Artigos
O casamento civil e os regimes de bens matrimoniais
O casamento civil e os regimes de bens matrimoniais
Wallace Costa Dos Santos
Acadêmico de Direito na Universidade Paulista – UNIP, estagiário no escritório de advocacia Aires Vigo Advogados, e estudante de língua portuguesa no Kumon Institute of Education (Faria Lima - SP).
RESUMO.
O presente artigo tem como objetivo demonstrar, de maneira simples e objetiva as noções gerais sobre o casamento, como ele é conceituado pela doutrina, qual a sua natureza jurídica, o que se entende por capacidade das partes, além de estabelecer algumas considerações sobre a autorização para casar-se e a antecipação da idade núbil.
Além disso, o estudo tem por finalidade demonstrar como o casamento é celebrado, quais suas particularidades, por quem deve ser feito, e quais as documentações que são exigidas atualmente para que a sua celebração ocorra.
Também será demonstrado como funciona os regimes de bens no casamento, o que cada cônjuge tem de direito no fim da relação conjugal, os conceitos de regimes de bens, os bens que são incluídos e excluídos da comunhão, a admiração dos bens no âmbito matrimonial, bem como qual o entendimento do STJ sobre o direito a herança quando tiver ocorrido a separação judicial ou de fato por mais de dois anos.
Por fim, será tratado da participação final dos aquestos, o que cada cônjuge tem direito nesse instituto, além de como deve ser feito a divisão dos bens.
Palavras-chave: Casamento. Regimes de Bens. Doutrina. Entendimento Jurisprudencial. Código Civil.
ABSTRACT.
In a simple and objective way, this article aims to infer the general notions about the marriage institute; how it is conceptualized by the school of thought; the outsets about its legal nature; the meaning on the parties’ capability, in addition to creating some reflections on whether a marriage is legally authorized and the early-maturing to get married.
In addition, this study aims to determine how to enter into a legally marriage; its particularities, by whom the marriage should be guided, and what documents are currently required for the marriage to take place.
It is also intended to present the marriage upon property ruling; the rights of each spouse at the end of the marital relationship; the concepts about property ruling; the assets which are included and those excluded from property ruling; the assets management while the marriage lasts; as well as the STJ's understanding on the rights to inheritance in the event of legal de facto separation of the spouses or that of more than two years.
Finally, we will discuss about the partnership of acquests; to what each spouse is entitled to in that ruling; besides how the assets should be divided into that ruling.
Keywords: Marriage. Property Ruling. School of Thought. Former Court Decisions. Civil Code.
1. NOÇÕES GERAIS SOBRE O CASAMENTO.
1.1. Conceito de Casamento Civil.
O casamento civil é o negócio jurídico, solene e público, que estabelece vínculo jurídico negocial entre duas pessoas, com o fim de estabelecer comunhão plena de vida, fidelidade recíproca, mútua assistência, regular a vida sexual, bem como o cuidado da prole.
Para a Professora Maria Helena Diniz, o casamento é “o vínculo jurídico entre homem e a mulher que visa o auxílio mútuo material e espiritual, de modo que haja uma integração fisiopsíquica e a constituição de uma família”.[1]
Nesse mesmo sentido, mas com outras palavras, o saudoso doutrinador Paulo Lôbo afirma que “o casamento é um ato jurídico negocial solene, público e complexo, mediante o qual um homem e uma mulher constituem família, pela livre manifestação de vontade e pelo reconhecimento do Estado”.[2]
Embora alguns doutrinadores clássicos ensinem que o casamento é o vínculo jurídico entre “o homem e a mulher”, esse conceito aplicado ao casamento não se revela o mais adequado com o cenário atual das relações conjugais na sociedade.
Isto porque, como bem assinala Carlos Roberto Gonçalves, “o casamento, como todas as instituições sociais, varia com o tempo e os povos”.[3]
Assim, com o avanço da sociedade e a possibilidade do reconhecimento da família homoafetiva, constituída por pessoas do mesmo sexo, se requer maior extensão do conceito de casamento, como forma de não o limitar apenas ao gênero masculino e feminino.
