Artigos
Princípio do melhor interesse da criança: como definir a guarda dos filhos?
Beatriz Picanço Florenzano
Graduada em Direito – Centro Universitário UNDB
Pós graduanda em Direito de Família aplicado pela instituição Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC
Pós graduanda em Direito Civil e Processo Civil pela instituição Legale.
Atuação com foco em Direito de família e sucessões.
RESUMO
O ponto principal e o objetivo deste artigo é expor o princípio do melhor interesse da criança com o recorte nos tipos de guarda regularizado pelo ordenamento jurídico, demonstrando o conceito, fazendo a distinção entre os tipos guardas, seus efeitos e aplicação. Para tal foi realizada uma breve análise do surgimento do princípio e como atualmente este torna-se imprescindível nas decisões do judiciário quanto trata-se sobre guarda de menor, visto que estes são pessoas dotadas de direito e que merecem que seus interesses sejam amplamente defendidos. A presente pesquisa utiliza a metodologia bibliográfica versando sobre as principais diferenças entre os institutos de guarda, estudando também as jurisprudências de modo a observar como o judiciário vem pautando suas decisões para atender de fato o melhor interesse da criança.
Palavras-chave: Direito de família. Tipos de Guarda. Princípio. Melhor Interesse da criança e do Adolescente. Guarda Compartilhada.
ABSTRACT
The main point and objective of this article is to expose the principle of the best interest of the child with the cut in types of custody regularized by the legal system, demonstrating the concept, making a distinction between the types of custody, its effects and application. To this end, a brief analysis of the emergence of the principle was carried out and, as it currently becomes essential in the judiciary's decisions when it comes to custody of minors, since these are people with rights and who deserve their interests to be widely defended. The present research uses the bibliographic methodology dealing with the main differences between the custody institutes, also studying the jurisprudence in order to observe how the judiciary has been guiding its decisions to actually serve the best interests of the child.
Keywords: Family law. Types of Guard. Principle. Best Interest for Children and Adolescents. Shared custody.
O princípio do melhor interesse da criança é um tema extremamente relevante em que se baseia a maioria das decisões proferidas a respeito do menor. Muito se escreve e fala sobre o princípio em questão, mas ainda surgem dúvidas na hora da sua aplicabilidade. Por isso, o presente estudo busca estudar o que vem a ser o melhor interesse da criança para que possa ser explorado e posto em prática de forma que cumpra sua conceituação, para que as decisões possam ser pautadas de forma mais objetiva, afinal, a falta de direcionamento e a obscuridade deste princípio trazem prejuízos irremediáveis, visto que estamos falando de crianças e adolescentes, e que as decisões muitas vezes, são baseadas nele.
Vale ressaltar que o melhor interesse da criança é algo claro mesmo para leigos em Direito, é de simples de se ter uma noção, no entanto, a fim de evitar conceitos vagos, o presente estudo busca dirimir o assunto exposto por meio de critérios objetivos e exatidão jurídica para que o tema seja de fácil compreensão e desta forma, aplicado de fato nas decisões judiciárias.
Faz se necessário um recorte, diante disso, o estudo visa a compreensão do melhor interesse da criança voltado para o âmbito de guarda dos filhos, visto que é comum que os responsáveis e inclusive o judiciário deixem de ver o menor como um indivíduo com direitos que tem personalidade merecendo ter seus interesses garantidos e protegidos. Para isto, será analisado no decorrer do presente trabalho o conceito do princípio, bem como o das guardas previstas no ordenamento jurídico e seus julgados para melhor compreensão da aplicabilidade do princípio em questão.
É importante analisarmos o que se pretende dizer com a expressão “Melhor interesse da criança e adolescente”, nesse sentido faz se necessário utilizar a origem do seu conceito para posteriormente analisar sua aplicabilidade, Camila Colucci, 2014, explica:
A origem do melhor interesse da criança adveio do instituto inglês parens patriae que tinha por objetivo a proteção de pessoas incapazes e de seus bens. Com sua divisão entre proteção dos loucos e proteção infantil, esta última evoluiu para o princípio do best interest of child.
Segundo Gonçalves, 2011, O princípio em comento não possui previsão expressa na Constituição Federal ou no Estatuto da Criança e do Adolescente. ‘’Os especialistas do tema lecionam que este princípio decorre de uma interpretação hermenêutica, está implícito e inserido nos direitos fundamentais previstos pela Constituição no que se refere às crianças
e adolescentes”.
