Artigos
O primeiro aniversário do GAAA
O Grupo de Apoio à Adopção de Angola-GAAA, que tem como moto “Ajudando na Construção de Famílias”, está a completar um ano de existência. É nas festividades deste primeiro ano que pretende partilhar as seguintes considerações.
Foi no passado dia 30 de Julho de 2023 que o Instituto Brasileiro do Direito da Família (IBDFAM-Núcleo Angola) inaugurou o primeiro Grupo de Apoio à Adopção intitulado “Ajudando na Construção de Famílias”, com quatro principais objectivos;
1. Adopções legais, seguras e para sempre;
2. Pela garantia do direito à família para todas as crianças;
3. Pela legitimidade da família adoptiva;
4. Por mais cultura de adopção na sociedade angolana.
O GAAA tem um papel fundamental na construção de famílias angolanas, na medida em que que dá, a título gratuito, preparação às famílias que pretendam adoptar crianças, evitando assim o elevado número de devolução de processos de adopção de crianças. Este grupo tem uma equipa formada por advogados e psicólogos angolanos e brasileiros, pais adoptivos, no intuito de poderem partilhar as suas experiências, e demais voluntários angolanos e brasileiros que estejam dispostos a ajudar na divulgação do importante papel que a adopção tem na materialização do direito a uma família às crianças institucionalizadas.
Outrossim, este grupo pode trabalhar como parceiro do Estado na certificação, a título gratuito, a todas as famílias que estejam interessadas em ter filhos pela via da adopção.
O Brasil, um país irmão – na verdade o primeiro país no mundo a reconhecer a independência de Angola, daí a forte ligação político-diplomática –, é uma referência internacional em Grupos de Apoio à Adopção, pois é pioneiro e o único país com vários grupos de apoio à adopção, contando com cerca de duzentos grupos.
“Muitas coisas de que precisamos podem esperar. A criança não! Agora é tempo em que seus ossos se formam, o seu cérebro se desenvolve. Para ela não podemos dizer amanhã, seu nome é hoje.”
Gabriela Mistral
É dando primazia ao superior interesse da criança que o GAAA não mediu esforços e começou com as suas reuniões com apenas duas famílias angolanas e uma luso-angolana, tendo no dia do seu lançamento contado com a presença de convidados especiais, tais como: presidente do IBDFAM-Núcleo Angola, Dr. Arlindo Castro, Juíza Titular da 3.ª Vara de Infância, da Juventude e do Idoso da Comarca da Capital do Rio de Janeiro, Dra. Monica Labuto, Procurador do estado do Rio de Janeiro, Dr. Sávio Bittencourt, Presidente da Comissão Nacional de Adopção do IBDFAM, Dra. Silvana do Monte Moreira, e demais psicólogos e advogados que actuam na área da adopção.
Este foi um ano de muito trabalho, muito aprendizado e também de muitas alegrias. O grupo funciona uma vez por mês de forma virtual e já contamos com frutos: a atribuição do direito à família a 13 (treze) crianças, quatro (4) com sentenças decretadas e nove (9) em guarda provisória. O número de crianças em família adoptiva ainda está muito aquém das crianças que efectivamente precisam de um lar nas nossas instituições.
O grupo é um lugar seguro para expressão de sentimentos, onde se estuda e se orienta os habilitandos nas questões dos traumas que as crianças trazem, as dificuldades iniciais enfrentadas logo que a criança chega ao lar adoptivo, e se ensina formas de amenizar os conflitos que poderão ocorrer no dia-a-dia. Além da troca de experiências, os integrantes do grupo sentem-se confortáveis para falar das suas angústias e aliviar a sua ansiedade enquanto aguardam um filho em adopção. Na verdade, os pretendentes são auxiliados a sair da idealização para enfrentarem a realidade da adopção, para que esta aconteça de forma legal e segura para sempre.
Para que uma adopção tenha sucesso, é necessário que, ainda dentro da instituição, a criança e o adolescente tenham uma escuta especializada e sejam preparados para adopção. Por outro lado, o grupo de apoio à adoção oferece uma importante contribuição na preparação dos postulantes à adoção, levando-os a saírem dos sonhos, dos devaneios e colocando-os em contacto com a realidade das crianças e adolescentes que perderam as suas famílias e vivem nas instituições de acolhimento.
Sem o devido preparo, será muito difícil conseguir adopções bem-sucedidas.
É notório que é convém intensificar as acções no sentido de se combater o preconceito que existe nas adopções em Angola. As pessoas precisam de entender que adopção não é caridade, também não se adopta ao fazer o bem a outrem. A adopção nasce do desejo de maternar/paternar e assim formar ou aumentar a sua família.
Este ano foi também marcado por uma visita a Angola de um grupo de advogados e psicólogos brasileiros que teve a oportunidade de conhecer algumas casas de acolhimento e pôde perceber que há grande número de crianças e adolescentes à espera de uma família. Na ocasião, ao conversarem com alguns adolescentes que ali habitam, os visitantes ficaram muito impressionados ao ouvir os jovens dizerem que o que mais desejavam para o futuro era estudar.
Foi durante a visita a essas instituições que surgiu o ensejo de advogar por crianças com menos chances de serem adoptadas e encontrarem uma família, com primazia a crianças especiais, grupos de irmãos, e adolescentes muito próximo de completarem 18 anos. Daí surgiram as seguintes questões: O que é que acontecerá a esses jovens quando completarem 18 anos? Para onde irão? Como viverão por si mesmos sem estudo, sem uma estrutura familiar? Porque não dar oportunidade a eles? Uma criança não pode esperar... O tempo da infância é muito curto, passa rápido demais e precisa de ser melhor aproveitado com cuidado, afecto e segurança.
O GAAA gostaria de poder contar com o apoio do Governo angolano no sentido de se criar um mecanismo de busca activa em Angola, mecanismo ainda sem respaldo legal, que seria a busca das famílias para as crianças e não esperar pelas famílias para as crianças. Essa busca seria prioritariamente interna, portanto em Angola, e internacional, em situações de insucesso no país.
Ainda na senda da visita àquelas instituições, foi identificada uma que o GAAA ficou com o compromisso de arranjar padrinhos para duzentas (200) crianças. Já tendo conseguido os padrinhos, está agora o GAAA na fase de arranjar uma forma de ajudar esta instituição a receber os valores que virão maioritariamente de fora do país. É de salientar que nenhum desses padrinhos pretende adoptar as crianças, mas sim ajudá-las a viver com alguma dignidade.
Para encerrar, o GAAA cita o provérbio africano que diz:
“É necessário toda uma aldeia para se criar um filho”, significando que o Governo precisa de todos os parceiros necessários para ajudar na diminuição de crianças institucionalizadas.
Iracelma Medeiros-Filipe, advogada e presidente do GAAA
Jadete Calixto, psicóloga especialista em adopção e coordenadora principal do GAAA
Angola, 30/06/2024
Os artigos assinados aqui publicados são inteiramente de responsabilidade de seus autores e não expressam posicionamento institucional do IBDFAM