Logo, melhor se adequa ao conceito atual de casamento as lições do saudoso doutrinador Flávio Tartuce, ao dizer que:
O casamento pode ser conceituado como a união de duas pessoas, reconhecida e regulamentada pelo Estado, formada com o objetivo de constituição de uma família e baseado em um vínculo de afeto.[4]
Por fim, em palavras mais claras e objetivas, pode-se conceituar o casamento como sendo a união celebrada de forma voluntária por duas pessoas que buscam constituir família.
1.2. Natureza Jurídica do Casamento.
Atualmente, ainda não há consenso na doutrina sobre a natureza jurídica do casamento, sendo existente 3 (três) teorias sobre a temática, veja a seguir:
A primeira, Teoria institucionalista que sustenta ter o casamento natureza jurídica de instituição, de um estado de normas, e nessa corrente há forte carga moral e religiosa, sendo defendida por alguns doutrinadores como Rubens Limongi França,[5] e Maria Helena Diniz.[6]
Por sua vez, a segunda, Teoria mista ou eclética (defendida pelos doutrinadores Eduardo de Oliveira Leite, Guilherme Calmon Nogueira da Gama e outros), diz ser o casamento uma instituição quanto ao conteúdo e um contrato especial quanto à sua formação.
Por fim, a Teoria contratualista que vem defendendo ser o casamento um contrato de natureza especial, que contém suas próprias regras de formação, e que é melhor aceita e aplicada atualmente no meio jurídico brasileiro.
1.3. Capacidade, Autorização para Menor de 18 anos e Antecipação da Idade Núbil.
Sabe-se que todo negócio jurídico contratual possui requisitos, tais como agente capaz, objeto lícito, possível, determinado ou determinável. Sendo neste diapasão a manifestação de vontade requisito indispensável. Senão veja-se:
A vontade é pressuposto básico do negócio jurídico e é imprescindível que se exteriorize. Do ponto de vista do direito, somente vontade que se exterioriza é considerada suficiente para compor suporte fático do negócio jurídico.[7]
Pois bem, a parte geral do direito civil apresenta com relação ao direito de família notas distintivas, como por exemplo, a questão da capacidade.
Isto porque, o artigo 1.517 do Código Civil, estabelece que a capacidade para se casar é atingida quando os nubentes tiverem 16 (dezesseis) anos de idade, senão leia-se o que estabelece referido dispositivo legal:
Art. 1.517. O homem e a mulher com dezesseis anos podem casar, exigindo-se autorização de ambos os pais, ou de seus representantes legais, enquanto não atingida a maioridade civil.
Parágrafo único. Se houver divergência entre os pais, aplica-se o disposto no parágrafo único do art. 1.631.
Note-se que, o presente dispositivo legal não estabelece um rol específico a respeito das pessoas capazes ou incapazes de se casar, sendo apenas necessário para o casamento que se tenha de 16 (dezesseis) anos para que o ato seja efetivado, além de se exigir a autorização de ambos os pais, ou de seus representantes legais.
Ademais, é de boa prática lembrar que quando houver justo motivo, ou seja, não for de forma injusta, os pais ou tutores podem revogar a autorização concedida, conforme prevê o artigo 1.518 e 1.519 do Código Civil:
Art. 1.518. Até a celebração do casamento podem os pais ou tutores revogar a autorização.
Art. 1.519. A denegação do consentimento, quando injusta, pode ser suprida pelo juiz.
Registre-se que, existente a capacidade para se casar, e concedida uma das autorizações, dos pais ou representantes, o casamento poderá ser celebrado. Por outro lado, se a autorização for revogada de forma injusta, poderá esta ser suprimida via judicial.
Observe-se, ademais, que na forma do artigo 6º, inciso I, da Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), a deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa, inclusive para casar-se e constituir união estável.
Noutro ponto, sobre a questão da antecipação da idade núbil, essa não é possível de ocorrer, conforme dispõe o artigo 1.520 do CC:
Art. 1.520. Não será permitido, em qualquer caso, o casamento de quem não atingiu a idade núbil, observado o disposto no art. 1.517 deste Código.
