZ UNIAS SILVA
Relator
V O T O
O SR. JUIZ UNIAS SILVA:
Trata-se de recurso de apelação interposto por Alexandre Batista Fortes – menor púbere representado por sua mãe – contra a r. sentença que, nos autos da ação de indenização por danos morais ajuizada contra seu pai, Vicente de Paulo Ferro de Oliveira, julgou improcedente o pedido inicial, ao fundamento de que inexistente o nexo causal entre o afastamento paterno e o desenvolvimento de sintomas psicopatológicos pelo autor.
Sustenta o apelante, em síntese, que o conjunto probatório presente nos autos é uníssimo ao afirmar a existência do dano resultante da ofensa causada pelo apelado. Afirma que a dor sofrida pelo abandono é profundamente maior que a irresignação quanto ao pedido revisional de alimentos requerido pelo pai. Aduz que o tratamento psicológico ao qual se submete há mais de dez anos advém da desestruturação causada pelo abandono paterno. Pugna, ao final, pelo provimento do recurso.
Contra-razões às fls. 105-407.
É o relatório necessário.
Conheço do recurso, pois que presentes os pressupostos de sua admissão.
A relação paterno-filial em conjugação com a responsabilidade possui fundamento naturalmente jurídico, mas essencialmente justo, de se buscar compensação indenizatória em face de danos que pais possam causar a seus filhos, por força de uma conduta imprópria, especialmente quando a eles é negada a convivência, o amparo afetivo, moral e psíquico, bem como a referência paterna ou materna concretas, acarretando a violação de direitos próprios da personalidade humana, magoando seus mais sublimes valores e garantias, como a honra, o nome, a dignidade, a moral, a reputação social, o que, por si só, é profundamente grave.
Esclareço, desde já, que a responsabilidade em comento deve cingir-se à civil e, sob este aspecto, deve decorrer dos laços familiares que matizam a relação paterno-filial, levando-se em consideração os conceitos da urgência da reparação do dano, da re-harmonização patrimonial da vítima, do interesse jurídico desta, sempre prevalente, mesmo à face de circunstâncias danosas oriundas de atos dos juridicamente inimputáveis.
No seio da família da contemporaneidade desenvolveu-se uma relação que se encontra deslocada para a afetividade. Nas concepções mais recentes de família, os pais de família têm certos deveres que independem do seu arbítrio, porque agora quem os determina é o Estado.
Assim, a família não deve mais ser entendida como uma relação de poder, ou de dominação, mas como uma relação afetiva, o que significa dar a devida atenção às necessidades manifestas pelos filhos em termos, justamente, de afeto e proteção.
Os laços de afeto e de solidariedade derivam da convivência e não somente do sangue.
No estágio em que se encontram as relações familiares e o desenvolvimento científico, tende-se a encontrar a harmonização entre o direito de personalidade ao conhecimento da origem genética, até como necessidade de concretização do direito à saúde e prevenção de doenças, e o direito à relação de parentesco, fundado no princípio jurídico da afetividade.
O princípio da efetividade especializa, no campo das relações familiares, o macro-princípio da dignidade da pessoa humana (artigo 1º, III, da Constituição Federal), que preside todas as relações jurídicas e submete o ordenamento jurídico nacional.
No estágio atual, o equilíbrio do privado e do público pauta-se exatamente na garantia do pleno desenvolvimento da dignidade das pessoas humanas que integram a comunidade familiar.
No que respeita à dignidade da pessoa da criança, o artigo 227 da Constituição expressa essa concepção, ao estabelecer que é dever da família assegurar-lhe "com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária", além de colocá-la "à salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão". Não é um direito oponível apenas ao Estado, à sociedade ou a estranhos, mas a cada membro da própria família.
Assim, depreende-se que a responsabilidade não se pauta tão-somente no dever alimentar, mas se insere no dever de possibilitar o desenvolvimento humano dos filhos, baseado no princípio da dignidade da pessoa humana.
No caso em comento, vê-se claramente, da cuidadosa análise dos autos, que o apelante foi, de fato, privado do convívio familiar com seu pai, ora apelado.
Até os seis anos de idade, Alexandre Batista Fortes, ora apelante, manteve contato com seu pai de maneira razoavelmente regular. Após o nascimento de sua irmã, a qual ainda não conhece, fruto de novo relacionamento conjugal de seu pai, este afastou-se definitivamente. Em torno de quinze anos de afastamento, todas as tentativas de aproximação efetivadas pelo apelante restaram-se infrutíferas, não podendo desfrutar da companhia e dedicação de seu pai, já que este não compareceu até mesmo em datas importantes, como aniversários e formatura.
De acordo com o estudo psicológico realizado nos autos, constata-se que o afastamento entre pai e filho transformou-se em uma questão psíquica de difícil elaboração para Alexandre, interferindo nos fatores psicológicos que compõem sua própria identidade.
"É como se ele tentasse transformar o genitor em pai e, nesta árida batalha, procurasse persistentemente compreender porque o Sr. Vicente não se posiciona como um pai, mantendo a expectativa de que ele venha a fazê-lo." (fls. 72).
"Neste contexto, ainda que pese o sentimento de desamparo do autor em relação ao lado paterno, e o sofrimento decorrente, resta a Alexandre, para além da indenização material pleiteada, a esperança de que o genitor se sensibilize e venha a atender suas carências e necessidades afetivas." (fls.74).
Assim, ao meu entendimento, encontra-se configurado nos autos o dano sofrido pelo autor, em relação à sua dignidade, a conduta ilícita praticada pelo réu, ao deixar de cumprir seu dever familiar de convívio e educação, a fim de, através da afetividade, formar laço paternal com seu filho, e o nexo causal entre ambos.
Desta forma, fixo a indenização por danos morais no valor equivalente a duzentos salários mínimos, ou seja, R$ 44.000,00, devendo ser atualizado monetariamente de acordo com a Tabela da Corregedoria Geral de Justiça e com juros de mora em 1% ao mês, a contar da publicação do presente acórdão. Pelo que, condeno o apelado a pagar ao procurador do apelante, a título de honorários sucumbenciais, o valor relativo a 10% do valor da condenação em danos morais.
