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Licença maternidade: um paradoxo normativo
RESUMO: Este despretensioso trabalho pretende tecer críticas aos fundamentos da legislação que concede licença-maternidade e demonstrar que, da forma como este direito é estabelecido no Brasil, embora soe protetivo, enseja riscos à igualdade de gênero na seara trabalhista, com reflexos nas relações sociais, na medida em que reforça o estereótipo do modelo familiar em que à mulher se reserva o papel de cuidadora, enquanto ao pai, o de provedor. Tal concepção cria barreiras à emancipação da mulher na sociedade contemporânea, pois, além de reforçar mitos antropológico-religiosos, cria obstáculos à contratação da mão de obra feminina. Diante desse cenário, as mulheres vêm empreendendo sua luta por reconhecimento cada vez mais ampliada para se estabelecerem como par na vida social, com o intuito de deixarem de ser vistas apenas como mães, e passarem a ser consideradas também como trabalhadoras e provedoras do lar, repartindo os afazeres com os companheiros de forma justa. Assim, busca-se apresentar uma solução para a questão, trazendo um modelo de licença parental que seja neutra quanto ao gênero, e não crie situações de desvantagem para algum sexo ou para outros tipos de arranjos familiares.
INTRODUÇÃO
Tradicionalmente, a divisão sexual do trabalho privilegiou o homem em detrimento da mulher. A elas cabia principalmente o trabalho doméstico, e mesmo com a sua inserção no mercado de trabalho, principalmente após a revolução industrial, aquela tarefa continuou sendo de responsabilidade quase que exclusiva da mulher.
Durante o período histórico em que se deu a Revolução Industrial, preponderava o afastamento do Estado das relações privadas, e a mão de obra foi duramente explorada em ambientes insalubres e mediante péssimos salários, sendo que quanto à feminina, a situação era ainda pior. Diante desse contexto criado pela Revolução Industrial, os Estados viram-se obrigados a agir, e, com o objetivo de reduzir as desigualdades entre os sexos, criaram políticas afirmativas para as mulheres.
As primeiras normas protetivas ao trabalho feminino surgiram na Europa, em meados do século XVII, em geral restringindo o trabalho das mulheres em locais considerados nocivos, o que trouxe reflexos negativos para essas medidas afirmativas, visto que acabaram por excluir mulheres de diversos postos de trabalho.
Em 1842 a Inglaterra proibiu o trabalho das mulheres em subterrâneos. Em 1844, foi limitada sua jornada de trabalho a dez horas e meia, devendo aos sábados, terminar antes das 16:30 horas.
Não tardou que a França e a Alemanha seguissem esse exemplo. Na França, em 1848 surgiu uma lei que restringia o trabalho feminino nas minas subterrâneas. Ainda na França, a Lei de 1874, protegendo os trabalhadores não se aplicava à mulher operária, o que sucedeu a partir de 1892. Esta Lei, aliás, decorria das recomendações da Conferência de Berlim, em 1890, sobre a proibição do trabalho feminino na industria.
Na Alemanha, o Código Industrial, de 1891, também se ocupou do problema, fixando algumas normas mínimas. Posteriormente a suíça disciplinou essa espécie de trabalho ao promover a conferencia de Berna (1905), com o temario em que se incluía a proibição do trabalho noturno das mulheres (ROCHA, p. 09).
Um grande exemplo de direito protetivo à mulher que traz reflexos negativos, e que constitui o enfoque principal deste trabalho, é o benefício da licença-maternidade, que assegura à mulher o direito de se afastar das atividades laborais, assegurada a estabilidade no emprego e preservada sua remuneração, quando do nascimento de um filho.
O benefício tem por objetivo proteger a gestante e seu bebê, impedindo que um fato biológico – a mulher é dotada da capacidade gestar o filho – funcione como fator de discriminação e provoque desvantagens no mercado de trabalho.
Porém, esse instituto, da forma como foi estabelecido no Brasil, bem como em outros países, parece não ser adequado à sua finalidade principalmente quando comparado a modelos de outros países, pois privilegia uma forma tradicional de organização da família, em detrimento de outras combinações igualmente legitimas, e pode trazer reflexos negativos para a mulher tanto no âmbito trabalhista, quanto nas relações sociais.
É preciso, então, averiguar quais riscos a licença-maternidade, da forma como é estabelecida no ordenamento jurídico brasileiro, enseja para a afirmação da igualdade de gênero.
1. A AFIRMAÇÃO HISTÓRICA DOS DIREITOS DAS MULHERES
Segundo alguns historiadores, desde as sociedades primitivas, havia uma diferenciação do trabalho do homem e o da mulher. “Aos homens eram confiadas a caça e a pesca, e à mulher a coleta de frutos, evoluindo para cultura da terra” (PEREIRA, 2005, p. 29).
Na Antiguidade, para as mulheres predominavam as atividades agrícolas, competindo a elas, além disso, “o cuidado com o rebanho, fiação, confecção de utensílios domésticos e das vestimentas, além do trabalho com a casa, alimentação e criação dos filhos, (...) que não era reconhecido e nem valorizado” (PEREIRA, 2005, p.29).
A autora Emília Pereira afirma que “por largo período, a mulher (não escrava) esteve afastada do processo produtivo próprios às sociedades, circunscrita aos afazeres domésticos. Não trabalhava, pois, na direta produção social, mas no âmbito interno da família” (2005, p. 27).
No passar dos séculos elas começaram a trabalhar em tapeçarias, joalharias, mas a agricultura ainda era o principal ofício (ROCHA, 1991, p. 7).
Mesmo com a passagem para a idade média e a transformação no modo de produção, a situação jurídica da mulher permaneceu a mesma. “Se admitida para trabalhar, a mulher jamais alcançava uma posição de destaque, sendo considerada a vida inteira como aprendiz, quer nas oficinas, quer no lar pelos maridos” (PEREIRA, 2005, p.29).
Na segunda fase da Idade Média, no início de sua decadência, as profissões permitidas para as mulheres aumentaram. Entre os séculos X e XIV, grande parte dos ofícios já era acessível para os dois sexos, contudo as discriminações quantos aos direitos decorrentes do trabalho começaram a aumentar. No final do século XIV, as mulheres em geral ganhavam três quartos da remuneração dos homens (ROCHA, 1991, p.8).
Com a Revolução Industrial, a mulher começou a ocupar novos postos, sendo introduzida em larga escala nas fábricas, devido às suas habilidades manuais, úteis para tecelagem e bordado, num momento de desenvolvimento de máquinas que exigiam menos esforço físico e maior qualificação do trabalhador. Houve, nesse ponto, uma decadência da mão de obra masculina.
