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Casamento e União de Facto na Lei da Família Moçambicana: Direitos e Diferenças
Casamento e União de Facto na Lei da Família Moçambicana: Direitos e Diferenças
Teresa Chelengo - Jurista e Presidente do Instituto Brasileiro de Direito da Família- Moçambique
A família é uma célula vital da sociedade, e o seu reconhecimento jurídico é essencial para garantir proteção, estabilidade e dignidade às pessoas. Em Moçambique, a Lei da Família n.º 22/2019, de 11 de Dezembro consagra dois modos de constituição da família: o Casamento e a União de Facto. Ainda que ambos estabeleçam vínculos afectivos e compromissos mútuos, possuem diferenças jurídicas importantes que merecem atenção.
O Casamento: um contrato com efeitos jurídicos plenos
Nos termos da lei, o casamento é a união voluntariamente estabelecida entre duas pessoas, com o objetivo de constituir família. Trata-se de um acto jurídico formal, celebrado nos termos exigidos por lei, e que produz efeitos automáticos e amplos nas esferas pessoal, patrimonial e sucessória.
A Lei da Família reforça princípios de igualdade entre os cônjuges, deveres recíprocos de respeito, assistência, fidelidade e coabitação, bem como o dever de sustento e educação dos filhos. O regime de bens adoptado, salvo convenção em contrário, é o da comunhão de adquiridos.
Além disso, o casamento confere direito de sucessão entre cônjuges e facilita o acesso a direitos sociais como pensão, assistência médica e herança.
União de Facto: um vínculo reconhecido, mas com limitações
A união de facto, por sua vez, é definida como a convivência duradoura, pública e contínua entre duas pessoas, com características de vida em comum, sem que entre elas tenha sido celebrado casamento.
A lei reconhece essa forma de união e concede proteção legal, mas os seus efeitos são mais restritos. Para que produza efeitos jurídicos semelhantes aos do casamento, é necessário que seja declarada judicialmente, mediante comprovação de convivência mínima de três anos, salvo prova em contrário.
Entre os efeitos jurídicos da união de facto destacam-se:
- Direito a alimentos em caso de separação ou falecimento;
- Possibilidade de divisão de bens adquiridos durante a convivência;
- Reconhecimento como entidade familiar para efeitos sociais;
- Não altera o estado civil.
- Caso seja devidamente registrada pode ser impedimento para contrair casamento.
Implicações práticas e a importância da informação jurídica
Compreender as diferenças entre casamento e união de facto é fundamental, para que os cidadãos façam escolhas conscientes sobre sua vida afectiva e patrimonial. Muitas uniões informais perduram por anos, mas sem garantir à parte mais vulnerável os direitos que teria se houvesse um reconhecimento formal.
A compreensão das diferenças jurídicas entre casamento e união de facto é mais do que um exercício técnico, na verdade, é uma questão de cidadania, protecção de direitos e justiça social. Em Moçambique, milhares de pessoas vivem em uniões não formalizadas, muitas vezes sem plena consciência das limitações legais que isso implica, especialmente no que diz respeito à sucessão, protecção patrimonial e segurança jurídica em caso de separação ou desaparecimento físico.
A Lei da Família n.º 22/2019, de 11 de Dezembro, avança ao reconhecer e proteger diversas formas de organização familiar, mas também exige que os cidadãos estejam informados e juridicamente orientados. A formalização da relação, seja pelo casamento ou pelo reconhecimento judicial da união de facto, não é apenas um detalhe legal - é um instrumento de empoderamento e garantia de dignidade, sobretudo para mulheres, crianças e idosos que muitas vezes são os mais vulneráveis nestas relações.
Por isso, o papel de nós, Advogados, Juristas, Defensores de direitos e instituições como o IBDFAM Moçambique, é essencial: informar, educar e intervir. A protecção da família começa com o conhecimento. E o conhecimento começa com a leitura e o diálogo.
Os artigos assinados aqui publicados são inteiramente de responsabilidade de seus autores e não expressam posicionamento institucional do IBDFAM