Artigos
As constelações familiares como método alternativo de resolução de conflitos no direito de família
Vitória Lima Figueiredo [1]
Ma. Francisca Juliana Castello Branco Evaristo de Paiva[2]
RESUMO
Devida a grande demanda do poder judiciário, que resulta cada vez mais no acúmulo de processos e à morosidade das suas soluções, torna-se natural a procura por outras abordagens, outros métodos que auxiliem na resolução desses problemas. Nesse sentido o Novo Código de Processo Civil aborda a conciliação e mediação, privilegiando tais meios como método de solução consensual de conflitos. Atualmente um novo método de resolução de conflitos vem ganhando visibilidade, o método das constelações familiares. Tal método vem sendo estudado e aplicado em determinados Tribunais de Justiça, contribuindo com o Judiciário para diminuir a sobrecarga, bem como proporciona aos jurisdicionados uma solução de conflito harmônica.
Palavras-chave: Conflitos. Bert Hellinger. Constelação Familiar. Sami Storch.
ABSTRACT
Due to the great demand of the judiciary, which increasingly results in the accumulation of lawsuits and the slowness of their solutions, it is natural to look for other approaches, other methods that help in solving these problems. In this sense, the New Civil Procedure Code addresses conciliation and mediation, privileging such means as a method of consensual solution of conflicts. Currently, a new conflict resolution method is gaining visibility, the family constellation method. This method has been studied and applied in certain Courts of Justice, contributing to the Judiciary to reduce the burden, as well as providing jurisdictional persons with a harmonic conflict solution.
Keywords: Conflicts. Bert Hellinger. Family Constellation. Sami Storch.
INTRODUÇÃO
Fazemos parte de uma sociedade em que o Judiciário se tornou a principal e a primeira fonte de procura para a resolução de conflitos. As demandas da sociedade diante o sistema jurídico, o acúmulo de processos, a morosidade e a insatisfação com as resoluções gera a busca por mecanismos que possam auxiliar o Judiciário, visando diminuir a sobrecarga do sistema jurídico. Dentre esses mecanismos auxiliadores estão a conciliação e a mediação.
No âmbito do Direito de Família a possibilidade da utilização de métodos consensuais para a resolução dos conflitos é essencial e eficaz, pois o eixo central da família é o afeto e mesmo quando as relações são desfeitas, as repercussões perduram, por isso a necessidade da existência de mecanismos de soluções de conflitos que preservem a harmonia no núcleo familiar e os laços afetivos.
Técnicas de conciliação e mediação já são habitualmente utilizadas para a resolução de conflitos no direito de família. Entretanto, atualmente um novo método de resolução de conflito vem ganhando visibilidade, o método das constelações sistêmicas ou constelações familiares.
No primeiro capítulo foi abordado sobre a teoria do conflito, onde demonstra-se a necessidade da mudança de entendimento da sociedade, para que a expressão “conflito” deixe de ter conotação negativa, passando a ser visto de forma positiva e comum nas relações humanas. Ainda no primeiro capítulo, o artigo abordará sobre os conflitos familiares e a crise no sistema judiciário brasileiro em relação à resolução de conflitos.
O segundo capítulo versa acerca dos métodos alternativos para resolução de conflitos que foram privilegiados pelo Código de Processo Civil e pela Resolução 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça. Neste mesmo capítulo o artigo apresentará a Constelação Familiar como método alternativo de resolução de conflitos.
Por fim, o último capítulo demonstrará a aplicação da Constelação Familiar no Direito Brasileiro, discutindo a sua aplicabilidade, discorrendo a introdução da Constelação no Judiciário e demonstrando à eficácia da utilização da Constelação como instrumento auxiliador do Poder Judiciário.
Portanto, objetiva-se através deste estudo oferecer uma melhor compreensão sobre as Constelações Familiares e analisar sua eficácia em relação a acordos e ao encerramento de atritos entre as partes.
A visão do Direito sistêmico é nova, isso pode ser constatado pela falta de publicações científicas sobre o tema, portanto torna-se relevante para o operador de Direito e para a Instituição de ensino trabalhar um tema pouco discutido e bastante atual.
De modo geral este trabalho busca apresentar métodos alternativos de resolução de conflitos no processo civil Brasileiro, especialmente a aplicação da técnica das constelações familiares no âmbito do Direito de família, demonstrando os benefícios tanto para as partes quando para o Poder Judiciário. O presente trabalho foi realizado mediante pesquisa bibliográfica, com abordagem do método dedutivo de pesquisa.
2 A TEORIA DO CONFLITO
Conflito é uma forma de sociação, segundo Georg Simmel (2011, p. 01):
Conflito é admitido por causar ou modificar grupos de interesse, unificações, organizações. Por outro lado, pode parecer paradoxal na visão comum se alguém pergunta se independentemente de quaisquer fenômenos que resultam de condenar ou que a acompanham, o conflito é uma forma de sociação. À primeira vista, isso soa como uma pergunta retórica. Se todas as interações entre os homens é uma sociação, o conflito, - afinal uma das interações mais vivas, que, além disso, não pode ser exercida por um indivíduo sozinho, - deve certamente ser considerado como sociação.
O primeiro questionamento que surge é que se o conflito trata-se de um problema do direito. Não é função principal da Ciência do Direito o estudo do conflito, mas é evidente que o Conflito é fenômeno presente na vida em sociedade, de forma que os operadores do Direito necessitam traçar um estudo visando sistematizar logicamente desde a sua origem até as suas consequências.
