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Construção do instituto da usucapião familiar: Questões controversas
Construção do instituto da usucapião familiar:
Questões controversas
Trabajo presentado como uno de los prerrequisitos para la evaluación del aprendizaje en la disciplina "Derechos Reales" ministrada por el Prof. Dr. Carlos Mario Clerc en enero de 2019 en el Doctorado en Derecho Civil de la Universidad de Buenos Aires. Elaborado pelos alunos do curso: EDSON OLIVEIRA DA SILVA; GHISLAINE ALVES BARBOSA; GISLENE CREMASCHI LIMA; MARILANE LOPES RIBEIRO
RESUMO
Com a evolução da sociedade alguns direitos são positivados e outros revogados para atender as novas demandas sociais. Dentro desta perspectiva suscitou-se a seguinte problemática: Quais as questões controversas que envolvem a construção do instituto da usucapião familiar? Para entender as questões controvertidas que submergem deste processo de atualização jurídica foi procedido o levantamento histórico da posse e da propriedade, tal como dos seus conceitos, finalidades e requisitos, chega-se ao direito da “Usucapião”, também com sua devida análise quanto ao seu modo de aquisição, se alcança, com isso, o instituto da “Usucapião Familiar”, também chamada de “Usucapião por abandono de lar”, ou ainda “Usucapião Pró-Família”, o qual surgiu para tutelar um direito há muito tempo negligenciado. Neste contexto, este artigo tem como objetivo demonstrar a construção deste instituto e as questões controversas que o permeiam, através da apresentação da evolução histórica, dos conceitos doutrinários, das especificidades normativas, disposta no Código Civil brasileiro em seu artigo 1.240-A, instituído pela Lei nº 12.424/2011 e pode servir para fomentar a criação deste instituto em outros ordenamentos jurídicos da América Latina, onde ainda não se tem previsão legal para o instituto da “Usucapião familiar”, a exemplo, Argentina e Chile. Para abordar as questões controversas, além da exibição dos dispositivos legais o presente estudo realiza uma breve abordagem doutrinária e jurisprudencial acerca da construção do aludido instituto visando refletir sobre as divergências na tutela do direito fundamental social “a moradia”, amparando o direito daquele que sofre o abandono do lar. A pesquisa recorre a dados qualitativos submetendo-os a análise de conteúdo para abordar o tema proposto. Por fim, pretende-se traçar um panorama geral das questões controversas que envolvem a “Usucapião familiar”.
Palavras-chave: Direitos Reais. Usucapião. Direito de Família. Abandono do Lar.
RESUMEN
Con la evolución de la sociedad algunos derechos son positivados y otros revocados para atender las nuevas demandas sociales. Dentro de esta perspectiva se planteó la siguiente problemática: ¿Cuáles son las cuestiones controvertidas que involucran la construcción del instituto de la usucapión familiar? Para entender las cuestiones controvertidas que se suman a este proceso de actualización jurídica se procedió al levantamiento histórico de la posesión y de la propiedad, tal como de sus conceptos, finalidades y requisitos, se llega al derecho de la "Usucapión", también con su debida análisis en cuanto al fondo, su método de adquisición, se alcanza, con ello, el instituto de la "Usucapión Familiar", también llamada "Usucapión por abandono de hogar", o aún "Usucapión Pro-Familia", el cual surgió para tutelar un derecho largamente descuidado . En este contexto, este artículo tiene como objetivo demostrar la construcción de este instituto y las cuestiones controvertidas que le permean, a través de la presentación de la evolución histórica, de los conceptos doctrinarios, de las especificidades normativas, dispuesta en el Código Civil brasileño en su artículo 1.240-A, instituido por la Comisión La Ley nº 12.424 / 2011 y puede servir para fomentar la creación de este instituto en otros ordenamientos jurídicos de América Latina, donde aún no se tiene previsión legal para el instituto de la Ushuaia familiar, a ejemplo, Argentina y Chile. Para abordar las cuestiones controvertidas, además de la exhibición de los dispositivos legales, el presente estudio realiza un breve abordaje doctrinal y jurisprudencial acerca de la construcción del aludido instituto para reflexionar sobre las divergencias en la tutela del derecho fundamental social "la vivienda", amparando el derecho del que sufre el abandono del hogar. La investigación recurre a datos cualitativos sometiéndolos al análisis de contenido para abordar el tema propuesto. Por último, se pretende trazar un panorama general de las cuestiones controvertidas que involucran a la "Usucapión familiar".
Palabras clave: Derechos Reales. Usucapión. Derecho de Familia. Abandono del Hogar.
A CONSTRUÇÃO DO INSTITUTO DA USUCAPIÃO FAMILIAR:
QUESTÕES CONTROVERSAS
1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho aborda a construção do instituto da usucapião familiar. Antes de adentrar no tema estudado faz-se necessário contextualizar a temática e esclarecer alguns conceitos necessários ao presente estudo. A usucapião é uma forma de aquisição originária da propriedade móvel ou imóvel. Originária porque, segundo Tartuce (2018), não há relação jurídica entre o usucapiente e o antecessor, isto é, não existe entre eles relação qualquer que transmita a propriedade de um para o outro, onerosamente ou não, tornando assim o usucapiente proprietário em face da posse efetivada. No entanto, para a sua aquisição é necessário que estejam presentes requisitos legais, como por exemplo: a posse, o tempo, bem como o justo título e a boa-fé.