Com base em tais considerações, dou provimento ao recurso, para julgar procedente o pedido inicial, modificando a r. decisão ora objurgada.
Custas pelo apelado.
Posteriormente, outra decisão ganhou destaque na mídia jurídica, dessa vez prolatada por magistrado paulista, o juiz de direito Luis Fernando Cirillo, no Processo n. 01.36747-0, da 31ª Vara Cível Central de São Paulo, decisão publicada em 26 de junho de 2004. Eis alguns dos principais tópicos da r. sentença, nos quais o magistrado desdobra as razões de sua convicção, ao proferi-la:
A paternidade provoca o surgimento de deveres. Examinando-se o Código Civil vigente à época dos fatos, verifica-se que a lei atribuía aos pais o dever de direção da criação e educação dos filhos, e de tê-los não somente sob sua guarda, mas também sob sua companhia (art.384, I e II). Há, portanto, fundamento estritamente normativo para que se conclua que a paternidade não gera apenas deveres de assistência material, e que além da guarda, portanto independentemente dela, existe um dever, a cargo do pai, de ter o filho em sua companhia. Além disso, o abandono era previsto como causa de perda do pátrio poder (art. 395, II), sendo cediço que não se pode restringir a figura do abandono apenas à dimensão material. Regras no mesmo sentido estão presentes também no Código Civil vigente (arts. 1.634, I e II e 1.638, II).
É certo que o Código Civil em vigor explicita ser lícito o exercício exclusivo do agora denominado poder familiar por um dos pais, se não existir casamento (art. 1.631), a ponto de prever expressamente a perda do direito dos pais de ter filhos em sua companhia na hipótese de separação judicial (art. 1.632). Mas a perda do direito à companhia não é absoluta, uma vez que o art. 1.589 da mesma lei prevê direito de visita, companhia e de fiscalização da manutenção e educação do filho em favor do pai ou d mãe que não detém a guarda.
Vê-se, portanto, que não há fundamento jurídico para se concluir, primeiro, que não haja dever do pai de estabelecer um mínimo de relacionamento afetivo com seu filho, e em segundo lugar que o simples fato da separação entre pai e mãe seja fundamento para que se dispense quem não fica com a guarda do filho de manter esse relacionamento.
A par da ofensa à integridade física (e psíquica) decorrente de um crescimento desprovido do afeto paterno, o abandono afetivo se apresenta também como ofensa à dignidade da pessoa humana, bem jurídico que a indenização do dano moral se destina a tutelar.
É evidente que a separação dos pais não permitirá a quem não detém a guarda o estabelecimento de convivência freqüente, ou mesmo intensa. Por este motivo é que efetivamente não se mostra razoável, em princípio e em linhas gerais, considerar que todo pai ou mãe que se separa e deixa o filho com o outro genitor deva pagar ao filho indenização de dano moral. Mas nem por isso poderá ir ao outro extremo e negar a ocorrência de dano moral se o pai ou a mãe, tendo condições materiais e intelectuais, se abstém completamente de estabelecer relacionamento afetivo ou de convivência, ainda que mínimo, com seu filho, como se não houvesse um vínculo de parentesco, que no âmbito jurídico se expressa também como companhia, transcendendo assim a dimensão estritamente material.
A Perita judicial concluiu que a autora apresenta conflitos, dentre os quais o de identidade, deflagrados pela rejeição do pai (situação de abandono), uma vez que o réu não demonstra afeto pela autora nem interesse pelo seu estado emocional, focando sua relação com a requerente apenas na dimensão financeira, a ponto de considerar normal ter se esquecido da filha. A autora não teve possibilidade de conviver com uma figura paterna que se relacionasse com ela de forma completa, defrontada com a situação de ser formalmente filha do réu ao mesmo tempo em que tentava vivenciar uma relação pai/filha com o segundo marido de sua mãe. Seu referencial familiar se caracterizou por comportamentos incoerentes e ambíguos, disso resultando angústia, tristeza e carência afetiva, que atrapalharam seu desenvolvimento profissional e relacionamento social.
Essas decisões, portanto, são o caso escolhido (MG), o caso anterior (RS) e o caso posterior (SP), sempre no sentido do acolhimento dos pedidos.4. RECOLHENDO LIÇÕES E EXEMPLOS – ATÁVICOS, NO MUNDO ANIMAL – PARA ALÉM DO CONSTRUÍDO, NO ENTORNO JURÍDICO
Sempre se disse serem as aves os mais belos exemplos de animais que mantêm uma forma mais definida do que se poderia chamar estrutura familiar, por se mostrarem completamente responsáveis pela família que constroem. Os machos manifestam tal atitude desde o acompanhamento à fêmea durante toda a fase de choco, até após o nascimento dos filhotes, quando passam a responsabilizar-se pela recolhida diligente de alimentos para os ninhos, o que os leva a deslocar-se quilômetros e quilômetros para tanto.
Mais significativo ainda, em termos dessa responsabilidade familiar atávica – se assim se puder chamá-la – é o momento em que essas aves ensinam as jovens crias a voar e a recolher seu próprio alimento, o que lhes garantirá a segurança e a sobrevivência qualitativa no porvir. Ensinar a voar é uma lição tão sintomática, no prisma referido, que tem sido decantada, por poetas de todas as épocas, como ato de verdadeiro amor. Os gansos canadenses ou o grou norte-americano, aves migratórias pela própria natureza, teriam de comprometer a continuação da espécie se, porventura, não ensinassem a tempo – antes, portanto, do início do processo migratório – suas crias a voar, as quais teriam de ser deixadas para trás. Partem no inverno, retornam na estação seguinte, e assim a vida animal prossegue na doce harmonia que habita o modus de quem nasceu sabendo. Jovens gansos e jovens grous sabem que podem contar com a responsabilidade paterna no preparo para a luta pela sobrevivência, tornando-se gansos ou grous adultos e sadios , na perpetuação da espécie.
