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Multiparentalidade: uma análise entre o reconhecimento e seus efeitos no âmbito do direito da família
Multiparentalidade: uma análise entre o reconhecimento e seus efeitos no âmbito do direito da família.
Lucicleide Monteiro dos Santos Lima[1]
João Paulo Lima Cavalcanti[2]
RESUMO
O presente trabalho vem apreciar o advento da multiparentalidade no direito da família, partindo do pressuposto da possibilidade jurídica de uma pessoa ter dupla maternidade ou paternidade. Contudo, faz-se necessário análise histórica sobre o estado de filiação no ordenamento jurídico nacional para entender o estado de filiação sob ótica da origem genética e a filiação sob o prisma do princípio da afetividade. Cuida da possibilidade do reconhecimento multiparental, e questionar suas particularidades quanto à adoção. Buscar compreender às consequências jurídicas do reconhecimento da multiparentalidade, em relação a prestação de alimentos, o instrumento da guarda e averiguar os efeitos jurídicos no âmbito civilista.
Palavras-chaves: Filiação biológica. Filiação socioafetiva. Multiparentalidade. Reconhecimento multiparental.
ABSTRACT
The present work appreciates the advent of multiparentalidade in family law, based on the assumption of the legal possibility of a person having dual maternity or paternity. However, it is necessary historical analysis about the state of affiliation in the national legal system, to understand the state of affiliation from the perspective of genetic origin and affiliation from the perspective of the principle of affectivity. Take care of the possibility of multiparental recognition, ask why not adoption? It also reflects on the possibility of multiparental recognition through administrative channels. Seek to understand the legal consequences of the recognition of multiparentalidade, in relation to the provision of maintenance, the custody instrument and to investigate the legal effects in the succession scope.
Keywords: Biological affiliation. Socio-affective affiliation. Multiparentalidade. Multiparental Recognition.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho dedicar-se-á a explanar a possibilidade jurídica de uma pessoa ter dupla maternidade ou paternidade, ou seja, ter múltiplos pais ou mães. Para isso faz necessário uma breve análise geral sobre a temática multiparental no direito da família.
A metodologia deste trabalho é de cunho bibliográfico, no qual buscar utilizar-se dos entendimentos doutrinários, julgados, em especial, do Supremo Tribunal Federal para construção de um pensamento científico sobre a matéria multiparentalidade.
O direito de família estimar estudo minucioso sobre as entidades familiares, no qual o Estado tenta regulamentar através um conjunto de normais coercitivas. Todavia, o Estado não conseguir acompanhar a evolução da sociedade, e, tratando-se da estrutura familiar no Brasil não seria diferente. Isso porque, a evolução do pensamento cognitivo da sociedade não acontece na velocidade da luz, ou seja, para que suja uma norma regulamentadora é necessário um conjunto de interesse visando corresponder um direito para qual foi proposto.
A evolução do instituto da família, trouxe a possibilidade jurídica do reconhecimento perante o Estado Democrático de Direito de novo estado de filiação. Antes da constituição federal de 1988, existia distinções entre filhos, nos quais eram tidos como legítimos e ilegítimos. Esse concebidos fora do casamento, aquele fruto da união matrimonial civil.
O presente trabalho tem como escopo analisar o advento da dupla paternidade ou maternidade, no qual consiste na possibilidade de uma pessoa ter mais de dois pais ou mais de duas mães no registro civil, contudo ter “múltiplos” pais. Visar analisar o conceito da multiparentalidade no direito da família, entender a diferença da filiação biológica e filiação afetivas, quais as consequências jurídicas no direito da família.
A metodologia deste trabalho é de cunho bibliográfico, no qual buscar utilizar-se dos entendimentos doutrinários, julgado do Supremo Tribunal Federal e jurisprudências para construção de um pensamento científico sobre a matéria multiparentalidade.
O conhecimento cientifico é obtido sobre uma análise logica-sistemática de um pensamento cognitivo racional, ou seja, é um conhecimento exato e verificável no campo da realidade, visto que acompanha um logica racional.
Para desenvolver esse trabalho cientifico é preciso uma análise sistemática da teoria e da história do estado de filiação no Brasil, como se chegou a temática da multiparentalidade, quais os efeitos no mundo jurídico do reconhecimento da multiparentalidade, há consequências jurídicas? Para responde tal indagação, é necessário verificar o entendimento doutrinário sobre o assunto, analisar de formar minuciosa os julgados e as jurisprudência sobre à multiparentalidade.
O método cientifico abordado nesse trabalho de pesquisar, tem natureza básica, na qual o escopo deve gerar conhecimentos novos, com utilidade e possíveis avanços para ciências jurídicas.
Quanto o método de abordagem será qualitativo, tendo em vista que devesse considera a relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito. Quanto o objeto, terá natureza exploratória, cujo problema deve ser resolvido por levantamento bibliográfico e análise de julgados. O conhecimento técnico-cientifico deste trabalho terá procedimento de pesquisar bibliográfica, teóricos e estudo jurisprudencial. O primeiro, método de pesquisar bibliográfica retoma o conhecimento cientifico acumulado a respeito sobre o problema, ocorrido através de assuntos já publicados. O segundo, método de pesquisar, teórica, cuidar de analisar determinadas teorias, com proposito de ampliar estruturar sistemas e modelos teóricos. O terceiro, método de pesquisar, é analisar julgados e jurisprudência sobre o desfecho da multiparentalidade.
O primeiro capitulo descreve breve análise histórica sobre o estado de filiação no ordenamento jurídico nacional, como a sociedade compreendia o conceito de filiação a luz da legalidade, as respectivas distinções entre filhos legítimos e espúrios, até a evolução do ordenamento jurídico atual, no qual a CF/88 trouxe igualdade sem distinções de filhos. Conceituar a filiação sob ótica da origem genética e a filiação sob o prisma do princípio da afetividade, trazendo um binômio, pelo direito da personalidade qual filiação tem prevalência no registro civil: Filiação biológica versus afetiva.
O segundo capitulo cuida da possibilidade do reconhecimento multiparental, em que pessoa poderá ter dois pais ou duas mães no registro civil, ou seja, ter múltiplos pais. Levanta o questionamento, por que não adoção? Explicar os efeitos jurídicos da adoção e relata qual benefício de escolhe um instituto invés de outro, reflete também sobre a possibilidade do reconhecimento multiparental pelas vias administrativas.
O terceiro capitulo buscar entende as consequências jurídicas do reconhecimento da multiparentalidade. Para tanto, buscar entender o dever da prestação de alimentos em relações que envolva pais e filhos, quem tem dever de prestar verbais alimentares, e no caso de multiparentalidade quais são os efeitos da responsabilização sobre a prestação de alimentos. Buscar também compreender elemento jurídico guarda, como ela é exercida sobre o filho, e como a multiparentalidade afeta tal instrumento. Averiguar os efeitos jurídicos no âmbito sucessório com relação a multiparentalidade, como fica a linha de sucessão em relação ao descendente e os ascendentes. Ressalva, ainda, de forma mitigada, a multiparentalidade como meio provável de proteção as famílias poliafetivas.
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1. BREVE ANÁLISE HISTÓRICA SOBRE O ESTADO DE FILIAÇÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO NACIONAL.