Antigamente era possível a antecipação da idade núbil, para evitar a imposição ou cumprimento de pena criminal ou em caso de gravidez, porém, com a redação nova dada pela Lei nº 13.811, de 2019, ao artigo 1.520, restou determinado a impossibilidade de antecipação da idade núbil, em qualquer caso.
1.4. Celebração do Casamento.
O casamento, sendo ato solene, deve ser celebrado em estrita obediência aos ditames legais, sob pena de, a depender das circunstâncias do caso concreto encontra-se eivado de nulidades.
Os documentos necessários para o início do processo de casamento, via de regra, são os seguintes:
- Certidão de nascimento ou documento equivalente; - Comprovante de endereço dos cônjuges; - Autorização por escrito dos pais ou responsáveis legais para os menores de 16 anos, ou ato judicial que a supra; - Declaração de duas testemunhas maiores, parentes ou não, que atestem conhecê-los e afirmem não existir impedimento que os impeçam de casar;
- Declaração do estado civil, do domicílio e da residência atual dos contraentes e de seus pais, se forem conhecidos;
- Certidão de óbito do cônjuge falecido, sentença declaratória de nulidade ou de anulação de casamento, transitada em julgado, ou do registro da sentença de divórcio ou escritura pública de divórcio consensual, se o caso. |
Além disso, para celebração do casamento, é necessário que esse seja feito por pessoa legalmente competente, devendo ser presidido pelo juiz de direito, juiz de paz, ou no âmbito do matrimônio religioso com efeitos civil, pela autoridade religiosa.
Os doutrinadores Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, ao tratar da celebração do casamento ensinam que:
O casamento será celebrado no dia, hora e lugar previamente designados pela autoridade que houver de presidir o ato, mediante petição dos contraentes, que se mostrem habilitados com a certidão de habilitação, expedida pelo Cartório de Registro Civil responsável pela publicação dos proclames (art. 1533 do CC/2002).[8]
Pois bem, no momento da celebração do casamento, no dia, hora e lugar, deverão comparecer ao ato duas testemunhas, os noivos, na sede do cartório, ou noutro edifício ou público ou particular, e o casamento será celebrado com toda publicidade, a portas abertas (art. 1.534 do CC), para que eventuais impedimentos possam ser opostos, até o momento da celebração do casamento, por qualquer pessoa capaz (art. 1.522 do CC).
Destarte, realizado todos os trâmites necessários, o presidente do ato, ouvindo a afirmação dos nubentes de que persistem no propósito de casar por livre e espontânea vontade, declarará efetuado o casamento nestes termos:
De acordo com a vontade que ambos acabais de afirmar perante mim, de vos receberdes por marido e mulher, eu, em nome da lei, vos declaro casados”. (art. 1.535 do CC).
2. REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL DE BENS.
2.1. Conceito.
Para os casamentos celebrados depois da Lei 6.515/1977 e sem a existência de pacto antenupcial (contrato prévio ao casamento, feito por escritura pública, a respeito da divisão dos bens), ou se o fizerem, for nulo ou ineficaz, o regime habitual costuma ser o de comunhão parcial de bens.
O regime de comunhão parcial de bens consiste na preservação da individualidade de bens que cada um dos cônjuges possuía antes do casamento, e na comunicação comum dos bens adquiridos em conjunto pelo casal após o casamento.
Nesse mesmo sentido, Carlos Roberto Gonçalves ensina:
O regime da comunhão parcial é o que prevalece se os consortes não fizerem pacto antenupcial, ou, se o fizerem, for nulo ou ineficaz (CC, art. 1.640, caput). Por essa razão, é chamado também de regime legal ou supletivo, como já mencionado. Caracteriza-se por estabelecer a separação quanto ao passado (bens que cada cônjuge possuía antes do casamento) e comunhão quanto ao futuro (bens adquiridos na constância do casamento), gerando três massas de bens: os do marido, os da mulher e os comuns.[9]
O regime da comunhão parcial de bens tem por fim formar um patrimônio comum entre os cônjuges, reunindo, assim, todos os bens que forem adquiridos depois da celebração do casamento.