A Revolução Industrial trouxe, portanto, a disputa sexual do trabalho e os salários ínfimos pagos às mulheres foram fator determinante para a preferência pela contratação de mão de obra feminina (ROCHA, 1991, p. 09).
Assim afirmam Matos e Gitahy, (2007, p. 76)
Com a chegada do capitalismo moderno, o trabalho da mulher foi um dos setores mais sacrificados da sociedade. Cresceram as profissões ditas femininas, desvalorizadas e sem prestígio: engomadeira, lavadeira, bordadeira. Trabalhavam como domesticas sem nenhuma lei que regulamentasse esse tipo de trabalho.
Nessa época, os abusos do liberalismo econômico foram intensos, suscitando protestos em prol de direitos trabalhistas.
Foi nesse contexto, na Europa, que surgiram as primeiras normas reguladoras do trabalho feminino. A Inglaterra, pioneira, proibiu o trabalho feminino em subterrâneos em 1842 e limitou sua jornada de trabalho em 1844. A França restringiu a mão de obra das mulheres em minas subterrâneas em 1848 e a Suíça proibiu o trabalho noturno da mulher no ano de 1905 (ROCHA, 1991, p. 9).
Contudo, foi com o advento do Tratado de Versalhes que a questão passou a receber a atenção das nações envolvidas. Passou-se a regulamentar a duração, as condições de insalubridade ou periculosidade do serviço, a idade e as condições fisiológicas da mulher, como proibição do trabalho no período pré e pós parto (ROCHA, 1991, p. 9 e 10).
Todos esses direitos, ao serem concedidos às mulheres, representaram uma medida de proteção que se tornou excessiva, pois trouxe como reflexo a restrição da mão de obra feminina à diversos ofícios. Léa Calil explica que (2007, p. 52)
O direito do trabalho da mulher passou de uma fase de proteção alguma à mulher trabalhadora até chegar ao seu extremo, um período marcadamente protetivo, que começou a título de proteção, excluindo a mulher de inúmeras atividades e, assim, negando-lhe postos de trabalho.
Portanto, percebe-se que as garantias concedidas às mulheres com o pretexto de reduzir as desigualdades e que à época foram consideradas adequadas para este fim, ao passar do tempo foram percebidas como empecilhos para a contratação da mão de obra feminina, o que demanda revisão dos pressupostos destes direitos.
Percebe-se, então, que as mulheres vêm há muito tempo lutando por direitos que reflitam seu reconhecimento na sociedade, um reconhecimento como sujeitos de direitos iguais aos homens. No entanto, em cada momento histórico as demandas dessa luta por reconhecimento são diferentes, e vão continuar sofrendo transformações à medida que valores da sociedade também vão mudando. Um perfeito exemplo disso é a licença-maternidade.
2 SOBRE A LICENÇA MATERNIDADE
2.1 ORIGEM
A licença-maternidade tem origem no contexto de reconhecimento das vicissitudes fisiológicas, mas também sociais, das mulheres e de consequente concessão, a elas, de direitos trabalhistas específicos, o que se deu na primeira metade do século XIX, a partir do Tratado de Versalhes e das conferências internacionais do trabalho realizadas pela Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Este direito surgiu como uma forma de proteção para a gestante e também para o seu filho. Como afirma Calil (2007, p. 59), “a maternidade foi, por muito tempo, usada como argumento para que a mulher não trabalhasse, já que deveria ficar em casa cuidando dos filhos”.
No entanto, por necessidade financeira, abandono da família pelo companheiro ou outros diversos fatores, muitas mulheres jamais tiveram a opção de largar o emprego para que pudessem cuidar dos filhos e, portanto, tinham que manter a rotina de trabalho mesmo grávidas ou logo após o parto, o que sem dúvidas era prejudicial tanto para a mãe quanto para a criança.
Ainda, com a Revolução Industrial e a massificação da mão de obra feminina, o argumento de que as mulheres não poderiam trabalhar porque deviam cuidar da prole ficou ainda mais fraco. Surgiu, portanto, a necessidade de garantir a elas direitos protetivos à maternidade no contexto do trabalho.
A principal diferenciação biológica dos sexos com relevância para a área trabalhista é a gestação, por isso acreditou-se que seria necessário conceder benefícios diferenciados para assegurar a proteção da mulher no seu emprego. Um desses benefícios é a licença-maternidade, que dá ênfase à dedicação da mulher aos filhos e aos cuidados especiais nos primeiros meses de vida.
Mas não é só. Além da questão biológica, o fator ideológico foi de grande relevância para a criação da licença maternidade, pois a relação entre gêneros está enraizada em concepções distorcidas e preconceituosas que pré-estabelecem vocações e obrigações sem levar em conta as particularidades de cada indivíduo.
Na visão de Juliana Cleto (2014, p. 39),
alegar que a mulher detém um período de licença consideravelmente maior em comparação ao homem baseando-se pelo critério biológico é contribuir para a manutenção da ideologia corrente e ao mesmo tempo negá-la, ao se afirmar que tudo decorre de uma questão natural - a criação inicial dos filhos seria, portanto, nessa visão, atribuição exclusiva da mãe.
Nesse sentido, uma análise da origem da licença maternidade pautada em argumentos puramente biológicos é simplista, pois deixa de considerar a forte influência ideológica que vangloria o papel maternal da mulher. Não se pode perder de vista que, como expõe Juliana Cleto (2014, p. 39):
As relações entre gêneros vêm acompanhadas de uma ideologia velada, que promove a discriminação e a separação de vocações e obrigações - cria-se o indivíduo para que este atue de forma preestabelecida por construções sociais, assim como se esperam dele atitudes condizentes com o seu gênero.
Assim, as mulheres já nascem absorvendo informações que as limitam, sendo um exemplo a crença de que a mulher que deve cuidar do âmbito privado, enquanto o homem se volta para a vida pública.
Isso é claramente verificável quando percebe-se que as principais brincadeiras das meninas em tenra idade envolvem cuidado de bonecas ou realização de tarefas domésticas. Enquanto isso, os meninos são incentivados a brincarem nas ruas.
Ressalta-se que a defesa da igualdade de gênero não nega a existência de diferenças biológicas, mas propõe a dissociação de qualquer preconceito que imponha diferenças culturais e comportamentais inerentes aos sexos.