A sociedade brasileira sofreu uma gama de mudanças significativas no instituto do direito da família. Sobretudo no estado de filiação, os filhos eram aqueles nascidos na constância do matrimônio, tidos legítimos ou legitimados e entre os filhos contraídos foram do casamento civil, outrora classificados como ilegítimos ou espúrios. Neste sentido, Barboza, entende:
Os filhos nascidos de relações adulterinas eram chamados de ilegítimos e não possuíam qualquer reconhecimento jurídico. Já no âmbito do casamento, a filiação era presumida, com raras exceções, o que demonstra que a qualidade de filho estava intrinsecamente ligada ao estado civil dos pais. (BARBOZA 2000 Apud VIEIRA 2015, p.81).
. As distinções entre filhos e a impossibilidade do reconhecimento do estado de filiação, mitigava o direito da personalidade ao nome. Visto que, não permitia o pronome do pai no registro civil em caso de relação extraconjugal. Conquanto para poder registra um menor fazia-se necessário saber o estado civil do gênito, principalmente, para saber se tratava de uma relação adulterina. Consequentemente impossibilitava aquele concebido fora da relação conjugal ao direito personalíssimo, e, por conseguinte os direitos fundamentais a herança. Nesta perspectiva, Clovis afirmava: “ a falta é cometida pelos pais, e a desonra recai sobre os filhos” (BEVILÁQUA, 1917 Apud BERENICE, 2015.p.387).
O reconhecimento do parentesco por ascendente aos respectivos descendente advindos de relação adulterinas só passou a ser possível depois do Decreto-Lei nº 4.737/42, no qual trouxe a em sua redação o art. 1 °, expressa, “ O filho havido pelo cônjuge fora do matrimônio pode, depois do desquite, ser reconhecido ou demandar que declare sua filiação”. Ou seja, os filhos, advindos de relação extraconjugais, só poderia ter o direito ao reconhecimento em registro civil, caso houvesse um desquite. Visto que, a legislação com intuito primário de protege a família tradicional, fez por décadas descriminações entre filhos, até privá-lo do direito hoje consolidado, no que tange o pronome dos seus ascendentes.
Um marco importante para evolução do pensamento cognitivo sobre o estado de filiação e seu respectivo reconhecimento, foi a promulgação da Constituição Federal de 1988, no qual trouxe igualdade sem distinção entre filhos existente ou não dá constância do casamento. A Constituição Federal de 1988, em seu art.227, § 6º expressamente diz: “filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.
1.1 DO ESTADO DE FILIAÇÃO
A carta magna de 1988 veio sanar os vícios da lei anterior, a qual negava o direito do filho em ter um pai e desse reconhecer seu respectivo descendente. Contudo, passou a ser discutido estado de filiação com base na origem biológica, como dita “verdade real”, através da descoberta da cadeia de impressões digitais pelo exame de DNA, pelo pesquisador Alec Jeffreys, no ano de 1985 (RUMJANEK 1997, Apud GLANZ, 2005, p.533). Vieira explica:
A filiação passa a se fundar, especialmente, no vínculo de consanguinidade, uma vez que se tornou possível aferir a existência ou não de descendência genética com grau de certeza quase que absoluto. A busca da verdade real foi simplificada pelo advento do exame de DNA, fortemente utilizado nas ações de investigação de paternidade. (VIEIRA 2015, p.87)
Para reafirmar o entendimento da dita verdade real, o Superior Tribunal de Justiça editou a súmula n° 301, na qual dispõe: “Em ação investigatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz presunção juris tantum de paternidade”. Portanto, a presunção da paternidade condiz a dita verdade real por origem genética. Todavia, com a evolução da sociedade no quesito das relações familiares, foram surgindo outras formas cognitivas de vínculos familiares, e consequentemente vínculos de filiação. Nesse seguimento Paulo Lôbo aduz:
De um lado existe a verdade biológica, comprovável por meio de exame laboratorial que permite afirmar, com certeza praticamente absoluta, a existência de um liame biológico entre duas pessoas. De outro lado há uma verdade que não mais pode ser desprezada: o estado de filiação, que decorre da estabilidade dos laços de essencial da atribuição da paternidade ou maternidade. ” (LÔBO 2003 Apud DIAS 2015, p.396).
Portanto, a origem genética não é a única verdade para o reconhecimento da filiação, visto que foca apenas na herança biológica/consanguínea. Com isso, desvincular e depreciar outros liames para o reconhecimento parental, exemplo: filiação adotiva e filiação socioafetiva, nas quais decorre de laços não biológico.
O princípio norteado do âmbito do direito da família contemporâneo é o princípio da afetividade, por se tratar de um princípio constitucional implícito. Neste seguimento, Lôbo 2012, explica:
O princípio da afetividade especializa, no âmbito familiar, os princípios constitucionais fundamentais da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) e da solidariedade (art. 3º, I), e entrelaça-se com os princípios da convivência familiar e da igualdade entre cônjuges, companheiros e filhos, que ressaltam a natureza cultural e não exclusivamente biológica da família. (LÔBO 2012 Apud SOUZA 2018, p.12).
Para tanto, o princípio da afetividade basear-se nos laços do afeto, pouco importando se há origem genética. Tal princípio é um dever entre pais e filhos, partindo do pressuposto legal do direito das obrigações, ou seja, caso fique comprovada a falta de afeto, ocorre ato ilícito e nasce o dever legal de indenizar, exemplo: abandono afetivo e abandono afetivo reverso. Desta forma, o princípio da afetividade é um direito fundamental entre ascendente e descendentes, uma vez que o afeto é base essencial da construção do seio família.Desta forma Jackelline Fraga Pessanha compreende:
A família é a base da sociedade brasileira, haja vista ser ancorada primeiramente em laços de afeto, sabendo-se que o amor é o elo da comunhão de vida plena entre pessoas, de forma pública, contínua e duradoura. (...) Afeto significa sentimento de afeição ou inclinação para alguém, amizade, paixão ou simpatia, portanto é o elemento essencial para a constituição de uma família nos tempos modernos, pois somente com laços de afeto consegue-se manter a estabilidade de uma família que é independente e igualitária com as pessoas, uma vez que não há mais a necessidade de dependência econômica de uma só pessoa. (PESSANHA 2011, p.2).
Logo, pelo princípio da afetividade surge outros estados de filiação, entre ela a filiação socioafetiva, na qual pouco importado a origem genética, o que prevalece é o simples é animus de parentesco. Neste liame Fábio Ulhoa Coelho aduz:
A filiação sócio-afetiva constitui-se pelo relacionamento entre um adulto e uma criança ou adolescente, que, sob o ponto de vista das relações sociais ou emocionais, em tudo se assemelha à de pai ou mãe e seu filho. Se um homem, mesmo sabendo não ser o genitor de criança ou adolescente, trata-o como se fosse seu filho, torna-se pai dele. Do mesmo modo a mulher se torna mãe daquele de quem cuida como filho durante algum tempo. (COELHO 2006 Apud KOVALSKI 2007, p.24).
A filiação subsequente do princípio da afetividade depende da relação social e emocional entre indivíduos, cujo reconhecimento transcende a biologia. Desse modo, o fato social ocorre através do vínculo de convivência entre pessoas que por ter que adaptar às regras da sociedade assumir status de pai/mãe perante outro indivíduo, esse denominado de filho.
Ante exposto é inegável o reconhecimento da filiação decorrentes de laços afetivos, tendo em vista aplicabilidade do princípio da afetividade. Todavia, é válido destacar, nada impede que uma filiação originada de laços sanguíneos não comine em laços afetivos, considerando que o afeto poderá existir independente de genética. Entretanto, caso existam ambas filiações, seja uma biológica e uma afetiva, e nelas esteja presente o princípio da afetividade, qual prevalecerá no registro civil?
