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A importância e os desdobramentos da afetividade nas relações intra e interpessoais
A importância e os desdobramentos da afetividade nas relações intra e interpessoais
Claudio Augusto Varela Ayres de Melo Filho
Advogado
Ana Margareth Manique de Melo
Psicóloga
Ma. Ciências da Religião
Resumo: A afetividade como sentimento permeia as relações dos seres humanos, independente de raça, classe social, idade, gênero, e escolaridade. Este estudo teve como objetivo descrever como e em quais momentos, sua presença ou sua ausência nas relações interpessoais, interfere no desenvolvimento da personalidade, da autoestima e da qualidade das relações intra e interpessoais. Este estudo teve como base a pesquisa bibliográfica. A família e a escola são dois marcadores sociais de significativa importância para a socialização da criança, de tal forma, que os sujeitos destes têm grande responsabilidade na transmissão de afeto. Dessa compreensão, comungam a Psicologia e o Direito. Em termos de saúde mental, a Psicologia busca disseminar seus estudos a respeito desse tema, com o intuito de esclarecer e pontuar sua importância para a obtenção de um saudável desenvolvimento do ser humano em suas diferentes fases, porém, aponta a infância como uma fase estruturante. Esta mesma compreensão, também se fez presente no campo do Direito, impulsionando seus operadores com a intenção de salvaguardar a integridade física e psicológica da criança e do adolescente através de inovações e do Estatuto da Criança e do Adolescente, que completou 30 anos em 2020. Percebeu-se que por ocasião da pandemia provocada pelo Covid—19, e da imperante necessidade de isolamento social, muitas famílias viram suas relações e interações entre seus membros fragilizadas.
Palavras-chave: Psicologia. Direito. Família. Afetividade.
Abstract: Affectivity as a feeling permeates human relationships, regardless of race, social class, age, gender, and education. This study aimed to describe how and at wich times, their presence or absence in interpersonal relationships, interferes with the development of personality, self-esteem and the quality of intra and interpersonal relationships. This study was based on bibliographic research. The family and the school are two social markers of significant importance for the socialization of the child, in such a way, that the subjects of these have great responsibility in the transmission of affection. From this understanding, psychology and law share. In terms of mental health, Psychology seeks to disseminate its studies on this theme, with the aim of clarifying and punctuating its importance for obtaining a healthy development of the human being in its different phases, however, it points out childhood as a structuring phase . This same understanding was also present in the field of Law, boosting its operators with the intention of safeguarding the physical and psychological integrity of children and adolescents through innovations and the Child and Adolescent Statute, which completed 30 years in 2020. It was noticed that due to the pandemic caused by Covid-19, and the imperative need for social isolation, many families saw their relationships and interactions among their members weakened.
Keywords: Psychology. Right. Family. Affectivity.
Pensar em afetividade e autoestima requer que voltemos nossa atenção para o inevitável imbricamento do contexto social e cultural com a subjetividade que constitui cada um de nós. Não é possível compreender esses sentimentos inerentes ao ser humano dissociados das experiências que a vida oferta, cotidianamente, em diferentes campos e pilares de construção das sociedades, ou seja, social, familiar, político, religioso e seus desdobramentos.
Os sentimentos e emoções são objetos de estudo de diversas áreas de pesquisa, como a Psicologia, a Filosofia e o Direito, assim como tantas outras que buscam compreender o que permeia o desenvolvimento do ser humano enquanto ser sócio histórico.
Vygotsky (2003) em seus postulados, destacou a importância das emoções como mecanismos organizadores de comportamentos desenvolvidos nas relações interpessoais e no processo histórico cultural como fonte de construção dos nossos conhecimentos.
Entendemos ser pertinente fazer uma breve distinção entre emoções e sentimentos com o intuito de contribuir para maior compreensão do tema.
As emoções são reações que cada indivíduo vivencia quando sofre estímulos internos ou externos, conscientes ou inconscientes; são pontuais ou de pouca duração, e perceptíveis por outras pessoas além de quem as experiencia.
Os sentimentos têm sua origem nas emoções, estão associados a conteúdo intelectual e a valores; é um estado psicológico experienciado por um período mais duradouro. É possível ser escondido, disfarçado por quem o sente, não apenas para o exterior de si, mas também para si mesmo.
Porém, é preciso compreender que tanto as emoções quanto os sentimentos são sempre interpretações da subjetividade de cada indivíduo.
