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Adoção tardia: um olhar para os excluídos
Resumo: A questão da adoção no Brasil demanda uma análise a respeito dos desafios que apresenta, pois a igualdade de direitos de todos os atores sociais é pressuposto que precisa ser respeitado numa democracia. Nesse sentido, a presente pesquisa traça um percurso teórico capaz de explicar esse relevante tema, abordando, em primeiro lugar, as legislações pertinentes à adoção. A posteriori, analisam-se os procedimentos, requisitos, sentença, efeitos, e os diferentes tipos de adoção, visando o entendimento dos tópicos mais relevantes sobre o assunto. O foco do estudo enfatiza a adoção tardia como aspecto primordial desse instituto, explicando o conceito, o estágio de convivência e os mitos e preconceitos que permeiam a sociedade em relação a esse tema. Por fim, destaca-se as possíveis soluções para a problemática e as campanhas de estímulo como tentativa de minimizar esse quadro social preocupante.
Palavras-chave: Direito de família. Adoção tardia. Mitos e preconceito.
Sumário: Introdução. 1. Conceito de adoção. 2. Legislação sobre adoção. 3. Procedimento da adoção. 3.1. Requisitos do adotante e do adotado. 3.2. Sentença proferida na adoção e seus efeitos. 3.3. Adoção conjunta, unilateral e por tutor ou curador. 3.4. Adoção à brasileira. 3.5. Adoção de grupo de irmãos. 4. Adoção tardia. 4.1 Conceito e período de adaptação. 4.2. Mitos e preconceitos. 4.3. Possíveis soluções diferenciadas. 4.4. Campanhas de incentivo à adoção tardia. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
O presente estudo tem como temática principal o grande desafio de discutir alguns aspectos importantes sobre a problemática da adoção no Brasil. Para tanto, faz-se necessário, em primeiro plano, destacar a relevância da pesquisa, uma vez
que, se pretendemos participar de uma sociedade saudável e com maior igualdade de direitos, ela precisa conhecer suas dificuldades para ser capaz de minimizá-las.
Nesse sentido, é fundamental que todos tenham a mesma chance de participar de uma família, construindo vínculos afetivos e culturais, capazes de permitir o desenvolvimento emocional e intelectual em condições semelhantes.
Nessa perspectiva, ganha destaque a necessidade de se refletir sobre a importância do processo adotivo como fomentador dessa igualdade de direito. A adoção é importante, pois, através dela, crianças e adolescentes têm uma base familiar, a qual é primordial para sua formação psicológica e emocional.
A pesquisa destaca também alguns tópicos de relevância no processo adotivo, como os seus procedimentos, os requisitos cabíveis, os efeitos, a sentença e a certidão de nascimento. Além disso, explicita os principais tipos de adoção presentes no ordenamento jurídico brasileiro.
Outro aspecto relevante que deve ser analisado em relação ao tema da adoção, diz respeito ao entendimento do percurso legal pelo qual passou este instituto, que embora ainda precise ser muito melhor alinhado, considerando o número de crianças e adolescentes que ainda se encontram em abrigos a espera de uma nova família, já alcançou melhorias significativas para facilitar o processo adotivo. Nesse sentido, a pesquisa priorizou uma análise jurídica das leis que amparam a adoção em nosso país.
Considerando a amplitude do tema escolhido, o presente estudo tem como foco principal uma problemática que se agrava no contexto da contemporaneidade: a adoção tardia. Dentre inúmeros desafios que o processo adotivo coloca em evidência, as dificuldades da adoção tardia ganham destaque preponderante, pois há um caráter específico nesse tipo relação familiar que se estabelece entre adotantes e adotados.
Importante entender o paradoxo que permeia a análise da questão, pois, encontramos de um lado inúmeras crianças maiores em busca de uma família para conviver; em contrapartida, muitos adotantes que não conseguem concretizar o processo.
A adoção tardia destaca-se em nossa sociedade atual, devido a sua alta incerteza, essas dúvidas têm um peso enorme no momento da concretização da adoção. Essa é apenas a ponta do iceberg, a qual desvendaremos no desenvolvimento desse estudo.
É importante frisar a importância do ECA na atualidade, pois trouxe em seu bojo, como objetivo principal, os direitos fundamentais em relação à criança e ao adolescente. Fato que não acontecia antes da década de 1980, pois a adoção era vista apenas como um ato de caridade. Mas, infelizmente, a realidade das crianças e dos adolescentes não é como a Constituição prevê.
Uma das razões pela qual o processo adotivo é demorado em nosso país está relacionado aos mitos e preconceitos da adoção tardia. Dentre eles podemos citar, a preferência por bebês, pois acredita-se que a criança maior pode trazer problemas de adaptação, pelo fato de já terem convivido com outras famílias e não terem se adaptado a esse processo. Já em relação ao preconceito, pode-se destacar que o adotante busca uma criança que tenha uma ascendência semelhante ao do seu núcleo familiar, entendendo que a sociedade poderá discriminar a criança mais tarde.
Dessarte, a sociedade como um todo tem preconceito em relação aos adotados, uma vez que, para muitos, só são considerados filhos aqueles que têm laços sanguíneos com seus pais. O que o corpo social não compreende é que os laços do amor podem ser muito mais fortes que os de sangue.
- CONCEITO DE ADOÇÃO
A palavra adoção tem origem no vocábulo latino “adoptio” que, de acordo com o dicionário Houaiss, pode ser definido como um processo judicial que acontece pela aceitação de uma criança ou adolescente como filho(a), respeitando-se as regras jurídicas que a definem.
Pode-se conceituar a adoção como sendo uma conduta lícita que visa a aquisição, o resguardo e a transmissão de um direito para uma pessoa, o qual exige que sua forma seja prescrita em lei e, por fim, um ato de aproximação que se estabelece entre duas pessoas. A construção da relação adotiva é instaurada por meio de um vínculo ilusório de filiação, trazendo para a família alguém na condição de filho(a), baseando somente nos laços do amor.
É importante frisar que tal instituto jurídico é um ato complexo, personalíssimo e que ocorre de forma irrevogável, criando assim, na área cível uma nova relação de parentesco, que se estabelece verticalmente entre adotante e sua família e o adotado, formando dessa maneira uma família socioafetiva.
O conceito jurídico de adoção, de acordo com Artur Marques1, é definido por renomados juristas com diferentes perspectivas que, no entanto, guardam uma identidade de significação, dentre elas, destaca:
Para Clóvis Beviláqua a adoção “é o ato civil pelo qual alguém aceita um estranho como filho”, do que discorda Rubens Limongi França, porque “o adotado pode não ser um estranho”. Segundo Antônio Chaves, a adoção “é um ato sinalagmático e solene, pelo qual, obedecidos os requisitos da lei, alguém estabelece a relação típica de paternidade-filiação, de efeitos limitados e sem total desligamento do adotando da sua família de sangue”
Além disso, importante destacar também o entendimento de Caio Mario da Silva, ditado por Artur Marques, o qual insinua “que adoção é ato jurídico pelo qual uma pessoa recebe a outra como filho, independentemente de existir entre elas qualquer relação de parentesco consanguíneo ou afim”.