1.2 DO DIREITO DA PERSONALIDADE AO STATUS QUO DO REGISTRO CÍVIL: FILIAÇÃO BIOLÓGICA X FILIAÇÃO AFETIVA.
´ A origem genética tem um peso concludente no ordenamento jurídico brasileiro, trata-se de um direito personalíssimo, no que diz respeito à existência da pessoa.
Frisa-se que os bens tutelados pelos direitos fundamentais não são objeto, mas sujeitos ou parte integrantes deles, evidenciando sua substancialidade latente, a começar dos limites e extensão dos danos sofridos. Logo, é intolerável que, reconhecidos constitucionalmente e infraconstitucionalmente os aspectos não-patrimoniais dos direitos, toRna-se insustentável que atingido algum direito personalíssimo, fique a vítima irressarcida, na realidade, compensada, verificados no caso concreto o ato ilícito e a lesão a um direito da personalidade.
Conforme leciona Maria Celina Bodin:
A tutela da pessoa humana não pode ser fracionada em isoladas hipóteses, microssistemas, em autônomas fattispecie não intercomunicáveis entre si, mas deve ser apresentada como um problema unitário, dado o seu fundamento, representado pela unidade do valor da pessoa. Esse fundamento, como é feito nas teorias atomísticas. A personalidade é, portanto, não um “direito”, mas um valor, o valor fundamental do ordenamento, que está na base de uma série (aberta) de situações existenciais, nas quais se traduz a sua incessantemente mutável exigência de tutela. (MORAES, Maria Celina Bodin. Danos à Pessoa Humana, p. 121, 2017).
A supracitada autora prossegue sua explanação:
Daí sustentar-se que a personalidade humana é valor, um valor unitário e tendencialmente sem limitações. Assim, não se poderá, com efeito, negar tutela a quem requeira garantia sobre um aspecto de sua existência para o qual não haja previsão específica, pois quele interesse tem relevância aos nível de ordenamento constitucional e, portanto tutela também em via judicial. (MORAES, Maria Celina Bodin. Danos à Pessoa Humana, p. 127, 2017).
A teoria dos direitos de personalidade “teriam como finalidade proteger a pessoa no que ela tem de mais essencial: a sua personalidade. ”(CORTIANO JUNIOR 2000 apud BERTONCELLO 2006, p.15), alude ser um direito primário da existência, o código civil brasileiro em seu Art. 2o dispõe “A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida [...]”, para ser garantido direito da personalidade, esse qual traz direitos e deveres na ordem civil, faz apenas necessário nascer com vida. Contudo, o direito da personalidade abarcar “[...] todas as condições necessárias para a conservação e desenvolvimento da personalidade, e para o reconhecimento e respeito da dignidade moral e jurídica do homem” (PAIVA NETO 1850, Apud BERTONCELLO 2006, p.21).
Assim, o direito da personalidade trata de um bem intrínseco à pessoa humana, é um direito natural em que a pessoa não poderá dispor. Visto que se trata de uma tutela jurídica garantidora do direito fundamental a sua existência. Neste sentido “o direito à identidade genética passou a ser reconhecido como direito fundamental integrante do direito de personalidade, o que levou a jurisprudência a aceitar o retorno das partes a juízo na buscar da identificação da paternidade” (DIAS, 2015, p.423). Para defender o direito ad personam da essência natural do ser humano o ECA dispõe “Art. 48. O adotado tem direito de conhecer sua origem biológica [...]”, isso ocorre porque, mesmo adoção encerrando o vínculo como a família natural/biológica, retirar o direito personalíssimo a sua existência é violar o princípio da dignidade da pessoa humana. Segundo Silveira “Os direitos da personalidade destinam-se, pois, a resguardar a dignidade humana[...]” (SILVEIRA Apud BERTONCELLO 2006,p.23).
É inegável a importância do vínculo sanguíneo para o direito, neste sentido o STJ editou Súmula 301“Em ação investigatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz presunção juris tantum de paternidade”. A corte superior entendeu desta forma, tendo em vista a preservação do direito da personalidade do filho, visto que a recusar por parte do suposto pai feri o direito de outrem, no quesito de ter conhecimento de sua origem. Além de ter o direito ao patronímico frustrado, isso porque o reconhecimento a origem também possibilita o status quo do pronome paterno/materno no registro civil.
Diante o exposto, é relevante a indagação: numa relação que envolva de um lado a paternidade afetiva, consubstanciada pelo registro civil e de outro a verdade sobre a origem genética qual filiação tem prevalência para o status quo do registro civil? Tal ocorrência não é incomum: verifica-se quando um indivíduo assume a paternidade de filho que sabe não ser seu, por exemplo. Mantendo o entendimento jurisprudencial da jurisdição brasileira, no que tange a presunção de paternidade em relação ao suposto pai biológico, no caso em que haja negação do hipotético genitor em realizar o exame pericial de DNA, ocorrerá presunção de paternidade, conforme o julgado que deu ensejo a súmula 301 do STJ:
EMENTA Agravo regimental. Recurso especial não admitido. Investigação de paternidade. DNA. Recusa na realização do exame. 1. O posicionamento desta Corte é no sentido de que a recusa injustificada à realização do exame de DNA contribui para a presunção de veracidade das alegações da inicial quanto à paternidade. 2. Agravo regimental desprovido.AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO N. 498.398-MG (2003/0002781-4)
No caso em tela, o hipotético genitor buscava anulação do registro civil na corte superior, diante do entendimento que já tinha declarado ele como pai de um infante. Contudo seu recurso restou desprovido, consequentemente, mantendo a decisão de paternidade presumida, visto que sua recusar ofendia o direito do menor e até mesmo ofendia o direito personalíssimo em saber sua origem genética, como resultado, o direito ao nome.
Em contraposição a esse entendimento sumulado há questionamento da filiação socioafetiva, na qual é desencadeada pelo princípio da afetividade, tal questão princiológica é essencial para o âmbito do direito da família. Como já visto, o princípio da afetividade é implícito na constituição, no qual têm primazia no amor, respeito, afeto e dever de assistir a prole entre os quais participam da relação familiar. Diante tal fato, não deve ser meramente descartado. Segundo Fachin, o que indicar o estado de filiação não é o simples laço sanguíneo, mas sim o vínculo derivado do afeto. Desta forma, aduz:
O reconhecimento da filiação socioafetiva se impôs a partir do desenvolvimento da mesma engenharia genética que tornou inegável a verdade biológica. Se, de um lado, a ciência permite a certeza sobre os laços de sangue, ela admite, sobre outro aspecto, que tais laços sejam postos à margem diante de uma realidade socioafetiva.(FACHIN Apud KOVALSKI.2007, p.27).
Contudo, a indagação sobre o conflito entre estado de filiação biológica versus afetiva, quando houver dupla paternidade ou maternidade, não será uma resposta simples e objetiva. Pois a prevalência de uma filiação em detrimento à outra, partindo do pressuposto que em ambas poderão coexistir o princípio da afetividade, afetaria diretamente o interesse do filho. Assim, emerge a tese da multiparentalidade. Essa qual será melhor explicada no capítulo subsequente.
