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Phubbing e seu impacto nas relações familiares modernas: um olhar pelas lentes do Código Civil Brasileiro
Patricia Gorisch[1]
Em uma era de onipresença digital, o fenômeno do "phubbing" - o ato de esnobar alguém para focar em um smartphone - penetrou na dinâmica familiar e apresenta desafios não apenas socialmente, mas legalmente. A legislação brasileira, enquadrada no Código Civil e no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), tem um enorme papel a desempenhar no tratamento dessa complexa questão.
Phubbing, cunhado como uma junção de 'telefone' e 'desprezo', refere-se a ignorar alguém em um ambiente social para prestar atenção ao telefone. Embora aparentemente inócuo, o phubbing pode resultar em desconexão emocional, particularmente prejudicial em um ambiente familiar. Para crianças e adolescentes, as consequências podem ser ainda mais significativas, impactando seu desenvolvimento emocional e psicológico.
O Código Civil Brasileiro, em particular o artigo 1.566, enfatiza o respeito mútuo e o sustento que os cônjuges devem um ao outro, o que pode se estender às relações familiares. No entanto, o Código carece de diretrizes específicas que abordem os desafios modernos, como phubbing, que afetam diretamente o suporte emocional e o engajamento.
O ECA no Brasil tem em seu cerne a proteção da criança e do adolescente. O artigo 17 do ECA estabelece expressamente que toda criança e adolescente tem direito ao respeito à sua dignidade como ser humano. Considerando os efeitos prejudiciais do phubbing no bem-estar emocional de uma criança, isso poderia ser considerado uma violação de seus direitos sob o ECA? O Código Civil e o ECA estabelecem as bases para as obrigações familiares e relacionadas aos filhos, mas ambos parecem ficar aquém ao abordar a negligência emocional facilitada pelo phubbing. Na ausência de diretrizes legais, as famílias muitas vezes permanecem inconscientes do dano emocional de longo prazo que podem estar causando a seus filhos ao se entregarem ao phubbing. Surge a pergunta: o Código Civil e o ECA devem ser alterados para incluir disposições que tratem da negligência emocional por meio da tecnologia? Embora a legislação brasileira seja bastante abrangente na cobertura dos aspectos físicos e materiais da família e do bem-estar da criança, os aspectos emocionais e psicológicos muitas vezes permanecem sem consideração.
Para uma abordagem mais holística ao bem-estar familiar e à proteção da criança no Brasil, os órgãos legislativos poderiam considerar emendar o Código Civil e o ECA para abordar explicitamente os desafios modernos, como o phubbing. Campanhas de conscientização pública poderiam sensibilizar ainda mais os pais e responsáveis sobre as repercussões emocionais de tal comportamento.Além disso, integrar a educação digital e a inteligência emocional na estrutura legal pode ser um movimento revolucionário. Ramificações legais para negligência emocional facilitada por meio da tecnologia podem ser uma opção, mas deve-se tomar cuidado para não criminalizar o que é principalmente uma questão social.
Conforme as famílias brasileiras se ajustam à presença cada vez maior da tecnologia digital em suas vidas, é crucial que tanto o Código Civil quanto o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) se atualizem para abordar de forma eficaz novos desafios, como o fenômeno do phubbing. Embora modificações na legislação representem um avanço importante, elas necessitam ser complementadas por transformações no comportamento e na consciência social. Desta forma, será possível criar um ambiente familiar verdadeiramente equilibrado, alinhado com as metas e princípios da legislação brasileira relativa à família e à proteção de crianças e adolescentes.
Referências
Código Civil Brasileiro, artigo 1.566.
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Art. 17.
[1] Coordenadora da Pós Graduação em Direito das Famílias e Sucessões da Unisanta. Advogada. Presidente Nacional da Comissão de Direitos dos Refugiados do IBDFAM. Membro da Comissão do IBDFAM-Tec. Doutora e Mestre em Direito Internacional. Pós Doutora em Direitos Humanos (Universidad de Salamanca, Espanha), Pós Doutora em Direito da Saúde (Università degli Studi di Messina, Itália) e Pós Doutora em Psicologia (Universidad de Flores, Argentina).
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