Josué Rios, em linguagem bem simples e clara, conceitua o regime de comunhão parcial da seguinte forma:
Pelo regime de comunhão parcial de bens, um cônjuge não tem aos bens que o outro cônjuge já possuía antes de casar. Se o marido, ao casar, tinha uma motocicleta e a mulher tinha dois carros, a situação desses bens continua mesmo após o casamento.[10]
Com esse regime, somente os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento, comunicam-se, conforme dispõe o artigo 1.658 do Código Civil:
Art. 1.658. No regime de comunhão parcial, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento, com as exceções dos artigos seguintes.
Desta maneira, resta claro que os bens adquiridos antes do casamento pelos cônjuges não se misturam após o casamento, como ocorre na comunhão universal, que será objeto de estudo mais à frente.
2.2. Bens Incluídos na Comunhão Parcial.
Os bens que entram na comunhão, estão previstos no artigo 1.660 do diploma civilista, a seguir listados:
Art. 1.660. Entram na comunhão:
I - os bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que só em nome de um dos cônjuges;
II - os bens adquiridos por fato eventual, com ou sem o concurso de trabalho ou despesa anterior;
III - os bens adquiridos por doação, herança ou legado, em favor de ambos os cônjuges;
IV - as benfeitorias em bens particulares de cada cônjuge;
V - os frutos dos bens comuns, ou dos particulares de cada cônjuge, percebidos na constância do casamento, ou pendentes ao tempo de cessar a comunhão.
2.3. Bens Excluídos da Comunhão Parcial.
Os bens excluídos da comunhão parcial estão previstos no artigo 1.569 e 1.661 do Código Civil, e são os seguintes:
Art. 1.659. Excluem-se da comunhão:
I - os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na constância do casamento, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar;
II - os bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em sub-rogação dos bens particulares;
III - as obrigações anteriores ao casamento;
IV - as obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo reversão em proveito do casal;
V - os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão;
VI - os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge;
VII - as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes.
[...]
Art. 1.661. São incomunicáveis os bens cuja aquisição tiver por título uma causa anterior ao casamento.
2.4. Administração dos Bens na Comunhão Parcial.
Quando a administração dos bens na comunhão parcial, compete a qualquer cônjuge, por incidência do princípio da isonomia, a administração do patrimônio em comum (artigo 1.663 do CC).
A luz do §1º do dispositivo legal acima referenciado, as dívidas contraídas no exercício da administração obrigam os bens comuns e particulares do cônjuge que os administra, e do outro cônjuge na razão do proveito que houver auferido.
Por fim, convém lembrar que, nos termos do §2º do mesmo dispositivo, a anuência de ambos os cônjuges é necessária para os atos, a título gratuito, que impliquem cessão do uso ou gozo dos bens comuns.
3. COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS.
3.1. Conceito e Entendimento do STJ sobre Direito à Herança na Comunhão Universal de Bens.
Pelo regime de comunhão universal de bens, se abarca todos os bens presentes e futuros dos cônjuges e suas dívidas, é a típica fusão do patrimônio dos cônjuges.
Para Flávio Tartuce, a “regra básica do regime: comunicam-se tanto os bens anteriores, presentes e posteriores à celebração do casamento, ou seja, há uma comunicação plena nos aquestos, o que inclui as dívidas passivas de ambos (art. 1.667 do CC).[11]
Neste mesmo diapasão, o artigo 1.667 do Código Civil disciplina:
Art. 1.667. O regime de comunhão universal importa a comunicação de todos os bens presentes e futuros dos cônjuges e suas dívidas passivas, com as exceções do artigo seguinte.
Leia-se, objetivamente, que pelo regime de comunhão universal se faz a unificação dos bens e dívidas dos cônjuges.
Entretanto, quando do falecimento de um dos cônjuges, é necessário para o reconhecimento ao direito de herança pelo cônjuge sobrevivente que estes não estejam separados judicialmente, ou que tenha se separado de fato por mais de 02 (dois) anos, é o que disciplina o artigo 1.830 do CC, confira-se:
Art. 1.830. Somente é reconhecido direito sucessório ao cônjuge sobrevivente se, ao tempo da morte do outro, não estavam separados judicialmente, nem separados de fato há mais de dois anos, salvo prova, neste caso, de que essa convivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente.