A questão da adoção sempre esteve vinculada à ideia da assistência filantrópica e até o final do século XX haviam poucos estudos sistemáticos sobre o assunto. Nesse contexto, tornou-se comum uma visão social preconceituosa e estereotipada no que se refere ao processo adotivo. Somente a partir das duas décadas finais do século passado, estudos sobre o assunto passaram a ser divulgados. Além disso, surgiram debates entre profissionais da área de psicologia, assistentes sociais e pais adotivos a respeito desse processo.
Evidencia-se, na literatura específica, que essa forma de estrutura familiar sempre foi presente nas sociedades desde a antiguidade clássica, mas apenas na sociedade mais contemporânea esse importante tema passou a se destacar e, consequentemente, a ganhar devida importância.
- LEGISLAÇÃO SOBRE ADOÇÃO
Na contemporaneidade, o interesse da criança e do adolescente passou a ser colocado em destaque nas legislações importantes para a sociedade. Nesse contexto, o papel da adoção se deslocou da ideia de conceder uma criança para
1 FILHO, Artur Marques da Silva. Adoção: regime jurídico, requisitos, efeitos, inexistência, anulação. 4. ed. revista, atualizada e ampliada. São Paulo: Thonson Reuters Revista dos Tribunais, 2020, p. 65.
uma família, invertendo-se para dar uma família para uma criança, assegurando assim a dignidade ao adotado.
Tanto a Constituição de 1988, quanto o ECA e o Código Civil trouxeram dispositivos legais que garantem a dignidade, o respeito e a convivência familiar saudável para as crianças e adolescentes que precisam de uma estrutura familiar.
A regulamentação da adoção foi manifestada com o surgimento da nossa Constituição Federal, que nos remete em seu artigo 6º o instituto dos direitos sociais, o qual se refere à infância e à maternidade, construindo assim uma ponte direta com os princípios garantidos à criança e ao adolescente.
Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.2
O artigo 227 da Carta Magna de 1988 traz em seu bojo os direitos da criança e do adolescente, os quais são assegurados pelo Estado, sociedade e pela família. Cabe destacar que o §5º do referido artigo determina que a adoção será assegurada pelo poder público, em conformidade com a lei, que tratará da especificidade de cada caso.
Além disso, o §6º do mesmo dispositivo evidencia que os filhos adotados terão os mesmos direitos que os havidos no casamento. Nesse sentido, observa-se que a Constituição insere uma mudança de perspectiva em relação ao processo adotivo, tornando-o mais eficiente.
Nesse sentido, observa-se, então, que alguns princípios fundamentais são destacados em diversas leis e estatutos legais para proteger os direitos dos menores em nosso país. Um desses princípios existentes no nosso ordenamento jurídico é o princípio da proteção integral, no qual se observa os direitos que são inerentes a toda criança e adolescente.
Art. 227. [...] §5º A adoção será assistida pelo poder público, na forma da lei, que estabelecerá casos e condições de sua efetivação por parte de estrangeiros. §6º Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.3
2 BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 07 ago. 2021.
3 Ibid.
Sendo assim, nota-se que o Direito, por intermédio da Constituição Federal, aponta o início de uma nova postura em relação ao posicionamento adotado no que se refere às necessidades da criança e do adolescente. Para tal, usa como escopo o artigo 227, cujo princípio acima explicitado é claramente definido em seu texto.
No ECA, a questão da adoção é enfatizada nos artigos 39 a 43, destacando as regras que definem o processo adotivo na sociedade brasileira. Entretanto, pode- se analisar que o artigo 4º define um dos princípios basilares do ECA, que é o Princípio da Proteção Integral.
Art. 4º. A família, a comunidade, a sociedade e o poder público possuem a obrigação de garantir os direitos da criança e do adolescente. Esses entes alicerçam a forma básica de convivência humana.4
Importante frisar que o artigo 4º do ECA5 elenca a proteção dos direitos fundamentais da criança e do adolescente, sendo que em seu parágrafo único traz o que contém a prioridade. Cita-se como exemplo a precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública. Nesse sentido, é pertinente transcrever o referido artigo:
É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. Parágrafo único: A garantia de prioridade compreende: a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias; b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública; c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas; d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude.
Além disso, esse Estatuto institui, de forma absoluta, os três princípios que lhe orienta. O primeiro é o princípio da prioridade absoluta que visa assegurar os direitos da criança e do adolescente em suas esferas de interesse, quais sejam: judicial, extrajudicial, administrativo, social ou familiar, com base nos artigos 6º, 7º, inciso XXV, 227 e 229 da CFRB; e artigos 4º e 100, inciso II, do ECA.
4 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da Criança e do Adolescente: Doutrina e Jurisprudência.
Salvador: Juspodivm, 2019, p. 42.
5 BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente.
Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>. Acesso em: 15 ago. 2021.
O segundo princípio é o do melhor interesse, que traz em seu corpo, como objetivo principal, a priorização das necessidades da criança e do adolescente, como critério de interpretação da lei para a solução de conflitos ou elaboração de normas futuras, de acordo com artigo 227 CFRB.
Finalmente, o princípio da municipalização demonstra como indispensável o intuito de descomplicar o atendimento dos programas de assistência às crianças e aos adolescentes, visto que o Município tem como prioridade a conscientização das urgências infanto-juvenis e, consequentemente, execução da doutrina da proteção integral.
Ainda, no Estatuto da Criança e do Adolescente, o artigo 39 conduz e rege como será a adoção no nosso país, trazendo em seus três parágrafos as especificidades da adoção, dentre elas, o prevalecimento dos direitos e interesses do adotando em caso de conflito e a vedação da adoção por procuração.
Na sequência, o artigo 40 traz em seu teor que o adotante terá que ser maior de idade na data do pedido de adoção, porém não é necessário se o adotante já estiver com a guarda ou tutela da criança ou adolescente.
Posteriormente, o artigo 41 do ECA evidencia que o adotado, na condição de filho, tem todos os direitos e deveres inerentes à essa posição, afastando qualquer elo com sua família biológica, exceto os impedimentos matrimoniais.
O ECA repetiu essa ideia, prevendo que o filho adotivo se desliga de qualquer vínculo em relação aos genitores biológicos e parentes, salvo nos casos de impedimentos. Para tanto, no escopo de rompimento da relação anterior, certidão de nascimento é cancelada, lavrando-se nova com os dados do adotante. 6
É relevante destacar que no tocante aos laços familiares do adotando, os mesmos não se extinguem em relação aos impedimentos matrimoniais, uma vez que se tratam de impedir situações extravagantes, salvaguardando assim a moral e os bons costumes e, consequentemente, impedem que aconteçam relações incestuosas.
Art. 41. A adoção atribui a condição de filho ao adotado, com os mesmos direitos e deveres, inclusive sucessórios, desligando-o de qualquer vínculo com pais e parentes, salvo os impedimentos matrimoniais. §1º Se um dos
6 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da Criança e do Adolescente: Doutrina e Jurisprudência.