Portanto, a Licença Maternidade foi resultado da necessidade de amparo à mulher nos períodos de gestação e pós parto, mas também da visão de que a mulher é mais responsável pelo cuidado com a prole do que o homem.
2.2 REGULAÇÃO DO DIREITO NO BRASIL
A licença-maternidade, no Brasil, reflete a cultura sexista presente na sociedade, a qual preserva preconceitos que têm sido superados em outros países.
Trata-se de norma constitucional, regulamentada pela CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas). Segundo a Carta Magna Brasileira, a gestante tem direito à licença- maternidade de 120 dias: “Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: XVIII - licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias” (BRASIL, 2005, p. 10).
Segundo as leis, portanto, a mulher que engravida não pode ser demitida e receberá o seu salário integralmente no período em que estiver afastada, o que não ocorre com os homens. Trata-se do único benefício previdenciário que não se subordina a nenhum teto, correspondendo à remuneração integral da empregada, como prevê o art. 72 da Lei n. 8.213/91 (BRASIL, 2015, p.1540). A regra não se aplica aos aos homens, pois a cultura preponderante entende que, como provedor da família, o homem não deve se ausentar do trabalho.
A gestante pode se afastar a partir do 28o dia antes da data do parto, notificando a data de início ao empregador por meio de atestado médico, como prevê o artigo 392, § 1º da CLT. Caso necessário, a licença pode, ainda, iniciar-se 2 semanas antes, se houver necessidade médica (BRASIL, 2015, p. 914).
Em casos de aborto espontâneo ou não criminoso, previstos em lei (comprovado por atestado médico), a licença é de duas semanas. Já para aqueles que adotaram ou obtiveram guarda judicial, o período de licença é proporcional à idade da criança, de 30 a 120 dias, pela lei nº 10.421/2002 (BRASIL, 2002).
Há ainda a previsão de extensão do prazo trazido pela Constituição. Pela lei 11.770/2008, a pessoa jurídica que participar do programa empresa cidadã que ampliar a licença para suas funcionárias em até 60 dias possui incentivo fiscal (BRASIL, 2005, p. 1874).
Além disso, a gestante tem o direito à estabilidade no emprego desde quando é confirmada a gravidez até cinco meses após o parto, conforme estabelece o artigo 10 do ADCT (Ato das Disposições Constitucionais Transitórias), cujo conteúdo normativo é referenciado pelo artigo 391-A da CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas). Transcreve-se (BRASIL, 2005, p. 77):
Art. 10, ADCT. Até que seja promulgada a lei complementar a que se refere o art. 7º, I, da Constituição: (…)
II – fica vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa: (…)
b) da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.
Todos esses benefícios decorrentes do advento de um filho são exclusivos da mulher, o que demonstra que a sociedade, em termos culturais, não enxerga a importância do compartilhamento do ônus de cuidar e educar, refletindo esse pensamento na legislação brasileira.
3 A LICENÇA-MATERNIDADE E OS PREJUÍZOS PARA A CONCRETIZAÇÃO DA IGUALDADE DE GÊNERO
A Constituição da República Brasileira de 1988 estabelece como direito fundamental, no rol do seu artigo 5o, que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza [...]” (BRASIL, 2015, p. 06). Prevê ainda no inciso I do referido dispositivo que “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição” (BRASIL, 2015, p. 06).
A constituição concretiza assim o direito à igualdade de gênero, sendo tal igualdade material, uma vez que se tratando de desiguais, é necessário que haja medidas a fim de torna-los iguais.
No entanto, em se tratando de hipóteses em que não haja desigualdade, todos devem receber o mesmo tratamento, independente de gênero. Nesse sentido, José Afonso da Silva (2007, p. 217) defende que: “onde houver um homem e uma mulher, qualquer tratamento desigual entre eles, a propósito de situações pertinentes a ambos os sexos, constituirá uma infringência constitucional”.
Dessa forma, a licença maternidade, da forma como é estabelecida no Ordenamento Jurídico brasileiro, viola o principio da isonomia, vez que trata de forma distinta a relação da mulher e do homem com a prole, privilegiando o papel feminino de cuidadora, quando na realidade ambos possuem capacidade plena e dever de cuidado com os filhos.
Juliana Cleto defende que (2014, p. 42)
[...] o exercício do poder familiar, numa interpretação de acordo com o Direito, seria adequadamente realizável por ambos os pais, simultaneamente, mesmo porque se determinou, no atual Código Civil brasileiro, a competência dos pais quanto à criação e educação dos filhos menores (art. 1.634, inciso I).
Nesse sentido, não subsiste razão para o tratamento diferenciado imposto aos homens e às mulheres trabalhadores, no que tange ao nascimento de um filho.
Isso demonstra que os direitos trabalhistas protetores da maternidade, apesar de terem surgido como uma medida afirmativa para a proteção das mulheres e resguardo de seus filhos, da forma como atualmente é estabelecida no Brasil, apenas reforça a desigualdade de gênero no país. Como afirmam (PINHEIRO, GALIZA E FONTURA, 2009, p. 853):
Os direitos trabalhistas relacionados à proteção à família, além de terem cobertura bastante limitada, reforçam a concepção tradicional de família composta de um ‘homem provedor’ e uma ‘mulher dedicada aos cuidados do lar’, com sérios rebatimentos sobre a inserção feminina no mercado de trabalho e sobre a divisão sexual do trabalho reprodutivo.
Para aprofundar a reflexão, é preciso analisar quais são os direitos reprodutores da família, pois é justamente nesse contexto que a licença maternidade se insere.
À mulher gestante, pela CLT, são assegurados: estabilidade no emprego, licença-maternidade de 120 dias e intervalo para amamentação até que o filho complete seis meses de idade (BRASIL, 2015, p. 914).
Aos pais, é garantida a licença-paternidade de apenas cinco dias após o nascimento da criança, o que permite ao pai um tempo muito reduzido com a criança, se comparado à licença concedida à mãe. O salário-família é benefício de ambos e se trata de um auxílio financeiro por filho de até 14 anos de idade ou inválidos de qualquer idade, sendo o valor do benefício inversamente proporcional ao valor do salário mensal.
Ao analisar essa parte da legislação, fica evidente que ela reforça a ideia de responsabilidade maternal exclusivamente da mulher em detrimento do homem, ao invés de incentivar a divisão equânime da responsabilidade familiar de cuidado. Nesse ponto, aliás, a licença-maternidade é emblemática, oferecendo um exemplo privilegiado do problema que se pretende discutir no presente trabalho.