O melhor interesse da criança ou o best interest of the child, recepcionado pela Convenção Internacional de Haia, que trata da proteção dos interesses das crianças e no Código Civil, em seus artigos 1.583 e 1.584 reconhece tal princípio, por exemplo, quando trata-se sobre a guarda do menor. É mister ressaltar, este instituto tem força de princípio pois está previsto na Constituição Federal de 1988, em seu art. 227, caput, aduz sobre os deveres que a família tem para com o menor e adolescente, vejamos:
“É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”Brasil, Constituição Federal.
Tal proteção está presente também no Estatuto da Criança e do Adolescente- ECA, previsto na Lei 8.069/2013, estabelecendo um reforço que a própria Constituição o qual se refere no que tange aos direitos que devem ser assegurados aos menores. Em seu art. 3º e 4°, sucessivamente, o ECA leciona:
“A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando- se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.
Parágrafo único. Os direitos enunciados nesta Lei aplicam-se a todas as crianças e adolescentes, sem discriminação de nascimento, situação familiar, idade, sexo, raça, etnia ou cor, religião ou crença, deficiência, condição pessoal de desenvolvimento e aprendizagem, condição econômica, ambiente social, região e local de moradia ou outra condição que diferencie as pessoas, as famílias ou a comunidade em que vivem.” “É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária”.
O princípio em comento, como exposto, está inserido no ordenamento jurídico baseando a grande maioria das decisões do judiciário, especialmente quando se trata sobre a guarda dos menores e adolescentes. No entanto, no que concerne ao decidir sobre a vida e guarda de um menor, ainda se observa bastante a falta de interpretação social que melhor interesse carrega em sua essência.
Diante do exposto, o presente estudo pretende ao decorrer do trabalho, esclarecer e iluminar pontos que merecem atenção redobrada para que de fato seja assegurado o melhor interesse da criança.
A guarda dos filhos é direito e dever dos pais. Usa-se o termo “guarda” para caracterizar a vigilância, proteção e cuidado. Assim, a guarda dos filhos é o direito e o dever que os pais têm de vigiar, proteger e cuidar das crianças.
A guarda é marcada no momento em que um casal se separa ou quando estes nunca moraram juntos e é preciso definir com quem a criança vai morar. No ordenamento brasileiro, a guarda compartilhada é a regra. Porém, há outros tipos de guarda, as quais abordarei mais adiante.
Como definir qual guarda será escolhida? Isto vai depender do melhor interesse da criança. Considera-se “melhor interesse da criança” aquilo que a Justiça acredita ser o melhor para o menor, e não o que os pais acham que seja.
Com o advento da Lei 13.058/2014, a guarda compartilhada em casos de divórcio e dissolução de união estável torna-se a primeira opção para o judiciário. Doutrinariamente, os especialistas afirmam que esta seria dentre todas as outras guardas a ideal, visto que há maior participação dos genitores.
Na guarda compartilhada os pais possuem deveres e direitos iguais para com o menor, tomando decisões em conjunto sobre a vida em todos os âmbitos da criança, seja em qual o melhor colégio, os melhores esportes, línguas estrangeiras, etc. Segundo Ana Maria Milano Silva (2015, p. 61) “a noção da guarda compartilhada surgiu do desequilíbrio dos direitos parentais e de uma cultura que desloca o centro de seu interesse para privilegiar a criança, no meio de uma sociedade que agora mostra tendência igualitária”. Desse modo, os pais participam efetivamente da criação, diferente da guarda unilateral, em que apenas um dos pais se responsabiliza e o outro “supervisiona” de longe.
Dessa maneira, na guarda compartilhada a responsabilidade é de ambos e eles devem decidir de forma conjunta sobre a vida do menor. No entanto, para que funcione é de suma importância que exista uma boa convivência entre os genitores, e que os mesmo possam deliberar e concordar sem brigas, caso contrário não atenderia o melhor interesse da criança.
