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As petições recursais de um Ano Novo
Jones Figueirêdo Alves
“Quando tudo o que foi a tua vida ruir à tua volta, olha perto de ti, aquém das paredes que caírem. E, se vires a luz serena e firme, fixa-a e segue-a. Para lá das paredes que caírem, caminhos se abrem. Segue a luz que te levará uma a nova aurora”.
Muito em síntese, diz-nos o jurista português J.O. Cardona Ferreira que tudo tem sentido, diante do acima afirmado, quando a lei como norma objetiva que existe é menos que o Direito e este será instrumento para a justiça.
Em sua obra temática de direito recursal, expressou que a luz servirá de guia ao direito e o desafio apresentado ao jurista é pensar as vias de abertura do futuro. Citando François Ost, dar um futuro ao futuro, pondera que “o direito só tem sentido e deve ser vivenciado como uma ferramenta que deve ser útil à Justiça”. Os recursos são uma procura de resposta.
Tudo isto é tão mais oportuno, quando estamos circunstanciados no Ano Novo e, nele, seremos todos recorrentes na exata compreensão de apoiando-se no novo tempo, sentirmo-nos renascidos para a superação. Os recursos, jurídicos ou não, asseguram, a correta travessia na luz para as indispensáveis petições de vida.
Há que se eliminar, de vez, as injustiças do mundo, pensarmos uma base instrutória de solidariedade social, viabilizarmos a construção de outras paredes que edifiquem a nova casa de uma sociedade mais justa.
Embora o homem, como ser físico, seja limitado e finito, é no pensar, no amar e no agir em benefício do outro que ele ultrapassa suas fronteiras. Ele encontra infinitude quando: (i) constrói algo que ressoa além do tempo, como arte, ciência ou conhecimento; (ii) doa-se de forma genuína, por amor, para transformar a vida de outros; (iii) conecta-se ao todo maior — à humanidade, ao universo, ao divino.
O ato de transcender a própria individualidade é, em essência, um ato de amor. É reconhecer que somos partes de um todo e que nossas ações reverberam infinitamente. A tanto, outro ano chega para respondermos ao futuro e a nós mesmos e uma vez capazes de coerência com ele, sermos todos resilientes. A resiliência é fundamental para enfrentar os desafios da era moderna, marcada por rápidas transformações e incertezas.
Recorramos a este Ano Novo, como rede de apoio para adotarmos uma mentalidade de crescimento em organização sistêmica de nossas vidas, com esforços e aprendizados. Dentre tantos, aprender o próximo, irmão invisível, colocando-se no lugar do outro, para ciência de suas necessidades, entendendo o que o preocupa ou o que o motiva. Inspirados, saibamos sempre o outro para as ações coletivas.
Uma sociedade que "aprende o próximo" é mais empática, justa e colaborativa. E ao valorizar a história de cada indivíduo, criamos um ambiente mais acolhedor e inclusivo, onde todos podem crescer juntos. Essa, uma das petições recursais, em redução de danos do sofrimento humano.
Bem a propósito, surge a Lei nº 15.069, de 23 de dezembro passado, instituindo a Política Nacional de Cuidados, “destinada a garantir o direito ao cuidado, por meio da promoção da corresponsabilização social e entre homens e mulheres pela provisão de cuidados, consideradas as múltiplas desigualdades”. Em outras palavras, reorganiza a distribuição das tarefas de cuidado no país, promovendo a inclusão social e garantindo direitos de quem cuida e de quem recebe cuidados.
O cuidado como valor jurídico ganhou relevância no direito contemporâneo, designadamente na proteção dos direitos humanos. Reflete a preocupação com a dignidade humana, a solidariedade e a preservação de relações de respeito e proteção entre pessoas e instituições.
O dever entre pais e filhos, entre os cônjuges ou conviventes, a proteção dos idosos e uma vigília de atenção com os vulneráveis, são aplicações práticas que incorporam o cuidado para melhor regular as relações e as responsabilidades. Segue-se, daí, a necessidade de se desenvolver critérios mais eficientes para essas aplicações.
Cuidados essenciais para uma sociedade mais justa e harmônica demandam petições do direito à dignidade das pessoas, às condições de uma existência mais digna. São petições recursais dirigidas ao Ano Novo, em especial no âmbito das políticas públicas, onde os deveres da solidariedade e de segurança implicam maiores cuidados jurídicos nas relações entre o Estado e os cidadãos.
Quando cerca de 3,5% dos brasileiros ainda se situam abaixo da linha da pobreza (extremamente pobres) em retrato mais doído das desigualdades sociais, a determinação de acabar com a pobreza e a fome, em todas as suas formas e dimensões (Objetivo 1 da Agenda 2030 da ONU para o Desenvolvimento Sustentável) é petição recorrente dirigida a todos, para a meta dos próximos cinco anos. Evidente a corresponsabilidade social que se impõe.
A petição mais urgente é o recurso ao futuro, nas estruturas do Ano Novo, em maiores propósitos de vida para as ações, alinhando-as com seus valores e emoções. Significa dizer, com Carlos Drumond de Andrade, “para ganhar um Ano Novo que mereça este nome, você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo” (...) É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre”.
Desembargador Emérito do TJPE. Advogado e parecerista.
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