O mencionado instituto também é chamado de prescrição aquisitiva, como comumente é denominado no ordenamento jurídico argentino e chileno, já que, a prescrição está ligada ao lapso temporal em que o proprietário perde o direito a sua propriedade ao mesmo tempo em que o usucapiente adquire o direito a esta propriedade por ele usucapido. Vale ressaltar que, apesar de haver divergência doutrinária quanto a este instituto, o elemento “tempo” é o principal requisito, como será apresentado ao longo deste artigo.
O elemento tempo é um dos principais critérios diferenciadores das modalidades de usucapião, que se classifica conforme o Código Civil Brasileiro de 2002 em: Usucapião Extraordinária, disposta no artigo 1.238; a Usucapião Ordinária, encontrada no artigo 1.242 e; a Usucapião Especial Urbana, que encontra respaldo nos artigos 1.240. Além disto, destaca-se o art. 183, §§ 1º ao 3º da Constituição brasileira de 1988 que engloba a mais nova modalidade da usucapião trazida pela Lei nº 12.424/2011, denominada de “Usucapião Familiar”, ou “Usucapião por Abandono do Lar”, a qual, com os mesmos requisitos da usucapião especial urbana, acrescem a estes o fato do instituto tutelar o direito daquele que foi “abandonado” pelo ex-cônjuge ou ex-companheiro e utiliza o lar como sua única moradia ou da sua família (BRASIL, 2011).
É importante salientar que essa nova modalidade de usucapião carrega consigo divergências entre os doutrinadores e aplicadores do direito, uma vez que a maioria afirma a total inconstitucionalidade desde dispositivo, afirmando que para esta modalidade de aquisição faz-se necessário demonstrar no âmbito do Direito Civil a existência do elemento “culpa” pelo abandono, tendo este já sido superado no âmbito jurídico pela Emenda Constitucional nº 66/2010, a qual revogou o artigo 1.573 do CC/2002 que abrigava este elemento, com fundamento de que não cabe ao judiciário trazer à discussão, por ora apenas material, a vida íntima daquele que possui a culpa ou não, ferindo assim o princípio da vedação ao retrocesso (BRASIL, 2011).
Como se verifica este estudo é de grande importância para que se identifiquem as principais questões controvertidas que envolvem a Usucapião Familiar. A presente investigação pretende responder a seguinte problemática de pesquisa: Quais as questões controversas que envolvem a construção do instituto da usucapião familiar?
Para tanto se demonstrará no primeiro tópico, a construção do instituto da usucapião familiar focalizando a evolução histórica e os princípios que regem o referido instituto e as relações familiares. Dentro deste contexto, segue-se com a abordagem normativa, doutrinária e jurisprudencial, no que concernem as variadas divergências que englobam a temática estudada.
Ter-se-á por objetivo principal demonstrar a construção deste instituto e as questões controversas que o permeiam, através da apresentação da evolução histórica, dos conceitos doutrinários, das especificidades normativas, disposta no Código Civil em seu artigo 1.240-A, instituído pela Lei nº 12.424/2011. Com isso, pretende-se mostrar que a modalidade de usucapião familiar se encontra respaldada no ordenamento jurídico, bem como nos princípios que regem “os Direitos Reais e o Direito de Família” (BRASIL, 2011).
Com o respaldo deste arcabouço principiológico pode-se dizer que o instituto da usucapião familiar poderá ser usado de maneira efetiva pelo judiciário, desde que respeitados todos os seus requisitos e legitimados. E com isso não haveria inconstitucionalidade na usucapião por abandono do lar. Este dado será analisado a partir da abordagem jurisprudencial que será realizada ao longo desta pesquisa.
O método de abordagem utilizado para construção deste artigo é o dedutivo e a pesquisa terá caráter exploratório. A temática será desenvolvida utilizando-se a técnica de documentação indireta, realizada a partir da pesquisa bibliográfica.
Por fim, pretende-se traçar um panorama geral das questões controversas que envolvem o instituto da usucapião familiar. Com isso, traça-se como deve se dar sua aplicação, quem possui legitimidade para adquiri-la e, em especial, as divergências normativas, doutrinárias e jurisprudenciais no que tange a constitucionalidade do aludido instituto.
2. CONSTRUÇÃO DO INSTITUTO DA USUCAPIÃO FAMILIAR
Para abordar a construção do instituto da usucapião familiar é imprescindível tratar da posse e da propriedade que contidos no estudo dos “Direitos Reais”.
A Usucapião visa garantir a estabilidade e segurança da propriedade, englobando a função social da posse e da propriedade, que tange as exigências fundamentais de desenvolvimento das cidades, conforme dispõe o artigo 182 da Constituição Federal de 1988.
