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Agora, Francisco, reze por nós
Jones Figueirêdo Alves
O anúncio da morte do pontífice foi feito pelo carmelengo, o cardeal irlandês Kevin Farrell:
"Caros irmãos e irmãs, é com profundo pesar que me cabe anunciar a morte de Sua Santidade Papa Francisco." "Às 7:35 desta manhã (hora local. 2:35 de Brasília), o Bispo de Roma, Francisco, retornou à casa do Pai. Toda sua vida foi dedicada a servir ao Pai e Sua Igreja."
A sua herança é a humildade, a misericórdia, a concórdia entre os homens. Ele que se fez pontífice da ternura, embaixador da paz, servo dos últimos, dos oprimidos e dos pobres.
Roma amanheceu, ontem, em um dia ensolarado, e no toque ritual das horas, outro sol foi irradiado, o da claridade intima do homem que veio do fim do mundo e agora volta para o início de tudo.
Horas antes, no domingo de Páscoa, Francisco em sua mensagem e na benção “Urbi et orbi”, pregou a paz:
“Gostaria que voltássemos a ter esperança de que a paz é possível. Que do Santo Sepulcro – a Igreja da Ressurreição –, onde neste ano a Páscoa será celebrada no mesmo dia por católicos e ortodoxos, irradie a luz da paz em toda a Terra Santa e no mundo inteiro”.
Foi Francisco um papa para os tempos difíceis. Enfrentou não apenas desafios internos, como os escândalos de abusos e a resistência à reforma da Cúria, mas também crises globais: pandemias, guerras, e a polarização ideológica que penetrou até mesmo nos ambientes religiosos. Mesmo sob forte oposição, manteve-se fiel à sua missão: ser pastor. O Bom Pastor, que conhece suas ovelhas pelo nome.
Pai espiritual de uma humanidade ferida. Com seu coração aberto, ele tocou os corações fechados. Com sua voz mansa, fez ecoar a firmeza do Evangelho.
Em seus gestos — como a visita aos migrantes em Lampedusa, o abraço a pessoas desfiguradas pela doença, ou o silêncio solene na Praça de São Pedro vazia durante a pandemia — ele comunicou com o corpo o que muitos líderes não conseguem dizer com palavras.
O pontificado do Papa Francisco será lembrado como um dos mais marcantes e desafiadores da história contemporânea da Igreja Católica. Ele não apenas liderou a Igreja em tempos de profundas mudanças sociais e culturais, mas também a convocou a reencontrar sua essência evangélica: a misericórdia.
encíclica Laudato Si’ (2015) posicionou a Igreja na vanguarda do cuidado com a casa comum, unindo ecologia e justiça social de forma inédita. Já em Fratelli Tutti (2020), ele clama por uma fraternidade universal baseada no amor que transcende fronteiras, religiões e ideologias.
Hoje, seu trono está vazio, mas o espaço que ele deixa está cheio de memória. Cheio das sementes que plantou em cada gesto de compaixão, em cada palavra que desarmou corações, em cada encontro com o pobre, o doente, o esquecido. Francisco foi mais do que um Papa. Foi um sopro do Espírito sobre a poeira das vicissitudes e desencontros, um lembrete de que a Igreja não é palácio, mas casa. Não é poder, mas serviço.
Em um ato simbólico, o camerlengo quebra o "Anel do Pescador", o anel de sinete de ouro dos papas. O ato simboliza a suspensão do poder pontifício. Este é o momento da chamada sede vacante, ou "trono vazio". O poder dentro da igreja passa então às mãos do Sagrado Colégio dos Cardeais.
Com o seu falecimento, a Igreja se prepara para um novo Conclave, quando a escolha do próximo pontífice deverá ser bastante influenciada por diversos fatores, incluindo a atual composição do Colégio Cardinalício, onde 110 dos 136 cardeais eleitores foram nomeados por ele. Nesse quadro, tudo sugere a possível continuidade de sua linha pastoral, nada obstante as dinâmicas internas do próprio conclave.
No ponto, surgem, dentre outros, como preferenciais, os cardeais: (i) Luís Antônio Tagle (Filipinas, 67 anos). Prefeito do Dicastério para a Evangelização, é conhecido por seu carisma e alinhamento com as reformas de Francisco; (ii) Matteo Zuppi (Itália, 69 anos). Arcebispo de Bolonha e presidente da Conferência Episcopal Italiana, tem experiência em mediação de conflitos. Pode será um possível candidato de consenso; (iii) Pietro Parolin (Itália, 70 anos). Atual Secretário de Estado do Vaticano, diplomata experiente. Nada impede, porém, que a escolha recaia sobre cardeais de regiões emergentes.
Segundo as regras atuais, o Conclave deve começar entre 15 e 20 dias após a morte do papa. Esse intervalo serve para que todos os cardeais com direito a voto, atualmente, aqueles com até 80 anos, possam chegar a Roma.
Roma e o mundo inteiro choram. Mas o céu sorri. Pois chegou, enfim, aquele que passou a vida inteira dizendo: “Rezem por mim.”
A humanidade que vive seus momentos críticos, diante da polarização odiosa de seus líderes, das dissenções ideológicas, dos infortúnios das guerras e nas tragédias cotidianas dos mais pobres, perde o seu apóstolo protetor. Dele resulta, porém, um novo modo de ser Igreja em meio às dores do mundo. Uma Igreja mais próxima dos pobres e marginalizados: com prioridade pelos mais vulneráveis e em sua defesa da justiça social.
O legado do Papa Francisco será o caminho condutor da esperança do mundo! Agora, é dizer: Francisco reze por nós.
Desembargador Emérito do TJPE. Advogado e parecerista
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