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Questões de Direito de Família e Sucessões na empresa familiar
Em busca de análise detalhada sobre a necessidade de garantias que levem à continuidade de uma empresa familiar, torna-se de enorme valia o estudo da governança corporativa. Resta claro que as empresas familiares podem enfrentar dificuldades de relaciona-mento entre os membros da família, estando eles presentes, ou não, na gestão do negócio. E, conforme o grau de dissenso entre os pares, há graves riscos de ser inviabilizada a perenidade da empresa.
Considerando a independência entre empresa, família e patrimônio, e para providenciar a mantença da atividade empresarial, no que respeita ao patrimônio da sociedade familiar, é indispensável que sejam buscados instrumentos jurídicos na área de Direito de Família e Sucessões. Primeiramente, impossível tratar do tema desvinculado da realidade cultural da família fundadora e das relações emergentes entre os membros dessa família, integrantes de diversas gerações e titulares de diferentes aspirações no que respeita à administração do negócio, o que demonstra, por exemplo, a importância da cultura no que respeita à sucessão da gestão.
Mas qual a grande diferença entre a sucessão da gestão e do patrimônio de uma empresa? A sucessão da gestão diz com a administração da empresa, com a continuidade ao negócio iniciado por um fundador que, eventualmente, tenha trazido para a sociedade membros de sua família. Ocorre que os atores que irão suceder o gestor da empresa não serão necessariamente seus herdeiros, mas figuras que herdam o patrimônio de que era titular o fundador até o seu falecimento. Quando flagrante a inviabilidade da fusão das figuras de sucessor e herdeiro num único membro da família, uma das alternativas, a profissionalização da empresa, diz com a governança corporativa.
Entretanto, muito embora possa estar resguardada a figura do gestor do negócio, seja ele um profissional de mercado, ou um herdeiro do fundador da empresa, algumas questões merecem tratamento atento, no que respeita aos dispositivos concernentes à sucessão dos bens de um sócio. Vale dizer que, no momento do falecimento do fundador da empresa, se não estiver bem planejada a sucessão de suas ações, novos problemas podem emergir das relações familiares. E uma das dificuldades enfrentadas diz com o processamento da sucessão dos bens do morto, frente à figura do cônjuge, que passa a ingressar no rol de herdeiros necessários do falecido, juntamente com os descendentes e ascendentes, conforme o disposto no novo Código Civil. Vale lembrar que herdeiros necessários são aqueles que não podem ser afastados de, pelo menos, 50% da sucessão dos bens do morto, sendo a ele facultativo, ainda, deixar através de testamento 50% de seu patrimônio.
O único determinante para regular a sucessão do cônjuge do fundador da empresa irá dizer com o regime de bens pelo qual optou o casal no momento das núpcias, através de pacto antenupcial, ou, se inexistente o pacto, com o silêncio dos consortes que pressupõe a adoção do regime legal, atualmente o da comunhão parcial de bens. De ressaltar, entretanto, que cada um deles enfrenta a situação da sucessão de maneira distinta, não importando se o casamento foi celebrado sob a vigência do novo ordenamento ou não. Isso significa que a lei aplicável ao caso concreto será aquela em vigor no momento em que falecer o fundador da empresa, muito embora tenha contratado, por exemplo, o regime da separação total de bens com seu cônjuge através de casamento celebrado nos idos anos 50. E esse é um dos regimes de bens que causa maior polêmica no meio jurídico, tendo em vista a colocação como herdeiro necessário do morto o cônjuge sobrevivente casado pela separação total de bens, o que manifesta contrariedade à autonomia de que é dotado o casal, no momento da escolha do regime que vigerá durante o casamento.
Na seqüência da análise realizada oportunamente neste espaço sobre a incidência do direito de família e sucessões nas empresas familiares, serão abordados os regimes de bens e os instrumentos à disposição para auxiliar a perenidade da empresa, na busca de que sejam evitadas surpresas futuras, quando não mais presente o fundador do negócio, figura-chave para a melhor sucessão na empresa como um todo, seja do patrimônio, da gestão ou da família.
Fonte: Gazeta Mercantil/Finanças & Mercados
(*) A autora é Mestranda em Direito Privado (Direito de Família e das Sucessões) pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), especialista em Processo Civil pela UFRGS, pesquisadora da Direito GV na área de família e sucessões.) |
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