Salvador: Juspodivm, 2019, p. 176.
cônjuges ou concubinos adota o filho do outro, mantêm-se os vínculos de filiação entre o adotado e o cônjuge ou concubino do adotante e os respectivos parentes. §2º É recíproco o direito sucessório entre o adotado, seus descendentes, o adotante, seus ascendentes, descendentes e colaterais até o 4º grau, observada a ordem de vocação hereditária.7
Em relação ao artigo 42, observa-se em seu caput, como condição, que só estão aptos para adotar os maiores de 18 anos, sendo inobstante seu estado civil, e traz em seus seis parágrafos as restrições deste encargo. Dentre eles, podemos mencionar que não podem adotar os ascendentes e os irmãos do adotando.
Adoção por casal anaparental. O termo “anaparental” significa a existência de uma família com parentesco, mas sem vinculo de ascendência ou descendência. É o caso de dois irmãos. Pela interpretação estrita da lei, não haveria essa possibilidade. Analisando um caso de irmão e irmã que desejavam adotar, a Min. Nancy Andrighi entendeu possível, devendo a regra ser alvo de flexibilização, quando se detecta uma família estável (STJ, REsp 1.217.415/RS.j. 19.02.2012).8
Cabe destacar que é inobstante ser casado ou conviver em uma união estável, ou ter qualquer posição sexual para estar apto a adotar, bastando assim à pessoa interessada ter idade superior a 18 anos que já se enquadra nas regras.
Por fim, o artigo 43 do ECA nos traz a reflexão de que a aprovação da adoção será positivada quando houver vantagens para a criança ou adolescente e se basear em razões legítimas: “A adoção será deferida quando apresentar reais vantagens para o adotando, e fundar-se em motivos legítimos”.9
Em síntese, é importante atentar para a importância dos princípios elencados no ECA, pois eles são a base da garantia dos direitos da criança e do adolescente, que passam a ser respeitados como sujeitos de direito.
Na legislação contida no Código Civil vigente, há dois artigos que abordam a questão da adoção, os artigos 1.618 e 1.619 da referida lei.
O artigo 1.618 salienta que a adoção de crianças e adolescentes será outorgada nos termos do ECA, e o artigo 1.619 estipula que a adoção de pessoas maiores de 18 anos necessita da assistência real do poder público, e de sentença constitutiva, empregando no que for possível as regras gerais do ECA.
7 BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente.
Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>. Acesso em: 25 ago. 2021.
8 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da Criança e do Adolescente: Doutrina e Jurisprudência.
Salvador: Juspodivm, 2019, p. 181.
9 BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente.
Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>. Acesso em: 25 ago. 2021.
Portanto, é relevante destacar que as garantias fundamentais da criança e do adolescente na atualidade se ampliaram para garantir o desenvolvimento integral desses menores. Nesse sentido, a convivência familiar saudável é pressuposto essencial e, na medida que as leis se ajustam para que essas necessidades se efetivem, fatalmente construí-se uma sociedade mais justa e equânime.
Quanto à Lei da Adoção, nº 12.010/2009, essa foi criada com o intuito de promover mais celeridade aos procedimentos de adoção e dizimar o tempo de permanência de crianças e adolescentes nas instituições. Sendo assim, promove inovações importantes no texto do ECA e, consequentemente, um aprimoramento da sistemática, que é prevista para a garantia do direito à convivência familiar a todos menores.
Além disso, podemos observar que a instituição da referida lei trouxe significativas inovações, objetivando assim o melhoramento do processo, para garantir o direito de convivência com a família para todas as crianças e adolescentes. Podemos citar como exemplo de tal melhoria o ajuste da maioridade, o programa de acolhimento familiar ou institucional e o atendimento psicológico durante a gestação.
Tal lei traz em seu conteúdo a coabitação familiar e comunitária, estipulando assim as condições da criança. Outro aspecto, diz respeito a qual seria o tempo máximo de permanência em acolhimento institucional. Também define a manutenção ou restituição de criança ou adolescente à sua família, que terá prioridade em relação a qualquer ação.
Por fim, destaca-se que o objetivo mais importante da Lei 12.010 é propiciar cada vez mais o respeito pelo indivíduo e sua realização pessoal, pois é a família, seja ela estabelecida pelos vínculos sanguíneos ou de amor, a garantia da dignidade humana. Assim, tanto os adotantes que procuram um filho quanto os menores que precisam de proteção, cuidado e amor poderão ser beneficiados por um desfecho jurídico mais rápido e humano. Nesse sentido, a sociedade também será beneficiada, pois a entidade familiar é a base de uma estrutura social mais equilibrada.
- PROCEDIMENTO DA ADOÇÃO
O procedimento vigente para a habilitação à adoção foi instituído pela Lei 12.010/200910, a qual sofreu modificações com a Lei 13.509/201711. O presente trâmite tem por objeto incluir pessoas que possuam interesse em adotar crianças e adolescentes no CNA (Cadastro Nacional de Adotantes) em conformidade com o artigo 50 do ECA. Posteriormente à inscrição, os postulantes deverão esperar o chamamento, cumprindo a ordem cronológica de habilitação de acordo com a disponibilidade de crianças a serem adotadas.
Nesse sentido, é relevante transcrever o caput do artigo 50 do ECA12, que especifica essas regras legais: “A autoridade judiciária manterá, em cada comarca ou foro regional, um registro de crianças e adolescentes em condições de serem adotados e outro de pessoas interessadas na adoção”.
Frisa ressaltar que a pretensão realizada pelas partes interessadas na adoção terá que ser exposta ao magistrado da vara competente, abarcando assim as elucidações e documentos elencados no artigo 197-A do ECA13, dentre eles a qualificação, dados familiares, documentos pessoais, certidões negativas cível e criminal, e comprovação de sanidade física e mental.
Nesse sentido, pode-se concluir que esses procedimentos são essenciais para que, de fato, as crianças e adolescentes estejam resguardados em seus direitos fundamentais. Sendo exigido que o adotante que aguarda sua convocação faça a renovação de sua habilitação trienalmente, mantendo assim sua aptidão para a realização do processo adotivo.
- Requisitos do adotante e do adotado
Na perspectiva da imagem do adotante é primordial frisar que o pressuposto fundamental é o desejo de ter um filho, ofertando-lhe amor, educação, família, saúde e lazer.
Ao se tratar dos requisitos do adotante, observa-se algumas constantes que se mantêm ao longo da história da adoção. Tais pressupostos também são
10 BRASIL, Lei nº 12.010, de 3 de agosto de 2009. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l12010.htm>. Acesso em: 05 set. 2021.
11 BRASIL, Lei nº 13.509, de 22 de novembro de 2017. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/l13509.htm>. Acesso em: 05 set. 2021.
12 BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente.
Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>. Acesso em: 05 set. 2021.
13 Ibid.
privilegiados no ECA, embora com muito mais atualidade e seguindo princípios constitucionais relevantes em relação à salvaguarda do adotando. Dentre eles, destacam-se a diferença de idade entre adotante e adotado, a idade mínima para adoção, além de outras limitações e proibições.
Cabe ressaltar que a ocorrência da aprovação da adoção, depende de inúmeros requisitos que necessitam ser realizados para efetivar o processo adotivo. Nesse sentido, a adoção exige que o adotante esteja capacitado para assumir esse ato jurídico, além de demonstrar interesse legítimo para tal ação.
Para que o adotante possa realizar o ato de adotar, não é suficiente ter 18 anos, a pessoa tem que apresentar a chamada capacidade plena, incluindo a de direito ou a de gozo e a de exercício ou de fato, uma vez que a mesma é imprescindível para que tal procedimento seja realizado. Portanto, o adotante deve ser livre para cumprir seus direitos e deveres, sem nenhum impedimento no campo jurídico.