Não são diferentes, contudo, os grandes primatas, os grandes felinos e o elefante. Entre esses animais, parece ser possível dizer que a responsabilidade familiar pauta-se pelo matiz do afeto – sentimento que não pode ser observado com clareza, se houver, entre os pássaros –, uma vez que a observação de seu comportamento tem permitido a demonstração de variáveis muito ricas nesse sentido. Assim, por exemplo, segundo relatos, entre os primatas, o gorila macho inicia sua relação responsável com seus filhos desde a mais tenra idade destes, ao protegê-los de suas mães após o parto, quando correm risco de vida. Além disso, o macho prepara seus filhos do sexo masculino para que, no futuro, possam vencer uma luta e comandar um harém. Esses ensinamentos serão transmitidos, geração após geração, por força da observação e da repetição. Durante a infância dos filhotes, os gorilas não os deixam se afastar do grupo, atitude castigada com tapas de mão aberta; são pais protetores e rigorosos até a juventude de suas crias, uma vez que, nessa época, passa a acontecer um embate de autoridade, em que os mais jovens passam a desafiar seus pais cada vez mais constantemente. A situação culmina quando o jovem sai do grupo para constituir seu próprio núcleo familiar e prosseguir sua história. Contudo – eis a beleza dos fatos observados e relatados nos estudos – os laços familiares não se quebram nem são esquecidos, já que, depois de décadas de separação, continuam a respeitar-se mutuamente, de modo a colocar a própria vida em perigo, se for necessário, na defesa do outro.
A conclusão, após esses relatos e essas observações, só pode ser uma: se os animais conhecem e reconhecem, atavicamente, em suas relações de família, aquilo que podemos chamar de responsabilidade familiar simplesmente, desdobrada em deveres materiais e morais, certamente esses exemplos servem-nos à perfeição – a nós, humanos – para que, igualmente, não deixemos que a civilização contemporânea e as ágeis demandas da vida atual afastem-nos dos valores mais caros à convivência e à afetividade humanas.
Marco Antonio Mota Gomes, médico cardiologista, em interessante artigo denominado Momentos de juntar, escreve que
a vida vai impondo ritmos diferentes a cada um de nós, quase sempre determinando perdas nas relações de convívio, quer sejam sociais e/ou mesmo familiares. O contato entre os membros de uma família vai ficando limitado pelo tempo e também pela privação de algumas situações que no passado eram muito valorizadas. Numa avaliação superficial desta questão fico convencido de que estamos desperdiçando, no dia a dia, ricas oportunidades de exercitar a convivência, com prejuízo notório nas relações familiares.
Tem toda a razão o articulista, por certo, e surpreende a todos nós quando descobre por quanto tempo tem deixado a sua família órfã no momento das refeições, momento tão especial – e tão esquecido, hoje em dia – que, mais do que simplesmente jantar, necessariamente, deveria também significar juntar. E há tanto o que se ensinar e aprender neste juntar!
Seria tão difícil – ou, quem sabe, tão pouco sofisticado, do ponto de vista da supremacia humana – pensar que nos estamos esquecendo de ensinar a voar?
5. DIREITO AO PAI: NEM NOVO DIREITO, NEM DIREITO INVENTADO, MAS UM DIREITO DE SEMPREPor direito ao pai, na sua valoração juridicamente relevante, deve-se entender o direito atribuível a alguém de conhecer, conviver, amar e ser amado, de ser cuidado, alimentado e instruído, de colocar-se em situação de aprendizado e de apreensão dos valores fundamentais da personalidade e da vida humanas, de ser posto a caminhar e a falar, de ser ensinado a viver, a conviver e a sobreviver, o que ocorre com a maioria dos animais que habita a face da Terra.. Na via reversa, encontra-se o dever que tem o pai – leia-se também, sempre, a mãe – de produzir tal convívio, de modo a buscar cumprir a tarefa relativa ao desenvolvimento de suas crias, que é, provavelmente, a mais valiosa de todas as tarefas incumbidas à raça humana.
É na afetividade que se desdobra o traço de identidade fundamental do direito gerado no seio da relação paterno-filial, que, sem deixar de ser jurídica, distingue-se de todas as demais relações justamente pelo fato de que ela, e apenas ela, pode, efetivamente, caracterizar-se e valorar-se, na esfera jurídica, pela presença do afeto.
Não foi sempre assim que se entendeu o perfil da relação paterno-filial. Em tempos passados, à luz do modo anterior de se dizer o direito, o que efetivamente importava na relação entre pai e filho era a sua valoração biológica e patrimonial. Com isso se quer dizer que, sem se preocupar com a linha da afetividade, o Direito e a jurisprudência do passado mais se preocuparam em garantir ao filho o reconhecimento consangüíneo (caráter biológico da relação), o direito a alimentos e a sua possibilidade futura de herdar (caráter patrimonial da relação). Mas isso terá sido mesmo o suficiente? Terá efetivamente produzido o cumprimento integral da responsabilidade decorrente de tal relação? Desincumbir-se dos deveres de dar o nome e pagar alimentos terá exonerado pais e mais ausentes de qualquer necessidade que estivesse a escassear?
Com base em fontes psicanalíticas, Leonardo Boff, na obra dedicada à análise da figura paterna, escreve que o pai é o responsável pela ruptura dos laços originais que ligam a mãe ao filho ou à filha e pelo seu ingresso no ambiente maior, em que terá contato, a princípio, com os irmãos, os avós, os parentes e, posteriormente, com a sociedade de entorno. Ele esclarece que essa mudança transpessoal e social externa o que se costuma denominar de princípio antropológico do pai e significa a apresentação de outro mundo, no qual vige a ordem, a disciplina, o direito, o dever, a autoridade e os limites que devem valer entre um grupo e outro. Esse papel revela, então, o arquétipo e a personificação paterna, que oferecem à criança a referência e a segurança indispensáveis ao rito de passagem entre a segurança e o conforto do acolhimento materno e a exposição-limitação social feita por meio do encaminhamento paterno. Diz o autor em determinada passagem:
É [da] singularidade do pai ensinar ao filho/filha o significado desses limites e o valor da autoridade, sem os quais não se ingressa na sociedade sem traumas. Nessa fase, o filho/filha se destaca da mãe, até não querendo mais lhe obedecer, e se aproxima do pai: pede para ser amado por ele e espera dele esclarecimentos para os problemas novos que enfrenta.