Os estudos já realizados nos levam a depreender que a presença de afetividade nas inter-relações é fundamental para o desenvolvimento da personalidade. Algumas pesquisas já realizadas sobre a relação mãe/filho(a), apontam para a importância de sua demonstração ainda durante a gestação. Descrevem que pode se dar através de falas afetuosas, pelas quais os bebês sentem as emoções transmitidas a partir da vibração do som, emitida pelas palavras. Embora nesse momento, aqueles ainda não sejam capazes de compreender seus significados, sentem o que entendemos como afetividade; assim como por carinhos e toques na barriga da gestante, não apenas por ela mesma, mas também por familiares ou amigos.
Em seu desenvolvimento, a criança em tenra idade começa a perceber que os afetos são importantes para si, pois agora conseguem entendê-los com maior precisão, pois os associam a fonte de satisfação, logo inicia-se a necessidade de recebimento de afeto de modo mais contínuo.
Concomitantemente ao início da apresentação de limites pelos pais e, posteriormente, pelos professores, quando em idade escolar, para que a socialização se construa de forma saudável, a criança começa sua busca, não apenas pelo recebimento de amor ou aprovação, mas também por sua manutenção.
Sendo assim, tornou-se hegemônica a compreensão que durante o processo de construção da personalidade, a presença ou ausência de afeto proporciona o fortalecimento ou a fragilidade da autoestima.
Percebe-se que a necessidade de afeto também leva algumas crianças a realizarem atitudes com as quais não correspondem as suas próprias vontades, mas sim, apenas com intenção de agradar àqueles que lhes são afetuosos, na tentativa de corresponder a expectativa daquelas pessoas e, com isso, ser aceita e amada.
Por isso, na medida em que mais estudos são realizados, se fortalece o entendimento da necessidade do uso de diálogo e acolhimento às crianças por parte dos adultos, com intuito de levá-las a compreensão da existência de um caminho seguro para construção e fortalecimento dos laços afetivos, ou seja, pelo compartilhamento da sinceridade e da afetividade.
Os entendimentos a respeito da importância da afetividade seguiram se firmando e se expandindo para outros campos que não apenas o psicológico, encontrando assento também no campo jurídico. Assim, após 21 anos de ditadura civil militar foi consagrada a Constituição Federal de 1988, a qual trouxe diversos avanços democráticos, sociais e civilizatórios (BRASIL. Conselho Federal de Psicologia, Caderno de artigos: ECA: 30 anos, 2020, p. 18-22). A exemplo no que tange a criança, a Constituição passou a tratar como iguais os filhos havidos fora e dentro da relação matrimonial, pondo fim a uma diferenciação pejorativa entre os filhos, que acarretava em uns possuírem mais direitos que os outros. “Não mais cabe falar em filhos legítimos, ilegítimos, naturais, incestuosos, espúrios ou adotivos. Filho é simplesmente “filho”” (DIAS, 2020, p. 70).
Diante disto, seguindo os avanços sociais da Constituição de 1988, o Estado Brasileiro promulgou o Estatuto da Criança e do Adolescente (LEI Nº 8.069, DE 13 DE JULHO DE 1990), o qual trouxe um novo olhar sobre a criança e o adolescente, lhe garantindo direitos fundamentais, fomento de políticas públicas e ainda impondo deveres, à família, à sociedade e ao Estado, ou seja, atribuiu responsabilidade e cuidados devidos por todos aqueles que tiverem contato com a criança, independentemente da instância, de provê-la ambiente sadio e saudável para o seu desenvolvimento.
Mesmo assim, após trinta anos de vigência, o ECA ainda possui sérias dificuldades em ter suas normas cumpridas. A exemplo, o mesmo prevê a proibição de qualquer violência contra os menores, vindo a garantir que em seu desenvolvimento, os pais e familiares por extensão não as submeta à violência física ou psicológica como método de castigo.
No entanto, em 2017 a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), o Conselho Nacional de Medicina (CFM) e o Ministério dos Direitos Humanos, realizaram acordo de parceria no intuito de apontar possíveis soluções para agressões de crianças e adolescentes com idade de até 19 anos. O registro das agressões havia sido realizado pela Sociedade Brasileira de Pediatria no período compreendido entre os anos de 2009 e 2017, o qual totalizou 471.178 notificações, dos quais, apenas no ano de 2017 foram 85.293 notificações, o que configura uma média de 233 agressões de diversos tipos (físicas, psicológicas e tortura) por dia. Dentre os dados colhidos, se ressaltou que parte dessas agressões ocorreram no ambiente doméstico ou derivado de relações familiares.