2. MULTIPARENTALIDADE
A Multiparentalidade surgiu como possibilidade de sanar a indagação sobre qual o estado de filiação prevalece, a filiação biológica ou a afetiva. Ao averiguar que ambas eram possíveis, surgiu a tese multiparental, a qual consiste na possibilidade de uma pessoa física ter múltiplos pais, ou seja, uma pessoa ter dois pais ou duas mães no assentamento do registro civil. Tal alternativa visava garantir direito inerente a personalidade, no que tange o direito de ter o nome. Neste seguimento, Garcia e Borges afirma: “A multiparentalidade caracteriza-se pela possibilidade de a pessoa ter em seu registro de nascimento mais de um pai ou mais de uma mãe. ” (GARCIA e BORGES, p.6). Zamattaro, explica:
A multiparentalidade deve ser entendida como a possibilidade de uma pessoa possuir mais de um pai e/ou mais de uma mãe, simultaneamente, produzindo efeitos jurídicos em relação a todos eles, inclusive, ao que tange o eventual pedido de alimentos e até mesmo herança de ambos os pais. (ZAMATTARO Apud LIGIERO.2015, p.15)
O estado de posse sobre o filho é um requisito para entender como ocorre a paternidade responsável. Diante disso, como garante-se o direito da personalidade ao nome, quando acontece em caso fático duas ascendências paterna ou materna? Em recurso extraordinário nº 898.060, sobre matéria de repercussão geral, o STF entendeu:
Recurso Extraordinário a que se nega provimento, fixando-se a seguinte tese jurídica para aplicação a casos semelhantes: “A paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro público, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante baseado na origem biológica, com todas as suas consequências patrimoniais e extrapatrimoniais”.
A possibilidade da tese multiparental na jurisdição brasileira já consiste em uma realidade aceitável pelo STF, que reconheceu a cominação de ambos os pais no registro civil. Entretanto, para haver multiparentalidade é necessário atender alguns requisitos, os quais serão fragmentados a seguir.
2.1 DA HIPÓTESE DE RECONHECIMENTO DA MULTIPARENTALIDADE
A multiparentalidade é reconhecimento concomitante entre uma pessoa e dois indivíduos, sendo um ligado por vínculo afetivo e outro por um vínculo biológico e, ambos, tidos como pais. Uma pessoa poderia, por exemplo, ter uma mãe, um pai de laço oriundo da afetividade e outro de proveniente da consaguinidade.
Todavia, é válido salienta para ocorre dita multiparentalidade, é de extrema importância haver uma relação de afeto entre os envolvidos, ou seja, pais e filho multiparental. Desse modo, a multiparentalidade estar ligada diretamente ao princípio implícito constitucional da afetividade. Diante disso, não poderá ser reconhecida a multiparentalidade se inexistir laços afetivos entre um dos envolvidos. Neste sentido, Madaleno entende “[...] parentalidade científica só pode ter sentido como relação de filiação quando coincidir com a vinculação afetiva, jamais invertendo esses valores, muito menos se a intenção se traduz em gerar dinheiro no lugar de amor”. (MADALENO.2011 Apud FRÓES e SCHMITT SANDRIS).
Em mesmo seguimento, STF negou Provimento no reconhecimento pleiteado, no qual uma mãe buscava o reconhecimento da multiparentalidade e o assentamento do nome do pai biológico em proveito do filho menor. Entretanto, não havia vínculo afetivo entre o menor e o genitor, desta forma o recurso restou improvido. Conforme julgado:
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE C/C RETIFICAÇÃO DE REGISTRO DE NASCIMENTO. FILHO HAVIDO DE RELAÇÃO EXTRACONJUGAL. CONFLITO ENTRE PATERNIDADE SOCIOAFETIVA E BIOLÓGICA. MULTIPLICIDADE DE VÍNCULOS PARENTAIS. RECONHECIMENTO CONCOMITANTE. POSSIBILIDADE QUANDO ATENDER AO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA. APLICAÇÃO DA RATIO ESSENDI DO PRECEDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL JULGADO COM REPERCUSSÃO GERAL. SOBREPOSIÇÃO DO INTERESSE DA GENITORA SOBRE O DA MENOR. RECURSO DESPROVIDO. (REsp 1674849 RS 2016/0221386-0)
Ainda sobre o referido julgado é valido ressaltar que o embasamento da recorrente para o conhecimento e o provimento do recurso, seria a tese firmada no julgado do plenário do STF, no qual reconheceu a possibilidade do reconhecimento da paternidade biológica e socioafetiva em conjunto. Todavia, para refutar a tese trazida pela recorrente, a digníssima colenda turma, fundamentou:
5. O reconhecimento de vínculos concomitante de parentalidade é uma casuística, e não uma regra, pois, como bem salientado pelo STF naquele julgado, deve-se observar o princípio da paternidade responsável e primar pela busca do melhor interesse da criança, principalmente em um processo em que se discute, de um lado, o direito ao estabelecimento da verdade biológica e, de outro, o direito à manutenção dos vínculos que se estabeleceram, cotidianamente, a partir de uma relação de cuidado e afeto, representada pela posse do estado de filho. 6. As instâncias ordinárias afastaram a possibilidade de reconhecimento da multiparentalidade na hipótese em questão, pois, de acordo com as provas carreadas aos autos, notadamente o estudo social, o pai biológico não demonstra nenhum interesse em formar vínculo afetivo com a menor e, em contrapartida, o pai socioafetivo assiste (e pretende continuar assistindo) à filha afetiva e materialmente. Ficou comprovado, ainda, que a ação foi ajuizada exclusivamente no interesse da genitora, que se vale da criança para conseguir atingir suas pretensões [...] RECURSO ESPECIAL Nº 1.674.849 - RS (2016/0221386-0)
Pela análise do julgado acima, pode-se constatar que o STJ entendeu pelo não provimento do recurso especial, por falta um pressuposto essencial para o reconhecimento da multiparentalidade, ou seja, o princípio da afetividade entre os correlacionados, mais especificamente em relação ao genitor que detinha apenas o vínculo biológico.
Outro ponto, no qual é abordado no julgado ante exposto, é em relação ao melhor interesse da criança ou adolescente, esse qual deriva do princípio da paternidade responsável. No caso em tela, ficou evidentemente provado que o pai biológico não tinha nenhum interesse em reconhecer o menor, não havia laços afetivos. Em contraponto, o pai socioafetivo reconhecia o menor como filho, havia laços de afetividade e ele atuava no estado de posse sobre o filho, configurando assim a paternidade responsável. Diante disso, ficou mantido o nome do pai socioafetivo no registro civil e foi negado o pedido da configuração da multiparentalidade. Em face disso, fica o questionamento a seguir.
