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Até que a morte nos separe
O casamento é mais que uma instituição religiosa e jurídica: para a maior parte das pessoas é um sonho de felicidade. Todos queremos estabelecer um laço conjugal. Acreditamos que aí podemos selar nossa felicidade. Apesar das mudanças de valores, da revolução feminista, da separação Igreja/Estado (1891), o casamento constitui-se em um ideal, onde se depositam esperanças, sonhos e um viver juntos para sempre. Reproduz-se e constrói as regras de uma cultura e, acima de tudo, monta uma estrutura familiar.
Curiosamente, os dados do IBGE apontam para um número crescente de separação de casais. As leis jurídicas já não dificultam mais as separações judiciais e os divórcios. Esta é uma tendência em todo o Direito de Família no Ocidente. Há quem queira culpar o Estado por esta liberalização das dissoluções conjugais. Há também aqueles, aprisionados a uma determinada moralidade, que consideram os descasados como entes mobilizadores de desordem social. É como se todos tivessem um destino obrigatório de estabelecer o laço conjugal, como também agüentar até o fim, como nossos pais...
O verdadeiro sustento do laço conjugal está no desejo. Mas a fisiologia do desejo é sempre estar desejando outra coisa. Desejo é desejo de desejo (Lacan). Será possível então sustentar um casamento “até que a morte nos separe”? As estatísticas apontam para o crescimento de separações e divórcios. Será possível ainda o amor compromissado, ou estamos caminhando para uma sociedade de desenlaçados da conjugal-idade?
Diante de tantos desencontros, percebemos, como profissionais, um equívoco sério que está depositado neste ideal da conjugalidade. Estes des-encontros, que muitas vezes deságuam no Judiciário em intermináveis processos, poderiam ter um outro rumo. Aliás, um processo de separação não tem necessariamente que terminar em separação ou divórcio. O processo judicial é apenas um aspecto do processo de separação. Assim, é possível que este processo culmine, inclusive, com a não--separação. Isto torna-se possível a partir do momento em que estes casais puderem entender e derrubar o mito da conjugalidade onde os dois fazem Um. O amor, e conseqüentemente a conju-galidade, só será possível se se respeitar as diferenças e continuarem suas individualidades.
Mas, há casos em que o casamento talvez tenha mesmo chegado ao seu fim, embora seja sempre multo difícil admitir isto. É claro e certo que uma separação é muito dolorosa e só se faz como último recurso. Mas também não pode ser vista como o fim da família ou da felicidade. Talvez apenas o fim de um sonho. Muitas vezes uma separação pode significar uma saída, talvez a única salda para a saúde. Pode ser uma libertação do sujeito.
Nós, advogados, não podemos determinar e nem mesmo influenciar a que as pessoas se separem ou mesmo que não se separem. Isto não é de nossa alçada. A postura ética do advogado de família é antes de tudo escutar e perce-ber as sutilezas que entremeiam os elementos meramente jurídicos, para resolver de maneira menos traumática, mais rápida e menos onerosa os problemas a nós apresentados. Afinal, como os profissionais “psis” e os sacerdotes, somos também profissionais da escuta e, implicados, antes de tudo, na libertação dos sujeitos.
* Advogado em Direito de Família, Professor da PUC/MG e Presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM.
Curiosamente, os dados do IBGE apontam para um número crescente de separação de casais. As leis jurídicas já não dificultam mais as separações judiciais e os divórcios. Esta é uma tendência em todo o Direito de Família no Ocidente. Há quem queira culpar o Estado por esta liberalização das dissoluções conjugais. Há também aqueles, aprisionados a uma determinada moralidade, que consideram os descasados como entes mobilizadores de desordem social. É como se todos tivessem um destino obrigatório de estabelecer o laço conjugal, como também agüentar até o fim, como nossos pais...
O verdadeiro sustento do laço conjugal está no desejo. Mas a fisiologia do desejo é sempre estar desejando outra coisa. Desejo é desejo de desejo (Lacan). Será possível então sustentar um casamento “até que a morte nos separe”? As estatísticas apontam para o crescimento de separações e divórcios. Será possível ainda o amor compromissado, ou estamos caminhando para uma sociedade de desenlaçados da conjugal-idade?
Diante de tantos desencontros, percebemos, como profissionais, um equívoco sério que está depositado neste ideal da conjugalidade. Estes des-encontros, que muitas vezes deságuam no Judiciário em intermináveis processos, poderiam ter um outro rumo. Aliás, um processo de separação não tem necessariamente que terminar em separação ou divórcio. O processo judicial é apenas um aspecto do processo de separação. Assim, é possível que este processo culmine, inclusive, com a não--separação. Isto torna-se possível a partir do momento em que estes casais puderem entender e derrubar o mito da conjugalidade onde os dois fazem Um. O amor, e conseqüentemente a conju-galidade, só será possível se se respeitar as diferenças e continuarem suas individualidades.
Mas, há casos em que o casamento talvez tenha mesmo chegado ao seu fim, embora seja sempre multo difícil admitir isto. É claro e certo que uma separação é muito dolorosa e só se faz como último recurso. Mas também não pode ser vista como o fim da família ou da felicidade. Talvez apenas o fim de um sonho. Muitas vezes uma separação pode significar uma saída, talvez a única salda para a saúde. Pode ser uma libertação do sujeito.
Nós, advogados, não podemos determinar e nem mesmo influenciar a que as pessoas se separem ou mesmo que não se separem. Isto não é de nossa alçada. A postura ética do advogado de família é antes de tudo escutar e perce-ber as sutilezas que entremeiam os elementos meramente jurídicos, para resolver de maneira menos traumática, mais rápida e menos onerosa os problemas a nós apresentados. Afinal, como os profissionais “psis” e os sacerdotes, somos também profissionais da escuta e, implicados, antes de tudo, na libertação dos sujeitos.
* Advogado em Direito de Família, Professor da PUC/MG e Presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM.
Os artigos assinados aqui publicados são inteiramente de responsabilidade de seus autores e não expressam posicionamento institucional do IBDFAM