O conceito de posse pode ser identificado nos artigos 1.196, 1.198, e 1.208 do Código Civil brasileiro. Em suma a posse seria a exteriorização do animus de dono. Existem diversas classificações de posse, no presente estudo, por exemplo, quanto ao tempo, a posse pode ser nova ou velha e, quanto aos efeitos, a posse pode ser ad interdicta ou posse ad usucapionem (BRASIL, 2003).
Segundo Gonçalves (2017), a usucapião representa uma forma de tornar possível do ponto de vista jurídico o reconhecimento de perecimento do direito à propriedade pela não utilização e ou descaso de seus titulares. Desta forma, podendo promover a troca de propriedade legal do bem. A usucapião possui várias modalidades, tendo, cada uma delas, requisitos peculiares à sua espécie. Dentre as modalidades de usucapião, a presente investigação focalizará o instituto da usucapião familiar que surgiu com o estudo da separação judicial, previsto no artigo 1.571, inciso III do atual Código Civil, onde traz uma espécie dentro de seus moldes, qual seja a separação judicial a pedido de um dos cônjuges.
Neste contexto, a separação judicial a pedido de um dos cônjuges bem como o rol de suas espécies: adultério, injúria grave e sevícia, imputação caluniosa, abandono material e moral dos filhos e o abandono voluntário do lar conjugal, sendo este último o objeto de análise acerca da sua inconstitucionalidade, sendo está uma das principais questões controversas que envolvem a construção do instituto da usucapião familiar.
Na concepção de Mario (2017), a separação judicial por abandono voluntário do lar conjugal faz jus ao direito de não permanecer com um vínculo conjugal quando o outro abandona o lar, de maneira voluntária, sem o consentimento do seu cônjuge, com a intenção de não mais retornar e passado o prazo mínimo de um ano. Descartando, claro, uma impossibilidade física ou mesmo moral que o obrigue a abandonar o lar. Diante dessa situação, do abandono voluntário do lar, foi que surgiu o instituto da “Usucapião Familiar”. Esse instituto surgiu para assegurar um direito, há muito negligenciado pelo Poder Judiciário, daquele que permaneceu no lar com sua família e que passou a ser fonte de subsistência deste lar. Portanto, a respeito da usucapião, buscando corroborar a todos que fazem parte do mundo jurídico que, de fato, esse novo instituto servirá como parâmetro para aquisição do imóvel àqueles que não podiam contar com nenhuma lei que os resguardasse, uma vez que este imóvel é seu único lar e de sua família.
Para Gonçalves (2017) essa modalidade abrange todas as espécies de famílias ou entidades familiares, inclusive as homoafetivas, pressupondo que o imóvel seja bem comum do casal, atingindo cônjuges e companheiros. Outra aplicação da modalidade de usucapião descrita é o afastamento da culpa, para que não haja influência sobre um ou outro cônjuge que, porventura, seja atingido pela culpa, característica esta já superada na discussão de dissoluções matrimoniais ou de união estável do judiciário, uma vez que não cabe ao juiz decidir de quem veio à culpa pela dissolução da relação conjugal, dificultar ou penalizar o que não tem mais interesse em permanecer com a relação.
Portanto, para a caracterização do instituto da usucapião familiar o abandono deve se dá de forma voluntária, incluindo neste sentido a ausência de subsistência da família por parte do cônjuge que deixou o lar, fazendo com que aquele que ficou no imóvel seja o único provedor da família. Para entender a construção da usucapião especial urbana por abandono de lar faz-se necessário recorrer às características basilares e a abordagem normativa do tema.
3. CARACTERISTICAS BASILARES E ABORDAGEM NORMATIVA
Ao se falar de conceito, e antes de adentrarmos no tema espécie usucapião familiar, tem-se como necessário discorrer sobre a Usucapião. Destaca-se a peculiaridade, não menos importante, da utilização correta do vocabulário que é do gênero feminino, apesar de alguns doutrinadores se referirem como sendo masculino. O Código Civil Brasileiro, no Art. 1260, Capítulo III, trata – Da Usucapião -, bem como a Lei 6.969/1981, não sendo diferente no Código Civil e Comercial Argentino que cuida do tema no Art.1897 e seguintes e se refere a prescrição aquisitiva, também chamada de a usucapião (BRASIL, 1981).
O Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 6287/SC, RT 49/352 assim conceituou: “o usucapião é a aquisição do domínio pela posse ininterrupta e prolongada: são condições para que ele se verifique a continuidade e a tranquilidade”. Na ótica de Cura Grassi (2017) no ordenamento jurídico Argentino, a usucapião é tratada como prescrição aquisitiva no art. 1897 do Código Civil e Comercial/2015 que cita a prescripción adquisitiva como “La prescripción para adquirir es el modo por el cual el poseedor de una cosa adquiere un derecho real sobre ella, mediante la posesion durante el tempo fijado por la ley”.
Deste conceito se extrai, em linhas gerais, a conclusão de que o cidadão tem o direito de adquirir a propriedade de um bem móvel ou imóvel, que não seja público, caso tenha a posse destes, por um lapso de tempo, de forma ininterrupta, a qual não foi contestada.