Importante se faz pontuar que a família brasileira, por muitos séculos teve como base estrutural o patriarcado[1], porém, na contemporaneidade este pilar social, vem passando por uma repersonalização em sua essência. Percebe-se que a mudança está se dando lentamente e, o afeto, vem se tornando a nova fonte dos direitos das famílias.
A partir desse novo paradigma, surgiram outras formas de relação, estas baseadas no afeto que vieram a gerar a socioafetividade, esta entendida como a relação de parentesco não biológico (LÔBO, 2018). Esta forma de relação vem trazendo inovações no direito, sendo este fato verificado na doutrina e jurisprudência, principalmente em relação as crianças e os adolescentes.
O entendimento das duas fontes jurídicas acima citadas, resulta na propositura de que laços formados pela socioafetividade são prevalentes aos laços sanguíneos, como pode se verificar em decisões em sentido positivo em que preveem a inclusão do nome de outro pai ou mãe na certidão de nascimento, que não os biológicos (BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, 2019), como também em sentido negativo onde ocorre o pagamento de indenização e até mesmo a exclusão do sobrenome sob a tese do abandono afetivo e material (REsp 1.304.718-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 18/12/2014, DJe 5/2/2015).
Ainda nesta direção, se desenvolveu o princípio da proteção integral, que “não é uma recomendação ética, mas diretriz determinante nas relações da criança e do adolescente com seus pais, com sua família, com a sociedade e com o Estado” (LÔBO apud DIAS, 2020, p. 70).
Além disso, podemos ressaltar a observação de Dias (2020, p. 75), quando pontua que “o Estatuto da Criança e do Adolescente, por seis vezes, faz expressa referência à afetividade na definição de família extensa (ECA 8º, § 7º; 25 parágrafo único; 28 § 3º; 42 § 4º; 50 § 13 II; e 92 § 7º)”.
Dito isto, visualizando os precedentes legais que buscam o pleno desenvolvimento de crianças e adolescentes, com base no afeto, por estarmos vivenciando um momento atípico com a pandemia instalada e causada pelo COVID-19, no qual se fez presente a obrigatoriedade de distanciamento social, somos impelidos a refletir sobre a importância da afetividade, em especial para auxiliar as crianças na compreensão e melhor aceitação da situação. Observa-se, então, que a sociedade vive um momento bastante significativo e histórico, no qual tornou-se de suma importância a aplicabilidade das Leis supracitadas.
Segundos os Pesquisadores colaboradores de Atenção Psicossocial e Saúde Mental do Centro de Estudos e Pesquisas em Emergências e Desastres em Saúde (CEPEDES) da Fiocruz (2020):
Dentre as medidas adotadas pelas autoridades sanitárias para conter a rápida escalada do contágio da COVID-19, destaca-se o distanciamento social que implicou no fechamento de escolas, interferindo na rotina e nas relações interpessoais na infância. Além disso, as crianças podem ser afetadas pelas dificuldades financeiras vivenciadas em suas famílias (ex., familiares ou cuidadores que perderam o emprego ou tiveram a renda reduzida) e, ainda, pelo adoecimento, hospitalização ou morte de pessoas próximas, o que traz implicações para o seu senso de segurança e normalidade (FIOCRUZ, 2020, p. 04).
Com a rotina de todos modificada, o conhecimento que antes era adquirido pela criança no ambiente escolar, passou a ser no ambiente familiar. Porém, isto demandará maior atenção e dedicação dos pais/cuidadores. Estes precisarão estabelecer uma nova organização de atividades para eles e para as crianças, na qual deverão ser estipulados horários como uma forma de ofertar mínima sensação de organização e bem-estar para todos.
De tal forma, devem ser aplicadas pelos pais as proposituras que se encontram no Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI, 1998, vol.1, p. 21-22) como orientação para aquisição de conhecimentos não apenas no ambiente escolar, mas também no ambiente familiar, pois “as crianças constroem o conhecimento a partir das interações que estabelecem com as outras pessoas e com o meio em que vivem. O conhecimento não se constitui em cópia da realidade, mas sim, fruto de um intenso trabalho de criação, significação e ressignificação”.