Isso porque ao conceder o afastamento apenas para as mulheres a função cultural da mulher como mãe cuidadora, principal responsável pelas funções domésticas e de cuidado aos filhos, é reforçada. Ao mesmo tempo, reproduz-se a ideia de que o pai é o provedor, possuindo responsabilidade secundária de cuidar dos filhos e com atuação externa, sem preocupações práticas com a rotina doméstica.
O autor Caleb Salomão afirma que (2013, p. 111) :
O Homem parece por vezes determinado a apegar-se obstinadamente à identidade masculina tradicional para impor à Mulher o ônus de suportar, por vezes exclusivamente, as obrigações próprias da vida doméstica, e em particular, das relacionadas ao cuidado dos filhos.
Complementando a ideia, o autor defende que (SALOMÃO, 2013, p. 109): “Toda mulher tem direito a receber de seu Homem diuturno e incansável apoio no desempenho das atividades essenciais à manutenção da harmonia doméstica, especialmente no que respeita aos cuidados com a prole”.
Sobre isso, Pinheiro, Galiza e Fontura (2009, p. 854) afirmam que “nesse contexto, nota-se que o aparato legal contribui no mínimo para a manutenção e a reprodução de uma realidade bastante desigual no que diz respeito à divisão sexual do trabalho reprodutivo”, o que hoje é visto de forma muito mais crítica do que à época do surgimento dos direitos protetivos à maternidade.
Na visão de François de Singly: (2003, p. 57)
[...] uma mulher deve ser tratada como um homem; não é por dar a luz que ela é forçosamente “mãe” [...] os laços conjugais unem os respectivos indivíduos enquanto o elo paterno diz respeito a um terceiro, à criança, que não pode defender-se da mesma maneira.
Ademais, não se pode deixar de mencionar que a Organização Internacional do Trabalho, desde 1981, já se preocupava com a questão ora debatida, e ao editar a Recomendação 165 sobre os Trabalhadores com Encargos de Família estabeleceu a necessidade de uma política nacional a viabilizar o emprego de tais pessoas sem que haja discriminação. Vejamos (Organização Internacional do Trabalho, 1981):
[...] dar condições a pessoas com encargos de família, que estão empregadas ou queiram empregar-se, de exercer o direito de fazê-lo sem estar sujeitas a discriminação e, na medida do possível, sem conflito entre seu emprego e seus encargos de família. (grifo nosso)
O documento recomenda, ainda, que: (Organização Internacional do Trabalho, 1981)
as autoridades e órgãos competentes em todo país devem tomar medidas adequadas para [...] promover a educação suficiente para estimular a distribuição dos encargos de família entre homens e mulheres e dar condições a trabalhadores com encargos de família de cumprir suas obrigações de emprego e de família.
Dessa forma, o organismo internacional se preocupa com os danos que os Encargos Familiares podem levar para a inserção no mercado de trabalho, sendo que esse problema atinge principalmente às mulheres. Daí a importância de se estabelecer a distribuição equânime dos encargos.
Outro ponto que deve ser destacado é que, além do reforço dos estereótipos do homem e da mulher no contexto da família, ainda há a reprodução do imaginário heteronormativo, não levando em consideração as evoluções da sociedade a nível familiar e os novos arranjos que são igualmente legítimos.
Hoje em dia, não é mais possível conceber família como uma entidade constituída apenas a partir da união de homem, mulher e filhos. Deve-se dar reconhecimento às unidades monoparentais ou homossexuais, por exemplo, nas quais é possível haver filhos sem que haja mãe, ou até às mulheres que dão à luz como “barrigas de aluguel”, circunstâncias que constituem um problema, visto que a legislação, culturalmente atrasada não regulamenta adequadamente esse tipo de situação.
Além disso, atualmente prevalece a ideia de que a licença-maternidade existe como uma forma de permitir o desenvolvimento de vínculos entre a mãe e o filho, e é por esse motivo que se entende o mesmo direito às mães ou pais adotivos.
Em decisão acerca do assunto, o Supremo Tribunal Federal proibiu que a lei fixasse prazo inferior de licença maternidade para as mães adotivas. Vejamos a ementa.
EMENTA DIREITO CONSTITUCIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. EQUIPARAÇÃO DO PRAZO DA LICENÇA-ADOTANTE AO PRAZO DE LICENÇA-GESTANTE. 1. A licença maternidade prevista no artigo 7º, XVIII, da Constituição abrange tanto a licença gestante quanto a licença adotante, ambas asseguradas pelo prazo mínimo de 120 dias. Interpretação sistemática da Constituição à luz da dignidade da pessoa humana, da igualdade entre filhos biológicos e adotados, da doutrina da proteção integral, do princípio da prioridade e do interesse superior do menor. 2. As crianças adotadas constituem grupo vulnerável e fragilizado. Demandam esforço adicional da família para sua adaptação, para a criação de laços de afeto e para a superação de traumas. Impossibilidade de se lhes conferir proteção inferior àquela dispensada aos filhos biológicos, que se encontram em condição menos gravosa. Violação do princípio da proporcionalidade como vedação à proteção deficiente. 3. Quanto mais velha a criança e quanto maior o tempo de internação compulsória em instituições, maior tende a ser a dificuldade de adaptação à família adotiva. Maior é, ainda, a dificuldade de viabilizar sua adoção, já que predomina no imaginário das famílias adotantes o desejo de reproduzir a paternidade biológica e adotar bebês. Impossibilidade de conferir proteção inferior às crianças mais velhas. Violação do princípio da proporcionalidade como vedação à proteção deficiente. 4. Tutela da dignidade e da autonomia da mulher para eleger seus projetos de vida. Dever reforçado do Estado de assegurar-lhe condições para compatibilizar maternidade e profissão, em especial quando a realização da maternidade ocorre pela via da adoção, possibilitando o resgate da convivência familiar em favor de menor carente. Dívida moral do Estado para com menores vítimas da inepta política estatal de institucionalização precoce. Ônus assumido pelas famílias adotantes, que devem ser encorajadas. 5. Mutação constitucional. Alteração da realidade social e nova compreensão do alcance dos direitos do menor adotado. Avanço do significado atribuído à licença parental e à igualdade entre filhos, previstas na Constituição. Superação de antigo entendimento do STF. 6. Declaração da inconstitucionalidade do art. 210 da Lei nº 8.112/1990 e dos parágrafos 1º e 2º do artigo 3º da Resolução CJF nº 30/2008. 7. Provimento do recurso extraordinário, de forma a deferir à recorrente prazo remanescente de licença parental, a fim de que o tempo total de fruição do benefício, computado o período já gozado, corresponda a 180 dias de afastamento remunerado, correspondentes aos 120 dias de licença previstos no art. 7º, XVIII,CF, acrescidos de 60 dias de prorrogação, tal como estabelecido pela legislação em favor da mãe gestante. 8. Tese da repercussão geral: “Os prazos da licença adotante não podem ser inferiores aos prazos da licença gestante, o mesmo valendo para as respectivas prorrogações. Em relação à licença adotante, não é possível fixar prazos diversos em função da idade da criança adotada”. (RE 778889, rel. Min. Roberto Barroso, Tribunal Pleno, DJe de 01-08-2016)
Assim, percebe-se que a importância deste direito não está ligada apenas à proteção física e psíquica da mãe e do bebê, mas também para que a mãe estabeleça laços afetivos com a criança.