O ordenamento argentino classifica a prescrição aquisitiva em: 1. prescrição aquisitiva breve (art. 1898, CC e C), condicionada a justo título e boa fé e a posse por 10 anos e a sentença é declaratória. 2. prescrição aquisitiva larga (art. 1899, CC e C). Nesta não se exige justo título e boa-fé. Posse prolongada e contínua. O prazo é de 20 anos e a sentença é constitutiva.
No Chile são duas modalidades. Para Cura Grassi (2017) a usucapião ordinária não prevê justo título e boa-fé (art. 1507, CCC), mas a posse regular e continua de 5 (cinco) anos para os imóveis; e a usucapião extraordinária que não exige título e o prazo é de 10 (dez) anos (art. 2509, do Código Civil Chileno).
No sistema brasileiro as espécies da usucapião são diversas, como bem delimitou a jurista Maria Lúcia Guimarães Cardoso (2016): Extraordinária (art. 1238, caput, Código Civil Brasileiro de 2002 – CC/2002) com posse contínua, mansa, pacífica de 15 anos, sem justo título e boa fé e no parágrafo único se a destinação atender a função social da propriedade o prazo é mitigado para 10 anos, ]desde que o possuidor tenha como sua moradia habitual ou realizado obras ou serviços de caráter produtivo. Ordinária (art. 1242, caput, CC/2002), posse contínua, mansa e pacífica, prazo de 10 anos, justo título e boa fé. No parágrafo único é diminuído para 5 (cinco) anos se for aquisição onerosa do imóvel com registro regular posteriormente cancelado e que tenha estabelecida moradia, com investimentos de interesse social e econômico.
Pode-se dizer que é uma espécie de aquisição por aquele que foi vítima do abandono de lar, que tem a posse direta de imóvel urbano próprio, até 250 m², que teve a posse por dois anos ininterruptamente e sem oposição, de forma exclusiva e utilizou o bem para moradia de sua família, cuja propriedade dividia com ex-cônjuge ou ex-companheiro. Os requisitos para a aquisição da propriedade por meio da usucapião familiar são:
Lapso temporal de dois anos, esse prazo é a grande inovação da Lei nº 12.424/11, pois este prazo para aquisição da propriedade é o menor de todos os outros previstos para usucapir. Esse prazo há de ser ininterrupto. Como toda lei que entra em vigor discussões cercam sobre o início desse prazo, vários doutrinadores já explicam que a lei não pode surpreender o proprietário e nem ao menos trazer insegurança jurídica, como assim entende Farias e Rosenvald, (2017), ao dizer que o prazo de dois anos começa a contar com o advento da lei ocorrida em 16/06/2011. Veja-se que com a entrada em vigor da Constituição de 1988 essa forma de contagem foi adotada, bem assim com a publicação da Lei nº 10.257/01.
Em relação à usucapião familiar o imóvel é do casal e o requisito da posse é atendido pelo cônjuge ou companheiro, vítima do abandono do lar, de forma direta, com poderes de proprietário, isso após o decurso do prazo de 2 (dois) anos. Percebe-se que na usucapião familiar é peculiar que a posse seja direta, exclusiva para sua moradia e de sua família, sem oposição, e que não possua outro imóvel, seja urbano ou rural.
O imóvel urbano deve ter até 250 m², segundo o Art. 1240–A do Código Civil a metragem máxima do imóvel a ser usucapido é de 250 m². E não poderia ser diferente, pois a intenção do legislador é beneficiar família de baixa renda com o pensamento voltado à função social da propriedade.
Como requisito específico tem-se o “Abandono do lar e da família”, ou seja, separação de fato. Sobre a questão vamos recordar o texto do Art. 1240-A, do Código Civil Brasileiro “[...] cuja propriedade divida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar [...]”. Várias são as críticas doutrinárias sobre a exigência do requisito do abandono do lar por um dos cônjuges ou companheiros. Nesse tópico não vamos aprofundar os comentários, pois mais adiante os postos controvertidos da usucapião familiar serão esmiuçados.
No momento é importante destacar que o requisito do abandono do lar trouxe à baila a culpabilidade na separação a tempos abolido no ordenamento jurídico do direito de família, como Art. 317 do Código Civil de 1916, revogado pela Lei nº 6.515/77, que previa o abandono voluntário do lar conjugal durante 2 (dois) anos, como causa do antigo desquite. Hoje o abandono do lar não impõe culpa e não gera punição na dissolução do casamento.
Porém, ao se instituir no Código Civil Brasileiro, o requisito do abandono do lar, como motivo da perda da propriedade em favor de um dos cônjuges, a culpa pelo fim da união novamente passou a ser abordada e a prova do abandono abrirá discussão de quem deu causa a justificar a atitude, tornando ainda maior a tormenta da separação e até mesmo impossibilitando a conciliação, já que no interregno de dois anos, para se evitar a perda da propriedade, haveria de se adiantar a formalização da separação, com partilha de bens, etc, o que colabora com o processo que põe fim a relação que poderia ser retomada.
