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Potência: o poder ressignificado do Judiciário
Fonte: Boletim do IBDFAM nº 30
Temos tido notícias de importantes mudanças nas relações profissionais, como a do último Boletim em que o Diretor de Relações Internacionais, Dr. Paulo Lins e Silva, trouxe alerta no sentido de repensar e restituir a importância do advogado de família. Mas não é só.
Recente também é o artigo do Desembargador José Carlos de Aquino, publicado no Jornal "O Estado de São Paulo", 12/01/05, que, dentre outras questões, trata da necessidade de melhor formação no ensino do Direito e sugere a atuação do advogado nas instâncias de acordo com a experiência e idade. Polêmico, o artigo foi alvo de debates no site Migalhas, que veiculou diferentes opiniões polarizadas de acordo com as funções dos operadores jurídicos. E ainda, além da recém-votada reforma do Judiciário, em São Paulo, o Provimento do TJ autoriza a instituição de Setores de Conciliação ou Mediação, devidamente nomeadas, conferindo-lhes, assim, a necessária diferença.
Estas notícias trazem como denominador comum a mudança que está ocorrendo no papel e função do Judiciário e denunciam a necessidade em acompanhar as rápidas e necessárias modificações na dinâmica das relações. Com a liberdade que a interdisciplina permite, selecionei as notícias como disparadores para pensar os relacionamentos por meio de um eixo que se afigura importante a cada dia - o do poder.
A utilização mais freqüente do termo é emprestada da política. Mas temos visto uma resignificação do Público e do Privado, uma redefinição de fronteiras, uma modificação no que era a conhecida hierarquia nas relações e nas bases de seu exercício - o poder necessita ser pensado não como equivalente à autoridade, um dentre seus possíveis atributos, mas de modo mais amplo, como potência, que se exerce e legitima nos relacionamentos humanos.
Numa reversão dialética da perspectiva, ganham espaço os aspectos mais "familiares" do humano e faz-se útil também a análise das relações a partir de aspectos mais subjetivos, formadores da intersubjetividade que se apresenta na objetividade dos vínculos normatizados pelo Direito.
Nesta esteira, modificou-se o próprio conceito de poder na família, democratizado para Poder Familiar, hierarquizado não mais somente de forma decrescente conforme a idade e autoridade, mas reconhecido em suas diversas formas de expressão, de acordo com as funções de cada um dentro da família e legitimado pela finalidade desta.
O resgate da própria função da família e a modificação dos papéis e dinâmica de suas relações que tem ocorrido, nos dão elementos para pensar as mudanças que se espraiam para o espaço Público e as formas de exercício de poder. Em tempos de pátrio poder (exercido da mesma forma que o que o poder equiparado ao do Estado - poder Pátrio) o terceiro ocupava o lugar exclusivo de seu exercício - o da força e da potência, muitas vezes em detrimento dos outros polos da relação. Já em tempos de Poder Familiar, este é exercido na dinâmica das relações, equalizado nas diferenças, reconhecendo o poder de realização de todos, sendo a autoridade e a responsabilidade dos pais decorrentes da necessária assimetria das relações familiares.
Também as relações profissionais, privadas, atualmente obedecem à uma lógica que segue não só os parâmetros da idade, experiência e carreira, de modo linear. Da mesma forma, no poder público, no Estado e no Judiciário, assistimos importantes modificações em que as relações têm se pautado por uma demanda de humanização e de eficácia, em que também se faz necessária uma reversão de perspectiva com um resgate da autoridade e da responsabilidade como atributos do poder, da potência, conferidos pela função e legitimados nas relações.
Há necessidade de resignificar o uso do poder como potência, que se exerce nos relacionamentos e que se organizam para atender às finalidades das instituições que devem fazer sentido aos atores, no caso jurisdicionados e Operadores Jurídicos. Há necessidade de repensar o significado da idade, da experiência, mas sobretudo, da função, de modo análogo às modificações que estão presentes na família que têm se repensado, atribuindo um significado diverso ao poder, dos pais e dos filhos, exercido a partir de suas funções.
As reformas e mudanças visam a uma ansiada melhoria e, verificando os ecos destas modificações no poder presentes no presente das instituições, felizmente a frase "no meu tempo…." Pode não vir mais a ser assim necessariamente extemporânea.
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