Portanto, diante disso, conceder o benefício da licença apenas para a mãe – levando em conta que a licença paternidade de 5 dias é quase que insignificante frente aos 120 da materna – significa reconhecer como menos importante a atuação do homem como pai.
Ademais, a reafirmação legal dessas ideias que estão presentes no imaginário social acaba gerando outros problemas na hora da concretização da igualdade de gênero. Na seara trabalhista, ainda há um grande preconceito na contratação de mulheres, principalmente as recém-casadas. Na hora de contratar, a idade, o número de filhos e o estado civil da mulher são levados em consideração (ROCHA, 1991, p. 82).
As mulheres jovens, em idade fértil, serão objeto de discriminação por parte de empresas que não desejam arcar com encargos trabalhistas da gestante e que terão que contratar para substituir aquelas que ficarem grávidas
Para resolver o problema, houve uma tentativa do governo de subsidiar esse benefício por meio do INSS, incluindo essa prestação entre as devidas à previdência, prevista pela lei 6.136/1974 (BRASIL, 2015, p. 1350). Entretanto, tal medida não alcançou os escopos pretendidos, pois o empregador continua tendo que substituir a funcionária, que já é treinada, por outro novo destreinado, que será empregado temporariamente.
Valdenor Brito Júnior (2015) compartilha desta opinião e afirma que:
A licença-maternidade é custeada pela Previdência Social (uma vez que o empregador paga, mas desconta o valor dos recolhimentos que seriam feitos ao INSS), portanto, não gera um ônus em termos de pagamento, contudo, ao conceder um período de 120 dias de afastamento à mulher, sendo que o homem no máximo ausenta-se 5 dias (pela já mencionada licença-paternidade), isso também tem seu efeito em diminuir o emprego de mulheres em idade fértil em relação aos homens nessa mesma faixa de idade, ou de diminuir as promoções no emprego, uma vez que isso evitaria esse ônus que a empresa têm caso contrate e/ou promova mulheres que inexistiria no caso dela contratar e/ou promover homens.
Fica nítido, como expõe Emília Pereira, (2005, p. 75), que “o Mercado de trabalho descrimina a mulher grávida, mães com crianças pequenas ou até toda mulher com idade para contrair gravidez”.
Isso ocorre também pois acredita-se que a mulher é mais compromissada com os filhos e, em caso de doença, por exemplo, seria ela quem se ausentaria do emprego para levá-lo ao médico, ou que os homens estariam mais dispostos a trabalharem horas extras quando preciso, pois possuem menos compromissos domésticos. Segundo Brito Junior (2015):
Isso reforça um modelo de família baseado em uma divisão não igualitária das tarefas do lar mesmo quando ambos (pai e mãe) trabalham, e é justamente essa “dupla jornada” feminina que prejudica as perspectivas de emprego e de salário de muitas mulheres.
Essa situação faz com que os homens ainda sejam preferidos na hora da contratação em muitos casos. “Assim, a legislação, antes de funcionar como uma proteção à mulher e sua maternidade, é fator de descriminação, dificultando sua absorção no mercado de trabalho” (PEREIRA, 2005, p. 75).
Em consonância com esse pensamento, e a revelar o paradoxo, Regina Rocha conclui que “nem sempre as discriminações consideradas favoráveis à mulher revertem, na prática em seu favor” (ROCHA, 1991, p. 84).
Pode-se citar ainda um outro reflexo da forma como a legislação brasileira, bem como a própria sociedade, entende a divisão sexual dos deveres familiares. Como expõe Singly (p. 78, 2011), “é mais frequente as mães terem a guarda dos filhos, tanto por vontade pessoal, como por decisão judicial”, o que reflete o grau de distorção cultural.
Essa visão é compartilhada por Adriane Reis de Araújo e Tânia Fonteneli-Mourão (2007, p. 77), segundo as quais “a naturalização da divisão por sexo do trabalho e dos papéis sociais atribuídos a cada sexo influencia não apenas o senso comum, mas também a análise científica e as decisões judiciais”.
Singly confere a este fenômeno, duas explicações: primeiro seria que “o investimento mais fraco dos homens depois do divórcio ou da separação reflete o seu descomprometimento anterior, tendo este origem na definição da identidade masculina demasiado centrada no trabalho profissional” (SINGLY, 2011, p. 79).
Trata-se do “mito do provedor” segundo o qual o homem deve prover a família financeiramente, enquanto a mulher cuida da casa. Já a segunda causa seria, segundo ele “produzida ou confirmada pela instituição judicial que, em nome do interesse da criança, confia mais frequentemente a guarda das crianças à mãe, se a guarda compartilhada não puder ser posta em prática” (SINGLY, 2011, p. 80).
Dessa forma, “os movimentos em torno da condição paterna, os ensaios sobre a dominação das mães dão crédito à tese do papel demasiado importante da mãe, seja porque ela se impõe, seja porque ela deve gerir a ausência do pai” (SINGLY, 201, p. 80).
Portanto, a licença maternidade e a estabilidade em virtude da gravidez, medidas que foram fruto de uma luta da mulher por reconhecimento, e que à época pareciam adequadas, hoje se mostram como um reconhecimento distorcido, pois ao mesmo tempo em que beneficiam a mulher, trazem reflexos negativos para as trabalhadoras no mercado de trabalho.
4 A IMPERATIVA AMPLIAÇÃO DO RECONHECIMENTO
A questão da licença maternidade, debatida durante este trabalho, pode ser analisada a partir da teoria da luta por reconhecimento, abordada por Axel Honneth e Nancy Fraser em suas obras.