Nesse sentido constatam Andrea Maia, Angela Andrade Bianchi e José Maria Rossani Garcez (2016, p. 43) que: “O conflito é inerente às relações humanas e, assim, faz parte da sociedade. A forma de resolvê-los varia de acordo com os paradigmas vigentes nas diferentes culturas, em cada época”.
A respeito do tema, Christophe W. Moore (1998, p. 5) pondera que “Todas as sociedades, comunidades, organizações e relacionamentos interpessoais experimentam conflitos em um ou outro momento no processo diário de interação. O conflito não é necessariamente ruim, anormal ou disfuncional, é um fato da vida”.
O conflito em si é uma circunstância em que duas ou mais pessoas divergem em razão de determinado assunto. Acontece que normalmente a expressão “conflito” é associada a outras expressões com conotação negativa, fazendo-se necessário entender, que o conflito possui aspectos positivos, podendo resultar dele entendimentos e soluções. Para Angela Andrade Bianchi, Eva Jonathan e Olivia Agnes Meurer (2016, p. 75) os conflitos: “São em si inevitáveis e o que pode transformá-los em algo positivo ou negativo são as ações escolhidas para lidar com eles”.
A mudança de entendimento da sociedade, deixando de ver o conflito de uma forma negativa, passando a avaliá-lo de forma positiva tem representado uma verdadeira reviravolta na teoria do conflito, pois a partir do momento que o conflito é visto de forma positiva e comum nas relações humanas, ele poderá ser utilizado como ferramenta para solução de litígios.
2.1 CONFLITOS FAMILIARES
Por mais que a família tenha passado por diversas transformações sociais e estruturais ao longo dos séculos, esta continua sendo a base de qualquer sociedade. A sociedade avançou e novos modelos de família foram sendo construídos, e o termo família deixou de ser singular e passou a ser plural, privilegiando a dignidade da pessoa humana, e possuindo a afetividade como norteadora das relações. Nesse sentido pontua de forma precisa Maria Berenice Dias (2017, p.29):
Nem sem sabe como começou, mas muitos foram os fatores que levaram à transformação da família patriarcal de uma unidade de procriação e produção para a família dos dias de hoje: nuclear e familiar. A nova família estrutura-se nas relações de autenticidade, afeto, amor, diálogo e igualdade.
Quando surgem conflitos dentro do seio familiar e o diálogo já não é mais possível, não conseguindo assim resolver, surge a necessidade de buscar alternativas para a resolução dos conflitos, e é nesse momento que o Judiciário passa a ser o meio buscado para solucionar demandas referentes a conflitos familiares.
Esses conflitos exigem que magistrados, promotores, advogados e defensores públicos sejam mais sensíveis, e tenham uma formação diferenciada, pois trabalham com um ramo que lida diretamente com a pessoa e seus sentimentos. É necessário entender que a família é entidade cujo eixo central é o afeto, então mesmo que as relações se desfaçam, existindo filhos ou não, suas repercussões perduram e dessa maneira faz-se necessário a busca de mecanismos de solução de disputas que valide os sentimentos dos envolvidos, bem como compreenda a complexidade do conflito e das pessoas que estão nele inseridas. No dizer de Maria Berenice Dias (2017, p. 30), o desafio que se coloca a todos os Operadores do Direito é a capacidade de tratar das questões familiares de forma cuidadosa, preocupada e atenta.
Dessa maneira, no âmbito dos conflitos familiares se faz necessário mesclar o direito com outras áreas do conhecimento, que possuem a família como objeto de estudo, como por exemplo, a psicologia e assistência social, para assim poder lidar com o conflito de forma sensível, preservando as partes.
Quem vai ao judiciário em busca de solucionar conflitos familiares, na maioria das vezes chega fragilizado, com mágoas e incertezas, pois como bem preleciona Maria Berenice Dias (2016, p. 109):
O juiz não pode esquecer que, ao se apaixonarem, as pessoas sentem ter encontrado a parte que lhes faltava e nada mais fazem do que projetar sobre o outro sua própria imagem ou a imagem de seu ideal - "inventa-se" o outro, agigantando suas qualidades e defeitos. Assim, quando se rompe o sonho da plenitude da felicidade, as pessoas se confrontam com o desamparo, e partem em busca de um culpado. As separações acarretam perdas emocionais, lutos afetivos pela morte de um projeto a dois, pelo fim dos sonhos acalentados e não realizados.
Estas sentenças raramente produzem o efeito pacificador desejado, a maioria gera insatisfação às partes, e o judiciário Brasileiro encontra-se sobrecarregado devido as excessivas demandas da sociedade, resultando na morosidade nas soluções dos conflitos. Por esses motivos e outros, cada vez mais métodos alternativos de resolução de conflitos ganham espaço no Poder Judiciário Brasileiro.