A habilidade de criação e ressignificação, quando estimulada no ser humano, independentemente da idade, será mais próspera se respaldadas na paciência e afetividade, sem ameaças nem punições, pois estes podem desenvolver atitudes reativas e de autodesvalorização. Tal situação já foi constatada pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), através de entrevista cedida por Holanda, (2020), a qual trouxe em notícia que a quarentena agrava a situação de abandono afetivo e traz também um agravante na alienação parental. Sendo esta a interferência na formação psicológica da criança ou adolescente, no intuito de prejudicar o vínculo e a relação com o genitor(a).
Para Piaget (1983), a afetividade é imprescindível para desenvolver e manter boa saúde mental, para a aprendizagem, paro o comportamento e para o desenvolvimento cognitivo.
Em se tratando especificamente de adolescente, Alvarenga (2001) aponta que para a construção de autoestima elevada, além da afetividade, devem estar presentes na interação familiar, diálogo, modelo, e limite, pois entende que o comportamento dos pais, em sua maioria, está funcionalmente associado ao comportamento dos filhos.
Porém, é necessário pontuar que em algumas realidades essa postura não encontra espaço para ser desenvolvida. A existência de famílias em situação de vulnerabilidade socioeconômica é um fato complexo e real em nossa sociedade. Muitos desses grupos familiares são atravessados por tamanha necessidade de sobrevivência, que a afetividade se faz presente apenas no cuidado básico. Há maior comprometimento quando ocorre abandono parental, pois se torna um acréscimo para uma desestrutura familiar e fragilidade nos vínculos.
Na maioria das vezes, os pais que vivem essa realidade, não possuem capacidade de oferecer suporte emocional e psicológico que possa contribuir para o bom desenvolvimento de seus filhos, sejam eles crianças ou adolescentes. Estudioso das implicações neurológicas do afeto, ou da falta dele descreve que “A negligência emocional praticada por pais e cuidadores em relação às crianças deixa marcas nos circuitos neuronais” e que no “futuro, essas cicatrizes podem contribuir para o surgimento de sérios distúrbios afetivos” (HANSON apud PEREIRA, 2017).
Compreendemos que essa realidade traz desigualdades, dissabores, poucas oportunidades de mudanças e desenvolvimento dentro do contexto social, e por isso pode fragilizar o equilíbrio emocional e psicológico de modo geral, trazendo para os sujeitos envolvidos a possibilidade de também terem prejudicadas a construção e manutenção da autoestima ao longo da vida.
Todo esse contexto ficou ainda mais agravado pela pandemia, principalmente por esta trazer muito explicitamente a sensação negativa da incerteza no futuro, e que em grande medida se apresenta como obscuro.
Dalgalarrondo (2008, p. 155) corrobora com o exposto até o momento, ao afirmar que “A vida afetiva é a dimensão psíquica que dá cor, brilho e calor a todas as vivências humanas”.
O autor supracitado continua sua contribuição para o tema quando faz colocações sobre a reação afetiva:
A afetividade caracteriza-se particularmente por sua dimensão de reatividade. Nesse sentido, há duas importantes dimensões da resposta ou reação afetiva de um indivíduo. Denomina-se sintonização afetiva a capacidade de o indivíduo ser influenciado afetivamente por estímulos externos; assim, o sujeito entristece-se com ocorrências dolorosas, alegra-se com eventos positivos, ri com uma boa piada, enfim, entra em sintonia com o ambiente (DALGALARRONDO, 2008, p. 159).
As reações advindas do recebimento de afeto estão associadas as estruturas emocionais e psicológicas individuais, além do contexto sociocultural, entendendo que cada sociedade possui compreensão própria para um mesmo ato.
Carl Rogers (1902-1987), através da Psicologia Humanista compreende o ser humano a partir de uma perspectiva holística, identificando-o como aquele que é portador de potencial capaz de se desenvolver, um ser possuidor de impulso de auto atualização:
É este impulso que é evidente em toda vida humana e orgânica - expandir-se, estender-se, tomar-se autônomo, desenvolver-se, amadurecer - a tendência a expressar e ativar todas as capacidades do organismo na medida em que tal ativação valoriza o organismo ou o self (ROGERS, 2019, p. 32).
Em seus postulados, Rogers aponta a importância de se viver em espaços harmoniosos e afetuosos para que ocorra um desenvolvimento saudável do potencial que todo ser humano possui, proporcionando, assim, o alcance de congruência e autenticidade consigo e nas relações interpessoais. Defendia que a empatia e autenticidade são comportamentos importantes para as relações interpessoais.