Segundo essa teoria, toda luta por direitos, é no fundo, uma luta por reconhecimento. Neste sentido, faz-se mister destacar o entendimento de Axel Honnet do que ele chama de “luta coletiva por reconhecimento” (2011, p. 257):
Trata-se do processo pragmático no qual experiências individuais de desrespeito são interpretadas como experiências cruciais típicas de um grupo inteiro, de forma que elas podem influir, como motivos diretores da ação, na exigência coletiva por relações ampliadas de reconhecimento.
Na visão de Honnet, uma vez que os indivíduos são desrespeitados como integrantes de certo grupo, de forma que o desrespeito atinge a todos, a insurgência deste contra a forma de desrespeito é revestida de uma luta por reconhecimento “social”. Nas palavras do autor (HONNET, 2011, p. 258)
O surgimento de movimentos sociais depende da existência de uma semântica coletiva que permite interpretar as experiências de desapontamento pessoal como algo que afeta não só o eu individual mas também um círculo de muitos outros sujeitos (2011, p. 258)
Nesse sentido, é perceptível que os confrontos sociais e qualquer forma de conflito, no fundo é constituído do mesmo modelo de uma luta por reconhecimento (HONNET, 2011, p. 260).
Dessa forma, baseando-se nos ensinamentos de Axel Honnet, é possível afirmar que as reivindicações feitas há séculos pelas mulheres surgem a partir de uma forma de desrespeito à sua condição de gênero e passam a ser orientadas e revestidas de um esforço pela inserção social como forma de serem reconhecidas tal qual um par na vida social.
Neste ponto, a teoria da luta por reconhecimento nos leva a compreender melhor a necessidade do reconhecimento para a parceria plena na integridade social.
Nancy Fraser explica a ideia a partir do reconhecimento das perspectivas particulares das minorias. Segundo a autora, a teoria do “reconhecimento” traduz-se na ideia de que os grupos minoritários não precisam se adequar às normas culturais majoritárias ou dominantes na tentativa de estabelecerem a igualdade (FRASER, 200, p. 113).
Na sua visão, os grupos majoritários não podem ditar as regras, mas sim devem reconhecer as particularidades das minorias. É exatamente o que buscam os grupos considerados socialmente excluídos ao reivindicarem direitos. Nesse sentido, é possível afirmar que as mulheres lutam para serem reconhecidas na sociedade como sujeitos de direitos e deveres iguais aos homens.
Nancy Fraser propõe uma visão alternativa acerca da teoria do reconhecimento. Ela busca tratar o assunto a partir do que ela chama de modelo de status, segundo o qual o não reconhecimento representa a subordinação social, ou seja, quando há impeditivos para a participação no meio social como pares. Segundo a autora (FRASER, p. 122, 2007):
Para o modelo de status, [...] o não reconhecimento é uma questão de obstáculos externamente manifestos e publicamente verificáveis para a posição de algumas pessoas como membros efetivos da sociedade. E esses acordos são moralmente indefensáveis quer eles corrompam ou não a subjetividade dos oprimidos.
Nesse sentido, não é necessário realizar esforços para perceber os obstáculos manifestos e publicamente verificáveis impostos às mulheres, sendo a questão da licença maternidade, abordada neste trabalho, apenas um exemplo.
Complementando essa ideia, a autora afirma que : “o que exige reconhecimento não é a identidade específica do grupo, mas o status dos membros do grupo como parceiros plenos na integração social” (FRASER, 2007, p. 117).
Portanto, a ideia de uma licença maternidade que privilegia o modelo tradicional de família e valoriza o papel da mulher cuidadora, as impede de participar como parceiras plenas na integração social, vez que a norma valoriza o papel do homem como provedor, em detrimento da mulher.
A partir dessa reflexão é claramente perceptível que as mulheres vivem numa constante luta pelo status de serem reconhecidas como pares na vida social, tanto na esfera profissional quanto na esfera familiar. Nancy Fraser afirma que (2007, p. 118):
o não-reconhecimento surge quando as instituições estruturam a interação de acordo com a normas culturais que impedem a paridade da participação. Os exemplo incluem as leis matrimoniais que excluem as uniões entre pessoas do mesmo sexo considerando-as ilegítimas e perversas; as políticas de bem-estar social que estigmatizam as mães solteiras de parasitas sexualmente irresponsáveis; e as práticas de policiamento como os “delineamentos raciais” que associam as pessoas racializadas à criminalidade. Em cada um desses casos, a interação é regulada por um padrão institucionalizado de valor cultural que constitui algumas categorias de agentes sociais como normativas e, outras, como deficientes ou inferiores. [...]. Em cada caso, o resultado é negar a alguns membros da sociedade o status de parceiro plenos da interação, de capazes de participar no mesmo nível dos demais.
A questão sobre o reconhecimento, para Nancy Fraser, é uma questão de justiça, na medida em que não é justo que a determinado grupo seja negado o status de “parceiro pleno na interação social”, devido a padrões sociais institucionalizados. Ela defende que (p. 125, 2007):
uma teoria da justiça deve ir além dos padrões de valor cultural para examinar a estrutura do capitalismo. Ela deve considerar se os mecanismos econômicos que estão relativamente desacoplados das estruturas de prestígio e que operam de uma forma relativamente impessoal impedem a paridade da participação na vida social.
Assim, é possível afirmar que o Ordenamento Jurídico ao estabelecer a licença de 120 dias para as mães e 5 dias para os pais impede a paridade de participação de ambos, tanto no seio familiar quanto no competitivo mercado de trabalho.
Nessa lógica, Axel Honnet defende que (2011, p. 155)
A reprodução da vida social se efetua sob o imperativo de um reconhecimento recíproco, porque os sujeitos só podem chegar a uma autorrelação prática quando aprendem a se conceber, da perspectiva normativa de seus parceiros de interação, como seus destinatários sociais.
Assim, para Axel, a reciprocidade é premissa necessária para que os indivíduos se identifiquem como parceiros e dessa forma reconheçam uns aos outros como sujeitos autônomos e com particularidades, o que é de extrema necessidade para a concretização da divisão equânime de tarefas no seio familiar.
É possível afirmar que, da forma como este direito é normatizado no Brasil, ele confere à mulher um papel social distinto ao do homem, vez que concretiza o estereótipo da mãe cuidadora e do pai provedor, como já explicado anteriormente.
Tal situação é vista hoje como uma forma de reconhecimento distorcido, pois ao passo que confere à gestante o direito de se afastar do emprego e manter o salário durante este período, ela cria uma distinção no âmbito dos deveres familiares, conferindo maior responsabilidade maternal à mulher.
