Artigos
Considerações críticas sobre os impedimentos matrimoniais
Considerações críticas sobre os impedimentos matrimoniais
Andréia Fernandes de Almeida Rangel *
Luiz Augusto Castello Branco de Lacerda Marca da Rocha *
RESUMO
O presente artigo tem como foco promover uma análise crítica dos impedimentos matrimoniais, da forma como regulados pelo Código Civil Brasileiro. Para tanto, será realizada uma análise preliminar do art. 1.521 do Código Civil vigente, com o levantamento das razões apontadas em doutrina para sua normatização. A seguir, será avaliado o papel da autonomia (especialmente a autonomia negocial) para a promoção da dignidade humana, e dos mecanismos e critérios para sua limitação face a outros interesses relevantes. Posteriormente, será questionado se a norma legal atende aos requisitos válidos para tais limitações, destacando-se especialmente a tese dos interesses merecedores de tutela e a abordagem comunitarista liberal.
PALAVRAS-CHAVE: Impedimentos – Autonomia – Comunitarismo – Dignidade.
ABSTRACT
This article aims to promote a critical analysis of marital impediments, as regulated by the Brazilian Civil Code. Therefore, a preliminary analysis of art. 1,521 of the Civil Code in force, with the survey of the reasons pointed out in doctrine for its normatization. Next, the role of autonomy (especially negotial autonomy) for the promotion of human dignity, and the mechanisms and criteria for its limitation in relation to other relevant interests will be evaluated. Subsequently, it will be questioned whether the legal norm meets the requirements valid for such limitations, especially highlighting the thesis of interests worthy of tutela and the liberal communitarian approach.
KEY WORDS: Impediments - Autonomy - Communitarianism - Dignity.
Introdução
O presente artigo tem como objetivo promover uma análise crítica das hipóteses elencadas pelo Código Civil como causadoras de nulidade do casamento em nosso direito.
Para tanto, será inicialmente realizada pesquisa sobre as razões inspiradoras das situações positivadas, de acordo com a doutrina especializada. Num segundo momento, será promovida uma análise da noção de autonomia, com seus alicerces jurídicos e filosóficos, bem como a formulação de critérios para a limitação de seu exercício e harmonização com outros valores relevantes. Por fim, se pretende apreciar a compatibilidade dos impedimentos positivados com os valores insculpidos no ordenamento, de modo a concluir sobre a constitucionalidade, ou não, da norma. Essencialmente, o que se pretende discutir é se as razões inspiradoras do referido dispositivo limitam validamente o exercício da autonomia pessoal dos consortes, ou se as mesmas excedem as possibilidades permitidas pelo ordenamento constitucional brasileiro.
Dentre os critérios possíveis nessa verificação, se encontra o comunitarismo liberal, que tem como um de seus expoentes principais Amitai Etzioni. A proposta dessa abordagem está na necessidade de estabelecer um equilíbrio entre autonomia e ordem social, de modo a promover o bem comum. Este paper analisará as linhas mestras de tal pensamento, em especial os critérios propostos pelo autor para tal finalidade.
1. Análise do direito positivo: as causas de nulidades previstas no art. 1.521 do Código Civil Brasileiro
As causas de nulidade do casamento (e também da união estável[1]) estão elencadas em caráter taxativo[2], no art. 1.521, Cód. Civil. O referido dispositivo reforça a corrente contratualista, que advoga possuir o casamento natureza negocial, dominante na doutrina e jurisprudência pátrias. Trata-se de norma cogente, instituindo vícios absolutos, insanáveis, comprometedores da validade do matrimônio[3] e passíveis de arguição a todo tempo pelos interessados e pelo Ministério Público[4]. Uma observação preliminar das hipóteses insculpidas na norma, reforça a preocupação com certos valores morais, caros ao legislador (os quais, supostamente, refletiriam a percepção social dominante), bem como a intenção de evitar riscos a eventual prole do casal[5]. Ambas as preocupações são criticáveis, conforme se verá oportunamente.
A primeira nulidade do casamento veda o casamento entre ascendentes e descendentes, seja o parentesco natural ou civil. A ratio da norma é o repúdio social aos relacionamentos incestuosos[6]. Pouco importa aqui o distanciamento de gerações, ou se a origem do parentesco é genética ou socioafetiva.
O repúdio ao incesto tem papel simbólico nas sociedades em geral, em especial as ocidentais[7]. Tratar-se-ia da “primeira lei de qualquer organização social, a base de todas as proibições, que diferencia a sociedade humana dos animais”[8], e seria o interdito fundamental, responsável pela transposição do mundo da natureza para o mundo da cultura, fundamentando a ordem social e jurídica[9]. A vedação ao incesto (seja entre ascendentes e descendentes, seja entre colaterais de grau próximo) implica numa “interdição ao desejo”, atuando como uma verdadeira e “sofisticada técnica de controle das pulsões”[10], a limitar as relações erótico-afetivas.
Engels, na sua obra clássica, concluiu o capítulo dedicado à família afirmando que “a única coisa que se pode responder é que a família deve progredir na medida que progrida a sociedade [...] a família é produto do sistema social e refletirá o estado de cultura desse sistema” [11]. Na Escola de Durkheim, o mesmo afirmou que a família é uma instituição social e não apenas um grupo natural, entendendo a família como um resultado dos fatos sociais, considerados objetivamente como coisas, aplicando a primeira regra e mais fundamental para este autor: “considerar os fatos sociais como coisas” [12], tratando cientificamente sem retirar em nada suas características específicas. “Quando, portanto, o sociólogo empreende a exploração uma ordem qualquer de fatos sociais, ele deve esforçar-se em considerá-los por um lado em que estes se apresentem isolados de suas manifestações individuais” [13].
A segunda hipótese apresentada pelo dispositivo em comento é a vedação ao matrimônio entre afins em linha reta. O vínculo da afinidade se dá entre determinadas pessoas aos parentes de seu consorte[14]e, no caso da linha reta (sogro, sogra, genro e nora) é indissolúvel, mantendo-se mesmo após o fim do matrimônio[15]. A vedação se justificaria pelo fato de os afins em linha reta ocuparem posições análogas às de pai/mãe, filho/filha, de modo que a proibição preservaria os “valores familiares”[16].
O terceiro impedimento envolve o adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem o foi do adotante. Novamente, a “preservação da tranquilidade familiar” surge como fundamento para a norma[17]. Dispensável, contudo, parece ser a sua redação, vez que a situação se enquadra na hipótese anterior. O adotante é pai do adotado. Logo, parente por afinidade da esposa deste. Vedada a discriminação de qualquer natureza quanto aos filhos, em especial quanto à sua origem, não há sentido na norma, que, veladamente, sugere uma distinção que, juridicamente, inexiste[18].
