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Nos tempos de álcool gel, amores líquidos: Questões atuais de Direito das Famílias na pandemia da COVID-19
Nos tempos de álcool gel, amores líquidos: Questões atuais de Direito das Famílias na pandemia da COVID-19
Os problemas e as questões familiares que envolvem o Direito das Famílias se afloraram em tempos do COVID-19. O stress que os pais e mães estão passando com seus filhos em quarentena, no ensino à distância, é uma das muitas questões complexas nas relações familiares, como o pagamento de alimentos, visita ou convivência de filhos de pais separados, prisão por falta de pagamento de alimentos, utilização do plano de saúde nos casos da COVID-19, comunicação dos filhos, aumento da violência familiar e pedido de divórcio, dentre muitas outras demandas. A jurisprudência nacional já está elucidando algumas dessas questões. A prisão civil por falta de pagamento de alimentos, de acordo com habeas corpus coletivo 568.898/SP, decidido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) em 07/04/2020, suspendeu o efeito das decisões que determinou ou que estavam em vias de determinar a prisão civil pelo devedor de alimentos, transformando a prisão comum em prisão domiciliar. Sem dúvidas é melhor ter um pai ou uma mãe devedora de alimentos, a ter um pai ou uma mãe mortos pelo COVID-19, já que as condições carcerárias no Brasil são notoriamente insalubres e de superlotação. Em recente julgado da cidade de Jacareí/SP, decidiu-se pela redução da pensão alimentícia nos meses de março a junho de 2020 de 30% do salário da mãe para 30% do salário mínimo, já que ela está em isolamento, sendo impactada sobremaneira na sua atividade empresária. A Resolução Normativa 453 da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), decidiu que as operadoras de saúde estão obrigadas a realizar os exames para a COVID-19, desde que com expressa recomendação médica e realização em estabelecimentos conveniados. A convivência ou visita dos pais aos seus filhos, deverá ser feita remotamente, através de telefone, aplicativos ou plataformas de reuniões, cumprindo com o que determina a Constituição Federal, no art. 227, caput, pelo princípio do melhor interesse das crianças e dos adolescentes, bem como o Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu art.1º., quando trata da proteção integral. Da mesma forma, os arts.1.584 §2º. e 1.586 caput do Código Civil, tem a mesma aplicação, pois houve efetiva mudança fática e ocorrência de motivos graves que ocasionam tal suspensão da convivência ou das visitas. Houve ainda um aumento no número de casos de violência doméstica ocasionados pela convivência intensiva e obrigatória da quarentena. Nada justifica a violência e o desamor, devendo as vítimas de violência sererm encaminhadas a Delegacia da Mulher, com o pedido de afastamento do agressor. A intensidade das informações e das ocorrências de novos casos do COVID-19, acabam com a estabilidade tão desejada na sociedade atual, ocasionando nos términos dos casamentos e uniões. Como bem escrito pelo filósofo contemporâneo Bauman, na quarentena do uso intenso de “álcool gel”, muitos amores são frágeis, fulgazes e “líquidos”.
Patricia Gorisch - Pós Doutora, Doutora e Mestre em Direito. Advogada. Diretora Nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família. Professora da Universisdade Santa Cecília – Unisanta.
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