Ultrapassada toda a problemática que o direito de família traz em seu bojo, posto que regula relações humanas de afeto profundo, fato é que o requisito do abandono do lar é exigido para usucapir bem de propriedade anteriormente comum ao casal.
A construção do instituto da usucapião familiar teve como principal objetivo a proteção das famílias de baixa renda, mulheres beneficiárias do Programa Minha Casa Minha Vida instituído no Brasil em 2009 pelo Governo Federal, como dito alhures, e que eram abandonadas pelos maridos ou companheiros. O espírito do legislador foi o de salvaguardar os princípios inerentes à família, assim compreendidos a dignidade da pessoa humana, igualdade entre cônjuges e companheiros, a função social da propriedade, direito de propriedade e liberdade.
O direito à moradia é espécie do gênero direitos sociais previstos no Art. 6o da Constituição Federal do Brasil. Segundo Lenza (2011), “o direito à moradia busca consagrar o direito à habitação digna e adequada”, já a propriedade é um direito individual e coletivo e está prevista no Art. 5o, XXII, da CF no capítulo dos Direitos Fundamentais.
A importância do direito à moradia na usucapião familiar se nota da estipulação do prazo, 2 (dois) anos, o menor na classificação do instituto. O legislador teve a preocupação em proteger o cônjuge abandonado e sua família ao preservar a dignidade daqueles que moram no imóvel e não tem outro para morar, permitindo ainda que este tenha a propriedade e com isso se sinta seguro. Há um entendimento de que se em 2 (dois) o cônjuge ou companheiro abandonou o imóvel nele não tem mais interesse, ao passo que o cônjuge ou companheiro que ficou no bem tem a necessidade de nele permanecer.
No espeque do grandioso princípio da dignidade da pessoa humana, o princípio da liberdade contempla o direito dos cônjuges ou companheiros viver da forma que lhe aprouver, com quem quiser, no tempo que quiser, sem que com isso tenha que assumir culpa com relação às suas escolhas, daí a controversa dos que criticam a usucapião familiar quando atrai a discussão da culpa para se resolver o direito de usucapir.
É evidente a necessidade de se analisar o direito de família a partir da constituição, a necessidade de constitucionalização desse ramo do direito privado, afinal grande parte do direito civil e do próprio direito de família esta na Constituição que abarcou os temas sociais juridicamente relevantes para garantir-lhes efetividade.
4. ABORDAGEM DOUTRINÁRIA E JURISPRUDENCIAL
Ao iniciar a abordagem doutrinária a usucapião familiar como uma modalidade de usucapião especial urbana, entretanto, com algumas questões controversas. Também denominada de usucapião pró-moradia (GONÇALVES, 2017, p. 295), usucapião especialíssima (MÁRIO, 2017, p. 151) e usucapião por abandono do lar conjugal (MORAES MELLO, 2017, p. 203), alguns autores definem, limitam, caracterizam os elementos principais, e apenas poucos autores, muitas vezes em artigos específicos sobre o tema, é que se desdobram numa análise um pouco mais profunda, às vezes com opiniões contraditórias.
Porém, Gonçalves (2017, p. 295), vai além, e traz algumas reflexões interessantes, como o percentual da propriedade pertencente à cada cônjuge, ou as causas que levaram ao abandono do lar conjugal. Sendo assim, o referido autor relembra que não há distinção legal entre os percentuais que cabem a cada um dos condôminos para a eficácia do dispositivo, ainda que o percentual do cônjuge abandonado seja bem inferior em relação ao montante do cônjuge que deixou o lar.
Hoje, não se pode restringir o benefício do instituto da moradia concedido pela usucapião familiar apenas a família no molde tradicional, até porque a sociedade brasileira não mais se comporta assim, e o nosso direito já há algum tempo aceita a diversidade familiar e o casamento homoafetivo é celebrado de forma livre nos cartórios, bem como, desde a Constituição Federal de 1988, a união estável tem a mesma proteção conferida à família.
Por outro lado, Farias e Rosenvald (2017, p. 462), tecendo comentários sobre o instituto da usucapião familiar, critica a questão do abandono do lar de forma injustificada, por entender que tal requisito retoma a discussão já superada acerca da culpa para a separação conjugal/divórcio, desde a Emenda Constitucional nº 66/2010.
Claramente, o supra referenciado autor discorda em seu posicionamento da ausência de profundidade do requisito “abandono de lar” na lei em apreço, manifestando claramente que a presença desse requisito retoma ultrapassadas discussões acerca do mérito da culpa na separação conjugal.
Nesse sentido, para fins de esclarecimento do requisito do abandono de lar, o referido autor ressalta a importância do Enunciado nº 595 da VII Jornada de Direito Civil, quando anuncia que, “O requisito ‘abandono de lar’ deve ser interpretado na ótica do instituto da usucapião familiar como abandono voluntário da posse do imóvel somado à ausência da tutela da família, não importando em averiguação da culpa pelo fim do casamento ou união estável”. O exposto revogou o Enunciado nº 944.