A seguir, a lei veda o enlace entre os colaterais, de segundo e terceiro graus. Parecem aqui haver duas diferentes inspirações para a norma: a primeira, ligada à supramencionada proibição do incesto, impediria o enlace entre irmãos. Já quanto aos tios (chamado casamento avuncular), a razão parece ser mais de ordem eugênica do que propriamente moral, impressão reforçada pelo DL 3.200/41 (não revogado pelo Código Civil, para a doutrina majoritária[19]), que autoriza dito enlace, desde que haja laudo médico atestando inexistência de risco para eventual prole do futuro casal.
O inciso V do multicitado dispositivo, ao referir-se à proibição do casamento do adotado com o filho do adotante, é igualmente criticável por sua inutilidade e caráter discriminatório. Afinal, ambos são irmãos, pelo que albergada a situação pelo inciso anterior.
O inciso VI faz referência à proibição de contrair matrimônio das pessoas casadas. Trata-se do único dos impedimentos não aplicável à união estável, que será reconhecida desde que o convivente se encontre separado de seu cônjuge[20]. O sentido do impedimento aqui é preservar o princípio da monogamia. Trata-se de princípio implícito no ordenamento brasileiro, aplicável às relações afetivas[21], a impedir a configuração de relações poligâmicas, sejam elas poliginicas ou poliândricas. Parte da doutrina sustenta que não se trata de efetivo princípio de caráter moral, mas de “princípio básico e organizador das relações de família do mundo ocidental”, desempenhando o papel de “interdito proibitório” ao desejo[22]. A opção pela monogamia não seria justificada por uma suposta superioridade moral, antes sua função seria puramente estruturante, estabelecendo um modelo de organização social determinado pelo Estado, cuja origem estaria ligada mais ao aspecto econômico de tutela da propriedade que a alguma moralidade ou afeição específicas [23]. Relevante notar que a infidelidade em si - embora implique em infração a dever conjugal[24]-, não é o bastante para a violação da monogamia, que se configura pela estabilidade de relações simultâneas, sejam ou não conhecidas por todas as pessoas envolvidas[25].
O último inciso do art. 1.521 faz referência à vedação do matrimônio entre uma pessoa e o autor de homicídio contra seu cônjuge. A proibição compreende a modalidade dolosa, tenha sido o homicídio tentado ou consumado. Seu fundamento é, obviamente, o repúdio moral ao enlace contraído nessas condições. A doutrina diverge quanto à necessidade do trânsito em julgado da sentença penal condenatória para caracterizar impedimento, havendo, ainda, debate quanto à possibilidade desta produzir efeitos retroativos, a fulminar o enlace ocorrido no curso do processo[26]. Curiosamente, a lei não impede o casamento quando é o próprio cônjuge quem comete o homicídio de seu consorte, com intento de convolar núpcias com quem mantinha relação adulterina, desde que este não tenha sido cúmplice do crime[27].
2. O direito civil-constitucional e a valorização da autonomia da pessoa como expressão de sua dignidade
A metodologia do direito civil-constitucional pressupõe o reconhecimento da normatividade e não neutralidade da Constituição, cujos valores irradiam por todo o ordenamento. Dentre estes, destaca-se acima de todos o respeito e promoção da dignidade humana.
A autonomia se apresenta como um dos corolários da ideia de dignidade (ao lado da igualdade, integridade psicofísica e solidariedade)[28]. Seu conceito comporta variação histórica, tendo encontrado seu ápice no pensamento liberal, quando passou a ser associada a um egoísmo voluntarista, a ditar as normas dos comportamentos privados, devendo evitar-se ao máximo sua restrição pela intervenção do Estado, de modo a gozar de primazia moral sobre a heteronomia[29]. Essa conotação, coerente com o ideário então vigente, redundava em regras jurídicas que expressavam as relações de força mercantis[30], e pecava por desconsiderar que, antes de antagônicos, autonomia e heteronomia seriam conceitos complementares, “duas faces da mesma moeda, pois, além de ambas não subsistirem per se, moldam-se e originam-se mútua e conjuntamente”[31][32].
Esse viés voluntarista-contratual da autonomia passa a ser repensado com a superação da rígida cisão entre Direito Público e Privado, fenômeno que ocorre especialmente no século XX, após as duas Guerras Mundiais, quando ocorre uma transformação da hierarquia de pensamento até então dominante, de modo a ideia de liberdade não mais ser entendida como sinônimo de liberdade econômica, a qual se constitui em uma de suas faces, subordinada, na escala de valores constitucionais, à liberdade da pessoa humana[33]. A ideia de autonomia passa, assim, a decompor-se em dois ângulos: um referente às relações patrimoniais e outro ligado às relações existenciais[34].
As duas concepções de autonomia são reguladas por princípios próprios, não podem os mesmos serem reconduzidos unicamente à liberdade econômica ou à teoria geral dos contratos. Sobre os negócios jurídicos patrimoniais incidem a boa-fé objetiva, função social, justiça contratual, dentre outros[35], ao passo que as relações não patrimoniais, são pautadas pela lógica diversa, do “livre desenvolvimento da personalidade nos parâmetros que a própria pessoa estabeleceu para si e não do lucro, da paridade”, impondo que a elas seja dado tratamento qualitativo diferenciado e individualizado[36]. Quando a autonomia é voltada para tais relações, está mais diretamente ligada à ideia de dignidade, abrindo menos margem à intervenção estatal e demandando tutela constitucional reforçada[37].
Compreendida pelo prisma existencial, a autonomia pode ser compreendida como “autogoverno, manifestação da subjetividade, em elaborar as leis que governarão a sua vida e que coexistirão com as normas externas ditadas pelo Estado”[38]. Isso implica na possibilidade de desenvolver projetos existenciais, sem sofrer discriminação por parte deste[39]. Trata-se não de uma concessão ou atribuição do ordenamento, mas de verdadeiro poder privado, reconhecido pelo Estado, merecendo apoio jurídico sempre que se harmonize com os valores constitucionais que, a um tempo, lhe servem de suporte e limite[40].
É com esta autonomia privada existencial que o livre desenvolvimento da personalidade será garantido, que as escolhas pessoais serão efetivadas e o projeto de vida individual concretizado[41], será com a caneta da liberdade que cada indivíduo irá escrever sua história e criar sua própria identidade, tornando-se peça única do quebra-cabeça social “construída dialogicamente com seus convivas”[42].
O reconhecimento desta autonomia como parte essencial do conceito de dignidade humana (em especial no tocante às situações jurídicas existenciais), tal qual abraçado por nosso ordenamento, não implica em absoluto afirmar que a mesma não possa sofrer restrições em seu exercício[43], muito embora, conforme já visto supra, tal ingerência deva ser menor por parte dos órgãos estatais do que na esfera contratual. Mesmo sociedades fortemente liberais admitem certo grau (ainda que mínimo) de limitação aos desejos individuais. Por outro lado, sociedades fortemente moralistas ou autoritárias tendem a estabelecer um elevado grau de controle das ações individuais, como forma de alcançar o primado da ordem estabelecida. O desafio passa a residir na busca pelo equilíbrio entre as tensões sociais, de modo a garantir uma convivência harmônica que, não comprometendo a ordem vigente, assegure o mais elevado grau de autodeterminação, garantindo a cada pessoa uma igual consideração e respeito por seus interesses.