2.2 DA NORMA À JURISPRUDÊNCIA: POR QUE NÃO ADOÇÃO?
Para Diniz (2009) a adoção é “(...) um vínculo de parentesco civil, em linha reta, estabelecendo entre adotante, ou adotantes, e o adotado um liame legal de paternidade e filiação civil. ” (p.521). Dias explicar que“ a adoção cria um vínculo fictício de paternidade-maternidade entre pessoas estranhas, análogo ao que resulta da filiação biológica” (DIAS, 2015, p.481). A adoção é um elo de parentesco, no qual ligar uma pessoa a outra por meio do registro civil, é o ato jurídico que permite que haja parentesco em linha reta, sem existência de vínculo sanguíneo. Neste seguimento, Vieira explicar:
Adoção é o ato jurídico solene pelo qual alguém recebe em sua família, na qualidade de filho, pessoa a ela estranha, ou seja, filiação jurídica, pois não é resultado de uma gravidez, mas de demonstração de vontade ou de sentença judicial. Assim sendo a adoção diferencia-se da filiação natural, exatamente, pelo vínculo, esta é determinada pelo vínculo jurídico, firmado sobre uma relação afetiva. (VIEIRA.2011, p.11)
O Estatuto da criança e do Adolescente (ECA) dispõe em seu “Art. 41. A adoção atribui a condição de filho ao adotado, com os mesmos direitos e deveres, inclusive sucessórios, desligando-o de qualquer vínculo com pais e parentes, salvo os impedimentos matrimoniais”. Deste modo, entende-se que adoção encerra o vínculo jurídico com a família natural, não podendo futuramente o adotado pleitear direito inerente a sua personalidade, como por exemplo o direito ao pronome dos pais biológicos, tendo em vista que tal direito foi desligado, em outras palavras não existe vínculos de parentesco com a família natural. Posto que adoção, praticamente o encerrar. Contudo escolher a adoção seria romper com os outros laços familiares.
Em contraposição, a multiparentalidade mantém a relação familiar primária, já subsistente. A grosso modo, a multiparentalidade permite que avôs e netos, tios e sobrinhos, irmãos e irmãos mantenham direitos inerente a sua personalidade, ao conservar as relações familiares já existentes, não há, portanto, qualquer rompimento, mas em contrapartida, acréscimo. Neste sentido, foi dado provimento ao pedido de adoção, no qual buscava o reconhecimento sócio-afetivo sem excluir do assentamento civil o nome do pai biológico, em respeito à memória paterna, com efeitos multiparentais. Vejam a ementa do caso em comento:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE ADOÇÃO. PADRASTO E ENTEADA. PEDIDO DE RECONHECIMENTO DA ADOÇÃO COM A MANUTENÇÃO DO PAI BIOLÓGICO. MULTIPARENTALIDADE. Observada a hipótese da existência de dois vínculos paternos, caracterizada está a possibilidade de reconhecimento da multiparentalidade. DERAM PROVIMENTO AO APELO. (Apelação Cível Nº 70064909864, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: AlzirFelippeSchmitz, Julgado em 16/07/2015). (TJ-RS - AC: 70064909864 RS, Relator: AlzirFelippeSchmitz, Data de Julgamento: 16/07/2015, Oitava Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 22/07/2015)
No caso em tela, a sentença recorrida teria deferido o pedido de adoção unilateral, todavia retirava o patronímico do pai da apelante. Essa qual, irresignada com os efeitos da decisão a quo, apelou. Desta forma, devolveu a matéria para re-análise da decisão ao órgão colegiado, no qual entendeu que se tratava de um estado de filiação multiparental. Visto que havia o pressuposto do princípio da afetividade. Conformo disposto no mesmo julgado da Apelação Cível Nº 70064909864, pelo voto desembargador relator Alzir Felippe Schmitz:
No que pertinente ao pedido de reconhecimento da multiparentalidade, vejo o falecimento do pai de Juliane quando ela tinha apenas dois anos de idade e o exercício da paternidade de fato pelo também autor Juan, são fatores que não têm o condão de afastar a memória do pai biológico, tampouco de romper os demais vínculos de Juliane com a família de seu genitor.Portanto, observada a hipótese da existência de dois vínculos paternos em relação à Juliane, caracterizada está a possibilidade de reconhecimento da multiparentalidade.
No caso exposto, o douto relator Schmitz entendeu pela não exclusão do pronome paterno, mesmo que pedido inicial fosse adoção unilateral. Visto que acarretaria perda do vínculo família com seu pai biológico e, contudo, afastaria a memória do seu genitor. Assim o julgado entendeu que “observada a hipótese da existência de dois vínculos paternos, caracterizada está a possibilidade de reconhecimento da multiparentalidade”. Desta forma foi provido o apelo e reconhecida a multiparentalidade.
3. CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS DA MULTIPARENTALIDADE
A CF/88 trouxe igualdade sem distinções de filhos, que foi um grande avanço para as concepções de entidade familiar, ao qual tirou do descendente a cruel lástima de ser colocado diante da legislação antecedente CF/88, antes da constituição cidadã vigente, os filhos concebidos de relações extraconjugais, como já dito no primeiro capítulo, eram tidos como espúrios, e o teor pejorativo ofendia o direito inerente a personalidade. Não obstante, afetava tal discriminação por via legal o princípio da dignidade da pessoa humana, pois acarretava distinções e desigualdade entre o estado de filiação, nos quais os filhos concebidos no casamento matrimonial tinham maiores garantias e direitos fundamentais. Todavia tratamento discriminatório foi abolido pela atual Carta Magna, visto que a Constituição de 1988 dispõe em seu art. 227, § 6º “Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação”. Assim, ser pai ou mãe independe de quaisquer sentimentos discriminatórios, isso porque a Carta Maior veda distinção entre filho, para preserva o princípio da dignidade da pessoa humana.
A multiparentalidade é o reconhecimento jurídico de dupla paternidade ou dupla maternidade, sendo ela reconhecida, significa dizer que uma pessoa terá múltiplos pais/mães no status quo do registro civil. Desta forma, o reconhecimento da multiparentalidade acarretará consequências jurídicas advindas do estado de filiação, vejam a seguir alguns efeitos no mundo jurídico do reconhecimento multiparental.
3.1 DA PRESTAÇÃO DE ALIMENTOS
A prestação de alimentos estar relacionada ao trinômio: necessidade, possibilidade e proporcionalidade, no qual o devedor é aquele que tem responsabilidade de dar verba alimentar, no qual deve atender ao credor uma vida digna, para o mínimo de subsistência. Desta forma, o art. 1.695, do CC/02, expressamente dispõe, “São devidos os alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença, e aquele, de quem se reclamam, pode fornecê-los, sem desfalque do necessário ao seu sustento”. Portanto, a prestação de verbas alimentar cuida do direito fundamental e personalíssimo, e, consequentemente visa a assegurar uma vida digna. Assim, “[...] o primeiro direito fundamental do ser humano é o de sobreviver” (SILVIO Apud DIAS, 2015, p.558), e como garantir o mínimo para subsistência, sem a responsabilidade de prestar verbas alimentares aquele que necessita? Desta forma, segundo Lôbo surge o trinômio, o qual questionar: o dever de prestar alimentos, necessidade de quem receber verbas alimentares, e proporcionalidade da prestação de tais verbas? Diante disso “a obrigação alimentar tem um fim precípuo: Atender às necessidades de uma pessoa que não pode prover à própria subsistência” (SILVIO Apud DIAS,2015, p.558). Nesta perspectiva, Silmões de Sousa explicar:
O conteúdo dos alimentos envolve toda a prestação necessária para ajudar o alimentando na manutenção da sua condição de vida. Assim, não se limita ao que é necessário à subsistência, mas engloba também o que é preciso para que a pessoa alimentanda mantenha o seu padrão de vida anterior à circunstância excepcional que ocasionou a necessidade de receber alimentos. (SILMÕES DE SOUSA, 2014, p.4)
O dever de prestação de alimentos não se compreende apenas na assistência básica para sobrevivência. A verba alimentar deve ser ampliada a possibilidade daquele que tem obrigação de dar tal verba, conforme a redação do art.1.694, §1° do CC/02“os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada”. Segundo a CF/88 é dever dos pais ampara os filhos menores, dado o necessário para uma vida digna, e em contrapartida afirma que os filhos têm dever de prover os pais em sua velhice.