A exceção à regra de que não há direito sucessório do cônjuge sobrevivente separado judicialmente ou de fato há mais de dois anos, é se ele provar que a convivência se tornara impossível sem sua culpa.
Nessa linha, convém salientar que a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça reformou a decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que havia admitido a inclusão da esposa de um dos herdeiros no inventário do irmão dele, falecido, pois o casal estava separado de fato.
Para o relator do caso, ministro Luis Felipe Salomão, em regime de comunhão universal de bens, a comunicação destes, assim como as de dívidas, deve cessar com o término da vida em comum. Senão veja-se a ementa do julgado:
DIREITO CIVIL. FAMÍLIA. SUCESSÃO. COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS. INCLUSÃO DA ESPOSA DE HERDEIRO, NOS AUTOS DE INVENTÁRIO, NA DEFESADE SUA MEAÇÃO. SUCESSÃO ABERTA QUANDO HAVIA SEPARAÇÃO DE FATO. IMPOSSIBILIDADE DE COMUNICAÇÃO DOS BENS ADQUIRIDOS APÓS A RUPTURA DA VIDA CONJUGAL. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Em regra, o recurso especial originário de decisão interlocutória em inventário não pode ficar retido nos autos, uma vez que procedimento se encerra sem que haja, propriamente, decisão final de mérito, o que impossibilitaria a reiteração futura das razões recursais. 2. Não faz jus à meação dos bens havidos pelo marido na qualidade de herdeiro do irmão, o cônjuge que encontrava-se separado de fato quando transmitida a herança. 3. Tal fato ocasionaria enriquecimento sem causa, porquanto o patrimônio foi adquirido individualmente, sem qualquer colaboração do cônjuge. 4. A preservação do condomínio patrimonial entre cônjuges após a separação de fato é incompatível com orientação do novo Código Civil, que reconhece a união estável estabelecida nesse período, regulada pelo regime da comunhão parcial de bens (CC 1.725) 5. Assim, em regime de comunhão universal, a comunicação de bens e dívidas deve cessar com a ruptura da vida comum, respeitado o direito de meação do patrimônio adquirido na constância da vida conjugal. 6. Recurso especial provido.[12]
Assim, o entendimento jurisprudencial é no sentido de que apesar de o casamento ter sido celebrado sob a comunhão universal, com a separação de fato há mais de dois anos não tem direito à herança o cônjuge sobrevivente.
Ademais, no que se refere a comunicabilidade dos bens no regime de comunhão universal de bens, pode-se dizer que essa comunicação não é absoluta, por determinação legal, conforme se nota a seguir:
3.2. Bens Excluídos da Comunhão Universal.
Conforme dito alhures, existe determinados bens que a própria lei cuidou de excluir da comunhão.
O artigo 1.668 do Código Civil indica tais bens:
Art. 1.668. São excluídos da comunhão:
I - os bens doados ou herdados com a cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar;
II - os bens gravados de fideicomisso e o direito do herdeiro fideicomissário, antes de realizada a condição suspensiva;
III - as dívidas anteriores ao casamento, salvo se provierem de despesas com seus aprestos, ou reverterem em proveito comum;
IV - as doações antenupciais feitas por um dos cônjuges ao outro com a cláusula de incomunicabilidade;
V - Os bens referidos nos incisos V a VII do art. 1.659.
3.3. Administração dos Bens na Comunhão Universal.
No que se refere a administração dos bens na comunhão universal, aplica-se ao regime da comunhão universal o disposto no Capítulo antecedente (Art. 1.670 do Código Civil), que é dedicado ao regime de comunhão parcial de bens.
3.4. Extinção da Comunhão Universal.
A extinção da comunhão universal de bens é prevista no artigo 1.671 do Código Civil, que prevê uma regra muito clara: com a separação, cada cônjuge é responsável pelas suas próprias obrigações.
