Artigos
A insólita disputa pela guarda de ‘Bebês’ Reborn: Entre o absurdo e o jurídico
Nos últimos dias, uma polêmica peculiar tomou conta das redes sociais: a suposta busca por advogados para regulamentar a guarda e convivência dos "Bebês Reborn". Para quem não conhece, são bonecos inanimados ultrarrealistas que mimetizam bebês ou crianças pequenas. Embora a veracidade da notícia seja questionável – e provável que não passe de um boato – o frenesi gerado nos remete a outras situações inusitadas, como a recente discussão em torno da "guarda de pets", que, ao que tudo indica, já caiu no esquecimento da internet. No entanto, o episódio levanta uma questão: seria possível que tamanha extravagância chegasse aos tribunais?
Para aqueles que prezam pela boa técnica jurídica, a resposta é óbvia: nenhuma ação desse tipo teria qualquer guarida ou andamento nos tribunais. Pedidos para regulamentar a guarda de objetos inanimados, por mais realistas que sejam, seriam sumariamente rejeitados de plano. A lógica é simples: o Direito de Família e Sucessões tutela relações entre pessoas e bens, e não entre pessoas e seus objetos de afeto, por mais que esse afeto seja profundo. Tais demandas seriam rejeitadas de plano por ausência de objeto juridicamente tutelável, já que os "Bebês (bonecos) Reborn" são meros objetos, desprovidos de direitos ou status de sujeito.
Mais do que o mero indeferimento, a parte que ousasse postular tal absurdo correria sério risco de ser condenada por ato atentatório à dignidade da justiça. O artigo 77, inciso II, do Código de Processo Civil (CPC), prevê sanções para aqueles que tentam usar o judiciário de forma indevida ou com propósitos alheios à finalidade da justiça.
Adicionalmente, o advogado que aceitasse embarcar nessa empreitada estaria sujeito a sanções por lide temerária (art. 32 do Estatuto da Advocacia e da OAB) e/ou inépcia profissional (art. 34 do mesmo estatuto). A advocacia exige seriedade e conhecimento técnico, e a propositura de ações manifestamente descabidas pode resultar em responsabilização ética e profissional.
É crucial diferenciar o afeto pessoal de uma relação jurídica. Contudo, se a discussão em torno dos bonecos “Reborns” versar sobre sua propriedade ou sobre os frutos decorrentes da exploração comercial que envolvem esses bonecos (como, por exemplo, disputas sobre eventuais direitos autorais, comercialização ou questões contratuais), aí sim, a situação muda de figura. Nesses casos, onde a conotação é patrimonial e econômica, o judiciário pode, e deve, dedicar atenção à demanda.
Em suma, o apego a objetos inanimados, como os “Bebês Reborn”, por si só já levanta questionamentos no âmbito pessoal, refletindo uma tendência de antropomorfização que pode ser debatida sob diversas perspectivas. Contudo, no campo jurídico, a questão é cristalina: não há qualquer espaço para discussões sobre guarda ou “convivência” de bonecos, por mais realistas que sejam. O Judiciário tem a função de resolver conflitos entre pessoas e bens tangíveis no mundo real, e não de legitimar relações afetivas com objetos. Neste caso, a linha entre emoção e direito é, portanto, inequivocamente definida.
Os artigos assinados aqui publicados são inteiramente de responsabilidade de seus autores e não expressam posicionamento institucional do IBDFAM