Adiante, ele arremata: "Pertence ao pai fazer compreender ao filho que a vida não é só aconchego, mas também trabalho, que não é só bondade, mas também conflito, que não há apenas sucesso, mas também fracasso, que não há tão-somente ganhos, mas também perdas".
É no mesmo sentido a observação de David Blankenhorn, presidente do Institute for American Values, em Nova York, que escreve correntemente sobre o papel da paternidade e seu impacto na família, sempre dentro de uma análise sociológica e cristã. Diz ele que "as mães cuidam mais das necessidades físicas e emocionais dos filhos, [e] os pais voltam-se mais para as características da personalidade, necessárias para o futuro, especialmente qualidades como a independência e a capacidade de testar limites e assumir riscos."
Tanto o pai quanto a mãe concorre para que se organize convenientemente o desenvolvimento estrutural, psíquico, moral e ético do filho, cabendo à mãe um papel que mais se relaciona com a flexibilidade, com o afeto e com o conforto, enquanto ao pai cabe um papel que mais se relaciona com a fixação do caráter e da personalidade. A conjugação de ambos os papéis e a co-relação de seus efeitos são capazes de revelar, na maioria das vezes, uma pessoa mais harmoniosa sob muitos pontos de vista sociais e de acordo com muitos modelos culturais.
É claro que a ausência da figura ímpar do pai –assim como a da mãe, porque a estrutura ideal, nessa situação, é a bipolar – fará com que os filhos, no mais das vezes, sintam-se inseguros e incapazes de definir seus projetos de vida, bem como tenham grande dificuldade de aceitar o princípio da autoridade e a existência de limites. "Alguma coisa está quebrada dentro deles".
Esse princípio antropológico do pai – "estrutura permanente, fundamental no processo de individuação de cada pessoa humana" – externa-se de diferentes formas, conforme o modelo histórico-social em que se situa a família em questão. Assim, o modelo árabe é diferente do modelo hindu, que, por sua vez, é diferente do modelo ocidental, e assim por diante. Em uma mesma cultura, ou em um mesmo país, há modelos distintos, como é distinto o modelo rural do modelo urbano. Isso não importa, se o princípio estiver presente, uma vez que, como explica Leonardo Boff,
importa [...] é reconhecer que por todas as partes surgem figuras concretas de pais que se imunizam da impregnação patriarcal e dentro da nova sociedade emergente e mundializada vivem com dignidade, trabalham, cumprem seus deveres, mostram responsabilidade e determinação e dessa forma cumprem a função arquetípica e simbólica para com os filhos, função indispensável para que amadureçam o seu eu e, sem perplexidades e traumatismos, ingressem na vida autônoma, até serem pais e mães de si mesmos.
Esse é o direito ao pai, de que se fala neste estudo. Neste ponto, é fundamental deixar bem registrada a importante diferença existente entre as distintas relações afetivas do âmbito do Direito de Família. Quando se fala sobre o direito ao pai, a referência são, exclusivamente, as relações denominadas paterno-filiais e não as relações que poderíamos denominar de relações de conjugalidade – oriundas do casamento ou da união estável –, entre outras relações familiares. Vale dizer: quando se está, como agora, falando sobre a possibilidade de pleitear-se em juízo a reparação por danos decorrentes do abandono afetivo, apenas e exclusivamente sobre a relação paterno-filial é que se fala.
A relação paterno-filial não é marcada pela transitoriedade – como, de resto, é a característica intrínseca das relações de conjugalidade, entre as quais se incluem tanto as relações derivadas do casamento quanto as derivadas da união estável. O fato de ser a relação paterno-filial inamovível e perpétua lhe confere um traço ímpar, distinto de tudo o mais que se queira apreciar, em paralelo ou em comparação, na esfera do Direito de Família, ou no núcleo familiar. Esse traço diferencial, associado ao fato de não existir qualquer outra relação humana com maior potencialidade afetiva do que esta – natural e atávica –, é, provavelmente, o embrião do que se possa querer entender por direito ao pai.
A essas grandes, instigantes e desconfortáveis questões somam-se, certamente, outras que devem ser igualmente levadas em consideração, como – as mais comuns delas – alguém está obrigado a amar ou o desamor tem preço? Certamente, são perguntas de muito simples respostas, pois é certo que não se pode obrigar ninguém ao cumprimento do direito ao afeto, mas é verdade também que, se esse direito for maculado – desde que sejam respeitados certos pressupostos essenciais – seu titular pode sofrer as conseqüências do abandono afetivo e, por isso, poderá vir a lamentar-se em juízo, desde que a ausência ou omissão paternas tenham-lhe causado repercussões prejudiciais, ou negativas, em sua esfera pessoal – material e psicológica –, repercussões estas que passam a ser consideradas, hoje em dia, como juridicamente relevantes.
Assim sendo, não se está a afirmar, por certo – como, com clareza, descreve Caroline Said Dias em sua cuidadosa monografia apresentada à conclusão de seu curso de Direito, no Paraná – "que o direito possua instrumentos capazes de obrigar um pai ou mãe a amar os filhos, mas possui indubitavelmente instrumentos a fim de disciplinar pais e mães que amam os filhos, a fim de que possam exercer o poder parental de maneira adequada".
Com apoio em produções de outras áreas do conhecimento, profissionais e estudiosos do Direito de Família começaram a compreender que as demandas dos filhos vão além do reconhecimento de vínculos biológicos ou interesses materiais, posto que são as demandas de amor. A partir desse entendimento, novas questões são levadas aos tribunais por filhos que reconhecem o desafeto e reivindicam a responsabilização de seus pais pelos seus atos. Um desses caminhos jurídicos tem sido o pedido de indenização por abandono afetivo, que, embora possa ser um instrumento para coibir essa prática, ainda é motivo de muita discussão e controvérsia entre os profissionais.