Ao refletirmos sobre o que foi dito anteriormente por diferentes autores, podemos depreender que emoções e sentimentos como raiva, alegria, medo, tristeza e outros, por fazerem parte de todo ser humano, podem ser experienciados individual ou coletivamente no decorrer de um mesmo dia. Porém, quando ocorrem subsequentemente, em período curto como este, é preciso ser observado como são vivenciados. As situações e estímulos que os causaram apresentam-se como desafios a serem ultrapassados, mas nos sentimos fragilizados? São causadores de sofrimento que nos impossibilita reação? Somos capazes de enfrentá-los com segurança e assertividade? Parece-nos que a resposta mais coerente a essas perguntas é que sempre será necessário se observar o contexto, a singularidade e o autoconhecimento de cada sujeito.
Na contemporaneidade é usual associarmos a autoestima ao autoconhecimento. Porém, até pouco tempo autoconhecimento era associado ao narcisismo, egocentrismo, egoísmo, ou mesmo ao hedonismo, além de uma acepção de superioridade ou individualismo. Pensar no próprio bem estar e procurar viver com assertividade a partir de suas próprias prerrogativas, não se configurava uma boa escolha. Essa postura levava as pessoas a seguirem suas vidas a partir do posto pela sociedade como a maneira “certa” de se viver, sem se permitirem questionar ou refletir o que, realmente, lhes trazia sentido para suas vidas.
Hoje entendemos o autoconhecimento como a compreensão de si mesmo, capaz de proporcionar auto responsabilidade por suas escolhas, decisões, fracassos e êxitos, além de se tornar capaz de determinar a forma como as relações intrapessoal e interpessoais devem se desenvolver. Quando bem estruturado, torna o indivíduo mais forte, mais livre, com maior aceitação de sua singularidade, compreensão de que cabe apenas a si o trabalho de autotransformação. Por conseguinte, ao aumentar esse potencial, se torna mais capaz de questionar e se posicionar diante do que o rodeia.
O autoconhecimento ocorre cotidiana e constantemente, a partir da auto-observação e reflexões sobre nossos, valores, atitudes e sentimentos que fazem parte de nossa forma de existir.
Esse conjunto de premissas, quando adquiridas, contribui para a construção de uma autoestima elevada, conquistada com bases emocional e psicológica fortalecidas, capaz de proporcionar bem estar e auto segurança.
Rogers (2019) entendia que o autoconhecimento fortalece a autoestima, mas cita outros requisitos igualmente importantes, como por exemplo, o a decisão do indivíduo de se desenvolver na vida de modo destemido para se tornar e se manter autêntico e congruente nas relações intrapessoais e interpessoais.
Goñi e Fernández (2009, p. 28) nos esclarecem diferenças entre os conceitos de autoconceito e autoestima: “o autoconceito faz referência a ideia que cada pessoa tem de si mesma, enquanto que a autoestima alude ao apreço (estima, amor) que cada qual sente por si mesmo; o primeiro termo faz referência à dimensão cognitiva ou perceptiva e o segundo à vertente avaliativa ou afetiva”.
Os autores supracitados descrevem que a heteroestima — apreciação realizada por pessoa distinta do sujeito — serve de égide para a construção da autoestima deste. Inicialmente, ainda quando criança e adolescente, esse movimento ocorre através dos posicionamentos dos pais ou cuidadores, além de outros familiares, professores e amizades. Com o avançar da idade, se consolidam as próprias interpretações e avaliações sobre si, de tal forma que se passa a realizar modificações em si mesmo apenas quando as achar necessárias.
O indivíduo adulto, quando já inserido no mercado de trabalho e com boa autoestima, é capaz de constatar as conquistas alcançadas no campo social e profissional, fato que pode provocar uma elevação da autoestima. Porém, para aquele sujeito que possui baixa autoestima, quase sempre não consegue ver os feitos como algo significativos e relevantes, possuem uma espécie de resistência em se perceberem como competentes naquilo que realizam.
Compartilhar experiências e aprendizados em ambientes privados ou públicos, permeados por afetos positivos como alegria e prazer, e com menos afetos negativos como raiva e tristeza, inegavelmente, proporciona bem estar. Percebe-se que as pessoas que conseguem fazer suas vidas transcorrerem a maior parte do tempo desta forma, se apoiam mais em valores pessoais e menos em valores universais (NOVO, 2003).
REFERÊNCIA
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[1] O qual estabelece que o homem possui o poder de decisão e direitos sobre sua companheira e seus filhos.
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