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Paternidade Afetiva nas Técnicas de Reprodução Assistida Heteróloga
Desde a antiguidade os homens indagam sobre a possibilidade da reprodução sem que haja o envolvimento do ato sexual, é o que Aldrovandi; França[1] concluem após analisarem exemplos da mitologia como "Ates – filho de Nana, filha do Rei Sangário, que teria colhido uma amêndoa e colocado em seu ventre (Grécia)" e "Maria - mãe de Jesus (Bíblia)", ficando visível a importância do nascimento e de descendentes.
Porém, foi no século XIX que os cientistas começaram a pesquisar sobre o desenvolvimento embrionário e a fecundação humana.
No Brasil, conforme Sá[2], a evolução do conhecimento científico juntamente com a globalização, o declínio do patriarcalismo e a redivisão sexual do trabalho metamorfizaram a concepção tradicional da família hierarquizada existente até a metade do século passado, deixando de ser a fonte fundamental da economia e da reprodução.
Essa mudança do paradigma ocorreu, também, devido à Constituição Federal Brasileira de 1988, que nos seus artigos 226 e 227, inovou trazendo a previsão da liberdade quanto ao planejamento familiar, incorporando ao ordenamento novos tipos de entidades familiares baseadas no afeto, e não mais inteiramente no aspecto biológico.
O Código Civil de 2002 possui em seu art. 1.597 as hipóteses de presunção de paternidade, sendo esse o primeiro critério para determinação da paternidade, dentre as quais está inserida no inciso V, a inseminação artificial heteróloga; entretanto, não há no Brasil legislação específica regulamentando as técnicas de reprodução humana assistida. O segundo critério é o biológico e o terceiro o sócio-afetivo, mas qual deve prevalecer?
Diante da complexidade dos fatos sociais e da constante atualização na área tecnológica, surgem situações perplexas éticas e jurídicas, como, por exemplo, a utilização de um útero de substituição devido à impossibilidade de gerar de algumas mulheres, inovando a relação parentalidade-filiação sem que exista ainda uma solução correta para cada nova conduta.
No tema em questão será verificado em que medida a carga genética deve ser exclusiva para o reconhecimento da filiação e quais as implicações jurídicas da desconsideração do vínculo afetivo.
Hipótese
Ante a discussão, a hipótese dessa monografia defende que, em razão da evolução da biotecnologia estar afetando e transformando drasticamente as relações de família, trazendo novos paradigmas e situações, é necessário ampliar o critério em que essa relação está baseada, não podendo apoiar-se somente na consangüinidade dos membros, mais sim no afeto em que esta se construiu.
Desta forma, a importância do afeto está redimensionando as conseqüências jurídicas das relações materno-paterno-filial, sendo, para tanto, necessário a relativização do conceito de carga genética como fato determinante, olvidando a concepção patriarcal de família.
No caso de ser necessário, para a gestação desse embrião proveniente da reprodução assistida heteróloga, que outra mulher disponha seu útero, mesmo havendo uma troca sangüínea entre essa e o embrião, não haverá criação de nenhum outro vínculo.
Posto isto, nas relações familiares decorrentes das técnicas de inseminação assistida, os contraentes dessa tecnologia, mesmo não tendo a carga genética do futuro filho, terão a vontade de dar afeto á criança ainda por vir, o que é primordial para a evolução de todos os seres humanos.
Objetivo Geral
Identificar o nexo entre o material genético e a relação de filiação e verificar em que medida a filiação decorrente da reprodução assistida heteróloga baseia-se no afeto.
Objetivos Específicos
- Levantar a discussão acerca da filiação decorrente dos meios de reprodução assistida, descrevendo a importância do afeto na nova concepção de família; assim como as conseqüências e validades do contrato feito.
- Apresentar o afeto como fator primário para definição da relação de filiação, sendo a carga genética condição secundária, de acordo com princípios constitucionais; considerando a possibilidade de afetividade no útero de substituição.
- Estabelecer a relação parentalidade-filiação e averiguar quais as conseqüências na esfera jurídica da desconsideração do vínculo afetivo no mesmo.
Justificativa
Trata-se de um tema de extrema relevância no mundo jurídico, uma vez que representa uma problemática atual e interessante no âmbito da bioética e do direito civil, haja vista o aumento de situações fáticas de reproduções heterólogas que estão acontecendo cotidianamente com a utilização do novo conceito de família vinculado á afetividade.
O objeto de pesquisa pretende aprofundar uma questão pouco discutida, impensada até poucas décadas atrás, de forma a possibilitar outros operadores do direito a observar tal situação e ponderar sobre soluções éticas e morais para a mesma.
Por tudo isso, o tema abordado visa, além de se tornar mais uma fonte de conhecimento para acrescentar no estudo do assunto, levantar uma crítica construtiva, para que se possa avançar no que concerne aos conceitos jurídicos indeterminados.
Ao final, é esperado que essa investigação alcance utilidades práticas, implicando na concepção atual de família, e que o afeto seja aceito como satisfatório para determinar vínculos na sociedade pós-moderna.
Bibliografia
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ALVAREZ, Alejandro Bugallo. Princípios informativos da relação de filiação: indagações à luz dos progressos da biotecnologia. Disponível em: <<http://www.puc-rio.br/sobrepuc/depto/direito/revista/online/rev15_aalejandro.html>>. Acesso em: 20 ago.2005.
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MEDEIROS, Cristiano Carrilho S. de Medeiros. Inseminação artificial e filiação. Disponível em: <<http://www.universojuridico.com.br/publicacoes/doutrinas/default.asp?action=doutrina&iddoutrina=1039>>. Acesso em: 20 ago. 2005.
MOREIRA FILHO, J. R., Conflitos jurídicos da reprodução humana assistida – Bioética e Biodireito. Jus Navigandi, Teresina, a. 6, n. 54, fev. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2588>. Acesso em: 14 ago. 2005.
OMMATI, José Emílio Medauar. As novas técnicas de reprodução humana à luz dos princípios constitucionais. Disponível em : <<http://www.universojuridico.com.br/publicacoes/doutrinas/default.asp?action=doutrina&iddoutrina=627>>. Acesso em: 20 ago. 2005.
SÁ, Maria de Fátima Freire. Monoparentalidade e Biodireito. IN: Afeto, ética, família e o novo Código Civil. Belo Horizonte, Del Rey: 2004.
[1] ALDROVANDI, Andrea; FRANÇA, Danielle Galvão de. A reprodução assistida e as relações de parentesco. Jus Navigandi, Teresina, a. 6, n. 58, ago. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3127>. Acesso em: 20 ago. 2005
[2] SÁ, Maria de Fátima Freire. Monoparentalidade e Biodireito. IN: Afeto, ética, família e o novo Código Civil. Belo Horizonte, Del Rey: 2004 Aline Ferraz De Gouveia Granja é sócia do IBDAFM e advogada
Os artigos assinados aqui publicados são inteiramente de responsabilidade de seus autores e não expressam posicionamento institucional do IBDFAM