No caso da decisão paradigma deste estudo, essas controvérsias restaram afastadas, uma vez que a
ausência injustificada do pai origina evidente dor psíquica e conseqüente prejuízo à formação da criança, decorrente da falta não só do afeto, mas do cuidado e da proteção (função psicopedagógica) que a presença paterna representa na vida do filho, mormente quando entre eles já se estabeleceu um vínculo de afetividade [...]. E, além da inquestionável concretização do dano, também se configura, na conduta omissiva do pai, a infração aos deveres jurídicos de assistência imaterial e proteção que lhe são impostos como decorrência do poder familiar.
No caso paradigmático, portanto, claramente aquele filho ressentiu-se da ausência paterna. Havia falhas, em sua vida, que lhe causaram muita dor e aflição, que resultaram, é seguro, da extraordinária e quase inexplicável negativa de seu pai para estar ao seu lado. Assim, sentiu-se rejeitado, perdeu seu referencial. Quando pequeno, não compreendeu as razões da recusa. Por toda a vida, clamou por seu pai e não o teve.
São muitas vezes as letras anônimas que nos abrem as portas para o enfrentamento de temas assim, de forma a descortinar compreensão e destrinchar preconceitos. É o que acontece com o texto singelamente denominado Nó do afeto, não assinado, mas certamente escrito por quem sabia exatamente o que significa direito ao pai:
Em uma reunião de pais numa escola da periferia, a diretora ressaltava o apoio que os pais devem dar aos filhos. Pedia-lhes, também, que se fizessem presentes o máximo de tempo possível. Ela entendia que, embora a maioria dos pais e mães daquela comunidade trabalhasse fora, deveria achar um tempinho para se dedicar e entender as crianças. Mas a diretora ficou muito surpresa quando um pai se levantou e explicou, com seu jeito humilde, que ele não tinha tempo de falar com o filho, nem de vê-lo durante a semana. Quando ele saía para trabalhar era muito cedo e o filho ainda estava dormindo. Quando voltava do serviço era muito tarde e o garoto não estava mais acordado. Explicou, ainda, que tinha de trabalhar assim para prover o sustento da família. Mas ele contou, também, que isso o deixava angustiado por não ter tempo para o filho e que tentava se redimir indo beijá-lo todas as noites quando chegava em casa. E, para que o filho soubesse da sua presença, ele dava um nó na ponta do lençol que o cobria. Isso acontecia religiosamente todas as noites quando ia beijá-lo. Quando o filho acordava e via o nó, sabia, através dele, que o pai tinha estado ali e o havia beijado. O nó era o meio de comunicação entre eles. A diretora ficou emocionada com aquela singela história. E ficou surpresa quando constatou que o filho desse pai era um dos melhores alunos da escola. O fato nos faz refletir sobre as muitas maneiras das pessoas se fazerem presentes, de se comunicarem com os outros. Aquele pai encontrou a sua, que era simples, mas eficiente. E o mais importante é que o filho percebia, através do nó afetivo, o que o pai estava lhe dizendo. Por vezes, nos importamos tanto com a forma de dizer as coisas e esquecemos o principal, que é a comunicação através do sentimento. Simples gestos como um beijo e um nó na ponta do lençol, valiam, para aquele filho, muito mais que presentes ou desculpas vazias. É válido que nos preocupemos com as pessoas, mas é importante que elas saibam, que elas sintam isso. Para que haja a comunicação é preciso que as pessoas "ouçam" a linguagem do nosso coração, pois, em matéria de afeto, os sentimentos sempre falam mais alto que as palavras. É por essa razão que um beijo, revestido do mais puro afeto, cura a dor de cabeça, o arranhão no joelho, o medo do escuro. As pessoas podem não entender o significado de muitas palavras, mas sabem registrar um gesto de amor. Mesmo que esse gesto seja apenas um nó. Um nó cheio de afeto e carinho.
6. RESPONSABILIDADE POR DANOS DECORRENTES DO ABANDONO AFETIVOEduardo de Oliveira Leite é pioneiro, entre nós, ao diagnosticar, corretamente, que
toda separação brutal, sem atenuantes, particularmente para uma criança-jovem, é uma situação de alto risco para esta criança, tanto no plano afetivo quanto no plano cognitivo e somático; por isso, o direito positivo desenvolveu, atualmente, instrumentos que permitem manter as relações pais-filhos após a separação, qualquer que tenha sido a causa.
Assim é, igualmente, o que ocorre – ou pode ocorrer – em sede de responsabilização civil por abandono afetivo na relação paterno-filial. Ela também é um desses importantes instrumentos de reordenação da vida em família e em sociedade.
Luiz Felipe Brasil Santos refere, com muita oportunidade – reescrevendo Eugênio Facchini Neto e Konrad Zwegert & Hein Kötz –, que
o principal objetivo da disciplina da responsabilidade civil consiste em definir, entre os inúmeros eventos danosos que se verificam quotidianamente, quais deles devam ser transferidos do lesado ao autor do dano, em conformidade com as idéias de justiça e eqüidade dominantes na sociedade.
A visualização primeira deve ser o dano e não a sua origem ou causa, propriamente ditas, pois o que corre à frente é a circunstância da vítima do dano. É pela vítima e pela expectativa de reorganizar, tanto quanto seja possível, a essência lesada que se procura sistematizar um novo perfil para a responsabilidade civil – como se esboça neste estudo –, quando a ausência afetiva tenha produzido danos ao partícipe da relação paterno-filial, mormente o filho. Tal pensar, traduzido pela extraordinária sensibilidade de José Maria López Olaciregui, pode ser expresso da seguinte maneira:
La teoría del responder civil no debe ser construída como una teoría del acto ilícito, sino como una teoría del acto dañoso y de la repartición de los daños. [...] Se trata de evitar el daño injusto... un daño civil puede ser injusto tanto por haber sido injustamente causado como por el hecho que sea injusto que lo soporte quién lo sofrió.
