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Casal homossexual e inelegibilidade
Notícia muito importante e, realmente, de interesse nacional, foi publicada em O Liberal, no dia 4 de maio, próximo passado. Trata-se de uma consulta feita pelo deputado paraense Anivaldo Vale ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), para saber se é elegível para o cargo de prefeito de um Município o companheiro homossexual do atual prefeito, que já está no segundo mandato, e, portanto, é irreelegível. Na resposta, segundo o noticiário, o TSE alegou que ainda não encontra a união entre pessoas do mesmo sexo amparo na Constituição Federal e na legislação infraconstitucional, concluindo que não existem precedentes para a situação dessas pessoas, com base na regra da inelegibilidade, prevista na Lei Eleitoral, e preferiu declarar desconhecimento.
O deputado Vale afirmou que a Lei Eleitoral, apesar de nova, precisa ser aprimorada, e garantiu que a consulta que fez é hipotética, em âmbito nacional, e nada tem a ver com uma situação existente concretamente num município paraense, aparecendo na notícia os nomes das pessoas supostamente envolvidas num relacionamento homossexual.
No passado, quando a legislação eleitoral só proibia a candidatura do cônjuge do prefeito, a jurisprudência evoluiu, e equiparou a situação de cônjuge à de companheira ou companheiro (TSE, Ac. nº 13.006, Relator Min. Velloso, 6.out.92). E isto, note-se bem, ao tempo em que ainda não existia legislação regulando a união estável! Assim, a mulher que vivia com o prefeito, em união estável, foi considerada inelegível para o cargo de prefeita. Não tenho dúvida alguma que este vai ser o caminho a ser tomado pela Justiça Eleitoral, no que se refere aos casais homossexuais. Até fico muito admirado de o TSE, no caso da consulta do deputado Vale, ter fugido da questão, alegando falta de previsão constitucional ou legal, quando isto é o que menos importa, deixando de considerar uma realidade social, que fere os olhos com clareza solar, representada pela existência de muitas pessoas que têm uma orientação sexual diferente da maioria, e a elas deve ser dado, ao menos, o direito à felicidade, sem nenhuma discriminação, nenhum preconceito, nenhuma violência.
Independentemente de haver ou não uma lei regendo a questão, uma vez que a intransigência e o falso moralismo impedem que progridam alguns projetos que tramitam na Câmara dos Deputados, o Poder Judiciário já vem reconhecendo vários direitos e deveres entre pessoas do mesmo sexo que mantêm um relacionamento afetivo, pois o Direito não se esgota na lei. Trata-se de indivíduos que vivem juntos, que se amam, que formam uma entidade familiar, no molde de sua inclinação sexual, e tudo se passa de forma pública e notória. São situações em tudo semelhantes e equiparáveis às uniões estáveis entre o homem e a mulher. Em alguns países – Holanda, Dinamarca, Bélgica, Alemanha –, até o casamento já é permitido entre pessoas do mesmo sexo.
No passado, nossa sociedade privilegiava o casamento, a família matrimonializada, e fechava os olhos para as uniões entre homem e mulher que não tinham a consagração do matrimônio. Foram os juízes que se colocaram à frente dos legisladores (que, alguns, só enxergam a próxima eleição e não a futura geração) e, pouco a pouco, mas vigorosamente, foram sendo reconhecidos direitos às concubinas e aos filhos de pessoas que não eram casadas, pois as crianças, numa perversidade diabólica, também eram estigmatizadas e perseguidas, como se tivessem alguma culpa no eventual erro ou pecado cometido pelos seus genitores. Adveio a Constituição de 1988, que reconheceu a união estável como entidade familiar, que igualou marido e mulher quanto aos direitos e deveres matrimoniais, que proibiu a discriminação entre filhos, qualquer que seja a natureza da filiação. A Carta Magna brasileira cortou os laços com um passado secular repleto de preconceitos, democratizou e rejuvenesceu o Direito de Família, em nosso país.
No momento, diante da inércia do Legislativo, que se acomoda e finge que não enxerga o fato social, é o Poder Judiciário que, de novo, toma a frente. Mesmo na falta da legislação, mas com base em princípios constitucionais, nas regras superiores de Direito e na analogia, vem reconhecendo direitos aos parceiros homossexuais. Neste sentido, já foi decidido que devem ser partilhados os bens adquiridos pelo casal homossexual, com esforço comum. O companheiro homossexual pode indicar o outro como dependente na Previdência Social e como beneficiário em plano de saúde. Os parceiros do mesmo sexo já estão autorizados a comparecer num cartório e outorgar uma escritura formalizando a sua relação, ou a celebrar um contrato regulando a vida em comum, definindo, inclusive, questões patrimoniais. Já há um número expressivo de livros jurídicos abordando a matéria. A maior autoridade no assunto é a desembargadora Maria Berenice Dias, do Rio Grande do Sul. Já fui orientador de vários trabalhos de conclusão de Curso de Direito abordando o relacionamento homossexual. E uma advogada paraense está lançando um livro, pela Editora Método, de São Paulo, sobre o tema.
Quando são reconhecidos direitos, todavia, há a contrapartida dos respectivos deveres. E isto vale para os cônjuges, para os que vivem em união estável e para os que formam uma entidade familiar homossexual. O TSE pode não ter querido se comprometer, pode não ter desejado antecipar um posicionamento. Mas eu posso afirmar, com base nas decisões judiciais a respeito das uniões homoafetivas, e na equiparação que tem sido reconhecida com relação à união estável entre o homem e a mulher, que a conclusão inevitável da Justiça Eleitoral vai ser a de considerar inelegível para o cargo de prefeito o homem que vive uma relação estável, homossexual, com o prefeito, e a mulher que é companheira homossexual da prefeita, se o fato for público, contínuo, duradouro, estiver provado. E isto porque o Direito Eleitoral tem o objetivo principal de garantir a lisura nas eleições, evitando os abusos que estão sendo praticados e que mais ainda se praticam quando os detentores do poder querem se eternizar nos cargos por interpostas pessoas.
