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Sobre Muros, Pontes e... Banheiros: uma breve crônica sobre espaços femininos e feministas
Uma frase recorrente que ouvimos na prática forense é que devemos construir cada vez menos muros (no sentido de impor isolamentos, dividir categorias, separar direitos) e cada vez mais pontes (em uma perspectiva cada vez mais inclusiva, que cultive a diversidade e a partilha).
Muros e pontes são uma excelente representação dos percalços e conquistas do feminismo, pois conseguimos enxergar as dificuldades de ocupação da mulher nos espaços públicos desde a arquitetura desses espaços.
Até meados do Século XIX, uma mulher que saísse à rua sem acompanhante (e que não fosse com destino direto à Igreja) era malvista pela sociedade. O que teria a fazer na rua, e não no interior da sua casa? A própria arquitetura das casas era pensada e calculada para manter as mulheres dentro de casa: elas podiam observar a rua pelas rótulas, mas não podiam ser vistas.
A rua – e todo o espaço público - não era um espaço para mulheres. Não era um espaço de mulheres. A mulher pertencia à casa, e seus assuntos pertenciam ao espaço da casa. E podemos perceber, até os dias de hoje, quantos espaços físicos públicos estão despreparados para a presença e a permanência de mulheres.
Faço essa digressão histórica para contar o caso do Senado Federal: somente em 1979, quando eleita a primeira senadora brasileira, Eunice Michilis, se teve a ideia de destacar um banheiro específico para mulheres no prédio do Senado – banheiro este que ficava no restaurante anexo ao Plenário. E foi apenas em dezembro de 2015 que foi construído um banheiro feminino dentro do prédio do Senado, atendendo a uma histórica reivindicação das senadoras, que questionavam o tratamento desigual.
Qual o problema de não haver banheiro feminino em um prédio público? Significa a consolidação da ideia de que aquele espaço não é destinado à presença de mulheres, e que não havia sido preparado para recebê-las.
Espaços públicos que não acolhem a presença feminina são muros; repensar e readequar os espaços físicos para tornarem-se adequados à presença e permanência de mulheres são pontes.
A falta ou escassez de condições de acesso a espaços públicos são muros; e os movimentos em prol da paridade de gênero são pontes. Nunca antes se havia pensado em paridade, assim como numa antes se havia pensado em banheiros femininos, pelo simples fato de que não eram espaços destinados às mulheres.
No ano de 2024, são fortes as vozes e os movimentos para a concretização do acesso, da igualdade, da paridade, seja nas legislações, nas políticas públicas ou nas políticas judiciárias.
Tem sido construída uma nova arquitetura (física e simbólica) de representatividade para as mulheres, e todos(as) são convidados e convidadas para a grande festa no salão quando, enfim, isto for alcançado. Quem sabe, nesse dia, possamos ressignificar o 8 de março como uma data histórica, e não anual!
Por Bruna Barbieri Waquim
Vice-Presidente do IBDFAM/MA. Assessora Jurídica no TJMA. Doutora e Mestre em Direito. Educadora parental
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