Ainda, cumpre ressaltar que, referente ao direito de ação, não é suficiente ser capaz, exigindo também que haja legitimidade, ou seja, o adotante tem que ter interesse para mobilizar a relação processual. Como explica Artur Marques da Silva Filho,14 a “legitimação é a posição da pessoa em relação a determinados bens ou em relação a especiais categorias de atos jurídicos.”
Evidencia-se, então, que a legitimação pressupõe observar se o indivíduo que se candidata como adotante possui capacidade real para estabelecer a referida ação. Nesse sentido, é uma forma de averiguação específica para que se possa cumprir um ato da vida civil.
Com relação a diferença de idade entre adotante e adotando, é obrigatória que seja de, no mínimo, 16 anos, pois é fundamental que haja respeito e rigidez, uma vez que há a necessidade de que a entidade familiar substituta seja semelhante à família originária. Nesse caso, cumpre-se uma distância temporal com objetivo de manter uma relação de respeito e hierarquia, fundamental a um convívio saudável e respeitoso. De acordo com Venosa15:
14 FILHO, Artur Marques da Silva. Adoção: regime jurídico, requisitos, efeitos, inexistência, anulação. 4. ed. revista, atualizada e ampliada. São Paulo: Thonson Reuters Revista dos Tribunais, 2020, p. 74.
15 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito de Família. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2011, p. 290.
Exige-se, que a idade do adotante seja superior a dezesseis anos, pelo menos, à do adotado. Assim a diferença de idade se explica diante da expectativa de vida, a fim de que possa bem orientar o adotado, ou até mesmo com o intuito de igualar a adoção a família biológica.
Entretanto, ressalta-se que em relação à maturidade para a construção de uma família através da adoção é independente da diferença de idade, uma vez que para formar uma família o basilar é ter consciência que o ato de adotar nos remete a um compromisso.
Pode-se citar como proibições a discriminação entre os filhos (artigo 227,
§6º da CFRB), o empecilho da adoção por irmãos e ascendentes do adotando (artigo 42, §1º do ECA), a vedação da adoção por procuração (artigo 39, §2º do ECA) e, por fim, um impedimento por tempo determinado ou relativo relacionado ao tutor ou curador (artigo 44 do ECA).
Obsta destacar que as pessoas que vivem em união estável estão aptas a adotarem, contanto que fique evidenciada a continuidade da família e, igualmente, os divorciados e separados judicialmente na condição que ambos concordem em relação ao regime de visitas e a guarda, e que o estágio de convivência e o regime de visitas tenha sido instituídos durante o casamento.
Em suma, os requisitos do adotante são parâmetros que garantem ao adotado segurança jurídica e emocional em relação à nova família que o acolheu. Nesse aspecto, a capacidade plena do adotante para que, de fato, possa cumprir integralmente todos os direitos e deveres que são inerentes a um ato tão importante como esse.
No que concerne aos requisitos do adotado, é importante frisar que na data do pedido, o adotado não poderá ter idade superior a 18 anos, com exceção dos casos em que esse indivíduo já se encontre sob guarda ou tutela do adotante.
Cabe destacar ainda que, em conformidade aos requisitos do adotando, outros aspectos explicitados pelo ECA são relevantes, como explica Nader16: “Sobre a adoção por ascendentes ou irmãos: As vedações do ECA se justificam, pois seria inconcebível que alguém pudesse ser ao mesmo tempo avô biológico e pai adotivo”.
Partindo da compreensão do autor acima citado, deve-se analisar cada caso concreto, uma vez que a adoção pelos avós pode sim ser a melhor opção. Outra
16 NADER, Paulo. Direito de Família. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011, p. 329.
proibição que é trazida é a adoção por irmãos, considerando que a situação de filho ao adotado não é compatível com o caráter de tal instituto.
Outra questão problemática diz respeito à adoção de nascituro, uma vez que o ato adotivo está condicionado à personalidade civil, que só acontece a partir do momento do nascimento da criança com vida, quando assume seus direitos de personalidade.
No ordenamento jurídico vigente existem duas correntes teóricas sobre o nascituro ter ou não personalidade. Entretanto, a corrente adotada pelo Código Civil de 2002 explicita a teoria natalista, que nada mais é do que “a criança nascer com vida”. No caso, do feto nascer morto não se tem a personalidade jurídica, uma vez que mortos não têm direitos nem deveres.
Portanto, pode-se concluir que qualquer criança ou adolescente, de qualquer sexo ou idade, está apto a ser adotado, desde que as ressalvas legais para a efetivação do processo sejam, integralmente, cumpridas.
- Sentença proferida na adoção e seus efeitos
A respeito da sentença, explicita o artigo 162, parágrafo 1º do CPC que: “a sentença é o ato pelo qual o juiz põe termo ao processo, decidindo ou não sobre o mérito da causa”.17
Deve-se destacar que o ato da adoção se constrói apenas por meio da sentença judicial. Com o surgimento da Lei nº 8069/90, não se tem mais a chance de adotar criança ou adolescente através de escritura pública. Da mesma forma, com a admissão do Código Civil de 2002, apenas ocorrerá a adoção por meio de procedimento judicial.
Inusitadamente o Estatuto da Criança e do Adolescente no artigo 199-A antevê que a sentença que outorgar o instituto da adoção gera efeito imediatamente, apesar de submetida à apelação, que tornar-se-á obtida apenas no efeito devolutivo, exceto se ocorrer perigo de dano insanável ou de custoso reparo ao adotando.
Sobre este assunto dispõe Venosa18: “Caberá ao juiz utilizar do melhor critério para a avaliação da possibilidade de dano ao adotando, para receber a apelação em ambos os efeitos”.
17 BRASIL, Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 – Código de Processo Civil. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em 12 set. 2021.
No procedimento registral, mantém-se a disposição de que o elo da adoção forma-se por meio de mandado judicial, que necessitará ser exposto no Registro Civil de Pessoas Naturais competente. Entretanto, não existe mais a obrigatoriedade da abertura de uma nova certidão de nascimento ocorrer vinculada à residência do adotante, podendo assim ser realizado o documento no Município em que o adotado já tinha sido registrado ou no domicílio de sua família atual.
Outra mudança de suma importância que ocorreu em relação ao registro de nascimento, diz respeito ao sigilo de informações e as emissões das certidões nessas hipóteses. Sendo assim, continua sendo proibida a expedição de certidão de inteiro teor, exceto se houver mandado judicial consentindo.
O procedimento e a decretação definitiva da adoção possui vários efeitos, tanto pessoais quanto patrimoniais. Pode-se salientar que o efeito essencial é a constituição do parentesco civil, o qual se iguala ao consanguíneo. Porém, existem outros efeitos como o nome dos adotantes como genitores e a alteração do prenome, e a nacionalidade que é definida conforme a nacionalidade dos genitores e a territorialidade, ou seja, jus sanguinis e o jus soli.