O Enunciado acima mencionado, como destaca Gonçalves (2017) fruto da VII Jornada de Direito Civil, mostra-se bem-vindo, superando contundente preocupação demonstrada não somente pelo autor supra referenciado, mas também por inúmeros outros doutrinadores e aplicadores do Direito. Sendo assim, para caracterização do requisito do “abandono do lar”, não se questiona, portanto, a culpa pelo término do relacionamento conjugal, mas tão somente a saída voluntária do imóvel somada a ausência da tutela da família, que, conforme os demais requisitos, continuou residindo no imóvel, o que passa, portanto a se entender não somente como um simples “abandono de lar”, mas sim como “abandono familiar”, num conceito mais amplo.
No tocante à jurisprudência, sobre a usucapião familiar ainda não há entendimento uníssono, e isso se justifica por tratar-se de lei recente, cuja repercussão ainda não foi concretizada de forma sólida nem habitual em nossos Tribunais. Desse modo, no tocante ao prazo bienal como requisito legal de comprovação de posse do imóvel para o requerente da usucapião familiar, assim posicionou-se o Tribunal de São Paulo:
USUCAPIÃO - Familiar - Prazo bienal - Art. 1.240-A do Código Civil - Extinção do feito porque não implementado o lapso determinado em lei - Prazo que já deve estar cumprido quando do ajuizamento da ação - Hipóteses que, embora admitam tal facilitação, não podem ser acolhidas nesta espécie de usucapião, em que tão curto é o prazo aquisitivo, de apenas dois anos – [...] - Sentença mantida - Recurso desprovido”. (Apelação Cível Nº: 00123601720138260032, SP 0012360-17.2013.8.26.0032, Sétima Câmara de Direito Privado, Tribunal de Justiça de SP, Relator: Mendes Pereira, Julgado em 14/07/2014).
De igual modo, o Tribunal de Sergipe também reconheceu o lapso temporal e demais requisitos necessários para a usucapião familiar, no julgado abaixo transcrito:
As provas arregimentadas ao processo corroboram de forma segura para constatação da posse pela requerente no lapso temporal legalmente exigido, com a finalidade de moradia, portanto, restam evidenciados os requisitos necessários para aquisição do título por usucapião.” (TJ-SE - Apelação Cível: AC 2010208834 SE, Relator(a) Des. Ricardo Múcio Santana de Abreu Lima, 2010).
Em sentido contrário, demonstrando que o posicionamento jurisprudencial ainda mostra-se controverso, e ressaltando as contradições peculiares ao instituto, segue transcrição de julgado que manifesta posicionamento diverso em relação ao companheiro:
Direito Civil. União Estável. Imóvel Adquirido Durante Período de Convivência. Perda da meação pelo companheiro. Art. 1.240-A. Aplicação analógica. Companheira vítima de violência doméstica e familiar. Inaplicabilidade. Partilha necessária. Segundo dispõe o Art. 1.725 do Código Civil, reconhecida a união estável, aplica-se o Regime da comunhão parcial de bens. Não comprovado, na hipótese, os requisitos para usucapião nos termos do art. 1.240-A, em especial o Abandono do Lar e a posse sem oposição, inviável aplicação analógica deste dispositivo à companheira anteriormente vítima de violência doméstica e familiar a partir da Interpretação dos justos objetivos da Lei Maria da Penha, [...].” (TJ-DF - Apelação Cível: APC 20120310272384 DF 0026595-41.2012.8.07.0003. Relator(a) Carmelita Brasil, 03/07/2013).
Percebe-se, portanto, que no tocante a usucapião familiar, a jurisprudência ainda caminha para a consolidação de entendimento uniforme, o que evidentemente demandará tempo, considerando a lei bastante recente, bem como a falta de interpretação uníssona dos desdobramentos dos seus requisitos legais.
5. USUCAPIÃO FAMILIAR: QUESTÕES CONTROVERSAS
O instituto da “Usucapião Familiar” como é cediço é uma norma recente que merece ser aprofundado, destaca-se alguns aspectos deste instituto jurídico, onde é abordada a Lei que originou o artigo que foi acrescido ao Código Civil Brasileiro (BRASIL, 2011), trazendo também suas peculiaridades, finalidade e também as polêmicas e/ou controvérsias que giram em torno do tema. Outro ponto importante a se destacar é a possibilidade da aplicação da Usucapião Familiar em Uniões Homoafetivas.
A Usucapião Familiar é ainda um tema pouco abordado pela doutrina brasileira, visto tratar-se de Lei recente, conforme aventado no escopo deste trabalho. Pode se verificar que a principal controvérsia é versada sobre o “abandono de Lar”; “culpa” e possível “Inconstitucionalidade”.
Verificamos a literalidade da expressão “abandono de lar” acrescido no artigo do Código Civil, o qual é considerado como alvo de incoerências, o problema reside no fato de o assunto poder ser tratado em dois âmbitos diferentes, tanto o Direito de Família, quanto os Direitos reais, a depender da interpretação dada ao mesmo, há divergências também quando o assunto é avanços e retrocessos da inserção dessa expressão no artigo 1240-A do Código Civil. Diante do exposto, faz necessário saber quais as implicações da interpretação literal do termo “abandono do lar” no artigo pode provocar e a suas possíveis inconstitucionalidades.
