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Filhos da Mãe
Atualmente divórcios e separações, passando a mãe a usar o nome de solteira com a conseqüente retificação de todos os seus documentos pessoais é coisa normal. Naturalmente os filhos da mãe também podem mudar os documentos para retificar a filiação? Não é tão simples.
Foi sob a égide da idéia sacralizada do casamento que surgiu a Lei dos Registros Públicos de 1973, anterior inclusive à Lei do Divórcio de 1977, que permitiu a dissolução do casamento, facultou novo, deixando de ser obrigatória à adoção do nome. Portanto, quando da elaboração da Lei de Registros Públicos, sequer se imaginava a possibilidade de divórcio, quanto mais o retorno à utilização do nome de solteira. Por este motivo muitos juízes e tribunais, com base na lei de 1973, têm indeferido a retificação dos documentos dos filhos da mãe. Esquecem que em 1992, a lei que regula a investigação de paternidade dos filhos havidos fora do casamento, permitiu a mulher averbar a alteração do seu patronímico, em decorrência do casamento, no termo de nascimento dos filhos. Se o casamento enseja essa averbação, o descasamento, por igual, deve autorizar o mesmo procedimento. Não seria lógico permitir em uma hipótese e vedar em outra.
Na nossa realidade atual, não mais se justifica a mantença estéril na certidão do nome que a mãe tinha quando do nascimento do filho, perpetuando essa situação de uma maneira absolutamente injustificável. É evidente que o registro público deve primar principalmente pela situação fática atual. Se alguém portar um documento espelhando a indicação do nome da mãe, e esta já não adota mais esse nome, há um comprometimento com a verdade do momento. Aquela pessoa ali nominada não existe mais. O registro civil não é apenas um documento histórico, compromissado exclusivamente com a contemporaneidade da sua lavratura. Como instrumento necessário à prática dos mais diversos atos da vida civil há de ser permeado pelas alterações de estado que porventura ocorram na vida das pessoas, até mesmo para que venha a fazer jus à fé pública que lhe é inerente.
Mais complexo torna-se se a mãe tiver que dar uma autorização por escrito: ou ela dá uma autorização com o nome de solteira, firma reconhecida, anexando os documentos relativos à troca de nome, ou ela assina o nome de casada e está cometendo uma falsidade ideológica. Manter, portanto, registro incólume não acrescenta absolutamente nada em termos de estabilidade social; ao revés, continua a acarretar previsíveis contratempos, ao passo que a mãe passará pelo constrangimento de ter que dar explicações todas as vezes que for necessária a apresentação de documentos e vier a ser detectada a divergência entre os nomes.
A questão tem relevância diante da nova realidade social, porque a vida é dinâmica e revela que não pode o apego ao formalismo entravar a marcha da vida, preso a regramentos que reclamam uma maior flexibilidade, já que as relações afetivas de outrora implicavam vínculo perene e já não guardam hoje a mesma estabilidade. Ao permanecer com o nome da mãe da época de casada em seus documentos pessoais, o filho precisa levar consigo os documentos da separação dos pais. Uma exposição desnecessária da vida privada.
O assentamento no registro civil não é imutável. Em casos justificados é possível adequá-lo à realidade, de modo a se evitar situações indesejáveis. Uma simples alteração na Lei de Registros Públicos seria suficiente para simplificar a vida das pessoas. Com a palavra os nossos deputados federais recém eleitos.
Pedro Roberto Donel é advogado em Joinville. E-mail: advocacia@virmond-donel.adv.br
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