Nessa mesma linha, veja-se o que dispõe o referido dispositivo legal:
Art. 1.671. Extinta a comunhão, e efetuada a divisão do ativo e do passivo, cessará a responsabilidade de cada um dos cônjuges para com os credores do outro.
Portando, sendo extinta a comunhão pela dissolução do casamento e efetuada a divisão do ativo e do passivo entre as partes, cessará a responsabilidade de cada um para os credores do outro, porém sobrevindo eventual dívida após o fim da união, e cuja origem seja do período da vida em comunhão, haverá responsabilidade de ambos os cônjuges pelo seu cumprimento.
4. SEPARAÇÃO DE BENS.
4.1. Conceito.
O regime de separação de bens é a mais clara e irrestrita demonstração de manifestação de vontade das partes, por esse regime não se misturam nenhum dos bens dos nubentes.
Esse regime, porém, possui 2 (duas) modalidades, convencional (origem em pacto antenupcial) ou legal ou obrigatório, conforme disciplina o art. 1.641 do Código Civil.
Na separação convencional de bens, os próprios cônjuges optam, mediante convenção matrimonial, que os bens de um não se misturem com o do outro, mesmo depois da separação, porém, na proporção de seus rendimentos, ambos concorram para o sustento do lar, salvo se deixarem estipulação em contrário no pacto antenupcial (art. 1.688 do Código Civil).
Por outro lado, no regime legal ou obrigatório, os cônjuges ficam restritos ao que a Lei determina, e a separação se torna obrigatória em três hipóteses específicas, quais sejam: a) quando o casamento for celebrado com maior de 70 anos de idade; b) quando o casamento decorrer de supressão judicial de autorização para casar em favor de pessoa relativamente incapaz, e por fim, c) quando o casamento não observar as causas suspensivas.
Registre-se, por oportuno, que na separação legal ou obrigatória de bens não deve haver comunicação entre os bens dos cônjuges, passados ou futuros, mas em situações excepcionais é até possível que o bem adquirido nesse regime por esforço comum do casal seja rateado.
Nessa linha de pensamento, o STF editou a Súmula 377, dispondo que “No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento”.
A excepcionalidade atribuída pelo STF ao regime de separação legal de bens não despreza a autonomia da vontade das partes, mas sim, estabelece limites quando o bem foi adquirido por esforço comum do casal, o que se torna um condomínio voluntário, e para que não haja enriquecimento sem causa por qualquer deles.[13]
4.2. Administração dos Bens na Separação.
A administração dos bens no regime de separação compete a cada um dos cônjuges, exclusivamente, cabendo a cada um alienar ou gravar de ônus real o seu bem imóvel (art. 1.687 e 1.647, do Código Civil), sem autorização do outro.
Com efeito, apesar de a administração dos bens competir a cada um dos cônjuges, as despesas que forem contraídas e revertida em favor do casal, via de regra, deverão ser assumidas por ambos, essa é a disposição contida no artigo 1.688 do Código Civil.
5. PARTICIPAÇÃO FINAL DOS AQUESTOS
Sobre a participação final dos aquestos, dispõe o artigo 1.672, do Código Civil, in verbis:
Art. 1.672. No regime de participação final nos aqüestos, cada cônjuge possui patrimônio próprio, consoante disposto no artigo seguinte, e lhe cabe, à época da dissolução da sociedade conjugal, direito à metade dos bens adquiridos pelo casal, a título oneroso, na constância do casamento.
Na participação final dos aquestos, cada cônjuge possui seu próprio patrimônio, e lhe caberá à época da dissolução do casamento o direto à metade dos bens que foram adquiridos pelo casal, em conjunto, a título oneroso, e na constância do casamento.
A participação se perfaz sobre o patrimônio adquirido pelo casal na constância do casamento, de maneira contábil, e não sobre direito de um sobre o acervo patrimonial do outro.
6. CONCLUSÃO
Conforme apresentado no presente artigo, é por meio do casamento que se inicia o vínculo conjugal, e posteriormente a família.