2.2 A CRISE NO SISTEMA JUDICIÁRIO BRASILEIRO EM RELAÇÃO À RESOLUÇÃO DE CONFLITOS
Com o advento da Constituição Federal de 1988 e as garantias trazidas por ela, o judiciário passou a ficar mais próximo dos cidadãos e com isso verificou-se o crescimento de litígio que acabou por aumentar a quantidade de processos abarrotados no sistema judiciário. Com isso, a prestação jurisdicional tornou-se ineficiente, quantitativa e qualitativamente. Novos conflitos e controvérsias chegam para apreciação do Poder Judiciário todos os dias, e o atual sistema não consegue dar vazão de forma eficaz às milhares de ações judiciais que diariamente são trazidas ao Judiciário. É nesse contexto que o cidadão enfrenta o maior déficit do Judiciário – a morosidade –, o que acaba levando a sociedade a ver o Poder Judiciário com descrédito, a morosidade do Judiciário é comprovada através da Justiça em números do ano de 2018, disponibilizada pelo Conselho Nacional de Justiça, no qual afirma que o Judiciário chegou ao final do ano de 2017 com 80,1 milhões de processos em tramitação aguardando alguma solução definitiva.
A morosidade, o alto custo e a extrema burocratização dos processos, as ausências de informação por parte dos conflitantes acabam se tornando alguns dos obstáculos existentes para o acesso à justiça, acabando por afastar o Poder Judiciário dos cidadãos. No entanto, ao mesmo tempo em que o acesso à justiça é marcado por diversos obstáculos, o número de litígios aumenta, terminando por sobrecarregar o Poder Judiciário. Em relação a essa quantidade de processos que sobrecarregam o Judiciário, se deve ao fato já abordado por este artigo – a cultura do conflito. Nesse sentido, as pessoas se dirigem ao Judiciário para demandar qualquer espécie de problema.
O acesso à justiça é garantia constitucional, previsto no artigo 5º, XXXV da Constituição Federal, portanto é direito dos cidadãos não apenas o acesso à justiça, mas que essa justiça seja realmente efetiva e eficaz, que responda aos anseios de uma sociedade que está em constante transformação, uma sociedade cuja relações a cada dia se tornam mais complexas, surgindo diariamente novas controvérsias que necessitam de solução. Nessa óptica, em função da crise que se estabeleceu no Poder Judiciário, na qual pode-se observar através da quantidade de processos parados, é necessário que o Judiciário procure novas formas para a solução dos litígios, uma vez que a sociedade espera uma prestação jurisdicional efetiva, célere e de qualidade.
Diante da crise vivenciada pelo Judiciário e devido a ineficiência do Estado em garantir uma prestação jurisdicional adequada aos cidadãos, surgiram os meios alternativos de solução dos conflitos como uma nova forma de solução dos litígios, mais célere e eficaz. Entre eles aparecem: a arbitragem, a conciliação, a negociação e, a mediação, abordados no próximo tópico.
3 MÉTODOS ALTERNATIVOS PARA RESOLUÇÃO DE CONFLITOS
No primeiro momento é necessário entender que para que os meios de solução de conflitos obtenham êxito em sua prática, é necessário mudar a visão que se tem do próprio conflito, deixando de lado a lógica do processo de ganhador/perdedor e passar para a lógica do ganhador/ganhador, visando chegar sempre em um consenso entre as partes envolvidas.
É a busca por decisões mais justas, céleres e eficazes, que oportunizou a utilização de instrumentos de soluções pacificas de conflitos. O Código de Processo Civil traz em seu artigo 3º a seguinte determinação:
Art. 3º Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito.
§ 1º É permitida a arbitragem, na forma da lei.
§ 2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos.
§ 3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.
O Código de Processo Civil com o artigo acima transcrito normatizou a possibilidade de outros meios que não sejam o Estado para solucionar conflitos. A Mediação surgiu como uma possibilidade autocompositiva dos conflitos, ou seja, as partes passam a solucionar os litígios estabelecendo acordos sem que ocorra a interferência do Estado, o que levaria o Poder Judiciário a interferir apenas nos casos complexos, em que a mediação não conseguiu resolver. Em suma a Mediação é instrumento importante de pacificação social.
É importante salientar que a Resolução 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça, defende a criação de novas formas razoáveis de solução consensual de conflitos.
O parágrafo único do artigo 1º da Resolução 125/2010 dispõe que:
Art. 1º Fica instituída a Política Judiciária Nacional de tratamento dos conflitos de interesses, tendente a assegurar a todos o direito à solução dos conflitos por meios adequados à sua natureza e peculiaridade.
Parágrafo único. Aos órgãos judiciários incumbe, nos termos do art. 334 do Novo Código de Processo Civil combinado com o art. 27 da Lei de Mediação, antes da solução adjudicada mediante sentença, oferecer outros mecanismos de soluções de controvérsias, em especial os chamados meios consensuais, como a mediação e a conciliação, bem assim prestar atendimento e orientação ao cidadão.
Métodos como mediação e conciliação servem para propiciar a retomada de diálogo, principalmente em se tratando de conflitos familiares em que é necessária a preservação dos vínculos afetivos, visto que a maioria dos conflitos familiares têm como eixo central questões relacionada a crianças.
A conciliação conta com a ajuda de terceiro imparcial e capacitado, que orientará as partes envolvidas, podendo sugerir soluções. A mediação por sua vez, se diferencia da conciliação por não sugerir a solução de conflitos e sim facilitar o diálogo entre as partes.
Segundo Antônio Carlos Ozório Nunes (2016, p. 39) a mediação “é adequada para todos os conflitos, principalmente que as partes mantêm relacionamento continuado, frequente, como nas relações familiares, societárias, de vizinhança, entre outras”.