O deputado Vale afirmou que a Lei Eleitoral, apesar de nova, precisa ser aprimorada, e garantiu que a consulta que fez é hipotética, em âmbito nacional, e nada tem a ver com uma situação existente concretamente num município paraense, aparecendo na notícia os nomes das pessoas supostamente envolvidas num relacionamento homossexual.
No passado, quando a legislação eleitoral só proibia a candidatura do cônjuge do prefeito, a jurisprudência evoluiu, e equiparou a situação de cônjuge à de companheira ou companheiro (TSE, Ac. nº 13.006, Relator Min. Velloso, 6.out.92). E isto, note-se bem, ao tempo em que ainda não existia legislação regulando a união estável! Assim, a mulher que vivia com o prefeito, em união estável, foi considerada inelegível para o cargo de prefeita. Não tenho dúvida alguma que este vai ser o caminho a ser tomado pela Justiça Eleitoral, no que se refere aos casais homossexuais. Até fico muito admirado de o TSE, no caso da consulta do deputado Vale, ter fugido da questão, alegando falta de previsão constitucional ou legal, quando isto é o que menos importa, deixando de considerar uma realidade social, que fere os olhos com clareza solar, representada pela existência de muitas pessoas que têm uma orientação sexual diferente da maioria, e a elas deve ser dado, ao menos, o direito à felicidade, sem nenhuma discriminação, nenhum preconceito, nenhuma violência.
Independentemente de haver ou não uma lei regendo a questão, uma vez que a intransigência e o falso moralismo impedem que progridam alguns projetos que tramitam na Câmara dos Deputados, o Poder Judiciário já vem reconhecendo vários direitos e deveres entre pessoas do mesmo sexo que mantêm um relacionamento afetivo, pois o Direito não se esgota na lei. Trata-se de indivíduos que vivem juntos, que se amam, que formam uma entidade familiar, no molde de sua inclinação sexual, e tudo se passa de forma pública e notória. São situações em tudo semelhantes e equiparáveis às uniões estáveis entre o homem e a mulher. Em alguns países – Holanda, Dinamarca, Bélgica, Alemanha –, até o casamento já é permitido entre pessoas do mesmo sexo.
No passado, nossa sociedade privilegiava o casamento, a família matrimonializada, e fechava os olhos para as uniões entre homem e mulher que não tinham a consagração do matrimônio. Foram os juízes que se colocaram à frente dos legisladores (que, alguns, só enxergam a próxima eleição e não a futura geração) e, pouco a pouco, mas vigorosamente, foram sendo reconhecidos direitos às concubinas e aos filhos de pessoas que não eram casadas, pois as crianças, numa perversidade diabólica, também eram estigmatizadas e perseguidas, como se tivessem alguma culpa no eventual erro ou pecado cometido pelos seus genitores. Adveio a Constituição de 1988, que reconheceu a união estável como entidade familiar, que igualou marido e mulher quanto aos direitos e deveres matrimoniais, que proibiu a discriminação entre filhos, qualquer que seja a natureza da filiação. A Carta Magna brasileira cortou os laços com um passado secular repleto de preconceitos, democratizou e rejuvenesceu o Direito de Família, em nosso país.
No momento, diante da inércia do Legislativo, que se acomoda e finge que não enxerga o fato social, é o Poder Judiciário que, de novo, toma a frente. Mesmo na falta da legislação, mas com base em princípios constitucionais, nas regras superiores de Direito e na analogia, vem reconhecendo direitos aos parceiros homossexuais. Neste sentido, já foi decidido que devem ser partilhados os bens adquiridos pelo casal homossexual, com esforço comum. O companheiro homossexual pode indicar o outro como dependente na Previdência Social e como beneficiário em plano de saúde. Os parceiros do mesmo sexo já estão autorizados a comparecer num cartório e outorgar uma escritura formalizando a sua relação, ou a celebrar um contrato regulando a vida em comum, definindo, inclusive, questões patrimoniais. Já há um número expressivo de livros jurídicos abordando a matéria. A maior autoridade no assunto é a desembargadora Maria Berenice Dias, do Rio Grande do Sul. Já fui orientador de vários trabalhos de conclusão de Curso de Direito abordando o relacionamento homossexual. E uma advogada paraense está lançando um livro, pela Editora Método, de São Paulo, sobre o tema.
Quando são reconhecidos direitos, todavia, há a contrapartida dos respectivos deveres. E isto vale para os cônjuges, para os que vivem em união estável e para os que formam uma entidade familiar homossexual. O TSE pode não ter querido se comprometer, pode não ter desejado antecipar um posicionamento. Mas eu posso afirmar, com base nas decisões judiciais a respeito das uniões homoafetivas, e na equiparação que tem sido reconhecida com relação à união estável entre o homem e a mulher, que a conclusão inevitável da Justiça Eleitoral vai ser a de considerar inelegível para o cargo de prefeito o homem que vive uma relação estável, homossexual, com o prefeito, e a mulher que é companheira homossexual da prefeita, se o fato for público, contínuo, duradouro, estiver provado. E isto porque o Direito Eleitoral tem o objetivo principal de garantir a lisura nas eleições, evitando os abusos que estão sendo praticados e que mais ainda se praticam quando os detentores do poder querem se eternizar nos cargos por interpostas pessoas.
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