O casamento é a união entre duas pessoas, do mesmo sexo ou não, posto que se admite o reconhecimento da união homoafetiva como modelo de família no atual cenário jurídico vigente no Brasil.
Ademais, na celebração do casamento, após verificada toda a documentação e iniciado seu regular processo, passa-se as formalidades solenes, como por exemplo, os regimes de bens que serão adotados, se a noiva ou o noivo manterão o nome de solteiro ou não.
Os regimes de comunhão de bens, diga-se de passagem, tem grande relevância no âmbito matrimonial, uma vez que esses institutos impactam diretamente no patrimônio dos cônjuges.
Portanto, entende-se que o casamento é um dos negócios jurídicos mais solenes até então vigente no ordenamento jurídico, e suas peculiaridades, formas, e previsão legal, devem ser respeitadas, com o fim de evitar sua anulação, ou qualquer ato que venha colocar fim a família, ente este protegido constitucionalmente pelo Estado.
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro – Direito de Família, 22. ed. São Paulo, editora Saraiva, 2007, p. 35.
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro. Direito de Família. São Paulo, editora Saraiva, 2005. v. 5, p. 44.
FRANÇA, Rubens Limongi. Instituições de Direito Civil. 4. ed. São Paulo, editora Saraiva, 1996. p. 225.
GAGLIANO, Pablo Stolze. PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Manual de direito civil, volume único, 2 ed., São Paulo, editora Saraiva, p.1119.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 6 : direito de família, 9. ed. São Paulo, editora Saraiva, 2012, p. 39, e-book.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume 1, parte geral, editora Saraiva, 2003, p.306.
LÔBO, Paulo Luiz Netto. Direito Civil – Famílias, São Paulo, editora Saraiva, 2008, p.76.
RIOS, Josué Oliveira. Guia dos seus direitos, 3 ed. São Paulo, editora Globo, 1998, p. 177.
STJ. Recurso Especial nº 555.771 – SP, Min. Rel. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, j. 05/05/2009.
TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. 5. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro, editora Forense; São Paulo: MÉTODO, 2015, p. 878, e-book.
VADE MECUM JUSPODIVM, 5 ed. revista, ampl. e atual. 2019.
[1] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro – Direito de Família, 22. ed. São Paulo, editora Saraiva, 2007, p. 35.
[2] LÔBO, Paulo Luiz Netto. Direito Civil – Famílias, São Paulo, editora Saraiva, 2008, p.76.
[3] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 6 : direito de família, 9. ed. São Paulo, editora Saraiva, 2012, p. 39, e-book.
[4] TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. 5. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro, editora Forense; São Paulo: MÉTODO, 2015, p. 878, e-book.
[5] FRANÇA, Rubens Limongi. Instituições de Direito Civil. 4. ed. São Paulo, editora Saraiva, 1996. p. 225.
[6] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro. Direito de Família. São Paulo, editora Saraiva, 2005. v. 5, p. 44.
[7] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume 1, parte geral, editora Saraiva, 2003, p.306.
[8] GAGLIANO, Pablo Stolze. PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Manual de direito civil, volume único, 2 ed., São Paulo, editora Saraiva, p.1119.
[9] GONÇALVES, Carlos Roberto. ob. cit. p. 404.
[10] RIOS, Josué Oliveira. Guia dos seus direitos, 3 ed. São Paulo, editora Globo, 1998, p. 177.
[11] TARTUCE, Flávio. ob. cit. p. 918.
[12] STJ. Recurso Especial nº 555.771 – SP, Min. Rel. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, j. 05/05/2009.
[13] Nesse sentido, Paulo Lôbo (LÔBO, Paulo Luiz, ob. cit. p. 332) ensina que “Malgrado sua natureza, tem-se compatível com o regime de separação a eventualidade de condomínio dos cônjuges sobre determinados bens, que tenham sido adquiridos com a participação efetiva de ambos, nos limites e proporção correspondentes, ou em decorrência de doações ou legados conjuntos”.
Os artigos assinados aqui publicados são inteiramente de responsabilidade de seus autores e não expressam posicionamento institucional do IBDFAM