3. O comunitarismo e a soberania popular
Uma resposta possível para esta dificuldade é encontrada no comunitarismo, corrente de pensamento que surgiu nos Estados Unidos, na década de 80, como um movimento de crítica ao individualismo liberal. Influenciados pela doutrina de autores como Aristóteles, Hegel, Marx e Gramsci, os comunitaristas defendem a ideia de que os homens são sempre moldados por valores e pela cultura da comunidade onde vivem, ou seja, os indivíduos são sempre influenciados pelo seu próprio particularismo histórico[44]. É neste sentido que os comunitaristas criticam, em especial, o individualismo abstrato das teorias liberais, como por exemplo a Teoria da Justiça desenvolvida por John Rawls, em que princípios de justiça seriam escolhidos de forma abstrata e imparcial, independentemente dos valores culturais e históricos que condicionariam uma escolha deste tipo.[45]
Apesar de formarem uma única escola filosófica, os comunitaristas têm idéias bastante diferentes entre si, o que justifica a existência de vários matizes dentro de sua estrutura doutrinária, que vão desde um comunitarismo mais próximo ao liberalismo, cujo pensamento visa apenas a corrigir as imperfeições apresentadas pelos ideais liberais, até uma forma de comunitarismo mais autêntico, que busca uma completa autonomia para o movimento teórico e político-prático. De qualquer forma, existe uma estrutura teórica que perpassa todas essas diferentes versões de comunitarismo. Esta estrutura se fundamenta, primordialmente, no conceito de soberania popular.
Esta soberania popular está inserida na doutrina comunitarista como elemento fundamental de um modelo que pretende ser uma alternativa ao liberalismo político. Assim, se a teoria liberal propõe um Estado politicamente neutro, onde as liberdades individuais são prioritárias em relação à soberania popular, o comunitarismo, por outro lado, entende que a soberania popular e a deliberação pública devem ser prioritárias em relação aos direitos individuais. Neste sentido, as teorias comunitaristas defendem a existência de um Estado mais atuante que o limitado Estado previsto pelas teorias liberais. No modelo politico comunitarista, portanto, a ênfase é dada nos direitos de participação política do cidadão.
Porém, tal fato de modo algum significa que os comunitaristas são contrários à existência das liberdades individuais. O que a teoria comunitarista de fato pretende é valorizar o espaço público e a prática da cidadania, única maneira concreta do indivíduo exercer sua liberdade, o que significa em última análise afirmar que os direitos fundamentais do homem devem ser sempre equilibrados com uma noção de responsabilidade social perante a comunidade[46]. Desta forma, a doutrina comunitarista afirma a necessidade de se estabelecer mecanismos equilibradores das tensões existentes entre direitos individuais e responsabilidades sociais, entre as liberdades de cada pessoa e o bem comum[47], assim entendidas as preocupações compartilhadas de uma dada sociedade em um dado tempo acerca de assuntos de interesse global (ou, ao menos, de amplo alcance)[48]. Dada a maleabilidade da ideia de bem comum, há uma tendência de as sociedades oscilarem entre estabelecer maiores restrições em nome do interesse público ou o flexibilizarem em demasia, de modo a ampliar a tutela dos direitos individuais. Tais oscilações, contudo, podem ser contornadas e reequilibradas mediante o recurso a mecanismos democráticos[49]. As sociedades, então, estariam metaforicamente sujeitas ao embate entre duas forças conflitantes: uma centrífuga (a exigir medidas mantenedoras da ordem que as devolvam ao eixo de normalidade) e outra centrípeta (que demandaria a necessidade de medidas protetivas da autonomia)[50].
Na busca de estabelecer um balanceamento entre tais forças divergentes, Amitai Etzioni, importante autor comunitarista, propõe quatro regras fundamentais, a servirem como critérios que evitem o excesso de medidas jurídico-normativas, as quais poderiam produzir excessos comprometedores do contexto democrático: a) uma sociedade comunitarista não deve construir medidas coercitivas, salvo diante de um perigo “evidente e atual”; b) sempre que tal ameaça se evidencie, deve-se inicialmente recorrer a medidas não restritivas à autonomia; c) quando se faça necessário adotar medidas restritivas da autonomia, estas devem ser minimamente intrusivas; d) os efeitos colaterais de tais medidas devem ser evitados, ou ao menos minimizadas[51].
Por fim, é importante entender o papel da constituição dentro do cenário jurídico-político do comunitarismo, qual seja, representar um compromisso com os ideais, valores e histórias em comum, um verdadeiro projeto social daquela comunidade. A Constituição é assim aquilo que os comunitaristas irão chamar de constituição - projeto[52]. Fica evidente assim que o importante, para os comunitaristas, é que a comunidade possa se manifestar, que seja garantida a ela uma livre capacidade de autodeterminação, para que ele possa definir seus valores e, quando necessário historicamente, modificá-los. Para os comunitaristas, a deliberação coletiva não pode estar subordinada a uma declaração de direitos individuais, pois tal fato violaria, exatamente, o grande direito fundamental comunitarista, que é a deliberação pública livre de impedimentos de qualquer natureza. Neste contexto, a interpretação da constituição deve ser feita com base nestes valores comunitários, ou seja, valores que unem coletivamente os membros de uma comunidade política[53].
Considerados os aspectos abordados supra, segue uma análise da compatibilidade entre a legislação codificada e os valores constitucionalmente tutelados.
4. A incompatibilidade entre os impedimentos matrimoniais e a tutela da autonomia como componente da dignidade
Considerando que as causas apontadas para a existência dos impedimentos matrimoniais dividem-se em questões de ordem eugênica e moral, é preciso revisitar os dispositivos com base nos critérios supramencionados.
O argumento de evitar a majoração de possíveis patologias é ponderável. A proximidade genética pode implicar em maiores chances do nascimento de crianças portadoras de anomalias e patologias congênitas, risco ao qual a prole não deve ser exposta[54]. Entretanto, algumas considerações merecem ser feitas: se o casal desejar se submeter a um procedimento de esterilização voluntária, ou não queira[55], ou mesmo não possa ter filhos? Se o impedimento for descoberto quando o casal se encontre em idade avançada, não mais em idade reprodutiva, e tendo gerado prole saudável, ainda assim o matrimônio deve ser anulado? Caso em um futuro hipotético seja possível (legal, científica e eticamente) editar os genes defeituosos, de modo a minimizar ou mesmo eliminar tais riscos, ainda assim o matrimônio deveria ser vedado? Responder positivamente a tais indagações deslocaria o eixo do interdito para o campo da moralidade.