Ainda na mesma seara afirma Marilene Marodin (2016, p. 427):
A mediação é uma possibilidade de transformação cultural da gestão de situações conflitivas entre pessoas, grupos e instituições. Essa mudança paradigmática ocorre pelo abandono de opções que validam o litígio e, no lugar destas, adotam a cultura que valoriza o diálogo e estimula os envolvidos a buscarem as soluções dos próprios problemas.
Em 2015, conforme o Relatório de Justiça disponibilizado pelo Conselho Nacional de Justiça contabilizou-se pela primeira vez o número de acordos obtidos por mediações e conciliações em processos judiciais. Com o advento da Lei 13.140/15 e do Novo CPC, o número de acordos sem dúvidas foram ainda mais promissores, visto que tanto a Lei 13.140/15 e o Código de Processo Civil, trouxeram expressamente instrumentos alternativos de solução de conflitos.
Em relação à necessidade de implementação de novos métodos de solução de conflitos, preleciona Deusa Cristina Miranda Ferreira e Luanna Cecília Costa Sousa (2018, p. 169):
É de amplo conhecimento a urgência na implementação eficaz de novos métodos de tratamento dos conflitos, exigências estas trazidas pelo novo CPC como resposta à morosidade e ao descontentamento com o sistema judiciário brasileiro por grande parte da sociedade, sendo crescente o interesse pela abordagem sistêmica do direito, vez que a tradicional forma de tratar os conflitos já não é vista como a mais eficiente, pois busca apenas solucionar o conflito aparente, deixando os ocultos e quase sempre verdadeiros sem uma resolução, abrindo caminho para que novas demandas ocorram, ou seja, a utilização de tais métodos deseja não apenas resolver o conflito e sim tem como desejo maior o restabelecimento da comunicação entre as partes e a pacificação efetiva de toda a relação.
É evidente que as técnicas alternativas são os meios em que as partes certamente encontrarão solução consensual com um resultado mais efetivo, propiciando a retomada do dialogo, validando e respeitando as diferenças e sempre observando os Princípios que norteiam o Direito de Família, principalmente o da afetividade. Ademais é necessário que com o fim do processo, também se tenha o fim do conflito, que na maioria das vezes não acontece, e quase sempre surgem novas demandas, devido ao fato de não se ter trabalho o conflito de forma correta.
Outro meio método alternativo de resolução de conflitos por meio de forma pacífica são as constelações familiares. Neste sentido o Judiciário Brasileiro passou a introduzir as Constelações Sistêmicas ou Constelações familiares como método auxiliador para a resolução de conflitos familiares, no próximo tópico este método será abordado de forma mais detalhada.
3.1 DA CONSTELAÇÃO FAMILIAR: EVOLUÇÃO E CONCEITO
De forma direta a Constelação familiar pode ser definida como um método psicoterapêutico recente, com abordagem sistêmica não empirista, ou subjetiva, desenvolvido pelo psicoterapeuta alemão Bert Hellinger. Hellinger desenvolveu o método a partir de observações empíricas, baseadas em diversos tipos de psicoterapia familiar, nos padrões de comportamento que se repetiam nas famílias e em grupos familiares ao longo de gerações.
A constelação familiar foi desenvolvida por volta da década de 1970, como fruto das experiências e histórias vividas por Bert Hellinger. Mas para isso, Hellinger utilizou de diversas referências, linhas de conhecimentos, que o ajudaram a chegar na Constelação familiar que hoje se estuda.
A teoria da análise transacional de Eric Berne foi uma grande motivação para Bert Hellinger, tal teoria acredita que o ser humano é um indivíduo social, e que se colocado em contato com outra pessoa, algo irá resultar dessa interrelação. Outra referência para Bert Hellinger foi a descoberta feita pela psicoterapeuta americana Virginia Satir, que trabalhava com o método das “esculturas familiares”, tendo como foco do seu trabalho às estruturas formadas pelo modo como as pessoas dentro de um sistema se relacionam, ela trabalhava a história da família em questão em todas as suas facetas, utilizando-se todas as relações afetivas e de parentescos em diversas gerações.
Jakob Levy Moreno, também foi referência para Bert Hellinger no desenvolvimento da Constelação familiar, foi o criador do psicodrama e desenvolveu um conhecimento onde o cliente poderia representar toda sua vivência e sua experiência no mundo em uma encenação. Assim como Jacok Levy Moreno, Bert Hellinger também baseou-se nos estudos de Arthur Janov, psicoterapeuta americano que no fim nos anos 60 observou um fenômeno conhecido como “Grito primal”, criando a idéia de trabalhar com a reexperiência de momentos difíceis na busca de liberar e expressar algo que estava bloqueado.
Em relação as suas referências para o desenvolvimento dos seus estudos, Hellinger (2007, p. 400) afirma:
Fiquei profundamente impressionado com a maneira direta como Janov abordava as emoções básicas. Nos meus cursos de dinâmica de grupos experimentei secretamente seus métodos e imediatamente reconheci seu impacto. Resolvi então que, após terminar minha formação em psicanálise, iria submeter-me a uma terapia primal com Janov.