Assim há uma solidariedade recíproca, no qual a prestação de alimentos entre pais e filhos inverter, pois devesse observa o trinômio necessidade, possibilidade e proporcionalidade da prestação alimentar. Nesta perspectiva, o CC /02 dispõe no Art.1.696. ” O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos [...]”. Ante exposto, os pais têm dever legal de prestar assistência aos filhos menores, e os filhos dever legal de amparar os pais na velhice.
Em casos que ocorra a multiparentalidade, em que consistem da dupla paternidade/maternidade, o dever de prestação alimentos se estende em relações aos múltiplos pais em prol do filho, isto é, a prestação alimentar dever ser cobrado de ambos os pais, seja o pai biológico, seja o pai sócio-afetivo, na proporção da possibilidade de cada um, para atender as necessidades do alimentando. Da mesma forma, o filho maior que tenha múltiplos pais, deve prestar alimentos a todos em sua velhice, carência e necessidade, conforme o disposto na CF/88, Art. 229. Observa-se o maior amparo material entre ambos os pólos dessa relação. Tanto o filho detém, além da afetividade de dois pais ou duas mães alimentos, de ambos ou ambas, à medida que encontram, igualmente, assistência do filho quando precisarem.
Agora, passaremos ao estudo do instituto da guarda.
3.2. DA GUARDA NO ESTADO DE FILIAÇÃO MULTIPARENTAL
A guarda tem como escopo a proteção dos filhos, para tanto segundo Lôbo, será aplicada em conjunto pelos respectivos pais. Entretanto, em caso de separação conjugal, será individualizada (DIAS, 2015, p.523). Pode-se conceituar guarda como um componente do poder familiar, mediante o qual um indivíduo, encarregar-se da responsabilização civil de cuidados inerente a idade da criança ou adolescente, como exemplo, alimentos, saúde, educação e lazer (MELO, 2017, p.11). Strenger aduz:
A guarda dos filhos ou menores é o poder-dever submetido a um regime jurídico-legal, de modo a facultar a quem de direito, prerrogativas para o exercício da proteção e amparo daquele que a lei considerar nessa condição (STRENG,1998, p. 71Apud MELO, 2017, p.12).
Portanto a guarda estar diretamente ligada poder familiar, em que os pais, originariamente, exercem sobre os filhos. Assim, “na guarda está o dever de vigilância que, lenta e constantemente, atua decisivamente no desenvolvimento da personalidade do menor e na sua formação integral” (SILVA, 2006, p.22). Neste seguimento o art.33, § 1º “a guarda destina-se a regularizar a posse de fato”, isto é, a guarda cuida de uma instrumentalização de fato sobre o estado de posse sobre outrem, cujo seja criança ou adolescente.
Em concordância com a redação do CC/02, art.1.566, IV, é dever dos pais na constância do casamento a guarda dos filhos. É válido destacar que a CF/88, equiparou a união estável a casamento, diante disso a guarda também é aplicada em conjunto no caso de união estável. No fim da sociedade conjugal ou dissolução da união estável, o CC/02 dispõe duas possibilidades de guarda: unilateral e compartilha. Essa permite ambos os genitores permaneçam com o elemento guarda, aquela atribuir a guarda apenas a um único gênito. É importante ressalta que para determinar qual espécie de guarda deve ser aplicada, é necessário respeita o princípio do melhor interesse da criança ou adolescente. Tendo como pressuposto que a guarda unilateral priva o direito de um dos genitores em detrimento de outrem, já guarda compartilhada, em primeira análise, dar um caráter de igualdade entre pais. Em caso de multiparentalidade, qual guarda seria mais adequada? Bem para entender melhor instituto da guarda compartilhada, Grisard Filho explica:
A guarda compartilhada é um plano de guarda onde ambos os genitores dividem a responsabilidade legal pela tomada de decisões importantes relativas aos filhos menores, conjunta e igualitariamente. Significa que ambos os pais possuem exatamente os mesmos direitos e as mesmas obrigações em relação aos filhos menores. Por outro lado, é um tipo de guarda no qual os filhos do divórcio recebem dos tribunais o direito de terem ambos os pais, dividindo, de forma mais equitativa possível, as responsabilidades de criarem e cuidarem dos filhos (GRISARD, 2014 Apud MELO, 2017 p.28)
A guarda compartilhada garante o direito dos pais em comum acordo no poder-dever em decisão de proteção dos filhos, trata de uma prerrogativa estendida do direito anteriormente pré-existente, advindo da sociedade conjugal ou da união estável, em que o casal exercia guarda em conjunta, sem sofrer limitação do poder familiar. Neste sentido, Paulo Lôbo explicar:
A guarda consiste na atribuição a um dos pais separados ou a ambos dos encargos de cuidado, proteção, zelo e custódia do filho. Quando é exercida por um dos pais, diz-se unilateral ou exclusiva; quando por ambos, compartilhada. Nessas circunstâncias a guarda integra o poder familiar, dele destacando-se para especificação do exercício. (LÔBO,2008, p. s/n)
Em contraponto a guarda unilateral restringe direito do poder familiar, podendo até mesmo em alguns casos, afetar o direito de convivência entre pais e filho. Desta forma, Canezin compreende:
A guarda unilateral afasta, sem dúvida, o laço de paternidade da criança com o não guardião, pois a este é estipulado o dia de visita, sendo que nem sempre esse dia é um bom dia, isso porque é previamente marcado, e o guardião normalmente impõe regras (CANEZIN, 2015 Apud MELO,2017, p.24).
Para poder escolhe a espécie de guarda mais adequada no caso de filiação multiparental, em que três pais concorrerem pela guarda do menor, faz de extrema necessidade respeitar o melhor interesse da criança ou do adolescente. Visto que, a guarda serve como de instrumento jurídico para atender as prerrogativas inerentes à paternidade/maternidade responsável. A legislação nacional dar preferência a guarda compartilhada conforme art.1.584, § 2º do CC/02, pois garante um caráter de isonomia entre pais. Segundo Lôbo, “a guarda compartilhada tem por finalidade essencial a igualdade na decisão em relação ao filho ou co-responsabilidade, em todas as situações existenciais e patrimoniais” (LÔBO, 2008, p.s/n), nessa espécie de guarda o menor obterá domicílio na casa de um dos pais, mas isso não retirar a tutela de frequenta a casa do outro gênito e nem muito menos interferir, nem mitigar o instrumento da guarda, pois há um dever de solidariedade entre os pais. Neste liame Lôbo afirma:
A guarda compartilhada é caracterizada pela manutenção responsável e solidária dos direitos-deveres inerentes ao poder familiar, minimizando-se os efeitos da separação dos pais. Ela incita o diálogo, ainda que cada genitor tenha constituído nova vida familiar. Assim, preferencialmente, os pais permanecem com as mesmas divisões de tarefas que mantinham quando conviviam, acompanhando conjuntamente a formação e o desenvolvimento do filho. (LÔBO, P., 2008, p. s/n).
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Ante disso, em caso de separação conjugal a guarda compartilhada ressalta interferência mínima na vida do menor, pois frisa na manutenção de convivência entre os pais e o filho, sem quer haja uma mudança brusca, buscando o melhor interesse da criança ou adolescente. Em caso de separação conjugal, na qual esteja presente o pai/mãe multiparente a guarda compartilhada dever se estender a esse, visto que, hipoteticamente, já dever ocorre o sistema de guarda compartilhada ao pai/mãe biológico.