No entanto, apesar de o instituto da licença maternidade sofrer críticas neste sentido, ela nem sempre foi vista como prejudicial às mulheres. À época da concessão deste direito, acreditava-se que finalmente seriam reconhecidas como mães e também como trabalhadoras; porém atualmente, esta forma de reconhecimento não é mais satisfatória.
Isso demonstra que a luta por reconhecimento ocorre em ondas, ou seja, sofre mudanças ao longo da história, vez que o entendimento subjetivo de “ser reconhecido” depende do contexto histórico, e as demandas sociais sofrem alterações.
Nessa sentido, a licença maternidade que foi considerada uma grande conquista para as mulheres, hoje já é vista como uma forma de reconhecimento distorcido e também como instrumento de preservação de preconceitos. Assim, atualmente, a luta por reconhecimento, neste ponto, reveste-se de outras pretensões.
Sem admitir regredir em qualquer direito, a mulher, que ocupa uma posição desprivilegiada com os reflexos da licença-maternidade, hoje trava uma luta por reconhecimento que não apenas a possibilite ser mãe e trabalhadora, mas que reconheça a família, independente do seu arranjo, como uma entidade de direitos e deveres que devem ser compartilhados igualmente entre todos os membros.
A solução quanto a qual será a forma para estabelecer o reconhecimento depende dos obstáculos que eles encontram para se estabelecerem como pares sociais, como defende Fraser (2007,p. 127): “Assim, a(s) forma(s) de reconhecimento que a justiça exige em qualquer caso depende(m) da(s) forma(s) de não reconhecimento a serem remediados”.
Portanto, para Fraser, uma luta por reconhecimento só é legitima se forem respeitadas certas premissas, quais sejam (p. 133, 2007):
os reivindicadores devem mostrar, primeiro, que a institucionalização das normas culturais da maioria nega a eles paridade participativa, e, segundo, que as próprias práticas, cujo reconhecimento eles buscam, não negam a paridade participativa - a alguns membros do grupo assim como aos não-membros.
Portanto, a luta travada pelas mulheres para serem reconhecidas como pares da vida social é legítima e necessária na medida em que existem regras – como a licença-maternidade – que institucionalizam uma sociedade patriarcal, e sendo os homens e mulheres reconhecidos como sujeitos de direitos e deveres iguais, não haverá negativa de reconhecimento, nem às próprias mulheres nem aos homens, como será visto no tópico a seguir.
5 EXISTEM ALTERNATIVAS AO MODELO BRASILEIRO? O EXEMPLO SUECO E A CONCEPCAO DE LICENCA PARENTAL
Existem vários caminhos para o reconhecimento de especificidades e dos direitos que lhe devem ser assegurados às mulheres para sua melhor posição no mercado de trabalho. Nesse contexto, é importante entender que o modelo adotado no Brasil é apenas uma dentre diversas possibilidades.
Assim, não se defende, no presente trabalho, o retrocesso ao estágio da igualdade meramente formal, em que não eram reconhecidos direitos próprios do gênero feminino. Discutem-se, sim, os pressupostos filosóficos e sociológicos, teóricos e pragmáticos para afirmação consistente desses direitos, a fim de que não reforcem os estereótipos e a desigualdade que se pretende combater. Direitos não podem ser vistos como concessões instrumentais da manutenção do status quo diferenciador e redutor da mulher na sociedade.
Nesse contexto, vale citar, a título de exemplo, um modelo diverso do brasileiro, que apresenta um potencial interessante, do ponto de vistas das pretensões femininas na atualidade. Trata-se do modelo sueco de licença-parental, que rompe com estereótipo familiar representado pelo modelo vigente no Brasil. Como defende Valdenor Brito Junior (2015)
Talvez a maneira mais bem-sucedida de projetar políticas que ajudam famílias trabalhadoras mas evitando consequências não pretendidas, pessoas que estudam o tema dizem, seja fazê-las neutras em relação ao gênero. Em lugares como a Suécia e Quebec, por exemplo, políticas de licença parental encorajam tanto homens quanto mulheres a gastar o tempo fora por um novo bebê.
Nesse país, a mulher conta com um auxilio gravidez - Havandeskapspenning, mas que é um afastamento remunerado de no máximo 50 (cinquenta) dias, dependendo das condições físicas da mulher e das da função que ela exerce (FARIA, 2002).
Se uma mulher grávida tem um emprego que é fisicamente estressante, ela tem o direito de solicitar sua transferência para outra função. Se o empregador não puder fazer a transferência ou se a capacidade de trabalho da mulher estiver reduzida em um quarto ou mais, ela tem o direito a uma licença remunerada (ou auxílio gravidez) de no máximo cinquenta dias.
Mas o direito mais importante é o auxílio para os pais - Föräldrapenning. Leia-se aqui “pais” no sentido amplo da palavra, qual seja pai ou/e mãe. Esse instituto sueco concede aos pais uma licença remunerada de até 15 meses, com faculdade de escolha da data de gozo, até que a criança termine o primeiro ano da escola compulsória. Faria explica que (2002):
Após o nascimento do filho ou a adoção de uma criança que ainda não tenha dez anos, os pais têm direito a uma licença remunerada de até um máximo de 450 dias (quinze meses). (…) Os pais podem escolher quando tirar a licença remunerada, mas o benefício não é mais concedido após a criança ter terminado o primeiro ano da escola compulsória, o que geralmente acontece aos onze anos de idade.
A licença ainda pode ser acrescida de mais 180 dias por cada filho múltiplo. Como assegura Faria (2002), “os pais têm direito a mais 180 dias de licença no caso de gêmeos, a mais 360 dias no caso de trigêmeos e assim por diante”.
Vale ressaltar também que a forma de usufruir desse direito pode variar: O beneficiário pode se licenciar por tempo integral, por meio expediente ou apenas durante um quarto da jornada diária de trabalho.
Mas a questão mais importante desse instituto é que quando se trata de pais que possuem a custódia conjunta da criança cada um tem direito à metade do total de dias da licença remunerada. No entanto, os pais possuem autonomia para acordar como será dividido o tempo de afastamento. De acordo com Faria (2002)
Se um dos pais não tiver condições de cuidar da criança, devido a doença, incapacidade física ou outras razões similares, o outro tem direito a todo o período de licença remunerada. Também é possível transferir a licença remunerada para o parceiro(a), garantindo-se, entretanto, trinta dias que são intransferíveis; essa transferência deve ser formalizada junto ao escritório do seguro social mais próximo. Pais solteiros têm direito a todos os 450 dias de licença.