Nesse sentido, quando não há boa convivência entre os genitores, a guarda compartilhada ao que ela propõe, não cumpre seu propósito, como aduz Jamil Miguel:
O orgulho ferido, sopitado em ódio contra o parceiro, que fora outrora, destinatário de amor e carinho, passava a ser o móvel comum na conduta dos cônjuges ou companheiros, arrastando, nesse desiderato passional, os filhos, cuja guarda representava, o instrumento de segurança da vitória, com a certeza da vingança contra o parceiro, ainda que isso se desse, em alguns casos, de maneira inconsciente. (2015, p. 19)
As brigas entre casais não são benéficas em nenhuma guarda, no entanto, para os que vivem a guarda compartilhada o prejuízo é maior, pois fazem com que a criança se sinta perdida na relação. Os pais precisam compreender que o filho não pode ser um meio para se atingirem, como por exemplo o caso em que um deles não vai buscar na data combinada ou atrasa para levar o filho para o ex-cônjuge a fim de que atrapalhe uma viagem ou uma saída à noite.
É necessário ressaltar que quanto a pensão alimentícia, como é compartilhada os pais dividem as despesas, portanto, quando for adotada essa modalidade de guarda, cada um assume suas responsabilidades em relação à assistência material do filho. Suprindo dessa forma, de acordo com suas possibilidades financeiras, as necessidades da criança ou adolescente, este também é o entendimento do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE GUARDA. GUARDA COMPARTILHADA.
ALIMENTOS. Não obstante a fixação de alimentos não seja incompatível com o estabelecimento da guarda compartilhada, no caso, exercendo ambos os genitores atividade laborativa, e não sendo extraordinário os gastos da filha, cabe a ambos os genitores arcar com as despesas da menina no período em que a infante se encontra sob seus cuidados. RECURSO DESPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70065711848, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Liselena Schifino Robles Ribeiro, Julgado em 26/08/2015). (TJ-RS - AC: 70065711848 RS, Relator: Liselena Schifino Robles Ribeiro, Data de Julgamento: 26/08/2015, Sétima Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 28/08/2015)
É comum que na guarda compartilhada haja dúvidas à respeito sobre onde será a residência da criança, há especialistas que defendem a tese de que na guarda compartilhada seja confuso para o menor, pois este estaria vivendo em dois lares, sobre duas criações, com opiniões diversas, crenças religiosas diferentes e portanto, não seria benéfico para a criança, portanto, nessa modalidade de guarda o melhor interesse da criança é efetivamente vislumbrado. No caso em comento, no que tange os deveres quanto aos alimentos, a responsabilidade será de ambos os genitores.
No entanto, a guarda compartilhada não significa que a criança passará quinze dias na casa de um e quinze dias na casa de outro, se caso essa forma fosse inviável. A guarda compartilhada possui como maior finalidade a divisão de decisão, responsabilidade e maior participação de ambos na vida do menor, não pretendendo de forma alguma gerar na criança confusões de identidade e pertencimento
É importante lembrar que cada caso deve ser analisado conforme a realidade, se
for mais benéfico que a criança divida a residência, assim deverá ser feito. O que não pode ser confundido que o local de moradia da criança e a divisão dele entre os pais não é o que caracteriza a guarda compartilhada, entendimento da Terceira Turma do STJ:
“CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. FAMÍLIA. GUARDA COMPARTILHADA. CONSENSO. NECESSIDADE. ALTERNÂNCIA DE RESIDÊNCIA DO MENOR. POSSIBILIDADE. 1.
A guarda compartilhada busca a plena proteção do melhor interesse dos filhos, pois reflete, com muito mais acuidade, a realidade da organização social atual que caminha para o fim das rígidas divisões de papéis sociais definidas pelo gênero dos pais. 2. A guarda compartilhada é o ideal a ser buscado no exercício do Poder Familiar entre pais separados, mesmo que demandem deles reestruturações, concessões e adequações diversas, para que seus filhos possam usufruir, durante sua formação, do ideal psicológico de duplo referencial. 3. Apesar de a separação ou do divórcio usualmente coincidirem com o ápice do distanciamento do antigo casal e com a maior evidenciação das diferenças existentes, o melhor interesse do menor, ainda assim, dita a aplicação da guarda compartilhada como regra, mesmo na hipótese de ausência de consenso. 4. A inviabilidade da guarda compartilhada, por ausência de consenso, faria prevalecer o exercício de uma potestade inexistente por um dos pais. E diz-se inexistente, porque contrária ao escopo do Poder Familiar que existe para a proteção da prole. 5. A imposição judicial das atribuições de cada um dos pais, e o período de convivência da criança sob guarda compartilhada, quando não houver consenso, é medida extrema, porém necessária à implementação dessa nova visão, para que não se faça do texto legal, letra morta. 6. A guarda compartilhada deve ser tida como regra, e a custódia física conjunta – sempre que possível – como sua efetiva expressão. 7. Recurso especial provido”. (STJ – REsp: 1428596 RS 2013/0376172-9, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 03/06/2014, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/06/2014)
Faz-se então portanto, primordial que no momento em que esteja decidido e explicando como funciona os tipos de guarda previsto no ordenamento brasileiro os advogados e a vara especializada expliquem aos genitores para que não haja dúvidas e nem obscuridade quanto a melhor decisão a ser tomada por eles.
