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A diferença
Uma qualidade da mediação a ser retomada para reflexão é a dinâmica de um agir comunicativo envolvendo o número 3, como bem enfatiza Jean-François Six , o número da mediação, assim como o é o 3. Milênio.
A mediação é a própria comunicação associada à valorização do tempo, da informação, enfim, da valorização de passar o tempo nas relações humanas, valorização do eterno e do transitório em busca do axioma que norteia o Direito de Família, qual seja, a comunhão plena de vida, inscrito no art. 1.511 do Código Civil de 2002.
Portanto, a comunicação legitima a ética da mediação, um comportamento que constrói um agir comunicativo pela discussão, o agir estratégico e o agir comunicativo entre a razão estratégica e a razão comunicativa, como ensina Habermas. Enfim, trata-se de expressão de linguagem, ora binária, para expressar a razão, ora ternária, para expressar a razão comunicativa, numa atitude de agir comunicativo, no qual se privilegiam as diferenças.
Na mediação, o agir comunicativo só se dá com a participação do simbólico número 3, representativo dos mediandos e do mediador, formando uma dinâmica ternária de escuta, de exercício da palavra, de troca comunicativa, de disponibilidade pessoal, numa relação tempo-espaço transformadora.
A mais importante reflexão a ser extraída desta idéia é a de que o mediador não é estranho à mediação, mas participa estruturalmente de sua construção, conditio sine qua.non de existência deste meio de acesso à justiça.
E aqui vale rever a idéia de neutralidade atribuída ao mediador. Quando se diz que o mediador é um terceiro neutro, esta neutralidade não deve ser traduzida como se um humano pudesse ser incolor, insípido e inodoro, sem envolvimento com os mediandos. Esta neutralidade deve ser traduzida por distanciamento.
É natural que o mediador, formado para o exercício de uma escuta qualificada, envolva-se com algum dos mediandos, decorrendo daí uma aliança - consciente ou inconsciente - porque ele (mediador) se identifica com aquela situação que faz eco para as suas questões pessoais. O distanciamento é um movimento de recuperação do mediador para a distância adequada - nem tão longe, para não ficar fora da dinâmica, impedindo que a mediação se realize, nem tão próximo para não se colar no mediando, transferindo para ele a expectativa de ver realizado naquela pessoa ( mediando) o que faria para si ( mediador) que estará preparado para a percepção de que, naquela relação, a escolha é do sujeito do conflito .
Assim, quando o mediador emociona-se durante uma sessão de mediação, ou se surpreende irritado ou intolerante com algum dos mediandos, deve se perguntar: estou muito próximo dos mediandos? Por quê? E encontrará sempre a resposta: preciso buscar a distância que me permita perceber o que sou eu nessa relação e o que é o outro.
O ganho do mediador nessa dinâmica ternária - o número 3 - é o fortalecimento que ele vai adquirindo em identificar-se independente do outro - o mediando - para estar inteiro com os mediandos e suas diferenças, mesmo que este outro, diante das identificações das questões pessoais entre mediador e mediando, faça escolhas completamente diferentes daquelas que o mediador faria para si. Mas, nesse agir comunicativo, mediandos e mediador desenvolvem-se e a mediação acontece no momento em que os 3 participantes acrescem um ganho ao desenvolvimento da personalidade.
Este ganho pessoal - para mediador e mediandos - passa a integrar uma rede de comportamentos repetidos fora da dinâmica da mediação, multiplicando aquela experiência com outros relacionamentos. Trata-se do poder pedagógico da mediação.
Para uma reflexão a propósito das idéias aqui desenvolvidas, fica a questão: a arrogância pode estar presente numa mediação? O que fazer?
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