Ainda sob este prisma, um casal que, em virtude de certas circunstâncias pessoais, tais como faixa etária ou doenças pré-existentes das quais tenha ciência (e transmissíveis por hereditariedade, ou contágio) deveria ser impedido de casar? Não se encontra na legislação brasileira nenhum dispositivo que vede o matrimônio em tais condições, o que novamente reforça o aspecto moral como verdadeiro fundamento da norma.
Ainda que se aceite a questão eugênica como motivação dos impedimentos, uma abordagem comunitarista certamente a consideraria como um “perigo atual e evidente”, a justificar a atenção do legislador, de modo que o primeiro critério para intervenção normativa estaria materializado. A ideia de responsabilidade pelo direito de eventual prole em ter uma vida saudável, ou por não expor à coletividade aos custos de manter a saúde de indivíduos portadores de anomalias congênitas surge cristalina. Contudo, o segundo critério – o da menor invasividade – poderia responder satisfatoriamente ao problema (mediante medidas de conscientização e acompanhamento médico ao casal) sem que se fizesse necessária a imposição de medida restritiva mais severa, como a anulação do enlace.
Por sua vez, aceitando que a efetiva razão dos impedimentos seja de índole moral, se faz necessário investigar se a contrariedade entre o matrimonio realizado e os valores éticos e morais dominantes em dado contexto cultural justifica a opção do legislador, dados os valores imperantes no ordenamento[56].
Uma primeira solução possível, parte da análise se os interesses de contrair matrimônio nas circunstâncias em comento são, ou não, merecedores de tutela. Pietro Perlingieri aponta que tais interesses são definidos em virtude de sua conformidade com uma hierarquia de valores, preestabelecida em fontes normativas hierarquicamente superiores[57]. Sua tutela seria assim, pautada na realização dos valores constitucionais, mais do que na própria vontade em si[58]. Sob esse prisma, “o direito a ter uma família é tomado como direito fundamental, sob o argumento de que uma estrutura familiar é essencial para a concretização da dignidade humana, não importando a ‘fôrma’ em que tal estrutura seja obtida por qualquer ser humano”[59]. Neste sentido, a concretude das relações reais deve ser preferida aos standards normatizados. Nesse conflito entre o que é legalmente regulamentado e vivencialmente constituído[60], rompendo-se com a monocromia da moral social dominante[61], e albergando distintos modelos, de acordo com as aspirações de seus membros componentes, aos quais incumbe ao Estado proteger de forma inclusiva[62].
Um approach comunitarista abordaria a questão tendo como ponto de partida a existência de certos “valores nucleares compartilhados” existentes em certo contexto sociocultural, que compõem a percepção de “bem comum” e de “boa sociedade”[63]. Para um comunitarista liberal, a base da ordem moral reside na existência de certos valores compartilhados em determinada sociedade, com os quais a maioria de seus componentes se comprometem, ainda que em níveis diferentes[64]. Esta concepção de bem comum, contudo, não será necessariamente universal, podendo variar conforme certas categorias de valores[65], o que se torna particularmente evidente em sociedades marcadas por um forte pluralismo (nas quais exsurge o desafio de garantir a integridade social sem suprimir autonomia de subgrupos ou indivíduos[66]), ou na relação entre diferentes sociedades, caracterizadas por valores distintos (de modo a evitar “ilhas de comunitarismo, isoladas em um oceano não comunitarista”[67]).
Escrevendo sobre as relações entre comunidades maiores e subgrupos[68], Amitai Etzioni aponta alguns destes elementos centrais: a) Democracia, vista não como um arranjo procedimental, mas como como um valor substantivo[69]; b) o respeito à Constituição e seus direitos fundamentais, que materializam e reforçam os valores que norteiam uma sociedade e suas políticas públicas[70]; c) lealdades em camadas, expressão que implica no reconhecimento de diferentes níveis de comprometimento de uma pessoa, com seus grupos socioculturais (e.g., grupos étnicos, ou comunidades religiosas) e com grupos mais amplos[71]; d) neutralidade, tolerância e respeito, o que não implica necessariamente em aceitar todas as visões de mundo como igualmente válidas, mas aprender a conviver pacificamente com as diferenças[72]; e) limitação das políticas de identidade, de modo a evitar o sentimento de polarização e exclusão do outro (o que poderia ser um produto de um fortalecimento de tais políticas), ao reforçar que as diferenças existentes entre membros de uma dada comunidade podem ser trabalhadas sem que isso implique em desconsiderar os laços comunais[73]; f) estabelecimento de diálogos morais entre os membros da comunidade, garantindo o estabelecimento de laços de aproximação e comprometimento, sem que isso implique na formação de “guerras culturais”[74]; g) reconciliação, que, lidando com ressentimentos, estados psicológicos e elementos afetivos, permite o restabelecimento das conexões interpessoais[75].
Considerando tais elementos propostos na teoria comunitarista, ressalta-se sua compatibilidade com o reconhecimento da validade dos arranjos matrimoniais em todas as suas formas. Especialmente em se considerando as ideias de democracia (aqui compreendida como igual consideração e respeito por todas as concepções de vida), respeito à Constituição e tolerância. Novamente recorrendo aos quatro critérios para ponderação (balanceamento) entre a autonomia e a ordem social, a ocorrência de tais uniões não parece representar um “perigo evidente e atual”, a justificar a adoção de medidas restritivas.
Amitai Etzioni propõe quatro critérios para determinar quais seriam os valores nucleares a nortear as relações comunidade/indivíduo, dos quais os dois primeiros interessam mais diretamente ao escopo deste trabalho: a) a comunidade seria um árbitro de tais valores, porém não o árbitro definitivo, uma vez que, embora haja casos nos quais a maioria composta pelos membros de uma comunidade tenha legitimidade para determinar os comportamentos vinculantes (como, e.g., na eleição de representantes), há situações nas quais mesmo um consenso universalmente aceito não teria legitimidade para restringir interesses individuais, ligados à dignidade da pessoa humana (o autor usa o exemplo de certas sociedades que, em dado momento histórico, considerem as mulheres como “cidadãs de segunda classe”); b) A Constituição serve como um depositório dos valores sociais que as sociedades podem abraçar, bem como as salvaguardas dos direitos fundamentais individuais, face ao Estado e a particulares; c) a existência de diálogos morais cruzados, de modo a lidar com as diferentes visões de mundo entre distintos meios culturais e d) a extensão de tais diálogos às comunidades internacionais[76].
Assim, é preciso avaliar se a comunidade poderia legitimamente impor restrições matrimoniais que reflitam seus valores dominantes, ou se, nesse caso, o “árbitro definitivo” seria a própria pessoa que deseja casar. Parece-nos que, aqui, seria preciso formular um critério adicional: Toda e qualquer restrição à autonomia pessoal somente pode ser justificada na medida em que o exercício desta represente um risco aos interesses da comunidade como um todo, ou que proporcione a esta um benefício maior e justificado. Não parece que o matrimônio nas condições do dispositivo multicitado represente um ganho social relevante, ou evite um dano substancial.