O endosso para uma alteração paradigmática tão significativa vem de todos os lados da melhor doutrina de reconstrução do pensamento jurídico contemporâneo, mas vem especialmente – e é um dos melhores de todos os endossos – da lição derradeira de Caio Mário da Silva Pereira, quando afirmou que não pretendia "romper com toda uma tradição civilista e proceder a um processo de futurologia, para descrever toda a estrutura civilista, esboçando um novo Direito, como que tirado do nada". Nem que o animava "uma atitude iconoclasta, com a destruição da ordem jurídica existente e criação de um novus ordo". "Tudo o que acontece no mundo" – prosseguiu o insigne civilista brasileiro de todos os tempos – "acontece uma só vez". A significativa e vanguardeira beleza desse já clássico texto abre as cortinas do futuro para afirmar que "uma reforma do Direito Civil tem de considerar que ninguém se pode instalar comodamente deitado sobre a ordem estabelecida; e esperar inerte que a justiça lhe caia do céu". E disse mais o mestre de todos nós: "O Direito do século XXI forçosamente será diferente do presente, em razão de que o mundo está em permanente mutação – um perpetuo mobile – que constantemente terá de absorver o caráter mutante de uma sociedade em permanente evolução". Seu arremate tem como sentido dizer o que todos nós, hoje, vemos com clareza cada vez maior, o que reafirma o acerto da previsão: "Tenho sentido que se realiza uma transformação nos conceitos jurídicos, permitindo antever que, sobre o Direito que recebemos de nossos maiores, já se desenham as mudanças, permitindo às novas gerações readquirir a fé e a esperança em novos valores."
É, pois, nesse ambiente de revisão, de releitura, de amplidão da responsabilização civil nos dias atuais que se situa, inegavelmente, a possibilidade de falar de danos, na relação paterno-filial, derivados do abandono afetivo.
Sergio Resende de Barros tem sido um combativo defensor da idéia – não só defensável, mas completamente saudável – de que o afeto é "um direito individual, uma liberdade que o Estado deve assegurar a cada indivíduo, sem discriminações, senão as mínimas necessárias ao bem comum de todos." Trata-se de liberdade – assim como a liberdade de contratar – que não pode ser sonegada, ele diz, e negá-la seria o mesmo que "renegar ao regime e aos princípios constitucionais do Estado Democrático de Direito exigido pelo art. 1o da Constituição".
Mas é ele também quem adverte que "o afeto, em si, não pode ser incluído no patrimônio moral de um ou de outro, de tal modo que da sua deterioração resulte a obrigação de indenizar o ‘prejudicado’." O que produzirá o liame necessário – nexo de causalidade essencial – para a ocorrência da responsabilidade civil por abandono afetivo deverá ser a conseqüência nefasta e prejudicial que se produzirá na esfera subjetiva, íntima e moral do filho, pelo fato desse abandono perpetrado culposamente por seu pai, o que resultou em dano para a ordem psíquica daquele.
O dano causado pelo abandono afetivo é, antes de tudo, um dano culposamente causado à personalidade do indivíduo. Macula o ser humano enquanto pessoa, dotada de personalidade, que, certamente, existe e manifesta-se por meio do grupo familiar, responsável que é por incutir na criança o sentimento de responsabilidade social, por meio do cumprimento das prescrições, de forma a que ela possa, no futuro, assumir a sua plena capacidade de forma juridicamente aceita e socialmente aprovada. Trata-se de um direito da personalidade, portanto.
O pressuposto desse dever de indenizar – além da presença insofismável do dano – é a existência efetiva de uma relação paterno-filial em que ocorreu, culposamente, o abandono afetivo, pouco importando as circunstâncias múltiplas que possam ter originado a relação paterno-filial ou materno-filial. Mínima ou nenhuma será a importância que se dará ao fato de a prole ter se originado em momento posterior ou anterior à convolação das núpcias, ou de se ter originado de uma união estável ou, ainda, de uma relação sexual passageira. Importa apenas, como pressuposto e suporte fático à pretensão de reparar danos decorrentes de abandono afetivo, que exista, efetivamente, uma relação paterno-filial ou materno-filial no caso em questão. A existência de tal relação ultrapassa, sem de dúvida, o simples contorno biológico da mesma. Não é apenas disso que se fala, uma vez que há pais biológicos que nunca souberam dessa sua condição, assim como há pais biológicos que se distanciaram afetivamente de seus filhos por razões alheias à sua vontade real; há, enfim, pais e relacionamentos paterno-filiais pautados pela ausência afetiva que, embora possa ter produzido danos, poderão não configurar situações sólidas de suporte à demanda.
Já o fundamento desse dever de indenizar, por certo, demanda uma reflexão lastreada na dignidade da pessoa humana e no correto desenvolvimento sociopsicocultural dos filhos. Em sede de responsabilidade civil, como em todo o ordenamento civil, os princípios constitucionais de solidariedade social e de dignidade humana encontram-se presentes como atributo valorativo que funda a pretensão reparatória; também se apresentam tais princípios como uma espécie de autocritério de justificação da própria responsabilização civil. Judith Martins-Costa, ao analisar a reestruturação do Direito Privado na contemporaneidade, registra que "o conceito de ‘dano’ não é dado, mas sim ‘construído’ e, mais ainda, é, para usar uma expressão cara aos existencialistas, um ‘conceito situado’." O dever de indenizar decorrente do abandono afetivo encontra, por isso, os seus elementos constitutivos na funcionalização das entidades familiares, que devem tender à realização da personalidade de seus membros, com especial destaque para a pessoa do filho. Dessa forma, busca-se analisar os elementos clássicos da responsabilidade civil segundo tal paradigma.