De acordo com Pontes de Miranda apud Artur Marques da Silva Filho19, a questão da nacionalidade pode ser assim explicada:
Pontes de Miranda lecionou que a dificuldade ou impossibilidade de definir nacionalidade, a que se referem os autores, deriva do fato de não se reportarem somente à relação jurídica. Na sua visão, “nacionalidade é o laço jurídico-politico de direito público interno, que se faz da pessoa um dos elementos componentes da dimensão pessoal do Estado.
Com relação aos efeitos patrimoniais da adoção, destacam-se o direito a alimentos, os direitos sucessórios, a administração dos bens do adotado, e a responsabilidade civil dos pais pelos filhos.
Em resumo, pode-se enfatizar que as leis brasileiras em relação aos direitos sucessórios e alimentar dos adotados é totalmente coerente, pois eles adquirem com o processo adotivo os mesmos direitos que têm os filhos legítimos.
- Adoção conjunta, unilateral e por tutor ou curador
18 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito de Família. 11. Ed. São Paulo: Atlas, 2011, p. 296.
19 FILHO, Artur Marques da Silva. Adoção: regime jurídico, requisitos, efeitos, inexistência, anulação. 4. ed. revista, atualizada e ampliada. São Paulo: Thonson Reuters Revista dos Tribunais, 2020, p.208.
O instituto da adoção conjunta pode ser observado no artigo 42, §2° do ECA20, que explicita: “Para adoção conjunta, é indispensável que os adotantes sejam casados civilmente ou mantenham união estável, comprovada a estabilidade da família.
Nesse sentido, entende-se que a adoção conjunta é condicionada pela condição da estabilidade familiar, visando o bem estar do adotado. Como regra geral, a adoção conjunta sempre funcionou como a base deste instituto. De acordo com Maria Berenice Dias “Parece que é para adoção imitar a vida. Ledo engano. Crianças e adolescentes precisam de um lar.”21
O instituto da adoção unilateral pode ser definido como sendo: aquele “que ocorre quando há a manutenção dos vínculos de filiação com um dos genitores, fazendo com que surja o vínculo civil com o(a) companheiro(a) ou com cônjuge do genitor.”22
No nosso ordenamento jurídico tal classificação poderá acontecer em três situações: quando constar apenas o nome de um dos seus genitores na certidão de nascimento, necessitando assim ter a aquiescência por parte daquele genitor biológico; quando constar o nome do seu pai ou mãe biológica na certidão, situação que será necessário ter a destituição do poder familiar, daquele que deixará de obter o vínculo com o menor por meio do procedimento específico, além da concordância do genitor, com o qual permanecerá o vínculo; e, por fim, na hipótese do companheiro(a) ou cônjuge adotar quando o pai ou a mãe do menor tiver ido a óbito, bastando assim apenas a autorização do outro genitor.
Em suma, é relevante destacar que este instituto não trata apenas da adoção, mas de reconhecimento de filiação socioafetiva. Além disso, a adoção unilateral aparece como uma das poucas exceções à obediência ao cadastro de adotantes.
Na hipótese de adoção por tutor ou curador, poderá ser concretizada desde que o tutor ou curador cumpra com as exigências que são trazidas no bojo da lei. Tal medida é realizada para que a criança ou adolescente não seja ludibriada, para que
20 BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente.
Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>. Acesso em: 13 set. 2021.
21 DIAS, Maria Berenice. Filhos do Afeto. Questões Jurídicas. 2. ed. São Paulo: Thonson Reuters Revista dos Tribunais, 2019, p. 73.
22 PEREIRA, Tânia da Silva, Tratado de Direito das Famílias, 3. ed. Belo Horizonte: IBDFAM, 2019, p.431.
não ocorram prováveis apropriações, ou até mesmo a dilapidação de seus bens móveis ou imóveis.
O artigo 44 do ECA demostra tal obrigação: “Enquanto não der conta de sua administração e saldar o seu alcance, não pode o tutor ou o curador adotar o pupilo ou o curatelado.” 23
Em casos em que hajam dúvidas em relação à credibilidade do tutor ou curador, quando não realizarem as obrigações determinadas pela lei, a adoção não será concretizada, uma vez que é priorizado os interesses do menor. Não é consentido ao tutor ou curador sacar vantagens do instituto da adoção, sendo assim, a tutela ou curatela só será dada através de testamento.
Nessa perspectiva, tal modalidade terá de ser autorizada pelos pais ou representante legal do menor que será adotado, em conformidade com o caput do artigo 45 do ECA24, porém, a concordância dos genitores será desnecessária, caso o paradeiro dos mesmos seja desconhecido ou tenham sidos destituídos do poder familiar, de acordo com o disposto no artigo 45, §1° do ECA25.
Entretanto, caso a adoção que será realizada seja de adolescente com idade superior a 12 anos, necessitará da aquiescência do adotado, para que o ato seja válido e eficaz de acordo com o trazido no artigo 45, §2° do ECA26.
- Adoção à brasileira
Tal modalidade de adoção é a conduta de registrar um filho de outra pessoa em nome de outro casal, os quais não são seus genitores biológicos e não cumpriram com o procedimento legal para a realização da adoção.
Tânia da Silva Pereira no livro Tratado de Direito das Famílias27 conceitua o que entende-se por adoção à brasileira:
A adoção à brasileira ou afetiva é aquela em que uma pessoa registra como seu o filho de outrem, usando declarações falsas das maternidades ou
23 BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente.
Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>. Acesso em: 18 set. 2021.
24 Ibid.
25 Ibid.
26 Ibid.
27 PEREIRA, Tânia da Silva, Tratado de Direito das Famílias, 3. ed. Belo Horizonte: IBDFAM, 2019, p.438.
hospitais, ou mesmo comparecendo a suposta mãe a cartório acompanhada de duas testemunhas e declarar que teve o filho em casa.
De fato, grande parte das adoções realizadas em nosso país acontece de forma informal. A luta pela extinção de tal adoção, também se fundamenta na proporção em que o ato de adotar tem a possibilidade de ser concretizado de forma rentável para a mãe biológica ou o casal de genitores. Criminalizar tal ato é o jeito de apoiar a família, que é primordial no desenvolvimento saudável de qualquer indivíduo, essencialmente para os adotados. Tal criminalização pode ser observada no artigo 242 do Código Penal Brasileiro28.
Importa frisar que outro argumento que instiga a prática do instituto da adoção é que na ocorrência dos parâmetros legais, há exigências a serem realizadas na totalidade do processo, necessitando-se, assim, esperar, no desfecho, uma decisão do magistrado, que examinará os requisitos e, constatando o afastamento destes, não dará a solicitação como deferida.
Lembrando que o instituto da adoção só será realizado posteriormente a averiguação do magistrado, uma vez que ocorre por meio de uma ação judicial.
- Adoção de grupos de irmãos
A maioria dos menores acolhidos pelos abrigos é constituída por grupos de irmãos, contudo, em conformidade com a Lei 12.010/2009, será vedado o afastamento de grupo de irmãos, com exceção dos casos em que for legítimo o motivo, retratando assim o melhor interesse para a criança ou adolescente. Tal afirmação pode ser verificada no artigo 28, §4° do ECA29:
Art. 28. [...] §4º. Os grupos de irmãos serão colocados sob adoção, tutela ou guarda da mesma família substituta, ressalvada a comprovada existência de risco de abuso ou outra situação que justifique plenamente a excepcionalidade de solução diversa, procurando-se, em qualquer caso, evitar o rompimento definitivo dos vínculos fraternais.