Ademais, inexiste na Constituição, qualquer menção expressa aos valores da monogamia ou repúdio ao incesto como valores culturais preponderantes sobre o interesse em constituir família sob a forma que melhor se amolde às perspectivas existenciais de quem deseja formá-la, este sim um interesse fundamental.
Deste modo, parece que, ao menos os impedimentos cuja base reside em valores morais/culturais majoritários, não merecem guarida na ordem constitucional. Seja porque os interesses minoritários são igualmente merecedores de tutela (ao menos em uma sociedade cujo conceito democrático seja pautado pela noção de igual consideração), seja porque concernem primordialmente às pessoas envolvidas, ou por não representarem ameaça aos valores dominantes, a justificar sua restrição.
Considerações Finais
O presente estudo teve por objetivo promover uma análise crítica do tratamento normativo dado aos impedimentos matrimoniais, que fulminam de nulidade o enlace contraído da infringência a tais proibições. A indagação que motivou a pesquisa consiste em saber se a norma insculpida no art. 1.521 do Código Civil Brasileiro encontra suporte constitucional no estado atual do ordenamento brasileiro.
Inicialmente, foi realizada uma análise de cada um dos incisos que integram o dispositivo em comento, sendo apontados os supostos fundamentos para sua positivação, tais como indicados pela doutrina pátria. Verificou-se que são indicadas razões especialmente de ordem eugênica e moral, no sentido de evitar riscos à saúde de eventual prole, ou preservar certos valores sobre os quais a sociedade se estrutura. São argumentos extrínsecos, na medida em busca preservar interesses exteriores à família que se pretende constituir, ainda que limitando os interesses de seus componentes.
Tendo em vista que a existência de tais limites atua como um marco restritivo da autonomia individual, passou-se a analisar – ainda que com brevidade – seu conceito, variação histórica, bem como a proposta de desmembramento entre autonomia contratual e negocial, esta de conotação mais ampla, pautada nas relações existenciais, como as que envolvem o objeto desse estudo. Além disso, reconhecendo não ser o respeito à autonomia um valor absoluto (ainda que essencialmente ligada à noção de dignidade, ao menos em sua matiz kantiana), buscou-se uma análise de possíveis parâmetros balizadores da restrição válida a seu exercício, destacando-se em especial a noção de interesses merecedores de tutela, e a abordagem comunitarista, que prevê que uma boa sociedade será estruturada no equilíbrio entre autonomia e ordem social.
A seguir, se pretendeu promover uma análise do referido dispositivo, tendo como mote a compatibilidade, ou não, das restrições nele impostas à autonomia pessoal dos consortes e o ordenamento constitucional. A investigação passa pela verificação se tais restrições se sustentam, inicialmente analisando se o interesse em contrair matrimônio nas condições vedadas pelo dispositivo seria merecedor de tutela consoante os valores constitucionais vigentes, para, posteriormente, aplicar os critérios ponderativos do comunitarismo liberal de modo a ponderá-los com o interesse da manutenção da ordem social.
O que se conclui do caminho percorrido é que a norma do art. 1.521 estabelece restrição injustificada à autonomia conjugal, incompatível com a Carta Constitucional. Novos tempos não permitem o enraizamento de antigos valores. A cristalização dos mesmos poderia implicar em intolerável governo dos mortos sobre os vivos, a gessar a vida em comunidade e impedir o florescimento das individualidades. Especialmente considerando a família como lócus por excelência do desenvolvimento da personalidade de seus integrantes, descabe ao legislador estabelecer seus contornos e formatos, a partir de normas positivadas que expressem certos interesses dominantes ao tempo de sua elaboração. Um ordenamento constitucional que se pretenda seriamente promotor da dignidade humana em todas suas expressões multifacetadas e caleidoscópicas, não pode restringir o exercício da autonomia sem um claro e evidente risco de dano aos interesses sociais, e que não possam ser contornados por meios menos invasivos.
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_______________________________. A função dos impedimentos no Direito de Família: uma reflexão sobre o casamento dos irmãos consanguíneos ocorrido na Alemanha. In: TEPEDINO, Gustavo, et. all. Diálogos sobre Direito Civil. Vol. II. Rio de Janeiro: RENOVAR, 2008.
WALZER, Michael. Esferas da Justiça. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
WELTER, Belmiro Pedro. Teoria Tridimensional do Direito de Família. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009.
* RANGEL, Andréia Fernandes de Almeida. Doutora em Direito e Sociologia pela Universidade Federal Fluminense – UFF. Mestre em Direito pela Universidade Federal Fluminense – UFF. Pós-graduada em Direito Privado pela Universidade Federal Fluminense – UFF. Professora Adjunta do Departamento de Direito Civil da Faculdade Nacional de Direito – FND – UFRJ. E-mail: andreiafalmeida@yahoo.com.br.
* ROCHA, Luiz Augusto Castello Branco de Lacerda Marca da. Doutorando em Direito na Univerisade Veiga de Almeida – UVA. Mestre em Direito pela Universidade Católica de Petrópolis – UCP. Professor de Direito Civil do curso de graduação do Centro Universitário Augusto Motta (UNISUAM). E-mail: augustocastellobranco@gmail.com.
[1] A extensão dos impedimentos matrimoniais à união estável é prevista pelo art. 1.723, §1º, Cód. Civil, com a ressalva expressa das pessoas casadas que se encontrem separadas.
[2] HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes. Responsabilidade Civil Decorrente da Nulidade ou da Anulabilidade do Casamento. In: MADALENO, Rolf. Et. all. Responsabilidade Civil no Direito de Família. São Paulo: ATLAS, 2015, p. 212.
[3] A lei atenua o rigor do dispositivo permitindo o reconhecimento de efeitos civis para um – ou mesmo ambos – os consortes, caso estejam de boa-fé, desconhecendo a causa de nulidade. Trata-se do denominado casamento putativo, previsto no art. 1.561, do Cód. Civil, que, pretendendo homenagear a boa-fé e aparência de casamento válido, salvaguarda alguns direitos aos cônjuges, a despeito da anulação do enlace.
[4] A doutrina divide os interessados em arguir a nulidade matrimonial em pessoas que detêm interesse moral (como, e.g., o primeiro cônjuge daquele que pratica bigamia) e os que possuem interesse econômico (como os sucessores de um dos consortes). Neste sentido, HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes. Op. cit., p. 212.
[5] Em sentido aproximado, Giselda Maria Hironaka aponta que as hipóteses previstas no dispositivo “ou são de natureza eugênica, ou ética, ou moral, ou mesmo uma conjugação destas” (HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes. Op. cit., p. 217).