O ordenamento jurídico define a guarda unilateral prevista no Código Civil em seu art. 1.583 §º, é atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua. Esta guarda exclusiva para apenas um dos genitores resulta da vontade de ambos ou quando um deles declara ao juiz que não se interessa em ter a guarda compartilhada visto ser esse o tipo de guarda que é segundo os especialistas a mais benéfica à criança.
Segundo Paulo Lôbo 2019, “ a guarda exclusiva era consequência do sistema que privilegiava os interesses dos pais em conflito e da investigação da culpa pela separação''. A guarda era atribuída ao que comprovasse ser inocente, ainda que não fosse o que preenchesse as melhores condições para exercê-la. Após o surgimento do melhor interesse da criança previsto na Constituição e na Convenção Internacional dos Direitos da Criança, bem como prevista também no ECA, a culpa não tem relevância no que tange o direito de guarda entre os genitores.
Faz se mister ressaltar que a separação dos pais não deve interferir na convivência
com os filhos, mesmo que a guarda seja unilateral, ambos possuem o poder familiar e o não guardião pode sempre ver seus filhos em dias combinados ou por determinação do juiz.
Para fixação da guarda seja ela unilateral, ou compartilhada ou alternada, devem ser observar sempre o contexto para resguardar o melhor interesse do menor, vejamos jurisprudência que trata a respeito do tema:
APELAÇÃO CÍVEL. ALTERAÇÃO DE GUARDA UNILATERAL. IMPROCEDÊNCIA.
Caso em que instrução processual demonstrou que o melhor interesse da filha adolescente está sendo atendido pela guarda unilateral da genitora. Não havendo nenhum elemento que demonstre a inviabilidade da manutenção da guarda materna, a improcedência do pedido é medida que se impõe. NEGARAM PROVIMENTO. (TJRS. AC 0373944-25.2018.8.21.7000. Órgão Julgador: Oitava Câmara Cível. Publicação: 27/08/2019. Julgamento: 22 de Agosto de 2019. Relator: Rui Portanova).
APELAÇÃO CÍVEL. GUARDA UNILATERAL A FAVOR DO GENITOR. PRINCÍPIO DO MELHOR INTERESSE DO MENOR. ÔNUS PROBATÓRIO. SENTENÇA MANTIDA.
- nas ações em que se discute a guarda de menor, preponderam os interesses da criança ou do adolescente quando em confronto com quaisquer outros, inclusive os dos pais.
- Inexistindo prova cabal nos autos que desaconselhe a permanência da criança no ambiente familiar paterno ou motivo grave que justifique a alteração da situação fática com a qual a criança se encontra adaptada, deve ser mantida a guarda com o genitor, estando o menor está de fato sob seus cuidados faz 08 (oito) anos. Desta forma, a manutenção da sentença é medida que se impõe. APELAÇÃO CONHECIDA E DESPROVIDA.
(TJGO. APL. 0029027-71.2011.8.09.0113. Órgão Julgador: 6ª Câmara Cível. Publicação: DJ de 29/07/2020. Julgamento: 29 de Julho de 2020. Relator: Sival Guerra Pires).
A guarda unilateral pode ser fixada além da vontade de um dos genitores em não querer a guarda compartilhada bem como também na verificação de inaptidão, evidenciada, dentre outros, na falta de zelo e cuidado com o filho, por meio de abuso de autoridade ou descumprimento de deveres paternos ou maternos, caso comprovado por investigação detalhada, haverá a manutenção da guarda unilateral quando houver pedido para conversão para compartilhada ou a reversão da compartilhada para unilateral, quanto a isto, existe jurisprudência a respeito, vejamos:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. GUARDA COMPARTILHADA. RESIDÊNCIA HABITUAL MATERNA E REGIME DE CONVIVÊNCIA PATERNO-FILIAL. A redação
atual do artigo 1.584, § 2º Código Civil (introduzido pela Lei 13.058/14) dispõe que a guarda compartilhada é a regra há ser aplicada, mesmo em caso de dissenso entre o casal, somente não se aplicando na hipótese de inaptidão por um dos genitores ao exercício do poder familiar ou quando algum dos pais expressamente declarar o desinteresse em exercer a guarda. Caso em que a guarda compartilhada vai regulamentada, com fixação da residência habitual materna e regime de convivência paterno-filial em finais de semana alternados com pernoite. DERAM PROVIMENTO. (Agravo de Instrumento Nº 70065259194, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Pedro de Oliveira Eckert, Julgado em 20/08/2015). (TJ-RS - AI: 70065259194 RS, Relator: José Pedro de Oliveira Eckert, Data de Julgamento: 20/08/2015, Oitava Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 25/08/2015). (grifo nosso).