Por último, seria o caso de se perguntar qual seria o mínimo lastro fundador de tal pretensão, o qual serviria de oriente em busca de verificar a ocorrência de dano efetivo e injusto advindo da causa em questão? Ora, um dos fundamentos da Constituição Federal – como já se referiu antes – estabelecido no art. 1º, inc. III, é exatamente a dignidade da pessoa humana. A mantença dessa dignidade passa, também, pela ambiência familiar e pela possibilidade de correlação afetiva entre seus membros, para assegurá-la como bem maior que é. Este é certamente o primeiro lastro normativo a ser indicado, ápice de toda a construção legislativa de um país.
Ainda na Constituição Federal se inserta o dever de educar, à família, no art. 205. A extensão desse dever habita o art. 227 da mesma Lei Maior, que determina ser
dever da família, da sociedade e do Estado, assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
O art. 229, a seguir, imputa aos pais "o dever de assistir, criar e educar os filhos menores". Na ordem infraconstitucional, a normativa autorizadora e fundadora da pretensão do lesado evidencia a existência de um direito-dever, incumbido aos pais, de cuidar de sua prole e de protegê-la, não apenas sob as demandas materiais, mas, especialmente, sob as demandas emocionais, psíquicas, além das de ordem mental, moral, espiritual e social. Assim, o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n. 8.069/90), no art. 3º, prescreve que
a criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.
O mesmo Estatuto, adiante, nos seus arts. 19 e 20, reafirmam o direito da criança e do adolescente a "ser criado e educado no seio da sua família", imputando aos pais "o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores". Complementarmente, o art. 249 opera a previsão de sanção administrativa, a ser imposta a qualquer dos pais que infringir os seus deveres oriundos do pátrio poder.
Ao considerar o próprio Código Civil, observa-se que o sustento, a guarda e a educação dos filhos incumbem aos pais, atividades que são elencadas entre os deveres conjugais descritos no art. 1.566, inc. IV. Em seguida, em capítulo especial, o Código dispõe sobre a proteção da pessoa dos filhos, nos arts. 1.583 a 1.590, em caso de rompimento do casamento de seus pais, a observar sempre o interesse da criança.7. O PERIGO DA MONETARIZAÇÃO DO AFETO E A RELEVÂNCIA DO CARÁTER DISSUASÓRIO E PEDAGÓGICO DAS CONDENAÇÕES
Após todas essas considerações preliminares, conclui-se que a possibilidade de demandar-se em razão de abandono afetivo não se verifica de forma desarrazoada, irresponsável, ou desapegada da realidade. O molde jurídico para o restabelecimento da situação foi pensado pelo Direito há muito tempo. O que se assiste, atualmente, é uma adaptação do figurino clássico da responsabilidade civil aos casos que decorrem de situações de Direito de Família e entre membros de uma mesma família sem que isso implique subversão do sistema. Também a obrigação jurídica violada existe há muito tempo. O que ocorre é o necessário repensar desses direitos e deveres, que passam a ser permeados com o afeto, agraciados com a despatrimonialização das relações, pautados pela função de esteio e de alicerce para a dignidade humana, deixando de lado o autoritarismo, a perversão e o direito de disposição mais ou menos limitado a respeito do futuro dos filhos.
Os avanços ou as adaptações percebidos, portanto, não podem ser olvidados ou relegados, sob pena de retrocesso. Mas, certamente, também não se podem tornar instrumento nefasto às relações familiares sob o pretexto da penalização do pai que abandona o filho, o que ocasionaria – tal qual o tiro que sai pela culatra – a impossibilidade completa de restabelecimento dessas relações.
O risco de o abandono afetivo transformar-se em carro-chefe de uma indústria indenizatória do afeto certamente existe, mas o Poder Judiciário pode evitá-lo, desde que, a cada caso concreto, se fizer a necessária análise ética das circunstâncias envolvidas, a fim de verificar-se a efetiva presença de danos causados ao filho pelo abandono afetivo paterno, ou materno. Afinal, o perigo da banalizar-se a indenização reside em não se compreender, exatamente, na exposição concreta de cada pretensão, o verdadeiro significado da noção de abandono afetivo, o verdadeiro substrato do pedido judicial em questão. É por isso que as corajosas e inovadoras decisões analisadas – que têm tudo para exercer a sua função maior de alterar paradigmas e valorações no Direito contemporâneo – bem podem, infelizmente, abrir um precedente nefasto, se os seus fundamentos forem utilizados em casos dessemelhantes e mal intencionados, o que pode gerar odiosa avalanche a desencadear uma verdadeira indústria indenizatória do afeto.
Contudo, o perigo da banalização não deve fazer com que se perca de vista o verdadeiro e importante papel dos juízes, em casos como esses, que corresponde exatamente à sua função de agentes transformadores dos valores jurídicos, de molde a adequar o Direito aplicado aos paradigmas da atualidade. No que diz respeito aos advogados, urge alertar-se para a necessidade de que façam – sempre e cuidadosamente – uma séria e profunda análise ética das circunstâncias de cada caso, a fim de verificar-se a efetiva presença de danos causados ao filho pelo abandono afetivo paterno – ou materno, se for o caso – antes da propositura de tais ações. Porém – mais importante que tudo – a verdade é que o medo da banalização certamente não pode transformar-se em mais um dos gigantescos empecilhos que nos têm cegado na compreensão daquilo que verdadeiramente consideramos como nobre e essencial nessa conquista jurisprudencial tão significativamente corajosa e inovadora.
Desse modo, a indenização por abandono afetivo, se for utilizada com parcimônia e bom senso, sem ser transformada em verdadeiro altar de vaidades e vinganças ou em fonte de lucro fácil, poderá converter-se em instrumento de extrema importância para a configuração de um Direito de Família mais consentâneo com a contemporaneidade, podendo desempenhar, inclusive, um importante papel pedagógico no seio das relações familiares.