[6] “Ao reconstruir retrospectivamente a história da família, Morgan chega, de acordo com a maioria de seus colegas, à conclusão de que existiu uma época primitiva em que imperava, no seio da tribo, o comércio sexual promíscuo, de modo que cada mulher pertencia igualmente a todos os homens e cada homem, a todas as mulheres” ENGELS, Friedrich. A origem da família, da propriedade privada e do estado. Tradução Leandro Konder. Rio de Janeiro: BestBolso, 2014. p. 38.
[7] “Ela é um fato da cultura e da linguagem que proíbe em graus diversos os atos incestuosos justamente por estes existirem na realidade. Permite igualmente diferenciar o mundo humano ao arrancar uma pequena parte do homem desse continuum biológico que caracteriza o destino dos mamíferos. Nessas condições, a família pode ser considerada uma instituição humana duplamente universal, uma vez que associa um fato de cultura, construído pela sociedade, a um fato da natureza, inscrito nas leis da reprodução biológica” (ROUDINESCO, Elisabeth, apud FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil, v. 06: Famílias. 10ª ed. Salvador: JusPODIUM, 2018, p. 203.
[8] WELTER, Belmiro Pedro. Teoria Tridimensional do Direito de Família. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009, pp. 227-228.
[9] “Em outras palavras, a origem e o fundamento da norma autorizadora de todas as normas estão na necessidade de um interdito primeiro, primordial e essencial, sem o qual não é possível a existência da cultura. Essa norma fundamental é, portanto, fundante da cultura e da constituição do sujeito. Essa lei-do-pai, para usar uma expressão lacaniana, constitui o passo fundamental da existência de uma organização social jurídica. Foi a partir dessa primeira lei, o interdito proibitório do incesto, e com a ajuda do mito de Édipo, que Freud inaugurou e fundamentou a Psicanálise” (PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Princípios Fundamentais Norteadores do Direito de Família. 3ª ed. São Paulo: SARAIVA, 2016, pp. 49-50).
[10] PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Op. cit., p. 130.
[11] Ibidem. p. 91.
[12] DURKHEIM, Émile. As regras do método sociológico. Tradução: Paulo Neves. São Paulo: Martins Fontes, 2007. p. 15.
[13] Ibidem, p. 46.
[14] Art. 1595, Cód. Civil.
[15] Art. 1.595, §2º, Cód. Civil.
[16] “O fundamento dessa restrição é a preservação dos valores familiares, bem como o equilíbrio e a preservação da própria tessitura psicológica dos membros da família, segundo o papel exercido por cada um, especialmente pelo fato de os afins em linha reta ocuparem posições próximas às de pai ou mãe, filho ou filha” (GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo Curso de Direito Civil, v. 6: Direito de Família: As famílias em perspectiva constitucional. 2ªed. São Paulo: SARAIVA, 2012, p. 227).
[17] GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo Pamplona. Op. cit., p. 228.
[18] Em sentido idêntico, FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Op. cit., p. 205.
[19] Cristiano Chaves de Farias sintetiza a divergência doutrinária: “Com o silêncio do Código Civil de 2002, instalou-se uma fundada divergência doutrinária a respeito da recepção, ou não, dessa norma jurídica permissiva de casamento entre tios e sobrinhos. Em uma margem, Paulo Lôbo defende a não manutenção da possibilidade de autorização do casamento nesse caso, sustentando que a referida norma somente ‘fazia sentido em uma sociedade pouco urbanizada e de controle rígido das escolhas matrimoniais pelos pais, que definiam com quem os filhos, especialmente as filhas, deviam casar, incluindo os parentes próximos’. Noutra perspectiva, Luiz Edson Fachin e Carlos Eduardo Pianovski Ruzyk advogam a tese de que ‘ O Código Civil de 2002 não revoga o Decreto-lei nº 3.200/41’, por se tratar de ‘regra especial em relação ao Código Civil, pelo que sua disciplina se mantém íntegra’, concluindo que ‘não se alterou o regime de casamento entre tios e sobrinhos’, somente havendo ‘a vedação legal se comprovada a inconveniência das núpcias no que tange à saúde da futura prole’. Esse segundo entendimento, por sinal, terminou prevalecendo em sede doutrinária, tendo sido, inclusive, aprovado o Enunciado 98 na Jornada de Direito Civil, aclamando a possibilidade de casamento entre colaterais de terceiro grau, mantida a regra do multicitado Decreto-lei. Concordando com a posição prevalecente, entendemos que a proibição de casamento entre colaterais de terceiro grau está suavizada pelo referido decreto-lei, que permanece em vigor, porque não é incompatível com o sistema atual. Ademais, entendemos que, provada a inexistência de prejuízo para a saúde da prole, cai por terra a vedação legal, impondo-se a vontade das partes de viver em uma união afetiva. De mais a mais, a pluralidade e complexidade das relações familiares contemporâneas apresentam vínculos entre tios e sobrinhos bem diferentes dos que existiam antigamente” (FARIAS, Cristiano; ROSENVALD, Nelson. Op. cit., pp. 206-207).
[20] Cód. Civil, art. 1.723, § 1º.
[21] Embora seja aceita pacificamente a monogamia como princípio ligado ao casamento, é questionável sua extensão à união estável. Em que pese ser este o posicionamento majoritário em sede doutrinária e jurisprudencial, a redação do art. 1.724, Cód. Civil, ao empregar o termo lealdade (e não fidelidade) como obrigação entre os companheiros, parece ter permitido a configuração das assim denominadas relações de poliamor.
[22] PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Op. cit., pp. 127-131.
[23] Escrevendo a respeito da gênese histórica da monogamia, Engels concluiu que esta “De modo algum foi fruto do amor sexual individual, com o qual nada tinha em comum, já que os casamentos, antes como agora, permaneceram casamentos de conveniência. Foi a primeira forma de família que não se baseava em condições naturais, mas econômicas, e concretamente no triunfo da propriedade privada sobre a propriedade comum primitiva, originada espontaneamente. Os gregos proclamavam abertamente que os únicos objetivos da monogamia eram a preponderância do homem na família e a procriação de filhos que só pudessem ser seus para herdar dele” (ENGELS, Friedrich. A Origem da família, da propriedade privada e do Estado. In: MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Obras Escolhidas, v. 3. Trad. Leandro Konder. Rio de Janeiro: ed. VITÓRIA, 1963.p. 54).
[24] Código Civil, art. 1.566, I.
[25] PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Op. cit., p. 134.
[26] Entendendo que a decisão definitiva retroage para atingir o matrimônio, cf. GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo Pamplona. Op. cit., p. 234. Em sentido diverso, entendendo que a decisão não é retroperante, TARTUCE, Flávio. Direito de Família. 11ª ed. Rio de Janeiro: FORENSE, 2006, p. 60. Em posição mais rigorosa, sustentando a incidência do impedimento mesmo antes do trânsito em julgado, MADALENO, Rolf. Manual de Direito de Família. Rio de Janeiro: FORENSE, 2017, pp. 48-49.