Este modelo quebra o paradigma da tradicional divisão do trabalho reprodutivo (mulher cuidadora e homem provedor), porque, no campo social, favorece uma maior convivência do pai com a criança e aumento da responsabilidade quanto aos cuidados. Já no campo trabalhista, a licença-maternidade deixa de ser uma desvantagem na hora da contratação apenas da mulher, pois passa a ser um benefício de todos os trabalhadores.
Portanto, o instituto da licença-parental é um modelo mais adequado para a finalidade da igualdade de gênero. Contudo, a simples reforma legislativa é insuficiente para concretizar este objetivo, porque a mudança precisa surgir socioculturalmente, sendo a Lei um mero indutor de comportamento. É o que defende Valdenor Brito Junior (2015):
Uma boa parte desse trabalho teria de ser cultural: rumar em direção a um modelo de família mais igualitário, onde, se ambos os pais trabalham, ambos repartem mais igualitariamente as tarefas do cuidado das crianças e demais afazeres domésticos, equalizando as oportunidades de homens e mulheres no mercado de trabalho.
É papel da sociedade civil solidificar a tendência de divisão equânime dos afazeres domésticos, para que isso se reflita também dentro do próprio mercado de trabalho.
Cabe neste ponto destacar a importância do movimento feminista para mudança da mentalidade do grupo social, pois este movimento tem como objetivo a desconstrução de estereótipos e a concretização da igualdade de gênero em todas as instâncias da vida social.
Valdenor Brito Junior (2015) explica, a partir de um exemplo, que a existência da lei por si só não é capaz de provocar a mudança comportamental, vejamos:
A Espanha aprovou uma lei em 1999 dando aos trabalhadores com filhos mais jovens que 7 anos o direito de pedir por horas reduzidas sem medo de ser despedido. Aqueles que tomaram a vantagem disso foram aproximadamente todos mulheres.
Na próxima década, empresas foram 6% menos prováveis de contratar mulheres na idade fértil comparado com homens, 37% menos prováveis de promovê-las e 45% mais prováveis a rejeitá-las, de acordo com o estudo liderado por Daniel Fernándes-Kranz, um economista em IE Bussiness School em Madri. A probabilidade de mulheres em idade fértil de não ser empregada escala os 20%. Outro resultado: Mulheres foram mais prováveis de estar em contratos de emprego temporários de curto prazo, menos estáveis, que não são exigidos a prover tais benefícios.
“Uma das consequências não pretendidas da lei tem sido empurrar as mulheres para o segmento mais baixo do mercado de trabalho com empregos desprotegidos e de má qualidade, onde seus direitos não podem ser impostos”, ele diz.
Assim, observa-se que o direito, por vezes, não é capaz de, pura e simplesmente, criar novos comportamentos na sociedade, sendo apenas um indutor, restando para a sociedade o compromisso de se transformar culturalmente e dividir de forma igualitária as responsabilidades parentais.
CONCLUSÃO
Durante grande parte da história, houve uma divisão sexista do trabalho que afetou e afeta até hoje a vida das mulheres. Após um longo período de afastamento do Estado nas relações privadas, sem regulamentações no campo trabalhista, as mulheres sofreram muito com as péssimas condições de emprego e os baixíssimos salários.
Diante dessa situação, o Estado se volta à normatização das relações entre particulares e começa a criar medidas afirmativas para a proteção da mulher no mercado de trabalho e sua equiparação aos homens.
No entanto, tais medidas, ao longo do tempo, à exemplo da licença-maternidade discutida neste trabalho, demonstraram ensejar danos à igualdade de gênero, tornando-se uma forma de reconhecimento distorcida, pois criaram novos empecilhos à efetivação da igualdade de gênero.
Ficou demonstrado que a licença maternidade, como é atualmente instituída no Brasil, bem como em outros países, é também fator de discriminação quando possibilita que o empregador considere um problema uma funcionária licenciada.
Sobre essa questão, a teoria da luta por reconhecimento, abordada por Nancy Fraser e Axel Honneth, traz elementos importantes para a abordagem do tema, uma vez que se conclui que toda luta por direitos é uma luta por reconhecimento, e que esta só é legítima se respeitados certos pressupostos, quais sejam, a demonstração de que a institucionalização das normas culturais da maioria nega a paridade participativa, e que as práticas, cujo reconhecimento é almejado, também não negam a paridade participativa a qualquer sujeito.
Se não forem observados estes pressupostos teóricos e pragmáticos corre-se o risco de se criar uma norma protetiva capaz de prejudicar membros do próprio grupo ou do outro grupo, e que na prática não se reverta totalmente em benefício do público ao qual se destina. Foi exatamente o que ocorreu em relação aos direitos trabalhistas da mulher gestante.
Diante do problema envolvendo a licença-maternidade e as formas de discriminação que ela enseja a partir da forma como é atualmente estabelecida no Brasil, surge um novo modelo para enfrentar essa situação.
Os países nórdicos, a exemplo da Suécia, passaram a adotar a licença-parental como solução para o problema levantado acima, erigindo um novo paradigma no contexto da evolução dos direitos trabalhistas da mulher.
Tal modelo se fundamenta na maior autonomia do casal para acordar a forma como será dividido o tempo de licença para cuidar do filho, não deixando, como induz a Constituição brasileira, totalmente a cargo da mulher os compromissos com as crianças.
No contexto brasileiro, por sua vez, há de se destacar a necessidade de uma mudança sociocultural, para que a norma sirva como indutora de um comportamento e a sociedade o reproduza de forma natural.
A positivação de qualquer direito pode produzir efeito ambivalente, colocando em risco o que se pretende proteger, no caso, a igualdade de gênero no mercado de trabalho e no âmbito social.
Portanto, a sociedade, e em especial aqueles segmentos que operam no campo jurídico, devem atentar para os potenciais efeitos colaterais quando se decide institucionalizar certas condutas por meio de normas.
Nesse contexto, o presente trabalho propôs reflexões e novos rumos para a efetiva emancipação da mulher na sociedade contemporânea, o que dependerá da quebra de um modelo pré-estabelecido de família, e da divisão equânime de direitos e de deveres. Só assim será possível a afirmação da igualdade de gênero nas relações de trabalho no contexto do Estado Democrático de Direito.
Flávia Calmon Rangel Teixeira
Acadêmica de Direito na FDV- Vitória-ES
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