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Os desafios das famílias modernas
Os desafios das famílias modernas
Danielle Santos
Advogada Especialista em Direito de Família e Sucessões
Recife – PE
Os relacionamentos amorosos estão passando por um momento de transição cultural, econômica e social. Não podemos negar que as relações conjugais enfrentam dificuldades para manter o comprometimento nos relacionamentos contemporâneos que se findam com o a dissolução da união estável e o divórcio. Nosso ordenamento jurídico com a alteração do art.226 §6º da CF e a lei 13.894/19, vem facilitando os dois institutos que podem ser judicialmente ou extrajudicialmente, a depender da particularidade e observância dos seus requisitos.
As relações conjugais não são simples, é primordial a presença do exercício diário de cumplicidade, respeito às diferenças, a admiração e as semelhanças. Viver sozinho na solidão não faz bem, e para conviver a dois, a paciência não tem contraindicação.
Todos sabemos que é desafiador conviver em uma relação amorosa e quando o casal não está mais pré-disposto a aceitar o outro, não ter os mesmos objetivos, inevitavelmente vem à tona o processo de separação e o divórcio. Quando há ruptura da relação conjugal, é o momento de recomeçar, enfrentar uma realidade imposta pela vida.
A separação conjugal do casal termina, já a relação do casal parental permanecerá para sempre com as atribuições de cuidar, de proteger e de prover as necessidades materiais e afetivas dos seus filhos.
Nossa realidade é permeada por mudanças contemporâneas, e não é novidade alguma que os casais que se separam venham a constituir uma nova família e planejam mais filhos. No entanto, o poder familiar, outrora denominado de autoridade parental, atribui aos genitores a proteção e manutenção de sua prole, não havendo exclusividade do exercício deste poder no que tange a obrigação da pensão alimentícia até cessar a maioridade dos filhos.
O poder familiar está fundado no princípio da dignidade da pessoa humana consoante no art.227 § 7º da CF/88.
A titularidade do poder familiar encontra-se respaldo no Código Civil no art. 1.630, os filhos estão sujeitos ao poder familiar, enquanto menores.
E no Estatuto da Criança e Adolescente art.21, o pátrio poder familiar será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação civil, assegurado a qualquer deles o direito de, em caso de discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução da divergência.
Cristiano Chaves entende que o princípio da dignidade humana é a pedra de toque da fixação de alimentos, "o pai não pode ser insensível a voz de seu sangue em prestar alimentos ao filho menor que em plena adolescência, não só necessita sobreviver, mais viver com dignidade, não sendo prejudicado em sua educação, nem em seu lazer, pois tudo faz parte da vida de um jovem, que antes da separação desfrutava do conforto que a família lhe proporcionava, em razão do bom nível social de seus pais".
Mesmo com o desequilíbrio financeiro que alguns alimentantes vêm enfrentando durante a crise sanitária do Covid 19, a pensão alimentícia é uma obrigação que deve ser mantida e paga sem qualquer alteração. Trata-se de uma verba necessária para manter o mínimo de subsistência de quem o necessita. De acordo com a carta magna é um direito social disposto no seu art.6º, assegurando a integridade física, psíquica e intelectual da pessoa.
No caso de alteração significativa dos ganhos do alimentante, há possibilidade de pedir a revisão por meio de ação judicial própria com pedido de liminar. Importante frisar que qualquer alteração na pensão alimentícia fixada só pode ocorrer com determinação judicial prévia. Apenas uma decisão da justiça pode exonerar o pagamento de pensão ou reduzir os valores fixados anteriormente à pandemia. O motivo de estar o alimentante desempregado não o desobriga de cumprir com sua obrigação perante o filho. Cada caso deverá ser analisado com observância aos requisitos mínimos para a propositura da demanda ao judiciário.
Via de regra, as despesas da prole devem ser divididas igualmente entre os genitores. No caso de separação, a legislação brasileira prevê a contribuição à alimentação dos filhos, mas não é uma determinação estagnada.
Não há artigo da lei 5.478/68 que estabeleça valor específico para as pensões ou mesmo o percentual a ser fixado, e no contexto em que estamos vivendo muitas revisões estão sendo pleiteadas, no entanto deve ser observado os parâmetros do binômio necessidade, possibilidade e proporcionalidade atendendo o melhor interesse da criança.
Não posso deixar de citar aqui uma frase do Conrado Paulino Rosa que diz: quem paga pensão alimentícia, acha que paga muito, e quem recebe a pensão alimentícia, pensa que recebe pouco.