É o que ocorre com o julgado paradigma deste estudo, o caso Alexandre. Com grande proficiência, Luiz Felipe Brasil Santos refere que a "indenização deferida nesse contexto não teve a finalidade de compelir o pai ao cumprimento de seus deveres, mas atendeu a duas relevantes funções, além da compensatória: a punitiva e a dissuasória." Este é o ponto! E assim é porque, como explicita o mesmo autor, citando Facchini,
pela primeira [função da responsabilidade civil], busca-se ‘punir alguém por alguma conduta praticada, que ofenda gravemente o sentimento ético-jurídico prevalente em determinada comunidade’. Com a segunda [função da responsabilidade civil], procura-se "sinalizar a todos os cidadãos sobre quais condutas a evitar, por serem reprováveis do ponto de vista ético-jurídico".
Ora, toda alteração paradigmática é sempre muito complicada, polêmica e gera efeitos divergentes. Se for certo que o mundo e a vida dos homens estão transição contínua, também será verdade que a mudança causa sempre uma expectativa que, por um lado, é ser eufórica, mas, por outro lado, preocupante. E não poderia ser diferente agora, diante deste assunto – tão delicado quando difícil – que é a responsabilidade civil por abandono afetivo. Tanto a sociedade quanto a comunidade jurídica propriamente dita tem reagido de maneira dúplice em face do tema em destaque.
Também é assim com o próprio Poder Judiciário, e nem poderia deixar de ser. Contudo, como se procurou demonstrar ao longo deste estudo, é inegável e louvável a disposição e a seriedade com as quais o Poder Judiciário brasileiro tem se conduzido, nesse novo viés judicial, o qual tende a avolumar-se cada vez mais, tanto em pleitos justos quanto em pleitos simplesmente aventureiros. O cuidado do Poder Judiciário na análise pontual, caso a caso, tem resultado até aqui – pelas decisões que podemos conhecer – em momentos de alta consagração jurisprudencial, quer quando os nossos julgadores atendem ao pleito, quer quando negam a possibilidade de seu acolhimento. Concretamente, visualiza-se desde já um futuro de concretização do justo equânime, atendendo à principiologia fundamental de nossa nova Lei Civil, o Código de 2002.
Provavelmente, o grande bloqueio ou estrangulamento da questão resida no fato – difícil de ser compreendido, é certo – de obter-se, ao final, quando forem julgados procedentes os pedidos, uma condenação em quantia de dinheiro que pode ser mal definida e mal compreendida, de modo a permitir que antigas e preconceituosas ponderações – que tanto já ouvimos antes, acerca da quantificação do dano moral propriamente dito – voltem ao cenário atual para tão pobremente se perguntar se o afeto tem preço. O Direito Privado mais humanizado que se instala certamente entre nós, na contemporaneidade, é um direito que não alberga mais esse tipo de questionamento, por entendê-lo completamente despiciendo e inútil. O novo Direito não se agrega mais a dúvidas que tenham por foco questão de fundo patrimonial acerca de assuntos que são pertinentes à afetividade. Não há mais espaço para tanto; é descabido e é anacrônico fazê-lo.
Contudo, é certo não ser possível simplesmente deixar de ouvir a voz de reclamo, deixar de ouvir o protesto e a oposição daqueles que sempre estão dispostos a tanto, qualquer que seja o tema ou a intenção. A mudança de visões, a alteração de paradigmas envolve, obrigatoriamente, a flexibilidade cognitiva, pois, se assim não for, o que se estará a propor é simplesmente a imposição de verdades que correm o riso de ser apenas ideologias, no mal sentido dessa palavra.
Bem por isso, muitos têm pensado se, em face dos novos danos que despontam no contexto da responsabilização civil, não seria o caso de aplicar-se, alternativamente, um outro tipo de condenação ao pai que houvesse abandonado afetivamente seu filho, sem envolver pagamento em dinheiro. Ora, como já se mencionou que a condenação aplicável a tais casos tem duas relevantes funções, além da compensatória, que são funções punitiva e dissuasória, nada obsta que uma indenização de natureza não monetária, por certo, seria uma providência que afastaria essa conotação pejorativa, diga-se assim, dos casos justos – justos também pelo fato de que a irresponsabilidade social do pai da ou mãe ausente coloca em exposição prejudicial a sociedade como um todo, conforme antes se referiu.
Afinal de contas, como bem registra Rolf Madaleno , essas decisões favoráveis aos pleitos dos filhos que se sentiram lesados por abandono afetivo, "não condenam a reparar a falta de amor, ou o desamor, nem tampouco a preferência de um pai sobre um filho e seu descaso sobre o outro, condutas que evidentemente causam danos; penalizam, porém, a violação dos deveres morais contidos nos direitos fundados na formação da personalidade do filho rejeitado".
Mas, quando o tema em discussão é este (o da monetarização das ações de indenização) sempre vem à baila a lembrança daquele famoso caso ocorrido por volta dos anos de 1960, com a famosa atriz Brigitte Bardot. Tendo ela sofrido danos de natureza moral, requereu, na ação de indenização própria, que o causador da lesão fosse condenado a pagar um franco à guisa de reparação. Ao vencer a demanda, a atriz recebeu aquele único franco em sessão à qual estiveram presentes os meios de comunicação de todo o mundo, dando ampla divulgação ao fato. O desiderato almejado, certamente, foi melhor alcançado dessa forma.
Assim ocorre, também, no caso paradigmático de Minas Gerais, escolhido como ponto de partida para este estudo: aqueles 200 salários mínimos a que o pai de Alexandre foi condenado a pagar-lhe não devolverão o que este não teve, exatamente porque o afeto não tem preço! A quantificação em dinheiro não muda nada na vida de Alexandre. Não significa nada, a não ser o fato de ter sido o assunto colocado na pauta da sociedade, de modo a fazer que todos prestássemos atenção de alguma forma. Este é o fato principal que pode conter em si, intrinsecamente, aquilo que mais se almeja: a disseminação do valor pedagógico e do caráter dissuasório da condenação. Isso pode ser um significativo fator de reforma de valorações sociais e de alteração de paradigmas jurídicos.8. PARA CONCLUIR: POR TODAS AS VEZES.
Por todas as vezes que você está ao meu lado,
Por toda a verdade que você me faz ver,
Por toda a alegria que você traz para a minha vida,
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