APELAÇÃO CÍVEL. GUARDA. ALTERAÇÃO DE GUARDA UNILATERAL. LAR DE REFERÊNCIA MATERNO. MELHOR INTERESSE DOS INFANTES. AUSÊNCIA DE PROVAS A RESPEITO DA ALTERAÇÃO DA GUARDA UNILATERAL EXERCIDA PELA GENITORA.
- Na hipótese, o réu, ora apelante, pretende obter a guarda compartilhada dos filhos, atualmente com 9 (nove) e 4 (quatro) anos de idade.
- De acordo com o art. 1583, parágrafo único, do Código Civil, a guarda compartilhada consiste na responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns.
- As questões afetas à alteração da guarda, ou de lar referência, devem ser decididas com extrema acuidade, buscando-se sempre atender ao melhor interesse dos incapazes envolvidos.
- A guarda compartilhada corresponde à regra prevalente no ordenamento jurídico brasileiro, mesmo que inexista acordo entre os genitores. Ainda assim, o melhor interesse da criança deve ser sempre priorizado na definição da guarda nesses casos.
- Constatada a ausência de elemento probatório em sentido contrário, deve ser afastada a regra da guarda compartilhada, mantendo-se em observância ao princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, a guarda unilateral.
- Apelação conhecida e desprovida. Sentença mantida. (TJDF. 0000244-43.2017.8.07.0007. Órgão Julgador: 3ª Turma Cível. Publicação no DJE: 16/09/2019. Julgamento: 14 de Agosto de 2019. Relator: Álvaro Ciarlini).
No entanto, mesmo que a guarda seja unilateral, o não guardião tem o dever de supervisionar os interesses do menor. Podendo solicitar informações ou prestação de contas nas situações que dizem respeito à criança como saúde, lazer e esportes. Quanto à educação, é dever de ambos, previsto no art. Art. 1.634:
Compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos filhos: (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)
I - dirigir-lhes a criação e a educação; (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)
Portanto, a guarda unilateral não exime de responsabilidade aquele que não a detém e nem responsabiliza apenas o guardião. Esse tipo de guarda não é o recomendado pelos especialistas, segundo Maria Berenice, 2020, o laço de afinidade e convivência pode vir a sofrer danos pois para o não guardião é estipulado um dia de visita, às vezes não sendo esse dia, um bom dia para a criança.
A respeito da guarda alternada, esta caracteriza-se pela troca de períodos entre os genitores. A exemplo é de que a criança passaria uma semana sob a responsabilidade e autoridade exclusiva de um e na semana seguinte, sob a responsabilidade do outro genitor. Para alguns especialistas, essa guarda não é recomendada visto que a criança, especialmente, nos seus primeiros anos de vida precisa de um lar que seja referência, tem necessidade de pertencimento.
Por isso, a guarda alternada poderia vir a confundir e abalar o psicológico da criança, trazendo em alguns casos o pensamento de escolha entre um dos pais e má formação de base de afeto. Quanto aos adolescentes, a mudança contínua de casa e de poder exercido entre os pais, podem resultar em um escape desse adolescente para evitar conflitos e responsabilidades atribuídas por um dos genitores.
AÇÃO DE MODIFICAÇÃO DE GUARDA. GUARDA COMPARTILHADA. GUARDA ALTERNADA. NÃO ADEQUAÇÃO. LAR DE REFERÊNCIA EM QUE JÁ SE ENCONTRA. PREVALÊNCIA DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA. SENTENÇA
MANTIDA. 1. A guarda alternada não tem previsão expressa no Código Civil , sendo
criação doutrinária e jurisprudencial decorrente da previsão do CC 1.583, § 2º. A jurisprudência tem entendido que a forma equilibrada a que se refere o referido dispositivo não deve significar a divisão igualitária das horas que o filho passa com pai e mãe, sobretudo quando essa divisão não atenda ao melhor interesse do menor. 2. A alternada como proposto pela apelante é desaconselhada pela prática forense e relatos psicossociais em face da alternância constante de residência. 3. No caso, a manutenção da guarda com o genitor atende o melhor interesse do menor, bem como sua vontade, visto possuir a idade de 14 anos. 4. Recurso conhecido e não provido.