Assim, estabelecendo uma conexão entre tal artigo e os princípios constitucionais, bem como expor o nexo existente entre a Emenda Constitucional 66/10 (BRASIL, 2011) e o Usucapião Familiar que supostamente motiva a atribuição de sanção patrimonial à um dos cônjuges durante o processo de separação, que acaba por acarretar a ideia de culpa na relação conjugal, apresentando argumentos que corroboram com tal afirmação e posições que afirmam que o Usucapião Familiar não deve ser interpretado com base no abandono da família e sim do imóvel em si.
Esguarde-se que o debate acerca da nova modalidade de Usucapião criada pelo artigo supracitado estaria então em uma “via de mão dupla”, uma vez que por um lado a lei visa garantir a segurança para o cônjuge que ficou no imóvel, regularizando a situação da posse e adquirindo a sua propriedade, por outro lado ela faz ressurgir uma ideia já superada pelo Direito de Família, que seria a tão comentada culpa quanto à dissolução do matrimônio, visto que a intervenção do Estado no processo de separação foi consideravelmente reduzida com o advento da Emenda Constitucional 66/10.
Além da atribuição de culpa, outro ponto de suma importância, versa sobre o prazo exíguo de 02 anos, para perda da propriedade do imóvel para o cônjuge que cessou a posse, atribuindo uma sanção injusta caso seja levado em conta os reais motivos para tal feito. Neste diapasão, pode-se estabelecer a primeira violação da modalidade de usucapião aos princípios constitucionais, visto que a própria Constituição Federal, no inciso LIV (BRASIL, 2011), diz que ninguém será privado dos seus bens sem o devido processo legal, destarte, observando os requisitos para que ocorra a perda de propriedade do cônjuge que “abandonou o lar”, conclui-se que estes são requisitos fracos e arbitrários pra um instituto que tem efeitos que afetarão potencialmente a vida de todos os envolvidos.
Com base em tais argumentos observa-se que o artigo estudado, dá uma grande margem para interpretação, contrariando todos os princípios relacionados com a máxima clareza da lei, para que a ela não seja atribuído juízos de valor a ponto de provocar inúmeros conflitos jurisprudenciais.
Sabe-se que a Emenda Constitucional 66/10 (BRASIL, 2011) revolucionou o divórcio, tornando este muito mais célere, dispensando requisitos prévios para sua formalização. É cediço que com o progresso e atualização da vida urbana, o Estado viu-se em dispensar, com o advento desta emenda a ideia de culpa, visto que não há motivos para o divórcio ter força sancionatória, deixando claro que o Instituto do casamento tem uma natureza jurídica meramente contratual.
Como inicialmente asseverado, há duas tangentes para este Tema: 1)Versa sobre a questão familiar, qual seja: a relação entre a usucapião familiar e ideia de culpa no divórcio, já extinta pela Emenda Constitucional 66/10, destarte existe um dualismo entre aqueles que acreditam no efetivo retrocesso causado pela usucapião familiar, e aqueles que afirmam que inexiste qualquer relação deste com o direito de família. A primeira corrente se baseia no argumento de que a usucapião familiar causou um evidente retrocesso, ao permitir que o poder judiciário interfira no momento da dissolução do casamento através do abandono voluntário do lar, causando uma sanção para quem o faz.
Por outro lado, na 2) apresenta o fato de que não existe qualquer sanção patrimonial para aquele que abandonou o lar voluntariamente, há apenas uma consolidação do posicionamento do cônjuge que se manteve no imóvel, visto que pode-se dizer que a usucapião familiar em nada de relaciona com o direito de família e sim com os direitos reais, pois o abandono não diz respeito ao lar conjugal e sim ao bem a ser usucapido, dessa forma, uma vez que tem previsão legal no art. 1.275 inciso III, o abandono pode sim ser uma das causas da perda de propriedade.
Diante desses os posicionamentos tão antagônicos por abrangerem áreas tão distintas do direito, é certo que independentemente da corrente a ser adotada, a usucapião familiar gerou mais conflitos e duvidas do que soluções, visto que se trata de um artigo repleto de lacunas, que precisam ser preenchidas com eficiência e urgência. Outro tema controverso insurge-se no tocante a aplicação da usucapião familiar em uniões estáveis e homoafetivas.
Neste contexto, frisa-se que a usucapião familiar se aplica tanto em relação ao casamento, quanto em relação à união estável. Ainda, podemos afirmar que também se aplica nos casos de união homoafetiva, haja vista o texto da lei não ser claro, assim abrange a todos.
Neste sentido, aplica-se o artigo 1.240-A do Código Civil às uniões homoafetivas. Conforme fora deliberado no STF no julgamento da ADI 4277 e da ADPF 132/RJ que “interpreta-se o artigo 1723 do Código Civil conforma a Constituição Federal para estender à união homoafetivas os mesmos consectários jurídicos da união estável” (FARIAS, ROSENVALD, 2017, p. 406).