Bert Hellinger desbravou diversas teorias e métodos terapêuticos, como a análise transacional e a obra de Eric Berne. Com seu repertório enriquecido começou a associar os métodos e, junto com a primeira esposa Herta, integrou a dinâmica de grupo e a psicanálise Gestalt-terapia, terapia primal e análise transacional. Em relação aos métodos terapêuticos que foram importantes para o enriquecimento de seu repertório, Bert Hellinger (2007, p. 401), em suas palavras:
Durante muitos anos, de 1974 a 1988, combinei a análise do script e a terapia primal. Em seguida, ocupei-me intensamente com a terapia familiar, a nova tendência dos anos 70. Então estive nos Estados Unidos por mais quatros semanas e participei de um grande seminário sobre terapia familiar, dirigido por Ruth McClendon e Les Kadis. Com eles aprendi muito.
Bert Hellinger nasceu em 1925, entre duas Guerras Mundiais, trabalhou por 16 anos como membro de uma ordem de missionários católicos, sendo missionário na África do Sul. A partir de observações empíricas do comportamento dos zulus, tribo desse país, percebeu padrões que se repetem nas famílias e grupos familiares ao longo de gerações. Portanto Hellinger atravessou diversos campos, na filosofia, na teologia, na cultura zulu, na pedagogia, nas teorias e métodos terapêuticos, para assim construir a sua própria forma de trabalhar.
3.1.1 Bert Hellinger e Hellinger Sciencia
O fenômeno da constelação familiar e as técnicas desenvolvidas por Bert Hellinger tiveram origem no campo terapêutico. É imperioso afirmar que Bert Hellinger não foi o criador das constelações familiares e sim desenvolvedor delas, como já demonstrado no tópico anterior. O desenvolvimento das Constelações Familiares surgiu com junção dos saberes de comunidades tribais, de teorias e métodos de estudiosos, autores das áreas da filosofia, teologia, psicologia, psicanálise, dentre outras, bem como as vivências de Bert Hellinger.
Após desenvolver sua filosofia, Bert Hellinger passou a trabalhar com as constelações familiares tendo como único foco o âmbito terapêutico, até que sua esposa Sophie o fez entender e perceber a necessidade de transmitir esse conhecimento de modo mais abrangente. Nesse momento o casal Hellinger criou a Hellinger Schule, intitulando-a como uma escola da vida, com o objetivo de transmitir todo o conhecimento adquirido, a outros profissionais e às pessoas de modo geral.
A transmissão dos conhecimentos às pessoas de modo geral visa o autoconhecimento o crescimento pessoal para a composição de parcerias afetivas construtivas e famílias harmoniosas, aos profissionais na ajuda do equilíbrio das relações no ambiente de trabalho. A Hellinger Sciencia é apresentada como uma ciência do amor do espírito, uma ciência universal das ordens que regem as relações humanas. Mas ao mesmo tempo em que é uma é a ciência das ordens, é a ciência sobre as desordens que leva aos conflitos no convívio humano, nas quais invés de unir as pessoas as separam.
4 A CONSTELAÇÃO FAMILIAR APLICADA AO DIREITO BRASILEIRO
A Constelação Sistêmica ou a também Constelação Familiar quando aplicada nos conflitos familiares, consiste em um método psicoterápico desenvolvido pelo psicoterapeuta alemão Bert Hellinger, realizado através de representações, onde se estuda as emoções e energias que consciente ou inconscientemente são acumuladas pelos seres humanos e através de uma abordagem sistêmica, gera a compreensão de todos os fatores que estão envolvidos no conflito, e auxilia na identificação do problema em questão, bem como direciona as ações em direção a solução do conflito.
Durante a trajetória de Bert Hellinger, o psicoterapeuta e estudioso observou que as Ordens do Amor – como ele nomeou, exercem papel fundamental no equilíbrio e manutenção do sistema familiar e estas Ordens são compostas por três Leis: Ordem, Pertencimento e Equilíbrio.
Hellinger (2015, p.17) corrobora que:
Sentimos essas três necessidades com a permanência de impulsos ou reações instintivas. Ela nos subjulgam a forças que nos desafiam, exigem obediência, coagem e controlam; elas limitam nossas escolhas e nos impingem, queiramos ou não, objetivos que entram em conflito com os nossos desejos e prazeres pessoais.
A dinâmica da Constelação Familiar possibilita a exteriorização de conflitos que estão escondidos, ajudando a restaurar o equilíbrio familiar. Este método chegou ao Brasil no ano de 1999, e o percursor na aplicabilidade e desenvolvimento do Direito Sistêmico, é o Juiz Samir Storch, que além de colocar em prática a teoria sistêmica nas audiências, realiza palestras onde explica o método das constelações através de seus casos efetivados.
Este método vem sendo estudado e aplicado por determinados Tribunais de Justiça pátrios, alcançando êxito e contribuindo para que as partes identifiquem seus reais problemas e consigam resolvê-los de forma satisfatória, auxiliando então o Judiciário a resolver o litígio de forma mais rápida e eficiente, bem como abre espaço para uma Justiça mais humana.
Nessa vereda, Deusa Cristina Miranda Ferreira e Luanna Cecília Costa Sousa (2018, p. 171) confirmam:
Alguns estados brasileiros já estão usando a técnica de Constelação Familiares em um momento preliminar à audiência de Mediação e Conciliação com resultados positivos, visando a celeridade dos processos e soluções satisfatórias aos conflitos apresentados na busca de acordos onde as partes restabeleçam os vínculos rompidos.
O aproveitamento das Constelações Familiares é constatado através de diversas reportagens e publicações em Tribunais de diversos estados. Cerca de 16 Estados e o Distrito Federal utilizam a técnica das Constelações Familiares antes das audiências de conciliação e mediação como auxiliador efetivo na facilitação do diálogo.