O PRINCÍPIO DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA. As alterações
de guarda devem ser evitadas tanto quanto possível, pois implicam mudanças na rotina de vida e nos referenciais dos menores que podem acarretar transtornos de toda ordem. Caso concreto em que não se verifica razões plausíveis para que seja retomada a guarda alternada, tendo em vista que se trata de menor contando 08 (oito) anos de idade, não lhe convindo sucessivas modificações de rotina, sem referência do que seja seu espaço, sua casa. Modelo de guarda em que a constante alteração não permite ao menor continuidade no cotidiano para consolidar hábitos, valores padrões e formação da personalidade, sendo-lhe de todo prejudicial Decisão agravada que, ao designar a guarda provisória unilateralmente à genitora, estabeleceu regime de visitas suficientemente amplo e, portanto, apto a garantir o direito de convívio entre pai e filho. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. (Agravo de Instrumento Nº 70077944403, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sandra Brisolara Medeiros, Julgado em 26/09/2018).
No entanto, há quem defenda ser possível a criança viver de forma alternada sem que haja esse conflito de referência entre as residências. Isto porque o objetivo é com que o menor conviva com ambos os genitores e quanto os menores nos primeiros anos de vida há maior maleabilidade de adaptação, possibilitando assim, uma forma igualitária entre ambos de conviver com seus filhos.
Como exposto, legalmente o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente está inserido no ordenamento jurídico brasileiro, no entanto, quando trata-se das decisões a respeito de guarda do menor, é comum que entre o judiciário e os representantes do menor deixem esse princípio à margem da discussão embora as decisões de juízes da área sejam em sua maioria fundamentadas nele.
Diante disso, é necessário que haja uma compreensão ampla do que é o melhor interesse da criança, em que os pais ou um terceiro representado pela figura do juiz, que estes possam deixar as suas concepções e crenças do que acreditam ser o melhor para a criança, verificando de fato o que melhor atendem aos interesses da criança, pois o princípio não é uma recomendação, mas sim norma determinante nas relações dos menores para com seus pais, com a família, sociedade e com o Estado.
Segundo recomendações de Paulo Lôbo 2019, “nem o interesse dos pais, nem o do Estado pode ser considerado o único interesse relevante para a satisfação dos direitos da criança”. A criança deve ser a protagonista do processo, sendo os seus interesses os mais importantes, que devem ser assegurados pelo judiciário.
O presente artigo buscou estudar o princípio do melhor interesse da criança com o recorte nos tipos de guarda previstos no ordenamento jurídico brasileiro, chega à conclusão para que o melhor interesse seja observado, cada caso deve ser analisado minuciosamente na forma concreta, não podendo prever os detalhes de forma genérica.
No entanto, diante das opções de guardas, a guarda compartilhada como é defendida pela maioria dos doutrinadores, é a que melhor atende os interesses do menor, visto ser a que menos afeta a convivência entre os pais e a criança, resguardando a responsabilidade de ambos simultaneamente.
O estado de conflito que se instala com a separação do casal atinge de certa forma os filhos, que não é incomum que sejam usados como meios de vingança pelas mágoas da vida a dois, por este fato a lei determina a preferência da guarda compartilhada como medida prioritária.
Resta evidente que as vantagens da guarda compartilhada são inúmeras, como a prioridade do poder familiar em sua extensão bem como a igualdade entre os genitores, não sobrecarregando apenas uma parte em que por vezes poderia vir a ser um mero coadjuvante na relação, bem como fazer a diferenciação de papel exercido por cada um. Dessa maneira, na guarda compartilhada há diminuição dos conflitos entre as partes, visto que as decisões são tomadas em conjunto e existe a necessidade de diálogo, restaurando a relação de cooperatividade entre os pais.
Por fim, o presente estudo conclui que a guarda compartilhada é a que atende ao melhor interesse da criança e consegue de forma ampla manter o mais próximo possível a estrutura familiar equilibrada entre os seus responsáveis.
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