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Porque falar de mediação de conflitos em tempos de Covid-19?
Porque falar de mediação de conflitos em tempos de Covid-19?
Maíra Lopes de Castro
Professora, Mediadora e Advogada
Presidente da Comissão de Mediação do IBDFAM/MA
Sócia da Mediação LFG São Luís/MA
Mestre em Direito pela UFMA
e-mail: maira.lopes.castro@hotmail.com
RESUMO
O presente artigo tem por objetivo debater os efeitos da pandemia gerada pelo Covid-19, em solo brasileiro, sobretudo no que tange aos métodos adequados de resolução de conflitos. A partir do questionamento do modelo vigente de polarização e adjudicação de demandas, inaugura-se a reflexão sobre a importância e relevância da utilização da mediação de conflitos em cenários de crise. Para instrumentalização da pesquisa, optou-se por estudo bibliográfico.
Palavras-chave: Pandemia. Covid-19. Mediação.
RESUME
This article aims to discuss the effects of the pandemic generated by Covid-19, on Brazilian soil, especially with regard to the appropriate methods of conflict resolution. From the questioning of the current model of polarization and adjudication of demands, the reflection on the importance and relevance of the use of conflict mediation in crisis scenarios opens. To instrumentalize the research, a bibliographic study was chosen.
Keywords: Pandemic. Covid-19. Mediation.
Desde de que fora noticiado a primeira vez, no final do ano passado (2019), na cidade de Wuhan, na China, o corona vírus, ou, conforme nomenclatura oficial da Organização Mundial de Saúde (OMS), o Covid-19, vem fazendo vítimas, que apresentam diversos sintomas, desde de febre e dificuldades respiratórias, até síndromes respiratórias agudas e insuficiência renal.[1]
Vivencia-se, portanto, uma pandemia que tem atingido diversos países, em intensidades diversas. O Brasil não ficou imune, e até a data de hoje (16 de abril de 2020) foram contabilizados pelo Ministério da Saúde 30.425 casos confirmados de novo coronavírus (Sars-Cov-2) no país e 1.924 mortes.[2]
Não precisamos fazer um grande esforço para ver os impactos sociais e econômicos decorrentes da crise sanitária motivada pelo Covid-19. Mas, para fins ilustrativos, vamos citar os casos de quebras e revisões contratuais, paralisação de atividades em razão da adoção do regime preventivo de quarentena, superlotação de hospitais e clínicas públicas e particulares, dentre vários outros espectros da pandemia.
Tem sido um grande desafio para micro e pequeno empreendedores gerenciar a quantidade de reclamações, e pedidos de cancelamentos dos serviços contratados. Além da observância do período de quarentena, que tem levado muitos estabelecimentos a optar pelo não funcionamento das suas unidades físicas. Aqui está um efeito nefasto da pandemia que poderá gerar a falência de muitas empresas: a falta de ferramentas adequadas para a gestão desses conflitos.
Não custa rememorar que esse conflito que nasce embrionariamente aqui, provavelmente vai ser gestado no Poder Judiciário, somando-se aos 78,7 milhões de processos que lá já estão em tramitação[3].
Ademais, conforme dados do Conselho Nacional de Justiça, “mesmo que não houvesse ingresso de novas demandas e fosse mantida a produtividade dos magistrados e dos servidores, seriam necessários aproximadamente 2 anos e 6 meses de trabalho para zerar o estoque” [4], o que per si já demonstra a dificuldade que o Poder Judiciário terá em ofertar respostas céleres as demandas decorrentes da pandemia do Covid-19.
É por isso que precisamos pensar em formas menos traumáticas de gerir esses conflitos.
Luis Alberto Warat já enunciava em suas obras que a sensibilidade é um dos grandes temas do Direito na virada do milênio, nesse sentido, é necessário ultrapassar a noção cínica do paradigma jurídico moderno, que se apoia em um “individualismo possessivo e ignorante do outro”.[5]
A mediação propõe ao Direito portanto, “uma concepção do mesmo que seja eticamente comprometida com outro e com a vida”.[6]Nos parece então que não há momento mais oportuno para vivenciar essa transformação do que o momento de crise humanitária no qual nos encontramos.
Façamos então da crise uma oportunidade.
Afinal, esse poder de ressignificar os conflitos é algo inerente a mediação.
A mediação “consiste no meio consensual de abordagem de controvérsias em que um terceiro imparcial atua para facilitar a comunicação entre os envolvidos e propiciar que eles possam, a partir da percepção ampliada dos meandros da situação controvertida, protagonizar saídas produtivas”.[7]
Alcance-se, portanto, por meio da mediação, o aspecto humano do conflito. Sabe-se que grande parte das conflitivas decorrentes do Covid-19, tem por motivação um fator que foge da previsibilidade das partes, e que, por isso, gera impasse no momento de atribuição de responsabilidades.
Em situações de crise, o Direito não pode ser lido sem o compromisso com o outro. É necessário escuta ativa, identificação de interesses, exercício da empatia, e sobretudo criatividade na geração de opções, benefícios esses encontrados na mediação enquanto ferramenta de gestão de conflitos.
Para micro e pequenos empreendedores, o investimento nesses métodos autocompositivos apresenta-se como uma opção de fácil acesso, baixo custo, e sobretudo célere e adequada. Adotar posturas colaborativas, que visem a resolutividade das demandas, é também reflexo do respeito a responsabilidade social da empresa.
Nesse sentir, visando diminuir os impactos já assombrosos da pandemia do Covid-19, propõe-se a utilização da mediação, bem como dos demais meios adequados de resolução dos conflitos, para abordagem desses resíduos conflitivos.
REFERÊNCIAS
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Justiça em Números 2019. Brasília: CNJ, 2019.
TARTUCE, Fernanda. Mediação nos conflitos cíveis. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2016.
WARAT, Luís Alberto. O ofício do mediador. Florianópolis: Habitus, 2001.
[1] Informações noticiadas no site: https://g1.globo.com/bemestar/coronavirus/noticia/2020/02/27/qual-e-a-origem-do-novo-coronavirus.ghtml
[2] Dados obtidos no Instagram oficial do Ministério da Saúde (@minsaude), acesso pelo link: https://www.instagram.com/p/B_DlM07AQm7/?utm_source=ig_web_copy_link
[3] CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Justiça em Números 2019. Brasília: CNJ, 2019.
[4] CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Justiça em Números 2019. Brasília: CNJ, 2019.p.80.
[5] WARAT, Luis Alberto. O ofício do mediador. Florianópolis: Habitus, 2001.p.66
[6] WARAT, Luis Alberto. O ofício do mediador. Florianópolis: Habitus, 2001.p.72.
[7] TARTUCE, Fernanda. Mediação nos conflitos cíveis. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2016.p.176.
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