Dessa forma, uma vez que já foi legalizado e afirmado possível o enquadramento de união estável nas relações homoafetivas, conclui-se que é possível a usucapião familiar. Além do pronunciamento do STF, tem o entendimento do CNJ em seu Enunciado n. 500, quando o mesmo diz que “a modalidade de usucapião prevista no artigo 1.240-A do Código Civil pressupõe propriedade comum do casal e compreende todas as formas de família ou entidades familiares, inclusive homoafetivas.”
6. CONCLUSÃO
Com a dinâmica social e a formação de novos arranjos familiares há a necessidade de adequação normativa a realidade vivenciada. Um grande avanço legal neste sentido foi a criação da modalidade de usucapião por abandono de lar, garantindo àquele que ficou desamparado pelo cônjuge, na maioria das vezes sem esperar tal atitude de seu companheiro, e que não tem condições financeiras, muitas vezes nem psicológicas, de superar e sustentar a situação do abandono junto aos filhos.
Inicialmente, a usucapião familiar foi criada no intuito de beneficiar as pessoas mais carentes de direitos sociais, baseado no projeto “Minha casa, minha vida”, cônjuges ou família que não tem outro lugar para morar. Por isso, o prazo prescritivo é o mais curto em comparação com as outras modalidades de usucapião, pois, tem que se levar em consideração a urgência de um direito social. Assim, a usucapião familiar é um novo instituto criado para ratificar a previsão Constitucional, a saber, a uma moradia digna e adequada.
Todavia, não vislumbrou o Legislador, nas controvérsias com o Advento da Usucapião Familiar, criada a partir da lei nº 12.424/11 e acrescentada no Código Civil em seu art. 1.240 – A. Que, acabou atingindo um fim diferente do que era esperado. Incialmente buscava-se proteger as famílias que não tinham uma estrutura financeira significativa, tutelando o direito do cônjuge que fora abandonado, bem como da família como um todo.
O Código Civil brasileiro, os princípios ganham fundamental importância, eis que a atual codificação utiliza tais regramentos como linhas mestres do Direito Privado. Muitos desses princípios são cláusulas gerais, janelas abertas deixadas pelo legislador para o preenchimento, para complementação por aquele que opera o Direito. Ou seja, o próprio legislador, por meio desse sistema aberto, delegou parte de suas atribuições, para que o aplicador do direito, praticamente crie o direito. A seguir exibe-se a abordagem doutrinária e jurisprudencial do tema em estudo.
É evidente que esse tipo de situação pode ser facilmente vista na vida cotidiana, é comum ver homens, em sua maioria, deixando a casa onde antes vivia com sua família, de modo que a mulher acaba tendo que prover o seu sustento, assim como dos filhos, que usualmente ficam com a mãe.
Destarte a finalidade da Usucapião Familiar é nobre, e visa proteger essa família, que fora abandonada, e ficou na posse do imóvel, de posteriormente ter tal direito questionado por conta de uma reinvindicação inesperada daquele (a) que outrora abandonou o lar de maneira voluntária.
Levando-se em consideração esses aspectos é de suma importância apontar que apesar do motivo pelo qual foi criado, o instituto estudado resultou em interpretações que atestam a sua completa inconstitucionalidade, justamente por causa da letra do artigo no qual ele se encontra disposto. Sendo assim, o problema não está na Usucapião Familiar, e sim na redação do art. 1.240 – A, que não previu com clareza, os requisitos, os efeitos e as consequências da Usucapião Familiar.
Resta-se então buscar adotar as intepretações que mais se adequam à realidade, deixando, portanto, a literalidade de lado, pois caso artigo seja empregado em sua forma literal, resultará em uma série de conflitos e litígios, deixando para os Julgadores atestarem a forma adequada.
O presente trabalho buscou alcançar todos os objetivos propostos no estudo da Usucapião Familiar, deste seu conceito, princípios, aplicações, doutrina, julgados, bem como apontando as controvérsias geradas pelo uso da expressão “abandono de lar” na composição do artigo que regula tal instituto, quanto a apreciação do nexo existente entre a Emenda Constitucional 66/10 e a Usucapião Familiar que supostamente motiva a atribuição de sanção patrimonial à um dos cônjuges durante o processo de separação, que acaba por acarretar a ideia de culpa na relação conjugal.
Assim, forçoso concluir que se afigura controversa a fixação da competência para o julgamento da ação de usucapião familiar, tendendo, entretanto, a doutrina e a jurisprudência consagrar como competente o juízo de família pelas razões expostas, não sendo absoluto podendo ser na esfera cível em matéria de direito reais.
Por fim, apesar de se tratar de questão conflituosa, acredita-se que gradativamente restará consolidado o reconhecimento da possibilidade da usucapião familiar, não só no Brasil, mas como em outros países e que no futuro a questão a ser analisada em cada caso concreto ater-se-á apenas ao fato de estarem ou não preenchidos os requisitos necessários para tanto, sem que se questione sobre sua constitucionalidade, e que, esse direito esteja, tão somente, protegendo o mais vulnerável na situação do abandono.
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