[27] MADALENO, Rolf. Op. cit., p.49.
[28] MORAES, Maria Celina Bodin de. Na Medida da Pessoa Humana: estudos de direito civil constitucional. Rio de Janeiro: RENOVAR, 2010, p. 85.
[29] BUCAR, Daniel; TEIXEIRA, Daniele Chaves. Autonomia e Solidariedade. In: TEPEDINO, Gustavo, et. all. O Direito Civil Entre o Sujeito e a Pessoa: Estudos em Homenagem ao Professor Stefano Rodotà. Belo Horizonte: FORUM, 2016, pp. 99-100.
[30] PERLINGIERI, Pietro. O Direito Civil na Legalidade Constitucional. Trad. Maria Cristina De Cicco. Rio de Janeiro: RENOVAR, 2008, p. 335.
[31] BUCAR, Daniel; TEIXEIRA, Daniele Chaves. Op. cit., p. 100.
[32] Luís Roberto Barroso fala em autonomia e heteronomia como expressões da dignidade. A dignidade como autonomia seria pautada na capacidade de autodeterminação (“decidir os rumos da própria vida e desenvolver livremente a própria personalidade”), nas condições para o exercício desta autodeterminação (“meios adequados para que a liberdade seja real, e não mera retórica”), universalidade (sendo uma qualidade comuns a todos os seres humanos) e inerência (a sua universalidade deriva justamente de ser uma qualidade intrínseca a toda pessoa). Vista como heteronomia, a dignidade traduz uma visão ligada a valores compartilhados pela comunidade, pautados em conceitos de bem comum ou interesse público, estando associada não tanto aos desejos individuais, mas a uma percepção de coletividade e convivência. BARROSO, Luís Roberto; MARTEL, Letícia de Campos Velho. A morte como ela é: dignidade e autonomia individual no final da vida. In: GOZZO, Débora, et. all. Bioética e Direitos Fundamentais. São Paulo: SARAIVA, 2014, pp. 38-42.
[33] PERLINGIERI, Pietro. Op. cit., 335-336.
[34] Pietro PERLINGIERI apresenta o conceito de autonomia negocial como gênero compreensivo da autonomia nas relações existenciais e patrimoniais, estas últimas reguladas pela autonomia contratual, que seria espécie do conceito maior. PERLINGIERI, Pietro. Op. cit.,
[35] BUCAR, Daniel; TEIXEIRA, Daniele Chaves. Op. cit., p. 108.
[36] TEIXEIRA, Ana Carolina Brochardo. Saúde, Corpo e Autonomia privada. Rio de Janeiro: RENOVAR, 2010, pp. 159-160.
[37] “No que tange às situações pessoais, como aquelas que se referem à vida privada do sujeito – como por exemplo, à liberdade de crença, de associação, de profissão, de pensamento -, considera-se haver uma ‘proteção constitucional reforçada, porque sob o prisma da Constituição, estes direitos são indispensáveis para a vida humana com dignidade’. Significa dizer que as ações humanas que envolvem escolhas de caráter existencial são protegidas de modo mais intenso pela ordem constitucional. O mesmo não se dá com as situações privadas patrimoniais, mais sujeitas à intervenção por parte do Estado. Tais situações, em virtude de fatores socioeconômicos considerados pelo constituinte, devem desempenhar, além da função individual, também uma função social” (MORAES, Maria Celina Bodin de. Op. cit., p. 190).
[38] TEIXEIRA, Ana Carolina Brochardo. Op. cit., p. 268.
[39] BARROSO, Luís Roberto; MARTEL, Letícia de Campos Velho. Op. cit.,, p. 37.
[40] BARBOSA, Heloísa Helena. Reflexões sobre a autonomia negocial. In: TEPEDINO, Gustavo, et. all. O Direito & O Tempo: Embates jurídicos e Utopias contemporâneas. Rio de Janeiro: RENOVAR, 2008, p. 410.
[41] TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado; KONDER, Carlos Nelson P. Autonomia e solidariedade na disposição de órgãos para depois da morte. Revista da Faculdade de Direito da UERJ, v. 18, p. 8, 2010. Disponível em: https://cebid.com.br/wp-content/uploads/2010/05/1357-5250-1-PB.pdf. Acesso em 25 de julho de 2019. p. 3.
[43] “A visão da dignidade como autonomia valoriza o indivíduo, sua liberdade e seus direitos fundamentais. Com ela são fomentados o pluralismo, a diversidade e a democracia de uma maneira geral. Todavia, a prevalência da dignidade como autonomia não pode ser ilimitada ou incondicional. Em primeiro lugar, porque o próprio pluralismo pressupõe, naturalmente, a convivência harmoniosa de projetos de vida divergentes, de direitos fundamentais que podem entrar em rota de colisão. Além disso, as escolhas individuais podem produzir impactos não apenas sobre as relações intersubjetivas, mas também sobre todo o corpo social e, em certos casos, sobre a humanidade como um todo. Daí a necessidade de imposição de valores externos aos sujeitos. Da dignidade como heteronomia” (BARROSO, Luís Roberto; MARTEL, Letícia de Campos Velho. Op. cit., p. 42).
[44] TAVARES, Felipe Cavaliere. Multiculturalismo e hermenêutica constitucional: As principais diferenças entre liberais, comunitaristas e crítico-deliberativos. In: ASENSI, Felipe Dutra; PAULA, Daniel Giotti de. (Coord.) Tratado de direito constitucional. Volume 1: Constituição, política e sociedade. Rio de Janeiro: Elsevier, 2014, p. 530.
[45] TAVARES, Quintino Lopes Castro. Multiculturalismo. In: LOIS, Cecilia Caballero (org.) Justiça e democracia entre o universalismo e o comunitarismo: A contribuição de Rawls, Dworkin, Ackerman, Raz, Walzer e Habermas para a moderna teoria da justiça. São Paulo: Landy Editora, 2005, p.92.
[46] CITTADINO, Gisele. Pluralismo, Direito e Justiça Distributiva: Elementos da Filosofia Constitucional contemporânea. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p.135.
[47] O discurso comunitarista entende que a existência de direitos pressupõe a assunção de responsabilidades, muito embora o inverso não seja necessariamente verdadeiro, podendo existir responsabilidades sociais da pessoa perante a comunidade, a serem exercidas sem um benefício imediato, como e.g., aquelas relacionadas às gerações futuras. ETZIONI, Amitai. The Spirit of Community: The Reinvention of American Society. Nova York: TOUCHSTONE, 1993, pp. 04-05.
[48] ETZIONI, Amitai. The Limits of Privacy. Nova York: Basic Books, 1999, p. 05.
[49] ETZIONI, Amitai. How Patriotic is the Patriot Act? Nova York: Routledge, 2005, p. 05.