Em 2014, conforme disponibilizado no site do Conselho Nacional de Justiça, o Tribunal de Justiça de Goiás ganhou o prêmio de primeiro lugar na categoria “Tribunal Estadual” do V Pre?mio Conciliar é Legal. Em 2015, o Centro Judiciário de Solução de Conflitos – CEJUSC, da comarca de Sorriso no Mato Grosso, ofereceu pela primeira vez as dinâmicas das constelações familiares aos seus Jurisdicionados (CNJ, 2015). Dentre os casos que foram atendidos, estava o de um casal que havia procurado a justiça para realizar o divorcio, mas após participarem da dinâmica das constelações, acabaram desistindo.
Sobre a experiência de participar da dinâmica, declaram às partes (CNJ, 2015):
Eu nunca imaginava encontrar isso na Justiça. Aliás, nem acreditava nesse tipo de coisa. Achei que iriam falar sobre a importância do casamento, da família, mas nunca pensei que seria uma abordagem tão profunda. Minha esposa tem um irmão desaparecido e durante a sessão vimos que isso também interfere em nosso relacionamento. Isso me surpreendeu muito. Fiquei realmente impressionado. Percebi que coisas do passado, da família, que já aconteceram, influenciam diretamente na nossa vida. Eu aprovei a técnica e gostaria de participar de outra sessão dessas
No estado do Rio Grande do Norte, ainda em 2015, a juíza Virgínia Marques, da 6ª Vara da Família da comarca de Natal implantou um projeto piloto com o objetivo de abreviar a solução dos processos, de forma definitiva e pacífica entre as partes, utilizando o método das constelações familiares, de acordo com a Juíza em entrevista concedida para o jornal Câmara Repórter, com o uso da técnica da constelação familiar, o índice de acordos nas audiências de conciliação subiu de 30% para 70%.
Em setembro de 2016 a juíza Vânia Petermann, da Vara da Família no Norte da Ilha, em Florianópolis, sugeriu uma sessão coletiva denominada Conversas de Família antes das audiência. Conforme disponibilizado pelo site do Poder Judicário de Santa Catarina, a Justiça Sistêmica e Constelações Familiares ganham espaço nas comarcas catarinenses.
No estado de Pernambuco, em 2016, a constelação familiar foi feita em 33 processos com obtenção de acordo em 75%. A juíza Wilka Vilela (CNJ, 2018) esclarece que:
As pessoas vão ao Judiciário achando que nós, juízes, somos salvadores da pátria. E não somos salvadores da pátria porque o conflito que gerou aquela demanda está lá, no sistema familiar deles, e com essa técnica temos conseguido ajudar essas pessoas.
O papel do juiz não é só fazer sentença. Temos de buscar a paz social.
A juíza exemplifica sua fala com o caso de interdição de uma mulher em coma, cujo processo estava 13 anos em tramitação devido ao conflito envolvendo seus oito filhos, e após a magistrada realizar a Constelação familiar conseguiu uma conciliação total.
No Tribunal de Justiça do Piauí, foi idealizado em 2019 pela magistrada Lucicleide Pereira Belo o projeto Leis Sistêmicas a Serviço da (Re)Conciliação. O objetivo do projeto é somar mais um método de resolução consensual de conflitos aos métodos já implementados pelo Núcleo Permanente de Solução de Conflitos – Nupemec e Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania – Cejusc, sendo oferecidas às partes dos processos: constelações familiares, oficinas e palestras vivenciais (TJPI, 2019).
Ao participar como Ouvinte de uma Constelação Familiar realizada no Tribunal de Justiça do Estado do Piauí, constatou-se o impacto perante os jurisdicionados e como realmente possibilita que se tenha entendimento sobre os fatos geradores que culminaram naquele conflito no qual resultou um litígio jurisdicional. Nesta oportunidade a Secretária do CEJUSC informou os dados internos do Tribunal de Justiça, em que antes da utilização da Constelação Familiar, de Janeiro/2018 a Dezembro/2018 foram realizados 615 acordos e que após a implementação do mencionado projeto foram efetivas 315 acordados de Janeiro/2019 a Maio/2019, verificando, portanto a eficácia da utilização das Constelações Familiares.
Ter conhecimento acerca das constelações familiares e suas leis sistêmicas ajuda a auxiliar na condução dos processos. Ainda que de forma iniciante, as pesquisas apresentadas indicam que a prática contribui não apenas para o aperfeiçoamento da Justiça, mas também para a qualidade dos relacionamentos nas famílias. Dessa maneira, ao saber lidar melhor com os conflitos, as famílias podem viver mais em paz.
O interesse do Poder Judiciário na prática terapêutica de Bert Hellinger parece crescer a cada dia mais, motivo pelo qual é necessário que se pensem em medidas a fim de que a constelação familiar possa ser regulamentada e devidamente ofertada a todos, buscando-se uma justiça mais efetiva e acessível.
A utilização da lei somente, resolve o processo mas não resolve o problema. Nesse sentido acredita-se que a introdução da Hellinger Sciencia no Direito brasileiro, com a abordagem sistêmica e as técnicas da constelação familiar traz valioso complemento para se atingir uma verdadeira resolução das questões trazidas ao judiciário.