3.3. MULTIPARENTALIDADE NO ÂMBITO SUCESSÓRIO
A sucessão decorre do direito fundamental, previsto no art.5°, XXX, da CF/88, que garante a herança, que é a reunião de bens adquiridos pelo de cujus, autor da herança. De acordo com o conceito Clóvis Beviláqua, o direito sucessório trata sobre um conjunto de princípios, em que se passar transmissão de um determinado patrimônio à determinada pessoa (BAVILÁQUA Apud LEÃO CANDIL,2006, p.73). No mesmo liame “palavra sucessão, em seu sentido amplo, implica continuação, no todo ou em parte, em uma terceira pessoa, das relações jurídicas que cessaram para o seu titular” (SCUSSEL, 2016, p. 10). Portanto, direito de sucessão aborda sobre de direito uma pessoa em dar continuidade ao bem de outrem, suceder o direito de propriedade do de cujus, isto é, em sentido restrito, quando ocorre o evento morte, o direito real de propriedade cessar para um e nascer para outro.
Sobre a temática sucessória, será restrita uma breve análise a respeito da sucessão legitimas e como fica tal direito com o advento da multiparentalidade. Antes de tudo, o art.1784, CC/02, dispõe “Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários”. Os herdeiros legítimos são aqueles coexiste uma relação de parentesco, como indicado pelo art. 1829 do Código Civil, não poderá o excluir o herdeiro necessário, sem umas das restritas previsões legais. Neste seguimento Scussel compreende:
A sucessão legítima, contudo, torna-se impositiva quando o autor da herança possuir herdeiros necessários (descendentes, ascendentes e cônjuge ou companheiro). In casu, aquele só poderá dispor de metade do patrimônio em testamento, ficando a outra parte bloqueada. A porção patrimonial indisponibilizada chama-se legítima e sua justificação, por óbvio, é a solidariedade social e familiar. (SCUSSEL, 2016, p.27).
O conceito acima está previsto no ordenamento jurídico nacional conforme a redação do art.1.789, do CC/02, que diz “havendo herdeiros necessários, o testador só poderá dispor da metade da herança”, em cumulação com o art.1.845, do CC/02, “são herdeiros necessários os descendentes, os ascendentes e o cônjuge”. Desta forma, os filhos herdam os bens dos pais falecidos, e os pais, no caso que inexista descendente dode cujus, herdam os bens do filho, pois devesse respeito a ordem de vocação sucessória prevista no art.1.829. Como já dito anteriormente no primeiro capítulo deste presente trabalho, a CF/88 não faz distinção entre filhos, assim no âmbito sucessório o filho multiparental terá o mesmo direito garantido na sucessão legítima. Diante disso, o filho multiparental terá um aumento na sua linha sucessória, pois poderá herdam bens de até três ascendentes, visto sua condição decorrente do reconhecimento multiparental.
Todavia é válido frisar quer em caso ocorra o evento morte do filho, e neste exemplo o filho (de cujus) não deixe descendente, os parentes em linha reta por ascendência serão legitimados para recebe o direito fundamental a herança, na ordem de vocação em que o parente mais próximo excluir o mais remoto, conforme a redação do art.1836, §1°, do CC/02. Depara-se, então, em uma situação peculiar no âmbito da multiparentalidade referente à quota parte dos respectivos pais, visto que poderá haver o direito de suceder os bens do filho para três indivíduos. Exemplo: dois pais e uma mãe ou duas mães e um pai. Conquanto o CC/02, em seu art.1836, § 2° dispõe “havendo igualdade em grau e diversidade em linha, os ascendentes da linha paterna herdam a metade, cabendo a outra aos da linha materna”. Nesse viés, em caso de multiparentalidade, quando ocorre o direito de suceder na relação aos ascendentes em linha reta de primeiro grau, cabe a um gênito ficar com a metade do espólio e a outra metade será dívida entre a dupla paternidade/maternidade envolvida? Mesmo sendo a expressa previsão legal, quanto ao direito sucessório do respectivo herdeiro, não seria justo tal divisão, pois estaria claramente ferido igualdade entre os pais.
3.4. A QUESTÃO DA MULTIPARENTALIDADE COMO SALVAGUARDA DAS FAMÍLIAS POLIAFETIVAS
Inicialmente, deve-se frisar, que o direito brasileiro não permite o reconhecimento civil das famílias poliafetivas. São poliafetivas aquelas famílias em que se verifica a pluralidade de membros no núcleo familiar, isto é, uma verdadeira extensão de participantes em tal núcleo. Para Anapol (2012, p. 1), Polyamory é um neologismo que designa um tipo diferente de relacionamento. Explica a autora que o termo poly é oriundo do grego, que significa muitos. Já Amory tem sua origem no latim. O termo aportuguesado tem em sua tradução poliamor, como é comumente empregado para designar uma espécie de relacionamento descrito sinteticamente como aquele contrário às tradicionais regras monogâmicas de se relacionar, ao caracterizar estar amando mais que uma pessoa ao mesmo tempo (2012, P. 2). Nesta perspectiva, Paulo Lotti explica:
[...]na união poliafetiva temos apenas um núcleo familiar, no qual três ou mais pessoas mantém uma comunhão plena de vida entre si, ao passo que nas famílias paralelas, temos mais de um núcleo familiar, no qual pelo menos uma pessoa mantém uma comunhão plena de vida com diferentes pessoas, as quais não se relacionam entre si.( PEREIRA,2015 apud Silva,2017)
A poliafetividade, exemplificando, é compreendida como a união entre três ou mais pessoas, à semelhasse ao casamento civil ou união estável ambos monogâmico, contudo se distingue no ponto peculiar na amplitude de membros na constituição familiar. Como dito, o ordenamento jurídico nacional proíbe à constituição familiar de mais de duas pessoas, nos termos do art. 1521, VI combinado ao art.1548, II, ambos do CC/02, no qual considera-se impedidas de contraí novo casamento, caso ocorra será nulo de pleno direito. Em que pese à realização de escrituras públicas de registro de uniões poliamorosas o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), recebeu representação promovida pela Associação de Direito de Família e das Sucessões (ADFAS), que se transformou em um Pedido de Providências. O processo tombado sob o nº 0001459-08.2016.2.00.0000, teve como pedido liminar a proibição da lavratura de tais escrituras até a final regulamentação da matéria. A Ministra Nancy Andrighi negou a liminar, mas sugeriu aos cartórios de todo país que suspendessem a lavratura de escrituras de uniões poliamorosas até a conclusão dessa lide.