A pensão alimentícia é uma obrigação que deve ser cumprida e o seu descumprimento de acordo com nosso sistema jurídico poderá ocorrer de penhora de bens à prisão do devedor. O judiciário não vem determinando a redução da pensão alimentícia liminarmente por entender que muitos genitores estão tirando proveito da situação pandêmica.
Interessante pontuar que o alimentante que constitui uma nova família, dispõe de melhores condições de assumir mais encargos, o que não interfere na obrigação alimentícia previamente assumida ao tempo da nova união. Para apreciação e determinação da minoração da pensão alimentícia é imprescindível comprovar a impossibilidade do pagador de suportar a obrigação alimentar de acordo com os requisitos da legislação e entendimentos jurisprudenciais.
Na lição de Yussef Said Cahali, "[...] para que seja acolhido o pedido de revisão, deve ser provada a modificação das condições econômicas dos interessados; pedida pelo devedor a redução da pensão, compete-lhe provar a redução das necessidades do credor, ou o depauperamento de suas condições econômicas (6ª CC, TJSP, AC 170.106-1, 25.06.1992; CC, TJRN, 25.09.1995, RT 726/399; 7ª CC, TJRS, 05.04.1995, RJTJRS 172/386; 1ª CC, TJSP, 15.08.1995, JTJ 174/20)" (Dos alimentos. São Paulo: Revista dos Tribunais. 3ª ed. ver. ampl. e atual. 1998, p. 982).
Além disso, é bom lembrar que o STJ determinou neste momento de pandemia que estará suspensa a prisão ao devedor de pensão alimentícia, e aos devedores que já estão presos deverão cumprir em regime domiciliar do devedor, claro que o devedor não poderá ter acesso à internet e saídas de casa.
O ministro do STJ determinou que as condições de cumprimento da prisão fossem estipuladas pelos juízes estaduais, inclusive em relação à sua duração, considerando as medidas adotada para a contenção da pandemia.
A prisão domiciliar conforme decisão do STJ neste momento pandêmico favorece o devedor de pensão alimentícia e desprotege o alimentado, que é o lado mais fraco dessa relação. No entanto, em nosso ordenamento jurídico existem outras medidas coercitivas além da prisão a serem aplicadas aos devedores de alimentos para o cumprimento da obrigação alimentar.
Os alimentos são irrenunciáveis e não podem ser compensados com dívidas de quaisquer natureza.
O art.24 da lei 5.478/68 estabelece que a parte responsável pelo sustento da família, que deixa a residência do casal por qualquer motivo que não necessita declarar, pode recorrer ao juízo da vara de família de seu Estado ou Município, apresentar seus rendimentos e pedir a citação do credor para comparecer à audiência de conciliação e julgamento destinada a fixar os alimentos a que está obrigado a pagar.
Ainda podemos comentar a Súmula 596 do STJ que determina que é responsabilidade subsidiária aos avós no sustento dos netos quando os genitores não têm condições de cumprir com a obrigação alimentar dos seus filhos.
Por fim, cabe informar aos alimentantes que não se eximem de quaisquer responsabilidade em seu pagamento de prover o sustento do seu filho, que cumpra com sua obrigação na sua integralidade, e que caso não consiga manter o pagamento conforme acordado em determinação judicial, que recorra ao judiciário para demonstrar suas novas condições que obrigatoriamente devem ser comprovadas através da ação de revisão de alimentos.
Já para a propositura da demanda de pensão alimentícia, deverá ser juntado aos autos do processo, a certidão de nascimento, que prova a condição de filho; a criança ou adolescente se for menor de 18 anos, será necessário o representante legal, com RG, CPF e comprovante de endereço; Documento que comprove a representação legal, como a certidão de nascimento, termo de guarda ou curatela; Comprovante de endereço atualizado desse representante legal e da criança e adolescente, está comprovação poderá ser através da conta de água, luz ou mesmo qualquer correspondência que confirme o endereço; Comprovante de residência; Demonstrativo dos rendimentos do pai (caso a mãe possua).
Claro que as partes têm sua autonomia privada em negociar o valor a ser pago de pensão alimentícia durante está crise sanitária do coronavírus, porém ambos devem concordar e não manter na informalidade, devendo comunicar ao juízo da vara de família para a homologação do acordo para que futuramente não venha acarretar a propositura da ação de execução de alimentos.
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