[50] ETZIONI, Amitai. The New Golden Rule: Community and Morality in a Democratic Society.Nova York: Basic Books, 1996, p.46.
[51] ETZIONI, Amitai. The New Golden Rule. Cit., p. 52.
[52] Diferente, portanto, do modelo liberal, onde a constituição possui a função de garantir a realização dos direitos individuais e liberdades públicas, protegendo-as, inclusive, da deliberação pública. Por este motivo, a constituição liberal também é chamada de Constituição – Garantia. É o que nos diz Ronald Dworkin, que em sua teoria do ‘Direito como Integridade’, afirma que os argumentos baseados nos princípios racionais geradores dos direitos individuais devem ter mais peso do que os argumentos de política, voltados para o bem coletivo da comunidade. Cf. DWORKIN, Ronald. Levando os Direitos a Sério. Tradução de Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p.132.
[53] Este modelo de interpretação da constituição é defendido também por autores como Konrad Hesse e Peter Haberle, integrantes da chamada Nova Hermenêutica Constitucional Alemã, para quem os princípios e normas constitucionais são, na verdade, valores inscritos na cultura daquela comunidade, devendo o Tribunal Constitucional interpretar o sistema constitucional como um conjunto de valores, e não como um conjunto de regras e princípios. Cf. CITTADINO, Gisele. Pluralismo, Direito e Justiça Distributiva: Elementos da Filosofia Constitucional contemporânea. Op. cit., p.30.
[54] TEIXEIRA, Ana Carolina Brochardo. A função dos impedimentos no Direito de Família: uma reflexão sobre o casamento dos irmãos consanguíneos ocorrido na Alemanha. In: TEPEDINO, Gustavo, et. all. Diálogos sobre Direito Civil. Vol. II. Rio de Janeiro: RENOVAR, 2008, p. 554.
[55] É preciso ter em mente que a procriação e a reprodução não constituem necessariamente objetivos essenciais do casamento. Nesse sentido: “Há muito a reprodução não é essência da família, como era antigamente. Tanto é que o Direito reconhece expressamente a família monoparental (art. 226, §4º, CF/88), que não tem a procriação como seu objetivo. Sob essa perspectiva, o empecilho eugênico deve ser tratado não na órbita da violação a direitos fundamentais dos futuros filhos, mas sim, no âmbito de um projeto parental, previsto pelos art. 226, §7º, CF, uma vez que o objetivo de ter filhos pode não fazer parte do planejamento familiar daquele casal. Contudo, mesmo que o seja, haveria outras formas de alcança-lo, seja através da adoção, seja através da submissão a exames de previsibilidade genética, para constatar, na situação concreta, a existência e, em caso positivo, o grau de risco eugênico de forma precisa. Diante disso, a discussão se desloca não para a formação da prole, mas para a união entre os consanguíneos” (TEIXEIRA, Ana Carolina Brochardo. A função dos impedimentos no Direito de Família: uma reflexão sobre o casamento dos irmãos consanguíneos ocorrido na Alemanha. Cit., pp. 555-556).
[56] No mesmo sentido: “Estariam os impedimentos cumprindo o objetivo constitucional de tutela da pessoa humana, ao impedir a continuidade de uma relação em que as partes entendem como uma família conjugal? Nessa perspectiva, estariam eles cumprindo sua função”? (TEIXEIRA, Ana Carolina Brochardo. A função dos impedimentos no Direito de Família: uma reflexão sobre o casamento dos irmãos consanguíneos ocorrido na Alemanha. Cit, p. 559).
[57] PERLINGIERI, Pietro. O Direito Civil na Legalidade Constitucional. Op. cit., p. 359.
[58] Nesse sentido: “O ato negocial é válido não tanto porque desejado, mas se, e apenas se, destinado a realizar, segundo um ordenamento fundado no personalismo e no solidarismo, um interesse merecedor de tutela” (PERLINGIERI, Pietro. O Direito Civil na Legalidade Constitucional. Op. cit., p. 371).
[59] TEIXEIRA, Ana Carolina Brochardo. A função dos impedimentos no Direito de Família: uma reflexão sobre o casamento dos irmãos consanguíneos ocorrido na Alemanha. cit., p. 570.
[60] FACHIN, Luiz Edson. Direito Civil: Sentidos, Transformações e Fins. Rio de Janeiro: RENOVAR, 2015, p.159.
[61] “Naquele passo, a família era limitada a representar uma aquarela de tonalidades e cores morais e sociais, em lugar de ser uma tela policrômica para o desenho do sentimento e do afeto.
Essa renovada estruturação familiar abriu as portas à compreensão e ao reconhecimento de inúmeros outros tons, a rigor sem modelos excludentes, resultando de uma série de transformações sociais, especialmente ocorridas aos anos que sucederam a gênese da nova ordem constitucional” (FACHIN, Luiz Edson. Direito Civil: Sentidos, Transformações e Fim. Op. cit., pp. 161-162).
[62] “Nesse andamento, importa destacar que se a família for pensada em um viés plural e aberto, apreendida como espaço de uma autoconstituição existencial, não caberia nem ao Estado nem à comunidade a definição de como essa autoconstituição será desenvolvida, em quais pilares essa autoconstituição se sustentará, ou quais cores passará ela a exprimir. Tocaria, pois, ao Estado uma proteção inclusiva” (FACHIN, Luiz Edson. Direito Civil: Sentidos, Transformações e Fim. Op. cit., p. 163).
[63] Interessante notar que o comunitarismo compreende “boa sociedade” como aquela que confia primordialmente na sua infraestrutura moral e mecanismos informais de controle social (em detrimento dos mecanismos legais institucionalizados) para preservar seus valores morais essenciais. ETZIONI, Amitai. Law in a New Key: Essays on Law and Society. Nova Orleans, Quid pro Quo Book, 2010, p. 132.
[64] ETZIONI, Amitai. The New Golden Rule. Op. cit., p. 85.
[65] WALZER, Michael. Esferas da Justiça. São Paulo: Martins Fontes, 2003, pp. 01-11.
[66] ETZIONI, Amitai. The New Golden Rule. Op. cit., p. 195.
[67] ETZIONI, Amitai. The New Golden Rule. Op. cit., p.189.
[68] Em que pese esses elementos serem direcionados à relações entre comunidades, conforme já foi dito, nada impede sua adaptação à relações entre comunidades e indivíduos, ou que se considere as entidades familiares como células sociais que ocupam um papel de comunidades nucleares.
[69] ETZIONI, Amitai. The New Golden Rule. Op. cit., p. 199.
[70] Ibidem, p. 200.
[71] Ibidem, p. 203.
[72] Ibidem, p. 204.
[73] Ibidem, p. 205.
[74] Ibidem, p.208.
[75] Ibidem, p.208.
[76] Ibidem, pp. 218-241.
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