Nas lides que envolvem família, é viável e necessário que as resoluções das demandas não sejam apenas por vias processuais, pois exige recursos e ainda gera desgaste emocional. Reitera-se que as relações familiares são continuas, não acaba com o processo, portanto os métodos consensuais de resolução de conflitos que estimulam o diálogo ganham cada vez mais espaço no Judiciário Brasileiro.
É comprovada a eficácia das Constelações Familiares no Judiciário diante da quantidade acordos obtidos nos Tribunais Estaduais que utilizam da técnica de maneira auxiliadora, portanto fica evidente que as constelações familiares devem ser consideradas como métodos alternativos de resolução de conflitos, devendo assim ser regulamentada.
4.1 SAMI STORCH E A INTRODUÇÃO DA TÉCNICA DE CONSTELAÇÃO FAMILIAR NA SOLUÇÃO DE CONFLITOS FAMILIARES
Sami Storch é juiz no interior da Bahia e dedica-se aos estudos da filosofia de Bert Hellinger e das constelações familiares desde 2004, quando conheceu a terapia e a ciência hellingeriana ao utilizar da técnica para lidar com problemas pessoais. Storch começou a ter contato com a técnica das Constelações Familiares antes de se tornar magistrado e quando se tornou Juiz viu a oportunidade de utilizar as Constelações Familiares no Judiciário, objetivando humanizar e dar maior efetividade às decisões judiciais.
Asseveram Deusa Cristina Miranda Ferreira e Luanna Cecília Costa Sousa (2018, p. 170):
A introdução da abordagem sistêmica no Judiciário Brasileiro, denominando-se Direito Sistêmico ocorreu através do Juiz Sami Storch, em dois momentos distintos, no primeiro utilizando-se da visão sistêmica na percepção dos conflitos e do uso de frases sistêmicas durante as audiências de conciliação e em um segundo momento com a realização de palestras e vivencias de constelações aos jurisdicionados de forma preliminar às audiências de mediação ou conciliação.
Inicialmente, o referido magistrado introduziu a visão sistêmica de forma mais discreta, em audiências judiciais na área da família, utilizando frases. Em entrevista para a Revista Época (2014), Storch elucida:
Quando me tornei juiz, já estava fazendo a formação em constelações e logo percebi como na prática o conhecimento das leis sistêmicas auxilia na condução dos processos, a se posicionar de maneira a produzir mais conciliações. Por isso, passei a aplicar alguns princípios nas audiências. Dizendo algumas frases, pedindo que as pessoas fechassem os olhos e se imaginassem olhando para a outra pessoa e dizendo frases de reconhecimento.
Desde 2006, Sami Storch, passou a realizar as experiências, mas apenas em outubro de 2012, atuando na Comarca de Castro Alves, no estado da Bahia, encontrou o ambiente ideal para realizar a primeira Palestra Vivencial com o tema “Separação de casais, filhos e o vínculo que nunca se desfaz”, com a participação de pessoas envolvidas em ações judiciais na área de família.
Desse modo, Samir Storch (2015) escreve que:
Uma das bases do direito sistêmico é a consideração pela pessoa e pela bagagem que ela traz (família). Um indivíduo não pode ser tratado isolado, ele tem que ser encarado como um sistema, formado por ele próprio, pelo pai e pela mãe. Se queremos conhecer alguém ou a nós mesmos nós precisamos assimilar a origem desse ser. Todos gostam de ser reconhecidos. Muitas pessoas ingressam com processos na Justiça por conta de um motivo, mas quando é feita a análise mais profunda, é possível verificar que o problema maior é que elas foram desconsideradas pelo outro ou sofreram um gesto de não reconhecimento.
Para Storch, (2016) “Constelação Familiar é um instrumento que pode melhorar ainda mais os resultados das sessões de conciliação, abrindo espaço para uma Justiça mais humana e eficiente na pacificação dos conflitos”, desta forma o Juiz defende que o uso da teoria das Constelações Familiares possibilita novas formas de compreender o contexto dos conflitos, ajudando a encontrar soluções que harmonizem as partes.
Como bem evidencia Regina Bandeira (2014), Sami Storch tem conseguido evitar que conflitos familiares transformem-se em processos judiciais, alcançando o índice de 100% de acordos nos processos em que as partes optam pelo método das Constelações familiares. Pode-se perceber que o magistrado optou por utilizar de um viés terapêutico na aplicação da ciência jurídica, tendo como proposta utilizar as leis sistêmicas como mecanismos de tratamento das questões geradoras de conflitos.
É evidente que a utilização da técnica das constelações familiares antes das audiências de conciliação e mediação, possibilita que os jurisdicionados cheguem às audiências mais abertos para uma possível solução pacífica, beneficiando assim, a justiça que não terá o prosseguimento do processo, bem como os próprios jurisdicionados, já que a conciliação evita o desgaste emocional e financeiro que um litígio judicial gera.
4.2 A APLICAÇÃO DA CONSTELAÇÃO FAMILIAR
Explicando melhor as Constelações Familiares, na prática a experiência com a Constelação pode ser feita individualmente ou em grupo. É necessário que tanto de forma individual quanto em grupo, o Constelador – a pessoa que vai conduzir a Constelação e o Constelado – pessoa que busca a técnica, possa visualizar o emaranhado. Este emaranhado é definido por Bert Hellinger como a herança afetiva, que é a transmissão transgeracional de conflitos emocionais ou psíquicos.