A tese sustentada pela ADFAS é que a poliafetividade nada mais é que legitimação da constituição poligâmica nas uniões, em desacordo com disposição constitucional do art. 226, §3º, sendo, portanto, uma formação familiar inconstitucional, como exposto a seguir:
PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. UNIÃO ESTÁVEL POLIAFETIVA. ENTIDADE FAMILIAR. RECONHECIMENTO. IMPOSSIBILDADE. FAMÍLIA. CATEGORIA SOCIOCULTURAL. IMATURIDADE SOCIAL DA UNIÃO POLIAFETIVA COMO FAMÍLIA. DECLARAÇÃO DE VONTADE. INAPTIDÃO PARA CRIAR ENTE SOCIAL. MONOGAMIA. ELEMENTO ESTRUTURAL DA SOCIEDADE. ESCRITURA PÚBLICA DECLARATÓRIA DE UNIÃO POLIAFETIVA. LAVRATURA. VEDAÇÃO.[...]4. A relação “poliamorosa” configura-se pelo relacionamento múltiplo e simultâneo de três ou mais pessoas e é tema praticamente ausente da vida social, pouco debatido na comunidade jurídica e com dificuldades de definição clara em razão do grande número de experiências possíveis para os relacionamentos.[...]10. A escritura pública declaratória é o instrumento pelo qual o tabelião dá contorno jurídico à manifestação da vontade do declarante, cujo conteúdo deve ser lícito, uma vez que situações contrárias à lei não podem ser objeto desse ato notarial. 11. A sociedade brasileira tem a monogamia como elemento estrutural e os tribunais repelem relacionamentos que apresentam paralelismo afetivo, o que limita a autonomia da vontade das partes e veda a lavratura de escritura pública que tenha por objeto a união “poliafetiva”. 12. O fato de os declarantes afirmarem seu comprometimento uns com os outros perante o tabelião não faz surgir nova modalidade familiar e a posse da escritura pública não gera efeitos de Direito de Família para os envolvidos. 13. Pedido de providências julgado procedente.
Entretanto, não se pode negar há existência de fato desse novo núcleo familiar na sociedade brasileira, mesmo levando em conta o não reconhecimento e tutela estatal. Logo, indaga-se se é possível salvaguardar o direito do menor fruto de uma união poliafetiva? Bem, numa relação envolvendo três indivíduos, exemplo, dois homens e uma mulher, caso essa engravide, de fato existiria dois possíveis pais: apenas um biológico, portem, certamente, dois sócio-afetivos. Mas ambos reconhecendo sua posição de pai do infante, poderia se aplicar a multiparentalidade, com o reconhecimento de filiação de ambos, assegurando à prole, no mínimo, o dobro de amparo material, se focar-se apenas em critérios objetivos, afinal afetivamente, a prole já teria todo amparo factual dos dois.
Outro exemplo, de possível aplicação da multiparentalidade para salvaguarda às famílias poliafetivas seria, retomando a situação narrada, se o nascituro fosse sujeito de direito constitucionalmente garantido à herança.
Visto que há uma união de fato entre dois homens e uma mulher, diante disso se aplicada a multiparentalidade poderia supri a lacuna da lei em relação ao direito sucessório.
Ou seja, a multiparentalidade, em tese, poderia salvaguarda restritamente às famílias poliafetivas, no que tange a aplicação do princípio do melhor interesse da criança ou do adolescente. Pois, seria inexequível desprezar o fato que o nascituro, no exemplo fático, ter em sua vida a presença de dois pais. Mais que isso, agora lhe seria assegurado o dobro de suporte material, com mais pessoas a concorrer por sua integridade, seja em caráter alimentar, seja na garantia de mais uma linha sucessória.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O desenvolvimento deste presente trabalho possibilitou uma análise sobre multiparentalidade, para tanto, fez-se necessário uma averiguação histórica sobre o estado de filiação na sociedade brasileira. Em que ficou evidentemente provado que a legislação fazia distinção de filho, e consequentemente, os filhos concebidos de uma relação extraconjugal eram taxados de espúrios, tal descriminação impedia o reconhecimento do filho pelo respectivo pai. Houve uma minúscula possibilidade do reconhecimento do filho nascido de relações extraconjugais, foi com o decreto lei n°4.737/42, em que permitia gênito reconhecer o filho fruto de relação adulterina, só depois do desquite.
O marco mais importante na legislação brasileira para evolução do direito da família, no que tange o estado de filiação, foi promulgação da CF/88,na qual deu igualdade formal sem distinção de filhos, o que possibilitou discussão doutrinária de outra forma de filiação. A descoberta do exame de DNA, trouxe para o direito a dita verdade real, em que possibilitou o reconhecimento da filiação pela origem genética, tal exame garante ao filho descobrir sua origem biológica, e como resultadogarante o direito da personalidade a pronome paterno.Em contraponto a filiação decorrente da genética, existe a filiação socioafetiva, derivada do princípio constitucional da afetividade, sendo tal princípio a base da entidade familiar. Contudo, foram travados questionamento sobre a qual filiação deveria permanece no status quo do registro civil: Biológica ou afetiva. Mas nada impedi que na filiação biológica inexista vínculo afetivo, até porque o princípio da afetividade é a base para construção da entidade familiar, a regra é que o pai tenha vínculo afetivo com seu descendente. Ante exposto, para destrava o emblema, os tribunais começaram a reconhecer a tese da multiparentalidade, que consiste na possibilidade jurídica de uma pessoa ter dupla paternidade/maternidade no assentamento do registro civil, sendo uma biológica e outra afetiva, para tanto é de extrema importância estar presente o princípio da afetividade na relação multiparental.
O surgimento da multiparentalidade versa sobre a manutenção dos vínculos familiares com a família dos pais, trata sobre uma extensão da família decorrente dos laços afetivos. O reconhecimento multiparental invés da adoção mantém a linha de parentesco entre a família natural além de um vínculo civil culminando em uma verdadeira pluralidade de parentesco, na qual possibilita mais direitos e deveres na ordem civil. Portanto o reconhecimento multiparental acarreta consequências jurídicas no ordenamento jurídico nacional, nos quais são derivam dos princípios da paternidade responsável e da solidariedade familiar.
A Multiparentalidade ampliar a assistência material do menor, seja no dever da prestação de alimentos, seja no dever de guarda. Isso porque, o reconhecimento multiparental causa consequências no âmbito jurídico, decorrentes da paternidade responsável. Desta forma, o pai multiparente, mesmo ocorrendo o fim da sociedade conjugal, dever dar apoio material ao filho, além de dar amparo emocional e manter-se presente nas decisões referente a prole. No caso de separação em que exista o pai/mãe multiparente, a guarda compartilhada deve ser estendida ao mesmo, uma vez que, reconhecido o vínculo multiparental não poderá ser desfeito. Diante disso, a linha sucessória também é ampliada, o filho poderá suceder em até três linhas retas, enquanto os pais poderão sofre um emblema em relação a cota parte de sua herança, dado a omissão legislava em relação a multiparentalidade. Já que a lei prever divisão em 50% na linha materna e 50% na linha paterna, o que é injusto em relação a multiparentalidade, visto o caráter isonômico entre os pais.
A multiparentalidade aparece como forma restrita de salvaguarda às famílias porliafetivas, quanto ao direito da paternidade. Isto é, numa família poliamorosa, formada por três pessoas, caso uma mulher engravide poderá, visivelmente, buscar o reconhecimento multiparental de um dos envolvidos.
Ante exposto, concluir que o reconhecimento multiparental causa efeitos jurídicos no âmbito nacional. Nos quais são decorrentes do reconhecimento do estado de filiação, tal ligar um indivíduo a outro. Desta forma, acarreta o dever legal de solidariedade familiar, em que traz o dever de prestar alimentos, o dever a guarda e proteção do filho, além de garantir o direito fundamental à herança.
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[1] Bacharel em direito pela UNINASSAU.
[2] Pós Graduado em Direito Civil e Empresarial pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Mestre em Direito, mestre em Antropologia pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), professor titular da disciplina de direito civil da Faculdade UNINABUCO, advogado militante e membro da comissão de direito de família da OAB, subseçãol de Olinda.
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