Nesse sentido, é imprescindível que haja um trabalho minucioso efetuado pelo Poder Judiciário, comprovando assim, a relevância de tal instituto, propiciando
28 BRASIL, Decreto-lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm>. Acesso em: 21 set. 2021.
29 BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente.
Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>. Acesso em: 22 set. 2021.
aos menores a chance de uma coabitação familiar, totalmente plena, em um ambiente saudável a sua evolução.
- ADOÇÃO TARDIA
A modalidade de adoção tardia é um assunto que tem uma representatividade muito grande na nossa comunidade, uma vez que, é por meio desse ato que os menores abandonados, com idade maior, que já sofreram rejeição de sua família biológica ou até mesmo afetiva, ganham uma nova chance de serem felizes, de terem um lar saudável e, por conseguinte, se sentirem parte desse meio.
4.1 Conceito e período de adaptação
Pode-se definir a adoção tardia como sendo um processo adotivo que se realiza quando o menor já apresenta um desenvolvimento parcial que o capacita a ter alguma compreensão da realidade que o cerca, apresentando, portanto, uma relativa independência e comunicação com a sociedade em que está inserido.
Ressalta-se, além disso, que não existe uma idade certa para que a adoção seja considerada tardia. Entretanto, alguns renomados autores da área de direito de família estipulam idades diferenciadas para considerarem a adoção como tardia.
Nesse sentido, o autor Hélio Ferraz30 reconhece como sendo adoção tardia crianças acima de 6 anos e adolescentes. Contudo, independente de uma definição única de idade correta para esclarecer o conceito de adoção tardia, é relevante destacar a importância de tal instituto, como esclarece o referido autor: “É considerada ‘especialmente necessária’ em razão da dificuldade de localização de pretendentes à adoção com o perfil adotivo para crianças mais velhas.”
Assim como nas outras modalidades de adoção, no presente instituto tem-se a necessidade da realização do período de adaptação entre os adotandos e os pretendentes. Tal procedimento é realizado com a finalidade de ambas as partes se conhecerem melhor, saberem de forma mais aprofundada sobre a coexistência familiar e os costumes, em suma, a criação de um novo elo familiar, uma vez que o objetivo é ofertar uma moradia apropriada para o novo membro familiar.
30 OLIVEIRA, Hélio Ferraz de. Adoção. Aspectos Jurídicos, práticos e efetivos. 3. ed. Leme: Mundo Jurídico. 2020, p. 73.
A fase de adequação é complicada e fundamental no processo da adoção de crianças de mais idade, mesmo que não seja suscetível de universalização. Dessa forma, no decurso do estágio de convivência, o possível adotado, além de passar pelo convívio com os possíveis adotantes, também vivencia um processo de assistência psicológica e social, em que os profissionais envolvidos fornecerão subsequentemente a sua avaliação acerca daquele processo.
O estágio de convivência é um importante requisito presente no Estatuto da Criança e do Adolescente, tal requisito permite que os pais e o menor convivam intimamente por até 90 dias (prorrogável por igual período), como forma de teste de afetividade. [...] O estágio de convivência se trata de uma exigência legal, todavia, esta pode ser dispensada em situações excepcionais, como por exemplo, quando é realizada uma análise pela equipe de profissionais que contribuem com o processo de adoção e percebem que o infante já reside com o interessado por um período favorável e os laços afetivos já se consolidaram. [...]31
Nessa perspectiva, esta fase é fundamental, uma vez que é trazida a chance de aferir na prática se os postulantes à adoção e o menor encontram-se preparados para este passo, ofertando assim a oportunidade de se conhecerem mais profundamente.
Importa frisar que o processo adotivo segue parâmetros pré-estabelecidos, entretanto, cada caso é único. Assim, no estágio de convivência, na maioria das vezes, ocorrem comportamentos padronizados, os quais podemos chamar de peculiaridades dessa fase, como explica Niva Maria Vasques Campos32, são os seguintes tópicos: surgimento de comportamentos regressivos na criança; agressividade; agressividade em particular contra a mãe adotiva; ritmo acelerado de desenvolvimento global da criança; enfrentamento do preconceito social; esforço significativo da criança para se identificar com os novos modelos parentais; construção do vínculo de filiação com atropelamento de etapas; o vínculo de filiação pode se dar de forma diferenciada; aquisição de novos hábitos; aquisição de novos hábitos alimentares; a criança constrói um novo “eu”; mobilização de emoções
31 CHOCIAI, Anna Danyelly; SILVA, Elcio Domingues. O estágio de convivência e a adoção psicológica. Disponível em: < https://ibdfam.org.br/artigos/1593/O+est%C3%A1gio+de+conviv%C3%AAncia+e+a+ado%C3%A7%C 3%A3o+psicol%C3%B3gica>. Acesso em 30 set. 2021.
32 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIO – TJDFT, 2017. CAMPOS,
Niva Maria Vasques. Adoção tardia – características do estágio de convivência. Disponível em: < https://www.tjdft.jus.br/informacoes/infancia-e-juventude/publicacoes-textos-e-artigos/textos-e- artigos/adocao-tardia>. Acesso em: 02 out. 2021.
intensas e carregadas de ambivalência; Sentimentos de vulnerabilidade; impotência e culpa; a criança se mostra “imatura” para determinadas coisas e “muito avançada” para outras; enfrentamento da curiosidade; e preconceito social.
É indispensável que os trabalhadores capacitados para o processo de adoção, principalmente em relação ao assistente social que se incorpora ao grupo interdisciplinar com um olhar mais direcionado na integralidade, com a finalidade de atestar direitos de um determinado menor, elucidem ao grupo familiar pretendente à adoção as adversidades pertencentes a essa fase de adequação.
Dito isso, podemos concluir que é no decorrer do período de convivência que são analisadas minuciosamente as vantagens de construção do vínculo e, concomitantemente, traz a indispensabilidade de se aprontar para a modificação que acontecerá na vida dos novos genitores quando não ganharem um bebê. Essa circunstância causa dúvida e insegurança aos pretendentes à adoção, uma vez que eles não terão apenas que se acostumar com o infante, mas também com as suas práticas e rotinas.
- Mitos e Preconceitos
Embora haja um ponto de vista sobre o que é a cultura da adoção, a qual busca atender a indispensabilidade do infante ter uma família, a fatalidade de o menor estar pronto para ser adotado é agravada quando ele não atende às expectativas dos adotantes, que buscam perfis de crianças que se enquadrem nos padrões da sociedade.
Em relação à adoção tardia alguns entraves são recorrentes, pois a visão generalizada é a de que as crianças mais velhas têm experiências pregressas que afetariam sua capacidade de absorver novos valores de educação que seriam estipulados pelos pais adotivos. Nesse sentido, Simone Cunha, cita a explicação da assistente social Luciana Lacerda, pertencente à Comissão Estadual Judiciária de Adoção (CEJA) do Poder Judiciário do Espírito Santo:
O principal aspecto alegado pelos pretendentes para evitar a adoção tardia é o medo de que o adotado já tenha uma ‘personalidade formada’, e o que
traria dificuldades na educação, pois ele não aceitaria os padrões estabelecidos pelos pais adotivos.33
Na atualidade o número de crianças aptas a serem adotadas é inferior ao número de pessoas interessadas na adoção. Isso ocorre em nosso território, uma vez que, os pretendentes à adoção escolhem o perfil do infante, como por exemplo, a idade, a cor, se tem ou não doenças, entre outros aspectos.