Na modalidade grupo, as representações são realizadas com o auxílio dos participantes do grupo, enquanto a individual é realizada através de figuras, bonecos ou desenhos. As representações são uma espécie de simulação do sistema, ou seja, é a simulação do conflito familiar, desse modo o constelador e constelado posicionam as pessoas, ou as figuras e bonecos, para representar os componentes do sistema familiar. Assim as pessoas ou bonecos serão posicionados de acordo com o conflito ou a situação objeto da constelação.
Para melhor entendimento, o Juiz Storch explica em entrevista concedida a Revista Época (2014), como foi a primeira vez que utilizou a técnica das Constelações Familiares:
[...] A primeira vez que utilizei a prática verdadeiramente foi durante a disputa pela guarda de uma menina de quatro anos em 2010. Eu trabalhava em Palmeiras (a 450 km de Salvador).
Mãe e avó queriam a responsabilidade e trocavam acusações sérias. Percebi que o caso não poderia ser solucionado apenas com uma decisão sobre a guarda da menina, já que qualquer que fosse a decisão, permaneceria o drama e o sofrimento da menina, causado pela disputa entre mãe e avó.
No dia da audiência, levei comigo um kit de bonecos, que utilizo para a prática da terapia de constelações familiares no atendimento individual – essa terapia também pode ser feita em grupo, com outras pessoas representando membros da família do cliente. Quando eu chamei a menina para ser ouvida, coloquei os bonecos em cima da mesa e pedi para que ela posicionasse os brinquedos e montasse a história da família, mostrando que bonecos eram cada membro da família. Perguntamos onde a menina se sentia melhor, o que acontecia quando se aproximava da mãe ou da avó e outros personagens da família. E ela pôde expressar que ela se sentia melhor com a mãe, ainda que apresentasse um carinho grande pela avó e que ficasse bem com as duas.
Com a prática, a mãe, a avó e os advogados viram a verdade dos fatos naquela dinâmica. Antes, um juiz tinha tirado a guarda da mãe, mas quando a menina se expressou pela constelação, isso foi bem aceito por todos porque ficou muito claro e isso colaborou para a resolução do caso [...].
Constata-se que o conflito pôde ser solucionado de uma forma pacificadora, a intenção da utilização do método das Constelações Familiares é justamente que as partes consigam entrar em consenso, preservando aquele laço familiar. No caso relatado pelo Juiz Storch, era necessário a preservação da criança, que estava sendo afetada diretamente pela disputa entre mãe e avó.
Seguindo o entendimento da ciência de Bert Hellinger, um indivíduo não age no mundo somente guiado pelos limites e liberdades que acredita ter. Nesse sentido suas escolhas têm correspondência com outros fatores que lhes são invisíveis. Portanto muitos dos conflitos que pedem resolução na esfera jurídica podem estar sob influência desses fatores invisíveis.
CONCLUSÃO
No que se refere ao direito de família é possível observar a continuidade do conflito familiar. Isso se deve ao fato de que o processo em si, mesmo com o seu fim, não conseguir alcançar o real conflito. Ademais o método judicial não asseguram mais satisfação, tampouco, produzem ás partes os efeitos esperados e isso se dá ao fato de que o Judiciário encontra-se sobrecarregado.
A partir da insatisfação das partes, da morosidade, ineficácia do Judiciário, que demonstrou-se a existência de outros métodos mais adequados para a solução dos conflitos em que as relações humanas são duradouras, contínuas e necessitam que sejam restauradas. Nesse viés, além da mediação e conciliação, que são métodos amparados pela lei e comprovadamente eficaz, o presente artigo apresentou a Constelação familiar como ferramenta auxiliadora.
A dinâmica das Constelações Familiares possibilita a exteriorização de conflitos que estão escondidos, ajudando a restaurar o equilíbrio familiar. Este método contribui para que as partes identifiquem seus reais problemas e consigam resolvê-los de forma satisfatória, auxiliando então o Judiciário a resolver o litígio de forma mais rápida e eficiente, bem como abre espaço para uma Justiça mais humana.
Portando ao introduzir as Constelações Familiares no Judiciário Brasileiro possibilita a transformação da cultura jurídica brasileira em que o modelo de resolução de conflitos é o litigioso, transformando para um modelo de solução de conflitos consensual e pacífico.
Assim pode-se concluir que de fato as Constelações Familiares são ferramentas eficazes na resolução de conflitos de forma pacífica, é método importante de ser utilizado antes das audiências de conciliação e mediação. Essa eficácia pode ser comprovada através da quantidade de conciliações obtidas pelos Tribunais que passaram a introduzir as Constelações Familiares.
Dito isso, é importante enfatizar a necessidade de regulamentação das Constelações Familiares, para que assim, todos possam conhecer de fato o que é a prática, como é desenvolvida, e afastar a ideia que Constelação está diretamente ligada à religião. Por fim, reitera-se que a utilização das constelações sistêmicas para a solução judicial de conflitos familiares consiste em meio que humaniza e reestrutura os laços afetivos das famílias.
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[1] Bacharel em Direito pelo Centro Universitário Santo Agostinho – UNIFSA. Advogada. Pós-Graduada em Direito do Trabalho e Previdenciário pela Faculdade Ademar Rosado - FAR. E-mail: limavitoria@hotmail.com.
[2] Bacharel em Direito. Advogada. Professora. Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). E-mail: evaristojuliana40@gmail.com.
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