[...] enquanto 8,7 mil crianças e adolescentes no Brasil esperam para ser adotadas, 43,6 mil cadastros de famílias interessadas integram o Cadastro Nacional de Adoção (CNA). O número de candidatos a pais, portanto, é quase seis vezes maior que a quantidade de pequenos que aguardam um lar. Os dados são do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).34
Em conformidade com a agência de notícias do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)35 podemos observar a discrepância que ocorre no nosso sistema:
[...] dados do Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA), do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), indicam que mais de 30 mil crianças e adolescentes estão em situação de acolhimento em mais 4.533 unidades em todo o país. Deste total, 5.154 mil estão aptas a serem adotadas.
Sendo assim, atualmente, segundo dados do CNJ, temos aproximadamente oito mil infantes, os quais estão no período da primeira infância, que é de 0 a 6 anos. Estes menores encontram-se em condição de abrigo, sendo que a maioria é do sexo masculino. Entretanto, dessa totalidade, quase dois mil abrigados com idade de até
3 anos esperam num prazo de até seis meses para voltarem para sua família biológica ou serem adotados. Já em relação aos menores que estão na faixa etária entre 3 e 6 anos mantém-se no acolhimento institucional por um período mais prolongado, entre um a dois anos.36
33 UNIVERSAL UOL, 2018. CUNHA, Simone. Adoção tardia: pais falam sobre os desafios e alegrias dessa escolha. Disponível em: < https://www.uol.com.br/universa/noticias/redacao/2018/12/06/adocao-tardia-pais-de-criancas-mais- velhas-listam-seus-desafios-e-alegrias.htm>. Acesso em: 02 out. 2021.
34 GAZETA DO POVO, 2018. Número de famílias interessadas em adotar é 5,5 vezes maior que o de crianças abandonadas. Disponível em: < https://www.gazetadopovo.com.br/justica/numero-de- familias-interessadas-em-adotar-e-55-vezes-maior-que-o-de-criancas-abandonadas- bmpcw6708bzshf8acp6xc5r20/>. Acesso em: 02 out. 2021.
35 CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, CNJ, 2020. Mais de 5 mil crianças estão disponíveis para adoção no Brasil. Disponível em: < https://www.cnj.jus.br/mais-de-5-mil-criancas-estao- disponiveis-para-adocao-no-brasil/>. Acesso em 06 out. 2021.
36 Ibid.
Porém, não menos importante, a faixa etária que abarca a maioria dos acolhidos no nosso país é de adolescentes. Na totalidade são aproximadamente nove mil, com idade superior a 15 anos, sendo que a maior parte são do sexo masculino.37
Posto isto, o aguardo por um infante no demorado processo de adoção é rodeada por sensações marcantes e expectações sobre o amanhã. A insegurança e as dúvidas permeiam o ambiente vivido pelos pretendentes à adoção. Na hipótese do menor com mais idade as incertezas aumentam, uma vez que a maioria passou por traumas irreparáveis.
Os mitos que formam a cultura da adoção na modernidade são impedimentos à concretização da adoção de infantes com mais idade, casos recorrentes no nosso ordenamento jurídico comprovam essa infeliz realidade. Sendo assim, acaba que a preferência é para adoção de recém-nascidos e bebês e, consequentemente, os menores mais velhos acabam sendo colocados para o final da fila e esquecidos, uma vez que já têm sua personalidade parcialmente formada.
Cabe frisar que a modernidade, marcada por novas tecnologias de comunicação, apresenta uma mídia que reforça alguns pré-conceitos por meio de filmes, novelas, desenhos animados e literatura, corroborando na criação do modelo perfeito de filho que os adotantes desejam e, dessa forma, perpetuando estigmas que deveriam ser eliminados.
Desse modo, podemos concluir que a proximidade entre adotante e adotado é demasiadamente delicada, entretanto o elo que é instituído entre eles é de igual importância ao estabelecido entre pais e filhos biológicos.
- Possíveis Soluções Diferenciadas
Como podemos observar até o presente momento, a adoção tardia é dificultada pela cultura e pelo imaginário do corpo social, como também pela lentidão do processo de adoção perante a justiça, situações que ampliam o tempo dos infantes em entidades de acolhimento. Nesse sentido, as crianças abrigadas não têm os direitos necessários para o seu desenvolvimento saudável e pleno. Sendo
37 Ibid.
assim, nos vem à mente a seguinte indagação: como concretizar a adoção tardia diante das leis que vigoram em nosso país?
Antes de tudo, é primordial que identifiquemos quem obtém a legitimidade ou encargo substancial por aplicar os cursos que preparam os candidatos interessados para a adoção. Em conformidade com a legislação, o mencionado curso deve ser aplicado pelo staff técnico da Justiça da Infância e da Juventude, de preferência com o suporte dos técnicos incumbidos por executar a política municipal de proteção ao direito à coabitação familiar. Podemos confirmar tal escrita no artigo 50, §3° ECA:
Art. 50. [...] §3º. A inscrição de postulantes à adoção será precedida de um período de preparação psicossocial e jurídica, orientado pela equipe técnica da Justiça da Infância e da Juventude, preferencialmente com apoio dos técnicos responsáveis pela execução da política municipal de garantia do direito à convivência familiar.38
Entretanto, o que é visto, verdadeiramente, é que na maioria das vezes não existe uma equipe técnica em todas as comarcas do nosso país. Sendo assim, como uma possível amenização dos problemas, os próprios interessados à adoção têm feito grupos de apoio à adoção e, através de voluntários, desempenham tal elaboração descrita na legislação. Os voluntários são das mais diversas áreas, como por exemplo psicólogos, assistentes sociais, advogados, entre outros.
Podemos observar que o comprometimento da comunidade diante da supressão de material humano especializado no Poder Judiciário, para que o trabalho seja executado de forma correta, é nobre. Logo, é indispensável que tenha uma padronização dos métodos para a execução do citado curso.
Uma provável trilha é o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) preparar um material audiovisual a respeito da adoção para ser disseminado por todas as comarcas, assim como também uma cartilha impressa, com a garantia de que todos terão acesso ao mesmo material básico, uma vez que nem todas as Comarcas têm a mesma estrutura técnica.
Frisa destacar que, uma das aptidões do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) é cuidar da independência do Poder Judiciário e, por conseguinte, a efetivação do Estatuto da Magistratura, possibilitando, assim, enviar atos
38 BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente.
Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>. Acesso em: 08 out. 2021
regulamentares, no campo de sua capacidade, sugerir providências, conforme disposto no artigo 103-B, §4°, I da CFRB:
Art. 103-B [...] §4º [...] I. zelar pela autonomia do Poder Judiciário e pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar providências;39
Nesse sentido, a realização de um material bem elaborado traz informações corretas de todos os tipos de adoções e suas especificidades, atestando assim, que a quantidade de crianças e adolescentes aptas à adoção que obtenham conservado o direito ao convívio familiar e comunitário seja maior.
Outro aspecto ao qual devemos dar ênfase é o que está disposto no artigo 197-C, §2° do ECA, visto que o evidenciado em tal artigo não é cumprido nem respeitado pela nossa sociedade, por não haver materiais adequados para tal operação.
Art. 197-C [...] §2º. Sempre que possível e recomendável, a etapa obrigatória da preparação referida no §1° deste artigo incluirá o contato com crianças e adolescentes em regime de acolhimento familiar ou institucional, a ser realizado sob orientação, supervisão e avaliação da equipe técnica da Justiça da Infância e da Juventude e dos grupos de apoio à adoção, com apoio dos técnicos responsáveis pelo programa de acolhimento familiar e institucional e pela execução da política municipal de garantia do direito à convivência familiar.40
Em síntese, podemos concluir que perante tal situação instaurada nas Comarcas do Brasil, uma plausível solução seria a possibilidade de instauração de um projeto de visitação erguido em colaboração com o Juízo da Infância e Juventude, Ministério Público (MP), acolhimento institucional, Conselho Municipal de Proteção à Infância e Juventude, e Grupo de Apoio à Adoção.
É primordial a efetivação de um meio de colaboração mútua, em que os horários ocorram de forma pré-estabelecida, com aquiescência do Juízo para que ocorra tal projeto, uma vez que todos visam o melhor interesse da criança e do adolescente.
39 Brasil, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 10 out. 2021.
40 BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente.
Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>. Acesso em: 10 out. 2021.
- Campanhas de incentivo à adoção tardia
Com objetivo de estimular a adoção tardia, os Tribunais de Justiça de inúmeros Estados estão realizando campanhas. Um exemplo é a campanha “Adote um Vencedor”, idealizado pelo Poder Judiciário do Rio de Janeiro em parceria com o Fluminense Football Club para colocar em evidência a adoção tardia.
Diego e outras 61 crianças e jovens assistidos pelas Varas da Infância, da Juventude e do Idoso do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ) foram ao clássico numa ação do projeto “Adote um Vencedor”. Elaborada em parceria com o Fluminense, a iniciativa foi criada pelo Poder Judiciário para dar visibilidade à adoção tardia.41
É importante destacar que os possíveis adotantes passam por uma preparação psicossocial. Na maior parte dos lugares, esse preparamento pode ser realizado por Grupos de Apoio à Adoção (GAA), ONGs que, na maioria das vezes, são formadas por indivíduos que já vivenciaram o processo da adoção.
A presidente da Comissão Nacional de Adoção do Instituto Brasileiro de Direito de Família, Silvana do Monte Moreira, explica que as iniciativas de projetos que estimulam a adoção são fundamentais para a comunidade e as crianças e adolescentes que buscam por uma família substituta. Colocar em contato os possíveis adotados aptos com os adotantes habilitados é primordial. A autora ressalta:
Penso que o amor surge do olhar, o nunca te vi, sempre te amei é lindo como título de filme, mas não é factível. Muito mais fácil se apaixonar por João, 9 anos, pardo, animadíssimo, que adora dançar passinho, com grandes olhos castanhos, franzino, com certa dificuldade na escola, acolhido há 18 meses, do que por J., 9 anos, pardo, saudável.42
Cabe ressaltar que a perfilhação que se estabelece por meio da adoção, principalmente a tardia, demanda características que não são encontradas entre
41 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO – TJRJ, 2019. Governo do Rio,
TJRJ e Fluminense se unem em campanha por adoção tardia. Disponível em: < http://www.tjrj.jus.br/noticias/noticia/-/visualizar-conteudo/5111210/6394764>. Acesso em 11 out. 2021.
42 INSTITUTO BRASILEIRO DE DIREITO DE FAMÍLIA – IBDFAM, 2019. Estudante concorre a
prêmio internacional com projeto de adoção tardia. Disponível em: < https://ibdfam.org.br/noticias/6969/Estudante+concorre+a+pr%C3%AAmio+internacional+com+projeto
+de+ado%C3%A7%C3%A3o+tardia>. Acesso em 13 out. 2021.
pais e filhos biológicos. Pois esse é um processo mais complexo, uma vez que o adotado já participa ativamente das negociações que ele engloba. A criança mais velha, na maioria das vezes, além de conhecer a sua origem, já compreende a complexidade de sua realidade. Muitas vezes, ela já sofreu violência, negligência, além de ter vivenciado um grande trauma no momento do seu abandono.
Por fim, vale enfatizar que, para desconstruir as barreiras impostas pelos mitos e preconceitos, as campanhas de incentivo à adoção tardia são fundamentais, pois ajudam a entender como funciona esse processo de aproximação entre os pais adotivos e a criança ou adolescente que será adotado. Além disso, o amor, a disponibilidade e o comprometimento são os fatores que potencializam o convívio sadio e afetivo entre aqueles que serão parte dessa nova família. Adequar os sonhos com a realidade é o caminho para vencer os desafios e dificuldades que qualquer núcleo familiar apresenta.
CONCLUSÃO
Após esse percurso explicativo a respeito do processo adotivo, fica evidente, portanto, a importância das discussões abordadas sobre as especificidades da adoção tardia. Além disso, destaca-se a relação com os novos paradigmas sociais que precisam ser fomentados na realidade atual, para garantir os direitos de todas as crianças brasileiras.
Sendo assim, foi primordial a análise das principais partes do processo de adoção, que tem como objetivo garantir a dignidade da criança e do adolescente. Porém, cabe ressaltar que é dever do Estado o acolhimento das crianças e adolescentes aptos a serem adotados, para que eles possam participar de famílias capazes de suprir suas carências.
Posto isso, a adoção tardia, que é o ponto focal da presente pesquisa, enfatiza a adoção de crianças que já tenham seu desenvolvimento parcial e dos adolescentes. Considerando que, normalmente, os adotantes têm preferência, na maior parte das vezes, por recém-nascidos e bebês, os quais podem ser moldados por eles. Entretanto, os processos adotivos são demasiadamente morosos, o que
dificulta essa demanda. Por outro lado, a sociedade tem inúmeros mitos e preconceitos em relação a essa modalidade de adoção.
Não menos importante, outro empecilho que ocorre para que a adoção tardia seja concretizada é o estágio de convivência, o qual adotante e adotado precisam realizar para cumprir exigência legal. Esse período traz o desafio das crianças já terem vivenciado traumas e dificuldades, que nem sempre os futuros pais estão preparados para entender. Nesse sentido, destacar esse aspecto ganha destaque também fundamental nesta pesquisa.
Em síntese, a complexidade do processo de adoção tardia é uma temática que merece soluções diferenciadas e eficientes, para que os estigmas associados a esse tipo de adoção sejam desconstruídos em nossa sociedade. Da mesma forma, campanhas de incentivo à adoção tardia são preponderantes para alterar esse paradigma. Assim, de fato, a sociedade revelará um novo olhar para os excluídos do país.
REFERÊNCIAS
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:
< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>.
BRASIL, Decreto-lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto- lei/del2848compilado.htm>.
BRASIL, Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 – Código de Processo Civil. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015- 2018/2015/lei/l13105.htm>.
BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>.
BRASIL, Lei nº 12.010, de 3 de agosto de 2009. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l12010.htm>.
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